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Estudios sociales (Hermosillo, Son.)

versión impresa ISSN 0188-4557

Estud. soc vol.20 no.40 Hermosillo jul./dic. 2012

 

Artículos

 

Os Relatórios do Desenvolvimento Humano (RDHs) e o padrão de intervenção pública na área social: os desafios postos à forma de organização do Estado no Brasil

 

Los informes de desarrollo humano (RDH) y los métodos de la intervención pública en el área social: los retos enfrentados por la forma de organización del Estado en Brasil

 

The Human Development Reports (HDRs) and the Public Intervention Pattern in the Social Area: The Challenges Posed to the Form of State Organization in Brazil

 

Maria José de Rezende*

 

*Universidade Estadual de Londrina, en Paraná, Brasil

 

Dirección para correspondencia:
mjderezende@gmail.com

 

Fecha de recepción: noviembre de 2011
Fecha de aceptación: mayo de 2012

 

Resumo

Os RDHs sistematizam um conjunto de propostas que passam pela redefinição do padrão de intervenção do Estado na área social. Eles propõem modificações nas políticas voltadas para educação, saúde e saneamento. São propostas gerais que tentam apontar soluções comuns e viáveis para os diversos países da África, América Latina e Ásia. Os relatórios mostram, ao longo de centenas de páginas, exemplos de políticas sociais que têm sido implementadas em várias partes do mundo. Este estudo tem a finalidade de demonstrar tanto as sugestões de políticas sociais contidas nos RDHs, quanto as dificuldades que tais propostas encontram, no Brasil, onde o emperra-mento principal na redefinição das formas de intervenção na área social inscreve-se numa lógica política que não desmantela um modelo de transferência de rendas fortalecedor da concentração de recursos e de poder. Modificar essa orientação das ações do Estado é o maior desafio político posto aos segmentos (organizações da sociedade civil, lideranças políticas, movimentos sociais, associações, intelectuais e lideranças políticas) que lutam por um padrão de organização social mais inclusivo e igualitário.

Palavras-chaves: Desigualdade social, Estado, intervenção pública, mudança social.

 

Abstract

The HDRs systematize a set of proposals that undergo the redefinition of the state intervention pattern in the social area. They propose changes in policies for education, health and sanitation. These are general proposals that attempt to find common and viable solutions for several countries in Africa, Latin America and Asia. The reports show, over hundreds of pages, examples of social policies that have been implemented in various parts of the world. This study aims to demonstrate both the social policy suggestions contained in the HDRs, and the difficulties faced by such proposals in Brazil, where the main binding in the redefinition of forms of intervention in the social area, consists of a political logic that does not dismantle a model of income transfer which strengthens the concentration of resources and power. Changing the orientation of the State actions is the biggest political challenge posed to the segments (civil society organizations, political leaders, social movements, associations, intellectuals) that fight for a more inclusive and equitable pattern of social organization.

Key words: Social inequality, State, public intervention, social change.

 

Introdução

O, Relatórios do Desenvolvimento Humano (RDHs), publicados desde 1990, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, lidam com as possibilidades de avanços nos indicadores sociais (longevidade, renda e educação) dos países que compõem a África, a Oceania, a Ásia e a América Latina. Fazer melhorar tais índices é um desafio incomen-surável, uma vez que envolve uma multiplicidade de ações, de agentes, de instituições, de grupos, de organizações da sociedade civil e de lideranças políticas.

Vêm à tona no interior dos relatórios muitos dilemas sociais, econômicos e políticos, os quais são de diversas naturezas e matizes. As propostas para fazer progredir os Índices de Desenvolvimento Humano (IDH)1 dirigem-se a diversas áreas (saúde, educação, saneamento, moradia, urbanização) e enlaçam muitos agentes, tais como: Estado, sociedade civil, organizações não-governamentais (ONGs) entre outros.

Não é possível, no âmbito de um único artigo, abarcar as proposições dos RDHs em relação a todos os agentes envolvidos neste processo de fazer prosperar o combate a todas as mazelas sociais. Por isso, neste texto, será dada centralidade ao papel que é atribuído, pelos RDHs, ao Estado no processo de desenvolvimento humano. Este último tem como propósito "assegurar a liberdade, o bem-estar e a dignidade de todas as pessoas em todos os lugares" (A democracia na América Latina, 2004: 67).

Fica evidenciado que a noção de desenvolvimento humano inspira-se nas teses de Amartya Sen, que supõe

"um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam. Ela contrasta com as visões mais restritas, como as que identificam desenvolvimento com crescimento do PIB,2 aumento da renda per capita, industrialização, avanço tecnológico ou modernização. Essas cinco façanhas são obviamente importantíssimas como meios de expandir as liberdades. Mas as liberdades são essencialmente determinadas por saúde, educação e direitos civis"3 (Veiga, 200: 101).

Percebe-se, de imediato, que um dos maiores desafios que ganha proe-minência no interior dos RDHs diz respeito ao papel que o Estado deve desempenhar no processo de expansão do desenvolvimento humano. Desde os primeiros relatórios -ou seja, aqueles elaborados na década de 1990- ocorrem algumas oscilações concernentes ao que cabe ao Estado realizar como agente primordial e ao que ele deve fazer em parceria com os setores privados, ONQs, grupos voluntários e associações que compõem a sociedade civil. É muito frequente a utilização do termo governança quando os relatórios insistem que o Estado é um dos agentes líderes e não o agente único.

A proposta de governança pressupõe "redes intergovernamentais auto-organizadas" (Rhodes, 1997: 3). Por isso, os RDHs insistem na necessidade de formação de agentes capazes de organização e de construção de demandas por serviços públicos e por democratização das diversas instâncias de poder. Dá-se ênfase ao processo de geração de relações políticas mais transparentes e democráticas no âmbito local. A governança local seria, então, constituída por uma rede de agentes que participariam efetivamente da distribuição de recursos na área de saúde, educação, saneamento, moradia. Por isso, a defesa, nos RDHs (1991; 1992; 1993; 1995; 1997; 2002; 2003; 2004), da necessidade de construir e/ou expandir espaços de atuação de lideranças oriundas da sociedade civil. Os relatórios consideram essencial a desconcentração do poder no nível local. Seria este um passo rumo a uma democratização mais efetiva da aplicação dos recursos a favor dos interesses coletivos nos municípios e nas microrregiões.

Deve-se ter em conta que os RDHs apresentam parâmetros gerais acerca da possibilidade de os países irem construindo espaços mais democráticos de reivindicação e controle da aplicação dos recursos públicos. Não há como eles se aterem às especificidades de cada país no que diz respeito às chances reais de expansão de espaços públicos democráticos por onde possam fluir as demandas dos diversos grupos sociais.

Tanto os Estados como as sociedades possuem características muito distintas, por isso é necessário indagar o seguinte: Até que ponto é possível a um país, no caso deste estudo o Brasil, por exemplo, avançar no processo de desenvolvimento humano sem mudar, expressivamente, a orientação do padrão de intervenção do Estado na área social? Como, no Brasil, estão ganhando corpo, nas últimas duas décadas, espaços democráticos capazes de pressionar os dirigentes para uma atuação mais efetivamente voltada para os interesses públicos? De que maneira os vícios políticos (personalismo, clientelismo, populismo, corrupção moral, material e política) entranhados na sociedade brasileira têm impedido a formação de "redes intergoverna-mentais auto-organizadas" (Rhodes, 1997: 3) democraticamente?

No Brasil, há, ou não, possibilidade, conforme defendem os relatórios, de alcançar o "fortalecimento das capacidades criativas"? (RDH, 1990: 187). O que o predomínio dos interesses privados sobre o interesse público demonstra sobre isso? O que as práticas patrimonialistas que ainda vigem firmemente no interior das ações e procedimentos governamentais têm revelado acerca das impossibilidades de expansão das liberdades criativas a favor de outra forma de gerir os recursos do Estado?

O grande desafio que se coloca não só ao Brasil, mas também às diversas nações mencionadas pelos RDHs, é a dificuldade de "expandir as liberdades que temos (...), [pois elas] não só [tornam] nossa vida mais rica e mais desimpedida, mas também [permitem] que sejamos seres sociais mais completos, pondo em prática nossas volições, interagindo com o mundo em que vivemos e influenciando esse mundo" (Sen, 2005: 29). Essa interação tende a fazer prosperar melhores serviços sociais básicos para todos. Os relatórios consideram que é essa uma das formas de combater a pobreza absoluta e a miserabilidade, visto que "quando se gera mais educação, mais saúde, isso em si é uma eliminação da pobreza, pois pobreza não é apenas a baixa renda, também é analfabetismo, também é não ter tratamento médico quando necessário" (Sen, 2001: 12).

 

1. Que tipo de intervenção do Estado na área social os RDHs defendem?

Desde 1990 os RDHs têm feito diversas propostas de ação e de procedimentos, em prol do desenvolvimento humano, que demandam a atuação do Estado para a implementação, efetivação e continuidade dos serviços sociais básicos. Todavia, há algo que merece destaque no interior desses documentos: a sugestão de que não há um entendimento definitivo sobre qual seria o melhor sistema de deliberação e negociação (RDH, 1991: 69) para alcançar uma melhor forma de suprir os serviços públicos básicos na área de saúde, educação, saneamento, moradia e urbanização.

Em alguns momentos, os relatórios, no que se refere ao papel do Estado, ora indicam um tipo de ação e de procedimento, ora repensam e revêm as sugestões postas anteriormente. Um caso que ilustrou significativamente esse processo de reconsideração de suas próprias propostas pode ser encontrado quando se comparam, por exemplo, o RDH de 1990 e o de 2006. Neste há uma crítica àquele acerca da privatização dos serviços de saneamento sugerida como adequada dentro do primeiro relatório do PNUD. O RDH de 2006, editado 16 anos depois do primeiro relatório, considerava que era visível um enorme fracasso na política de privatização dos serviços de água e esgoto (Dagdeviren e Hailu, 2008: 1). O boletim chamado One Page do Centro Internacional de pobreza (CIP), ao comentar a situação da Zâmbia, um país africano, trazia a seguinte discussão:

"(...) A proporção da população com acesso a água potável tem reduzido de 72% em 1992 para 57% em 2002. A qualidade do acesso também tem deteriorado: aproximadamente 25% dos usuários perdeu seu abastecimento de água corrente na moradia e começou a depender de fontes públicas de água, poços, perfurações, rios, tanques e lagos" (Dagdeviren e Hailu, 2008: 1).

Percebe-se que, na década de 1990, parecia muito premente, no interior dos RDHs a urgência de uma tomada de posição por parte do Estado no que concerne as suas possibilidades de atender a população mais pobre. A pergunta era: Qual é a solução para os problemas de moradia, saneamento e água, se o Estado não pode prover os serviços básicos? Os relatórios não hesitavam em dizer que era necessário estabelecer parcerias com o setor privado. Contudo, havia, também, a seguinte orientação: para "criar a estrutura propícia para um desenvolvimento com uma cobertura mais ampla, devem melhorar a formulação e o manejo de políticas macroeconômicas, aumentarse a participação popular e fomentar-se a iniciativa privada" (RDH, 1990: 50).

Esse tipo de sugestão estará presente em todos os RDHs. Há uma compreensão de que a atuação mais contundente de diversos agentes da sociedade civil poderia ampliar o alcance dos serviços sociais básicos, isto porque, por um lado, o Estado poderia contar com a parceria de setores privados e, por outro, o Estado estaria, constantemente, pressionado por uma participação popular mais firme e controladora, o que faria com que os serviços sociais básicos chegassem aos mais empobrecidos. Para que isso ocorresse seria necessário

"descentralizar o poder e os recursos, transladando-os do governo central aos municípios. Em segundo lugar, devem gerar rendas municipais para que as cidades possam sufragar seus próprios gastos. Em terceira instância, há que desenvolver estratégias que permitam satisfazer as necessidades de vivência e infraestrutura urbana e prover assistência especial às comunidades pobres e aos grupos mais fracos" (RDH/1990: 187).

A discussão sobre descentralização do poder toma muitas páginas dos RDHs da década de 1990. Quase todas as propostas de reordenamento político e administrativo tinham como eixo central a necessidade de trasladar para os municípios uma parte expressiva de poder e de recursos. Os documentos entendiam que dessa maneira os processos de participação popular poderiam, de fato, efetivar-se e, assim, contribuir para a diminuição das mazelas sociais que eram agravadas pelo não-acesso à saúde,4 à educação, à moradia ao saneamento. As ações políticas dos segmentos populares os tornariam habilitados para alcançar esses direitos.

"A administração das cidades deve interessar-se muito mais em mobilizar a riqueza urbana em benefício de toda comunidade, manter e desenvolver a infraestrutura e as redes de serviços indispensáveis para as atividades urbanas e atender as necessidades do número crescente de cidadãos pobres" (RDH, 1990: 196).

O RDH de 1993 foi o que mais se dedicou à discussão sobre a necessária gestão compartilhada dos recursos públicos. O Estado teria de ser continuamente pressionado pelos segmentos sociais populares para responder, a contento, às demandas dos setores mais empobrecidos. A geração de melhores capacidades e habilidades econômicas, sociais e políticas é que transfiguraria a situação dos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos. O Estado, em razão da participação popular, se transformaria em um agente mais capaz de responder às demandas dos segmentos mais pobres.

"A participação significa que a pessoa intervenha (...) nos processos econômicos, sociais, culturais e políticos que afetam suas vidas. Em alguns casos a pessoa pode exercer um controle completo e direto sobre esses processos; em outros casos, o controle pode ser parcial ou indireto. O importante é que disponha de um acesso constante às tomadas de decisões e ao poder. A participação nesse sentido é um elemento essencial do desenvolvimento humano" (RDH, 1993: 25)

Desse modo, tanto o Estado como a sociedade se transformariam, visto emergirem mais agentes com capacidade quer de ação substantivamente voltada para beneficiar os mais pobres quer de controle dos recursos públicos que seriam empregados a favor dos serviços sociais básicos. O RDH de 1993 elogia algumas iniciativas de organização da participação popular que haviam sido implantadas na Ásia e na África subsaariana.5 Para os técnicos que prepararam o referido documento do PNUD, aquele era um modelo a ser seguido por outros países.

"Como a participação exige mais influência e mais controle, também exige um maior protagonismo em termos econômicos, sociais e políticos. Em termos econômicos, significa ter a capacidade para dedicar-se livremente a qualquer atividade desse tipo. Em termos sociais, significa a capacidade de intervir plenamente em todas as formas da vida da comunidade, independentemente de religião, cor, sexo, raça. E em termos políticos significa a liberdade de eleger e cambiar o governo em todos os níveis, desde o palácio presidencial até o conselho da aldeia" (RDH, 1993: 25).

A descentralização do poder seria, para o RDH de 1993, favorecedora de um maior controle dos gastos sociais. Essa é, sem dúvida, uma possibilidade que pode ou não se efetivar. Basta observar que, mesmo com certo grau de descentralização que tem sido implantado no Brasil após a Carta Constitucional, de 1988, não se conseguiu evitar e/ou coibir o desvio de recursos públicos que deveriam ser direcionados à saúde, à moradia, ao saneamento e à educação.

Quando se examinam os processos de corrupção que se têm desenvolvido localmente, vê-se que a descentralização não tem dado o resultado esperado. No Brasil, por exemplo, as poucas formas de controle do dinheiro público, tais como os conselhos municipais e os orçamentos participativos não têm conseguido cercear o processo de desvio de verbas que deveriam ser aplicadas nos serviços sociais básicos. Todavia, o RDH de 2003 afirmava que a descentralização6 era um antídoto, até mesmo, contra a corrupção.

"As reformas políticas, como a descentralização dos orçamentos e das responsabilidades pelo fornecimento de serviços básicos, colocam a tomada de decisão mais perto das pessoas e reforçam a pressão popular para a realização dos Objetivos do Milênio. Onde funcionou - como nalgumas zonas do Brasil, Jordânia, Moçambique e nos estados indianos de Kerala, Madia, Pradexe e Bengala Ocidental - a descentralização trouxe melhorias significativas. Pode levar a serviços governamentais que respondem mais depressa às necessidades das pessoas, à denúncia da corrupção e à redução do absentismo" (RDH, 2003: 2).

Os RDHs constroem quase uma idealização sobre a capacidade, habilidade e possibilidade da participação popular se constituir em fator efetivo de controle do dinheiro público. Eles não levam em conta o tipo de cultura política existente em cada país e/ou região, o tipo de procedimento político assentado, há décadas e séculos, em processos profundos de corrupção, cooptação, personalismos, populismos, clientelismos e abandono da causa pública. Observe-se como o RDH de 1993 lança um olhar panorâmico sobre os benefícios da descentralização. Visão geral de que ele tem plena consciência:

"Se supõe em geral que quando as administrações locais se encarregam da educação ou da saúde, por exemplo, utilizam os recursos com mais eficiência e eficácia, distribuem os benefícios de forma mais equitativa e em geral atendem com maior receptividade que os governos centrais as necessidades da comunidade local" (RDH, 1993: 80).

Essas discussões empreendidas pelos relatórios, no decorrer da década de 1990, abriam caminhos para a sedimentação de duas noções que vão estar cada vez mais presentes no interior dos RDHs, no limiar do século XXI: a de governança (a qual aparece como o norte do tipo de ação do Estado proposta pelos relatórios) e a de governação. Se a governança é realizada por meio de redes intergovernamentais que se articulam a partir de formas autônomas de organização, a governação, por sua vez, pode ser entendida como a conexão de ações cooperativas entre diversos agentes.

A governação está fundada, segundo Boaventura de Souza Santos, "em parcerias e outras formas de associação entre organizações governamentais, paragovernamentais e não-governamentais, nas quais o aparelho do Estado tem apenas tarefas de coordenação enquanto primus inter pares" (Santos, 2002, 37-8). A governação pode ser um modo de operacionalizar a governança. As duas noções são distintas, mas caminham, muitas vezes, juntas não somente nos RDHs, mas também no debate acadêmico.7 Veja-se, por exemplo, como os relatórios articulam esses dois conceitos:8

"Num mundo mais interdependente, a política e as instituições políticas são ainda mais importantes para o desenvolvimento humano. Por todo o mundo, as discussões sobre o desenvolvimento estão a dar mais ênfase às instituições e à governança. Esses debates concentram-se na eficiência das instituições públicas e nas regras para fazer funcionar os mercados e promover o crescimento econômico - desde o profissionalismo e a transparência dos sistemas fiscais à capacidade dos sistemas judiciais fazerem cumprir contratos comerciais. Essas questões são importantes para o desenvolvimento humano. Quando as instituições funcionam mal, as pessoas pobres e vulneráveis tendem a ser as que sofrem mais. Mas, tal como o desenvolvimento humano exige muito mais do que rendimentos crescentes, a governação para o desenvolvimento humano exige muito mais do que ter instituições públicas eficientes.9 A boa governação também exige a promoção de instituições justas e responsáveis, que protejam os direitos humanos e as liberdades básicas. (...) [Esse relatório] defende que os países só podem promover o desenvolvimento humano para todos quando tiverem sistemas de governo que sejam inteiramente responsáveis perante todas as pessoas - e quando todas as pessoas puderem participar nos debates e nas decisões que moldam a sua vida" (RDH/2002: 2-3).

Os relatórios procuram adjetivar a natureza da governança que eles estão defendendo. Trata-se de uma forma de organização de governo democrática. Somente ela pode desencadear ações favoráveis ao desenvolvimento humano. Sem liberdade política, os indivíduos ficam cerceados e sem possibilidades de externar suas reivindicações e demandas.10 Merece destaque o modo como os RDHs insistem na importância que tem a democracia para o desenvolvimento humano. Sem ela, não há possibilidade de expansão das habilidades e capacidades políticas favorecedoras de progressos duradouros e capazes de fazer prosperar as igualdades de oportunidades.

Os documentos procuram refutar todas as teses de que os governos autoritários realizam mais bem o desenvolvimento econômico, por isso, para os pobres, seria indiferente se o regime é autoritário e/ou democrático. Os RDHs procuram desmontar as argumentações que consideram a democracia um artigo de luxo para os países mais pobres. Percebe-se que há uma forte inspiração nas ideias de Amartya Sen que, no livro O valor da democracia, faz a seguinte afirmação:

"Os direitos políticos e civis oferecem para as pessoas a oportunidade de prestar atenção às necessidades gerais e demandar uma ação política adequada. A resposta de um governo ao sofrimento de sua gente depende em boa medida da pressão que se exerce sobre ele. O exercício dos direitos políticos (como o voto, a crítica e a contestação, entre outros) pode estabelecer uma diferença real e influir profundamente na atuação do governo em questão" (Sen, 2006: 66).

A ninguém interessa mais a democracia do que aos pobres, insistem os RDHs. Eles são os maiores beneficiados, a médio e longo prazo, com a vigência de procedimentos que expandem as oportunidades políticas e sociais. O crescimento econômico que resulta em bem-estar coletivo é somente aquele produzido dentro de um processo democrático, insistem os relatórios. Os mais pobres só têm a ganhar com o aperfeiçoamento das liberdades políticas e civis.11 As oportunidades somente podem ser expandidas em tais condições. Note-se o que afirma o documento do PNUD, do início da década de 2000:

"A governança democrática pode desencadear um ciclo virtuoso de desenvolvimento - na medida em que a liberdade política dá poder às pessoas para exercer pressão a favor de políticas que aumentem as oportunidades sociais e políticas, e na medida em que debates abertos ajudam as comunidades a moldar as suas prioridades. Da Indonésia ao México (...), iniciativas no sentido da democratização e da abertura política ajudaram a produzir este tipo de círculo virtuoso, com uma imprensa livre e um ativismo da sociedade civil fornecendo às pessoas novas maneiras de participar em decisões e em debates políticos. Dois exemplos proeminentes são a programação orçamental participada e a programação orçamental sensível ao gênero.12 Em Porto Alegre, Brasil, a participação dos cidadãos na preparação dos orçamentos municipais ajudou a formular a despesa, fazendo-a incidir em prioridades críticas de desenvolvimento humano (...). A programação orçamental sensível ao gênero, que examina as implicações dos orçamentos nacionais e locais na igualdade de sexos, é seguida em pelo menos 40 países. Na África do Sul, esses esforços prepararam os parlamentares para o exame minucioso das propostas orçamen-tais e levaram à inclusão da análise sensível ao gênero nos documentos políticos e a uma orientação mais eficiente da despesa pública" (RDH/2002: 3).

 

2. Desigualdades e padrão de intervenção pública na area social: Algunas difilcultades de o Brasil responder às exigências contidas nos RDHs

Os RDHs se constituíram num compêndio de sugestões que visam reorientar o modelo de intervenção do Estado na área social, nos países da América Latina, África, Ásia e Oceania. Não é possível dizer que o documento do PNUD desdenha do papel que o poder público ocupa na solução dos diversos problemas sociais. No entanto, há uma tentativa constante de alertar os governantes, lideranças da sociedade civil, movimentos políticos e sociais, entre outros, sobre o fato de que a forma de intervenção do Estado está, na atualidade, desafiada por mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais que devem ser levadas em conta quando se tenta implementar ações e procedimentos que objetivam atacar as debilidades no campo dos serviços de educação, saúde e saneamento, principalmente.

Tem-se muitas vezes a clareza de que os documentos do PNUD, em análise, não desejam ser confrontados com questões atinentes ao papel do Estado no processo de enfrentamento dos obstáculos estruturais. José Eli da Veiga (2011: 3) afirma que esse é o grande nó presente nas propostas dos organismos internacionais que elaboram sugestões para a diminuição da pobreza e das desigualdades sociais. Segundo ele:

"Não se percebe qualquer propensão [dos organismos internacionais] a encarar as necessárias 'grandes transformações estruturais das economias e das sociedades'. Isto é, as transformações globais e nacionais de caráter distributivo que nenhum setor da ONU, da OCDE,13 do FMI14 ou do BIRD15 ousaria sugerir ou aconselhar. Afinal, esse é o maior tabu nas reações internacionais, apesar das evidências de que as desigualdades atrofiam o bem-estar. (... ) Em suma, o mundo está num duplo impasse. O fatalismo de que as desigualdades são ossos demasiadamente duros para que possam ser roídos se combina à angustia de não se conseguir avançar" (VEIGA, 2011: 3) no sentido de um desenvolvimento humano sustentável.

Pode-se dizer que os RDHs sistematizam um conjunto de ações que devem ser implantadas na área social para que os Objetivos do Milênio (ODMs),16 definidos pela Declaração do Milênio (2000), sejam alcançados. Todas as metas postas pelos ODMs dependem de políticas públicas voltadas para o combate à fome, às epidemias, à miserabilidade e à mortalidade de mulheres e crianças. Todavia, os RDHs ressaltam que o Estado sozinho não tem como alcançar os diversos objetivos propostos. Kofi Annan, quando era secretário-geral da ONU, fazia a seguinte observação:

"Lamentavelmente, a 'aliança mundial para o desenvolvimento' é mais teórica que prática. Esta situação tem de mudar. Todos os agentes fundamentais de desenvolvimento -governos, setor privado, sociedade civil e pessoas que vivem na pobreza- devem iniciar um esforço verdadeiramente coletivo contra a pobreza que eleve o nível de vida e alivie os sofrimentos humanos" (Annan, 2006: 1).

Assim, o Estado tem, ainda, de estabelecer políticas para mobilizar outros agentes capazes de atuar em conjunto com ele. Isso pressupõe a existência de grupos habilitados, no interior da sociedade civil, para expandir e multiplicar as ações capazes de fazer avançar o combate às mazelas sociais. O RDH de 2003 faz as seguintes considerações:

"Grupos da sociedade civil - desde organizações comunitárias a associações profissionais, passando por grupos de mulheres e redes de organizações não governamentais (ONG) - têm um papel importante na (...) execução e acompanhamento do progresso em direção aos Objetivos do Milênio. Mas [alcançar tais metas tanto] exigem estados capazes e eficientes, que cumpram os seus compromissos de desenvolvimento [quanto] exigem mobilização popular para sustentar a vontade política de os atingir. Essa mobilização popular exige culturas políticas abertas e participativas" (RDH, 2003: 2).

Não há dúvida de que o déficit de democracia, a precariedade de formas de participação e de organização capazes de balizar a ação dos dirigentes e das lideranças políticas, a robustez dos procedimentos patrimonialistas,17 clientelistas e personalistas, no Brasil, dificultam, enormemente, o estabelecimento das ações sugeridas pelos RDHs. Em tais condições, avolumam as dificuldades de o Estado voltar suas atuações para a distribuição de renda, oportunidades e capacidades. Estando ele empenhado no atendimento de interesses de grupos (tecnocráticos, políticos, econômicos) particulares e não da sociedade como um todo, forma-se uma gama de dificuldades que obstam aos avanços nos três pilares do desenvolvimento humano (renda, longevidade e educação) garantidores da expansão do bem-estar social. Evidentemente, as sugestões de ações, que os RDHs fazem aos estados latinoamericanos, têm de ser problematizadas no âmbito dos avanços e empe-rramentos presentes nas últimas décadas.

Não só no Brasil, mas também na América Latina, assim como em diversas outras partes do mundo, muitos governantes não têm feito dos estados nacionais o lócus de medidas institucionais visando desconcentrar a renda e o poder; pelo contrário, eles têm tido participações ativas, ao longo de séculos, na fixação de mecanismos reprodutores e perpetuadores das inúmeras formas de desigualdades e exclusões. Por isso, não sem razão, vem de imediato à mente de muitos analistas, que se ocupam de entender as múltiplas formas de disparidades sociais, que seria, no mínimo controversa, a utilização da noção de welfare state para definir os padrões de intervenção pública na área social nos diversos países do continente.18 Isso leva à seguinte indagação: As noções de Estado de bem-estar podem ser empregadas para caracterizar quaisquer fases e/ou momentos pelos quais tenham passado as diversas nações latino-americanas?

Se não há qualquer consenso, entre os cientistas sociais, sobre como definir precisamente o Estado de bem-estar social, mesmo quando os técnicos e cientistas estão se referindo à caracterização de um padrão de responsabilidade dos estados europeus, os quais tiveram seu apogeu entre a década de 1930 e 1970, voltados para garantir os direitos sociais básicos para os seus cidadãos,19 imagine-se o grau de dificuldade quando a tarefa é tentar empregar essa noção para caracterizar a América Latina.

Sônia Draibe (1994: 274) elenca um conjunto de características mínimas que permitem empregar a noção de Estado de bem-estar para o Brasil após 1930. Entre elas estão: a existência de "um conjunto de mecanismos institucionais que definem cada área de ação e as relações das áreas entre si"; fontes de receitas viáveis e com "probabilidade de reproduzirem-se ano a ano", corpo de funcionários para administrar, gerenciar, desenvolver, fomentar os serviços sociais, a existência de critérios públicos para definir os grupos que serão atingidos pelas políticas de intervenção social e a vigência de visibilidade acerca dos mecanismos de intervenção postos em andamento pelo Estado. Em algum grau, ora maior ora menor, o período pós-30 no Brasil passou a desenvolver essas características mínimas, afirma Draibe.

Alguns analistas latino-americanos (Draibe, 1994; 1998; 2003; 2008; Mesa-Lago, 1994; 2000; Lavinas et al. 2004; Sojo, 2003) têm tentado compreender as diversas nuanças do padrão de intervenção do Estado na área social e, portanto, têm apresentado um amplo painel de argumentos que possibilitam refletir sobre as implicações teóricas e políticas de empregar genericamente a noção de Estado de bem-estar social para os diversos países do continente. As perguntas-chaves que estão explícitas ou implícitas em seus textos são: Até que ponto pode-se dizer que se formou, ao longo do século XX, um sistema de proteção social na América Latina?

Permeia a maioria das reflexões a convicção de que em alguns países latino-americanos, mais em uns e menos em outros, criaram-se algumas formas de proteção social. Todavia, vários analistas (sociólogos, economistas e cientistas políticos) têm buscado entender a natureza desse sistema de proteção bem como as possibilidades de avanços significativos rumo à diminuição do sofrimento social que tem afetado a vida de uma larga faixa populacional. Há quase consenso de que algum tipo de proteção social, mesmo que seja mínimo e, ainda, precário, formou-se na América Latina. Lavinas diz:

"É notório que o sistema de proteção social latino-americano jamais se constituiu verdadeiramente num welfare (...). O Brasil não é exceção nessa matéria. De cunho corpora-tivista-meritocrático, voltado aos segmentos formais da economia, nosso sistema de proteção social se caracteriza por ainda oferecer cobertura restrita, atendendo a uma parcela reduzida da população, da qual as pessoas pobres sempre foram, de facto, excluídas em razão dos seus vínculos instáveis e precários com o mercado de trabalho. Não sendo um grupo de pressão, sem posição sócio-ocupacional definida, as camadas pobres jamais foram sistemática e regularmente beneficiadas, e seu atendimento sempre foi justificado como um ato humanitário ou uma moeda política" (Lavinas et al, 2004: 67).

Se houvesse algum tipo de Estado de bem-estar social no continente, estaria em pauta a busca tanto da satisfação das necessidades mínimas quanto da ampliação dos serviços universais básicos para todos. Seriam, então, muito mais fáceis de cumprir as sugestões contidas na Declaração do Milênio (2000) das Nações Unidas. Na ausência de condições que possam ser caracterizadas como mantenedoras de bem-estar social para todos os segmentos, nos países latino-americanos, os analistas, governantes e técnicos encontram-se hoje envolvidos num debate sobre as possibilidades, ou não, de expandir os programas de enfrentamento da pobreza para todos os indivíduos extremamente pobres. Pergunta-se o seguinte: Até que ponto, as condições sociais atuais não estão indicando uma suspensão da expectativa de implantação, expansão e manutenção de políticas sociais de caráter universal?

Pode-se dizer que os RDHs têm dado ênfase, muitas vezes, a políticas de combate à pobreza absoluta. No entanto, não se pode dizer que não há preocupações com políticas sociais dotadas de universalidade. As sugestões de ampliação das ações que levem a melhorias nos indicadores de longevidade e educação podem ser tomadas como exemplo de que há uma preocupação com a expansão de investimentos na saúde e na escolarização.

Detecta-se, no entanto, que os relatórios do PNUD, na maioria das vezes, não parecem considerar possível que os avanços se façam somente através do poder público. Assim, indicam ser necessária uma divisão das tarefas, através de uma forma de participação ampliada, entre o Estado, o setor privado e a sociedade civil. Dentro dessa última estariam as associações e grupos voluntários. Note-se o que afirma o RDH de 1993:

"O desenvolvimento humano implica ampliar suas opções, e uma maior participação permite que as pessoas possam por si mesmas acercar-se de uma gama muito mais ampla de oportunidades. A pessoa pode participar individualmente ou em grupos. Individualmente, em uma democracia, as pessoas podem participar como votantes ou, até mesmo, como ativistas políticos, ou no mercado como empresários ou trabalhadores. (... ) Não obstante, participam de forma mais efetiva por intermédio de um grupo: como membro, talvez, de uma organização da comunidade, ou de um sindicato, ou de um partido político" (RDH, 1993: 25).

Se o norte do processo de avanço do bem-estar social é a participação, conforme sugerem os RDHs, vê-se que há, no Brasil, por exemplo, um longo caminho para ser percorrido. Ocorre, então, algo dúbio no interior das sugestões dos relatórios, ou seja, nota-se que os documentos exaltam a possibilidade de participação quer em condições em que não se verificam quer naquelas que existem alguns germes de processos participativos.

O redirecionamento da ação do Estado na área social aparece como dependente da expansão da participação dos diversos grupos da sociedade civil, todavia, o Estado aparece também como impossibilitado de responder, sozinho, às demandas coletivas. Há uma dubiedade que se expressa da seguinte maneira: os 3 eixos do desenvolvimento humano (renda, longevidade, educação) somente darão saltos de melhorias com o aumento da participação, mas aqueles que participam devem ter claro que o Estado enfrenta muitas limitações orçamentárias, administrativas e executoras.

Modificar a orientação do Estado na esfera social constitui-se um nó in-solúvel no interior dos documentos do PNUD. Tais nós vão-se tornando mais e mais difíceis de desatar nos RDHs produzidos a partir da Declaração do Milênio (2000) que sistematizou um conjunto de objetivos e metas a serem alcançados, com certa urgência, pelos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos, os quais são muitas vezes desprovidos tanto de participação política ativa de seus habitantes quanto de estados com orientações voltadas para a ampliação de políticas de bem-estar.

Seguramente, é possível dizer que os RDHs se afinam com aquelas posições que insistem na necessidade de que, nas regiões mais pobres do planeta, não se suspendam as expectativas de construir políticas de melhoramento social e político. É claro que as formas de construção de tais avanços é que suscitam muitos embates, até mesmo, entre os técnicos que vêm produzindo tais documentos. Na América Latina esta discussão tem sido alimentada pelas análises dos programas de transferências de renda para os segmentos que vivem em condição de pobreza absoluta.

Há, na atualidade, discordâncias entre vários analistas acerca da possibilidade, ou não, das políticas de Transferências Condicionadas de Rendas (TCRs) diminuírem as desigualdades. Há aqueles que atestam que as TCR podem, sim, ter um "expressivo impacto sobre a pobreza e desigualdade" (Soares e Zepeda, 2008: 1). Os dois últimos autores - num artigo intitulado Todas as transferências de Renda diminuem a desigualdade? - analisam três TCRs: Bolsa Família (Brasil); Oportunidades (México) e Chile Solidário (Chile) buscando compreender de que modo tais programas indicam que está havendo impacto nas desigualdades sociais. Eles afirmam:

"Esses programas diferem entre si em vários aspectos. O Bolsa Família e o Oportunidades são programas igualmente amplos, abrangendo, respectivamente, 11 e 5 milhões de domicílios em 2004, mas que divergem quanto à forma de focalização. Enquanto o Bolsa Família é um programa altamente descentralizado onde a responsabilidade de direcionar os recursos fica a cargo dos municípios, o Oportunidades realiza diversas pesquisas nas áreas pobres para escolher a população-alvo através de um mecanismo muito mais centralizado. Em contraste, o Chile solidário é um programa pequeno, que cobre em torno de 225.000 domicílios. O programa direciona seus esforços nos extremamente pobres, através de um sistema nacional que inscreve beneficiários determinados em função de um intenso monitoramento das famílias, realizado por assistentes sociais" (Soares e Zepeda, 2008: 1).

Serguei Soares e Eduardo Zepeda utilizam, como padrão de medida, o Índice de Gini (padrão de medida da distribuição mais utilizado naatu-alidade) e constatam que as "TCRs estão transferindo rendas para os mais pobres". Eles dizem:

"A renda domiciliar total resulta de diversas fontes: trabalho, pensões, previdência social e TCR, entre outras. Mudanças no coeficiente de Gini podem ser decompostas em alterações ocorridas em cada componente da renda. A efetiva contribuição de um determinado componente na mudança total da desigualdade pode ser indicada pela mudança na desigualdade desse componente (coeficiente de concentração) e pela mudança na participação desse componente no rendimento total" (Soares e Zepeda, 2008: 2).

A economista Lena Lavinas apresentou algumas análises, no início da década de 2000, que levantavam dúvidas sobre a efetividade dos programas TCRs na reversão das desigualdades. Segundo ela, era pouco conhecido

"o real alcance, o saldo líquido da ação social [dessas políticas] no que tange o número de pessoas que conseguiram escapar à pobreza porque passaram a integrar (...) o programa de transferência de renda [do governo federal e desconhece ainda] o impacto provocado em termos de aumento da massa salarial e geração de empregos, ou na retração do patamar de desigualdade que nos assola" (Lavinas, 2004ª: 1).

Tendo trabalhado, por anos a fio, e analisado esses programas, Lavinas possui vários textos que contestam o otimismo daqueles que insistem que esse caminho das TRCs, aberto nos últimos governos, é o único possível e que sua positividade está sim em atacar não somente a pobreza, mas também as desigualdades. Ela afirma:

"Talvez o déficit maior dos dois anos de gestão Lula (2003-2010) resida na incapacidade de instituir um novo denominador comum a todos os brasileiros em matéria de proteção social e bem-estar. Como o governo que o precedeu, faz sintomaticamente a 'opção pelos pobres', reproduzindo programas paliativos, residuais e de curto prazo, para os que conseguem comprovar graus de carência aguda. Programas ambíguos nos seus objetivos ao confundir pobreza e fome, sem metas claras, senão as de cobertura (percentual do púbico-alvo a ser contemplado).20 Programas que não se mostram capazes de vertebrar uma política social nacional, abrangente e integral, formatando um padrão de referência universal para todos os brasileiros, o que aliás muito contribuiria para superar o anacronismo do debate sobre linha de pobreza absoluta, deslocando-o para o campo das desigualdades" (Lavinas, 2004: 2).

As análises feitas pela economista acima mencionada visam demonstrar que as atuações dos governos Cardoso e Lula da Silva, na área social, tinham sido insuficientes ao combate à pobreza, já que, efetivamente, não há uma redistribuição de recursos, rendas e oportunidades (Lavinas, 2005; 2005a; 2005b; 2005c). Programas de combate à pobreza, com as características do programa Bolsa Família, acabam, até mesmo, diz ela, tendo dificuldade de manter o poder de compra que, em muitos momentos, encontra-se reduzido pela inflação. Uma política social, que ao menos se propusesse a um ataque veemente contra a pobreza absoluta (aqueles que vivem com até um dólar por dia), teria de estar muito mais atenta a perda do poder de compra do benefício em vigor, segundo Lavinas. Esses elementos particulares do funcionamento interno dos programas não poderiam ser analisados pelos RDHs que possuem uma simpatia genérica pelos mecanismos de transferências fiscais.

"Os benefícios do Bolsa Família, cujo valor inicial era de R$ 15,00 e R$45,00, sofreram reajuste de 33,33% muito próximo da inflação apurada pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) de alimentos no período janeiro de 2003 a maio de 2008, de 35,52%. Outras faixas, no entanto, não foram igualmente contempladas e receberam reajustes menores, posto que a atualização não foi linear. É o caso do benefício de R$65,00, que passou para R$82,00, com correção de 26,15%; e o de R$95,00, hoje fixado em R$122,00, com recuperação de 28,22% do poder de compra" (Lavinas, 2008: 2).

Os reajustes parciais dos valores recebidos pelos indivíduos contemplados (já que nem todas as pessoas extremamente pobres conseguem passar pela triagem dos assistentes sociais que trabalham na seleção dos mais necessitados entre os que estão em condições de pobreza absoluta), já seriam, segundo Lavinas, um indicador das amplas dificuldades desse tipo de política de combate à pobreza. Ela chega a considerar, até mesmo, que, desde que foi concebido, o programa Bolsa Família veio embalado numa intencionalidade de combate à pobreza, mas, na realidade, ele sempre foi uma tentativa de "melhorar o grau de acessibilidade alimentar da população mais pobre" (Lavinas, 2008: 2). Este tipo de análise coloca em dúvida até mesmo a possibilidade de os programas de transferência de renda condicionada serem eficientes para cumprimento efetivo dos ODMs.

Grosso modo, pode-se dizer que a questão central é a seguinte: o governo gasta menos do que deveria gastar nos programas de combate à pobreza. Não se está dizendo que tais programas não deveriam existir, mas sim que eles teriam de ser cada vez mais organizados para o fortalecimento de uma política que fosse, de fato, capaz de não estar circunscrita à acessibilidade alimentar. Ou seja, eles deveriam indicar, ainda que num horizonte distante, a possibilidade de um combate efetivo à pobreza, o que implicaria a criação das condições de redistribuição de rendas, recursos e oportunidades. Assim, o combate à pobreza deveria apontar, mais e mais, para o combate às desigualdades. Isso exigiria formas de intervenção pública na área social que institucionalizasse mais e mais políticas de caráter universal. Sem elas não há como avançar, efetivamente, no desenvolvimento humano.

No caso da América Latina, assim como em algumas outras partes do mundo, reduz-se, nas últimas décadas, a expectativa de bem-estar social universal, já que políticas sociais duradouras e indicadoras de que se estava perseguindo, a todo custo, este caminho nunca vingaram, de fato. Os RDHs trazem inúmeras indagações sobre as consequências sociais e políticas da suspensão, por parte dos administradores, técnicos, governantes e sociedade civil, da expectativa de construir, persistentemente, políticas de bemestar.

No entanto, os relatórios não saem em defesa de políticas universais, o que é visível pelo seu modo de ocupar-se muito mais do combate à pobreza do que do combate à concentração patrimonial e de renda. O RDH de 2005 chega a afirmar que se devem distinguir quais são as desigualdades evitáveis e as inevitáveis. Entre as primeiras estão as desigualdades de oportunidades e entre as segundas as de renda. Os documentos em análise passam, então, a buscar, com maior ênfase, modos de agir sobre as primeiras.

Assinale-se que há diferenças essenciais entre países (os da Europa, por exemplo) que vivenciaram, por décadas, alguma forma de Estado de bemes-tar que, na atualidade, está sendo desmontada e os países latino-amerianos que nunca tiveram experiências vigorosas nesse sentido.21 No decorrer da segunda metade do século XX foi possível detectar, principalmente entre os opositores dos governos autoritários que controlavam diversos estados no continente, uma expectativa positiva em torno da necessidade e da possibilidade de instauração seja da democracia seja de um Estado que investisse em políticas públicas universais.

Requer-se atentar para o fato de que o modo de apropriação do Estado como forma de fazer prevalecer somente os interesses de alguns setores deve ser analisado historicamente. São décadas de atuação dos segmentos preponderantes, desde a formação do Estado nacional, em 1822, empenhados em não permitir que se formem forças sociais capazes de desafiar, de fato, o padrão de domínio vigente no Brasil.

Tal padrão se aprimorou em responder às demandas de alguns segmentos que possuem acesso aos mecanismos de poder e de decisão. Ao longo da história do país, houve muitas manifestações dos trabalhadores, mas eles sempre foram tolhidos com repressões violentíssimas, chegando ao ponto de os setores preponderantes na economia e na política apoiarem um regime militar (1964-1985) que colocava a segurança acima de qualquer coisa e impunha a intolerância absoluta com quaisquer formas de manifestação social. Basta ver como foram as reações da ditadura militar contra os movimentos organizados pelos trabalhadores. Isso favoreceu, a partir de 1964, a expansão das desigualdades no país e também um sistema de proteção social que fez expandir "o uso da política social como recurso político e moeda de troca" (Draibe, 1994: 272). Assim, "o assistencialismo, a constituição de clientelas através da distribuição 'politizada' de benefícios sociais foram constantes, e o partido do governo [durante a ditadura militar] soube bem aproveitar esses mecanismos para disputar eleições" (Draibe, 1994: 272).

O modo de os RDHs abordarem os desafios postos ao continente é distinto. Apesar de insistirem na vinculação estreita entre desenvolvimento humano e democracia, os RDHs da década de 1990 mostravam-se, ainda, tímidos na defesa de um modelo de intervenção do Estado na área social que se situasse, decididamente, no âmbito dos propósitos de universalização de políticas que desconcentrassem rendas e recursos. Essa timidez continua, de alguma forma, ainda presente nos documentos da primeira década do século XXI.

A preocupação central dos RDHs está mais situada na tentativa de encontrar formas de distribuir melhor os gastos sociais, os orçamentos e os investimentos, do que de construir um modelo de intervenção do Estado na área social capaz de operar, paulatinamente, uma desconcentração da renda, por exemplo. Veja-se o trecho a seguir do RDH de 1990.

"Para os países em desenvolvimento em geral, as zonas urbanas têm o dobro de acesso aos serviços de saúde e água potável que as zonas rurais, e quatro vezes o acesso a serviços sanitários. A taxa de analfabetismo feminino é um terço menor que a taxa masculina. E com frequência, os ricos recebem uma parte considerável dos subsídios sociais. Estas amplas disparidades demonstram a imperiosa necessidade de melhorar a distribuição dos gastos sociais. (...) Para fazer frente ao objetivo da década de noventa, se devem remediar os prejuízos produzidos ao desenvolvimento humano em muitos países em desenvolvimento a fim de gerar o impulso necessário para alcançar as metas humanas essenciais acerca do ano 2000. A resposta a este objetivo exigirá a mobilização de maiores recursos, tanto nacional como internacionalmente, e em muitos casos requererá mudanças importantes nas prioridades orçamentárias. (... ) Os componentes chaves do Índice de Desenvolvimento Humano - esperança de vida, alfabetismo e rendimento básico - são o ponto de partida para este estudo sobre a formação das capacidades humanas. O rendimento básico se utiliza aqui como mecanismo para determinar o acesso aos recursos que permitem alcançar um nível decente de vida" (RDH/1990: 49-50).

 

3- Expectativas de bem-estar social no Brasil como um desafio permanente que ganha força após a publicação dos RDHs: as distâncias e as aproximações entre as propostas de alguns intelectuais e as contidas nos relatórios

As expectativas de geração de um projeto coletivo de nação, que tivesse no seu âmago a universalização do bem-estar social, estiveram, no Brasil, presentes desde o século XIX. Muitos homens de ciência, alguns deles também políticos, advogavam a necessidade de criar, no país, outro padrão de intervenção pública. Manoel Bomfim (1868-1932), em América Latina: males de origem (1993), de 1905, talvez tenha sido o intelectual - e também político, já que foi deputado federal - que mais tenha se dedicado, no limiar do século XX, a defender, naquele momento, a necessidade de definição de um padrão de intervenção pública que fosse capaz de ser inclusivo e de se voltar para a universalização das políticas sociais.

"É espantoso, é monstruoso, que um país novo, onde toda a educação intelectual está por fazer, onde a massa popular é ignorantíssima, onde não há instrução industrial nem técnica, onde o próprio meio e todos os recursos naturais não estão estudados - é monstruoso que, num tal país, para um orçamento de 300 mil contos, reservem-se 73 mil contos para a força pública, e apenas 3.200 contos para tudo, tudo que interessa à vida intelectual - ensino, bibliotecas, museus, escolas especiais, observatórios, etc. (...)" (BOMFIM, 1993: 196).

Manoel Bomfim afirmava ainda

"somente através de um esforço político incomensurável dos dirigentes, principalmente, o país poderia progredir no sentido da construção da democracia. Esta, por sua vez, passava tanto pelo investimento na instrução de massa quanto pela substituição de impostos indiretos pelas contribuições diretas e proporcionais. Ele afirmava: 'uma democracia não é democracia se não faz o imposto progressivamente proporcional aos recursos de cada contribuinte, e se não o emprega no custeio de serviços de interesse geral - preocupação quase fútil e ridícula em países, como estes nossos, onde o direito do proletário não existe'(BOMFIM, 1993, p.197). Em sua concepção, os condutores da política haviam internalizado a idéia de Spencer de que o Estado-providência era um mal a ser evitado. Portanto, supor que o Estado deveria investir em saúde, educação, formação profissional e pesquisas (...) era tido, por eles, como um descalabro" (Rezende, 2002: 84).

Outro defensor, no início do século XX, da implantação de políticas dotadas de um caráter não-clientelista, não-assistencialista, não-imediatista, foi Euclydes da Cunha (1866-1909). Desde o final do século XIX, ele teceu críticas contundentes ás formas de intervenção pública na área social. Segundo ele, os governos, no Brasil, não sabiam fazer outra coisa senão distribuir sacas de farinha nos momentos de exacerbação da pobreza e da miséria, mas nada de efetivo e duradouro faziam. O país vivia, no final do século XIX e início do século XX, à beira do abismo e

"a alma nacional, de chofre comovida, ostenta o seu velho sentimentalismo incorrigível desentranhando-se em subscrições e em sonetos, em manifestos liricamente gongóricos e em telegramas alarmantes; os poderes públicos compram sacos de farinha e organizam comissões, e os cientistas apressados -os nossos adoráveis sábios à la minute- ansiando por salvarem também um pouco a pobre terra, imaginam hipóteses" (CUNHA, 1966: 131).

No decorrer do século XX merecem ainda destaque dois pensadores que atuaram, não só no âmbito intelectual, mas também no âmbito do poder público visando implantar, no Brasil, um Estado de bem-estar social: Fernando de Azevedo (1894-1974) e Celso Furtado (1920-2004). Os dois ocuparam cargos públicos tentando estabelecer intervenções de caráter uni-versalizantes22 (Azevedo, 1958; 1958a; 1958b). O primeiro ocupou vários cargos na área da educação. Seu empenho consistia em construir uma educação pública e universal, a qual deveria abranger a todos indistintamente. O segundo demonstrou-se convicto de que era possível agir no interior do Estado para guiná-lo rumo à fixação de políticas capazes de levar à descon-centração da renda.

Criar políticas capazes de distribuir a renda deveria, para Celso Furtado, ocupar lugar central nas políticas de intervenção pública, quer na área social, quer também nas áreas econômica e política. Enveredar pelo caminho do combate à exclusão social e política exigia enfrentamentos na esfera da política institucional, da organização econômica, dos partidos, da sociedade civil e da burocracia.

As dificuldades de desconcentração da renda inscrevem-se no modo de operacionalização das ações políticas dos diversos grupos sociais preponderantes. Portanto, construir um projeto de nação capaz de combater as desigualdades e as exclusões é um ato político de grande envergadura que somente pode vingar em sociedades democráticas (Furtado; 1964; 1992; 2001; 2002). Segundo ele, a "repartição da renda (...) [é] comandada por fatores de natureza institucional e política" (FURTADO, 2001: 27).

Conforme foi dito anteriormente, os RDHs mostram-se acanhados para propor processos de desconcentração da renda e/ou patrimonial. Nisso verificam-se muitas distinções entre eles e as posturas políticas daqueles intelectuais, mencionados anteriormente, que enfatizaram a necessidade de o país desenvolver mecanismos e procedimentos capazes de levar a outro padrão de distribuição da renda, sendo este, sim, a base para que outros processos redistributivos ocorressem. O enfrentamento das desigualdades sociais parece dificílimo mesmo no interior dos relatórios do PNUD que são guias de sugestões para melhorar o desenvolvimento humano dos países da América Latina como também de outros continentes.

As políticas universais, capazes de distribuir rendas e, portanto, de diminuir as desigualdades, têm de enfrentar, se forem pensadas pela ótica de Furtado, uma situação estrutural que não se deixa resolver facilmente, porque toda e qualquer medida, para ser efetiva, tem de tocar em mecanismos reprodutores da concentração da renda.23 Nos países da América Latina, e no Brasil em especial, no limiar do século XXI, os governantes têm-se desviado, no debate sobre desigualdades, de uma questão que era para Furtado essencial: o cálculo das desigualdades tem de ser feito contrapondo-se as rendas mais baixas e as rendas mais altas, sejam as do trabalho, sejam também as do capital. Isso porque "em nosso país, os 20% de mais alta renda absorvem cerca de 70% desta" (Furtado, 2002: 13).

Essa polêmica sobre a possibilidade, ou não, de atestar a diminuição das desigualdades através dos dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD), os quais não aferem a renda do capital, levou o economista Cláudio Dedecca a afirmar: "Minha desconfiança é que a desigualdade não está caindo do ponto de vista da renda global. (... ) A riqueza cresceu mais do que a renda do trabalho, o que faz com que, sozinha, a renda da PNAD não possa ser usada como parâmetro da redução da desigualdade" (Dedecca, 2008: 7).

Isso não quer dizer que não sejam gravíssimas as diferenças de renda oriundas do trabalho. Há, no Brasil, diferenças gritantes entre aqueles que ganham mais e os que ganham menos. "Na Índia, os 20% mais ricos têm em média uma renda quatro vezes maior que a dos 20% mais pobres; no Brasil essa relação é de uma para trinta e três vezes" (Furtado, 2002: 20).

Esse debate sobre as desigualdades veio à tona porque em setembro de 2009 foi divulgada a pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) intitulada PNAD que demonstrou estar havendo uma queda das desigualdades no Brasil, o que foi medido pelo índice de Gini.24 O Índice era 0,5957 em 2001 e caiu para 0,5486 em 2008. Tais pesquisas não medem a renda oriunda de valorização da propriedade, dos investimentos financeiros e especulativos. A mensuração dessa desigualdade não é feita contrapondo-se as maiores rendas vindas da acumulação de capital e as menores rendas vindas do trabalho e de benefícios sociais. Há economistas (Neri, 2009: 3) que consideram que esses cálculos, que não levam em conta a renda do capital, são válidos e confiáveis.

Pode-se dizer, sem sombras de duvida, que diversos pensadores (Bom-fim, Azevedo, Furtado, Castro) brasileiros tiveram um papel significativo na gestação de expectativas em torno da instauração de outra forma de intervenção pública na área social. Todavia, essa expectativa foi alimentada também por alguns políticos (o deputado federal Josué de Castro25 pode ser citado como exemplo) progressistas (no Brasil, entre meados da década de 1950 e início da de 1960) que com muitas dificuldades voltavam seus esforços para a efetivação de políticas empenhadas em ações que tentavam colocar a questão da justiça social na agenda pública.

E por que é fundamental questionar se os programas básicos e os programas de enfrentamento da pobreza, apoiados pelo PNUD e vistos com muito bons olhos pelos RDHs, postos em andamento na atualidade servem de escudos para o abandono, muitas vezes, velado de políticas públicas de caráter universal? Celso Furtado afirmava que o maior desafio posto no umbral do século XXI é construir ações direcionadas ao bem-estar social. Nada é mais importante, dizia ele, do que

"estabelecer novas prioridades para a ação política em função de uma nova concepção do desenvolvimento, posto ao alcance de todos os povos (...). O principal objetivo da ação social deixaria de ser a reprodução dos padrões de consumo de minorias abastadas para ser a satisfação das necessidades fundamentais do conjunto da população" (Furtado, 2001: 64).

Os RDHs não propõem abertamente, ao Estado, procedimentos e ações para diminuir as distâncias sociais entre os mais ricos e os mais pobres. Porém, mesmo que a desconcentração da renda não seja vista como norte dos relatórios, não se pode dizer que há uma despreocupação dos documentos com a questão das desigualdades em geral. Há sim preocupação com as desigualdades raciais, de gênero, de habilidades, de capacidades, de acesso à participação política, de acesso a serviços básicos de saúde, de educação, de saneamento e de moradia.

O RDH de 2003 lida com os constrangimentos estruturais (barreiras nos mercados internacionais, níveis elevados da dívida, baixa capacidade de exportação, baixa fertilidade dos solos, tamanho dos países e quantidade de terra disponível e desastres naturais), que potencializam a pobreza, mas não se dedica a discutir os parâmetros estruturais (concentração da terra, da renda, de recursos e de poder), que ampliam as desigualdades sociais. Por isso, ele formula propostas de superação dos obstáculos estruturais que fazem avançar as condições de pobreza absoluta.

"Reduzir a pobreza nas regiões mais pobres exige políticas nacionais que reafectem recursos para essas regiões. A máxima prioridade política, neste caso, é aumentar a equidade e não só o crescimento econômico. As respostas aos constrangimentos estruturais exigem intervenções simultâneas em várias frentes - Juntamente com maior apoio externo. Seis cachos de políticas podem ajudar os países a sair das suas armadilhas de pobreza: Investir cedo e ambiciosamente na educação básica e na saúde, estimulando ao mesmo tempo a igualdade de gênero. (... ) Aumentar a produtividade dos pequenos agricultores. (...) Melhorar a infraestrutura básica. (...) Intensificar uma política de desenvolvimento industrial.26 (...) Promover a governação democrática e os direitos humanos para eliminar a discriminação, assegurar a justiça social e promover o bem-estar de todas as pessoas. (...) Assegurar a sustentabilidade ambiental e uma gestão urbana sã" (RDH, 2003: 4).

Conquanto isso não seja dito claramente nos documentos, percebe-se que há separação entre os obstáculos estruturais que exacerbam a pobreza absoluta e aqueles que são responsáveis pela concentração de renda e de recursos. Os RDHs situam suas propostas, essencialmente, no âmbito daqueles primeiros. Eles pressupõem que seja possível vencer alguns constrangimentos estruturais, outros, porém, não. Parece ao documento do PNUD que alguns deles são irremovíveis.

Talvez o problema maior dos relatórios sejam as dificuldades de articular em suas propostas, de modo simultâneo, o combate à pobreza, à concentração da renda e às múltiplas formas de desigualdades, desafio que tem sido imenso no âmbito dos embates políticos e também no das discussões acadêmicas. Celso Furtado faz algumas considerações fundamentais que auxiliam no questionamento das propostas dos RDHs. Ele afirma: "para que os pobres alcancem a habilitação de que fala Amartya Sen, precisam ter acesso a meios que lhes assegurem uma certa renda. Ora, esta só é assegurada, tanto na Índia como em parte do Brasil, por meio de uma reforma patrimonial" (Furtado, 2002: 17).

No Brasil e em outros países da América Latina tem sido um desafio constante o estabelecimento de políticas duradouras de distribuição da renda. Políticas universais que coloquem a justiça social no centro das formas de intervenção do Estado na área social é ainda, no Brasil, uma promessa que está esboçada na Carta Constitucional de 1988. Conforme afirma Lena Lavi-nas (2004ª: 1), não se institucionalizou, nas décadas de 1990 e 2000, "uma nova forma de fazer política social, ou seja, capaz de redistribuir bem-estar e promover justiça social".

O problema político que se interpõe no caminho de políticas que descon-centrem a renda visando um combate duradouro às desigualdades assenta-se no fato de que a distribuição da renda somente é alcançada através de um processo político capaz de balizar os interesses preponderantes daqueles que estão interessados somente na manutenção do status quo.

Uma das maiores dificuldades, no Brasil, é a fortificação de demandas coletivas capazes de influenciar as ações dos dirigentes para que eles façam investimentos contínuos no desmantelamento de um modelo que exacerba, de diversas maneiras, a concentração da renda nas mãos de uns poucos. Celso Furtado (2002a: 19), um dos mais importantes estudiosos das desigualdades vigentes na América Latina, fazia a seguinte afirmação: "A pobreza é a contrapartida da má distribuição da renda. Se você se limita a reproduzir um modelo de sociedade muito mais rica, concentra renda. (...) Quando importo automóveis ou coisas sofisticadas, concentro a renda no sistema de consumo".

O combate às desigualdades passa, então, por uma redefinição do padrão de organização econômico, social e político. Essa redefinição é condição essencial para implantar as sugestões trazidas pelos RDHs. É fundamental gerar uma melhor igualdade de oportunidades, mas é necessário também que ocorra uma reorientação do padrão de organização social para que as capacidades e oportunidades efetivem, de fato, outra lógica distributiva de renda e poder. É fácil que isso ocorra? Claro que não; é dificílimo, já que demandaria mudanças estruturais e institucionais de grande porte.

Mudanças que os RDHs enfrentam só parcialmente. Aqueles que possuem interesse (setores dirigentes, dominantes, intermediários, lideranças políticas) em manter esse modelo altamente concentrador da renda vão resistir tenazmente a qualquer modificação. Já conhecemos no país diversos métodos de resistência à mudança na estrutura concentradora de rendas. Um dos mais eficazes foi materializado pelas ações do regime militar de 1964 que efetivou uma modernização autoritária "que prescindiu dos mecanismos democráticos de participação e controle, abrindo ou mantendo os espaços ocupados pelos tradicionais mecanismos patrimoniais, corporativos e clien-telistas de apropriação e gestão da coisa pública" (Draibe, 1994: 298).

Acredita-se, então, que a relevância das propostas trazidas pelos RDHs está também no fato de propiciar a expansão de uma consciência pública maior sobre os entravamentos sociais e políticos que obstam às possibilidades de construir avanços rumo à diminuição do sofrimento social da grande parcela da população. Quando se comparam as sugestões de ampliação da participação política, da democracia, dos controles populares sobre os recursos públicos, por exemplo, com as condições ainda vigentes no país, fica evidente o quanto se faz, ainda, necessário avançar rumo a políticas mais inclusivas. Ao se verificarem as propostas de avanços nas áreas de educação, saúde, moradia, saneamento feitas pelos RDHs, como forma de combater a pobreza absoluta, constata-se o quanto estão entrelaçadas, no Brasil, a luta contra a pobreza e a concentração de rendas, recursos e poder.

 

4. Considerações finais sobre pobreza, desigualdade social e transferência de renda: alguns desafios postos às sugestões dos RDHs

O RDH de 2005, intitulado A cooperação internacional na encruzilhada, traz um capítulo que menciona a positividade, na luta contra a pobreza, das políticas de transferência de renda. O relatório adota uma posição favorável às diversas formas de transferência de recursos aos mais pobres. O acesso dos pobres a serviços básicos de saúde, educação, moradia, saneamento, educação, entre outros, é considerado essencial na diminuição das condições de pobreza, todavia, há o entendimento de que as políticas públicas necessitam de associação com outras iniciativas oriundas de ações desenvolvidas, muitas vezes, em parceria com organizações sociais diversas. Em momento algum as intervenções do Estado na área social são vistas como capazes de, isoladamente, responder aos desafios postos pela necessidade de redução da pobreza.

Além do aconselhamento feito ao Estado no sentido de desenvolver políticas diversas de expansão dos serviços básicos, o RDH de 2005 sai, também, em defesa das políticas de transferência de renda como forma de combater a pobreza e a desigualdade de direitos e de oportunidades, principalmente. No entender dos RDHs, as transferências de renda têm um papel importante porque possuem a potencialidade tanto de agir, simultaneamente, sobre vários fatores que exacerbam a privação e a exclusão social, quanto de acelerar a redução da pobreza nos países em que ela é implementada. A redução da taxa de pobreza é o principal efeito de políticas de transferências, sendo que o RDH de 2005 não fala somente de Transferências de Rendas Condicionadas (TRC), como as que vigoram no Brasil (Bolsa Família) e no México (Oportunidades). Ele menciona também o peso que teria na diminuição da pobreza, "uma hipotética transferência [de renda] dos ricos para os pobres" (RDH, 2005: 66). Há, no relatório, várias simulações, tais como a que se segue:

"Para o Brasil e México, a transferência de 5% do rendimento dos 20% mais ricos teria os seguintes efeitos: No Brasil, acerca de 2,6 milhões de pessoas seriam elevadas acima da linha de pobreza de 2 dólares por dia, reduzindo a taxa de pobreza de 22% para 7%. No México, cerca de 12 milhões de pessoas seriam tiradas da pobreza, ta como é definida nacionalmente, reduzindo a taxa de pobreza de 16% para 4%" (RDH, 2005: 66).

As políticas de transferências fiscais são tidas como políticas públicas eficientes "para criar uma saída sustentável da pobreza, dotando as pessoas de ativos, segurança e oportunidades necessárias para quebrar o ciclo da pobreza" (RDH, 2005, p.70). Elas são tidas como essenciais para o desenvolvimento humano porque tornam possível o estabelecimento de mecanismos distributivos que dotam "as pessoas de ativos, segurança e oportunidades necessárias para quebrar o ciclo da pobreza" (RDH, 2005: 70).

O RDH de 2005 classifica em 3 grandes grupos as transferências fiscais: as transferências de rendimento para grupos vulneráveis (pensões para idosos muito pobres e sem rendimento, por exemplo); as transferências efetuadas em razão do desemprego proveniente de secas e outras calamidades; e as transferências baseadas em incentivos (RDH, 2005:70) tais como o Bolsa Família (Brasil) e o Oportunidades (México). O documento atesta que esta última modalidade favorece em larga escala o desenvolvimento humano, já que há melhorias na escolaridade, na nutrição e na saúde. O relatório supõe que, ao agir sobre a pobreza, essas políticas de transferências fiscais, agem também sobre as desigualdades de oportunidades, de capacidade e de renda.

Alguns analistas têm partido do pressuposto de que a distinção mais apurada entre pobreza e desigualdade é essencial num debate dessa natureza. Enquanto a pobreza é definida pela quantia insuficiente de recursos que as pessoas possuem para suprir as suas necessidades básicas, a desigualdade é definida pela diferença de renda entre os segmentos mais ricos e os mais pobres. Por isso, os programas emergenciais agem essencialmente sobre a pobreza e não sobre as desigualdades. A diminuição desta última implica processos distintos daqueles, postos em andamento, através de programas de enfrentamento da pobreza, o que não quer dizer, de modo algum, que esses programas não sejam necessários.

Recentemente, o Boletim diário do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) traz um dado preocupante. Ele diz que 58% dos municípios brasileiros não conseguirão cumprir a meta dos ODMs (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio) de redução da pobreza, pela metade, até o ano de 2015. Isso é forte indicador das dificuldades de diminuir os índices de pobreza no país.27 Se há uma enorme dificuldade de redução, pela metade, do índice de pobreza, mais difícil ainda é diminuir as distâncias sociais entre os 10% mais ricos e os 50% mais pobres.

Ao não se aterem às especificidades de cada país, os RDHs acabam por fazer sugestões genéricas que muitas vezes tendem a esbarrar em problemas sociais e políticos enraizados há séculos no país. Como exemplo, podese dizer que os segmentos mais pobres da sociedade brasileira perdem duplamente, ou seja, há uma lógica altamente concentradora da renda que se favorece dos baixos rendimentos salariais de parte expressiva dos brasileiros e há, ainda, uma forma de distribuir a riqueza social, captada através de impostos, que favorece inteiramente aquelas camadas sociais que possuem em suas mãos meios de pressionar o poder público para fazer valer os seus interesses. Possuem esses meios altos funcionários públicos, grandes empresários, lideranças políticas, além de alguns outros agentes. A desigualdade social é tão gritante no país que, conforme dados da CPS/FGV (Fundação Getúlio Vargas), de 2005, os 10% mais ricos no Brasil se apropriam de 45,1% da renda total do país, enquanto os 50% mais pobres se apropriam de 14,1% da renda.

A Pesquisa do PNAD feita pelo IBGE, em setembro de 2008, mostra que os 10% mais ricos continuam a concentrar em suas mãos quase metade da riqueza, ou seja, 42,7% da renda nacional.28 Os 50% mais pobres apropriam-se de 17,6% da renda. Nas próximas décadas será possível avaliar se a diminuição do processo de concentração da renda, de fato, teve durabilidade e progressão continuada. Considera-se que a diminuição da desigualdade de renda seja condição básica para avançar rumo ao cumprimento das metas postas pelos RDHs e pela Declaração do Milênio. Isso dependerá, principalmente, da capacidade de o Estado implantar e aperfeiçoar políticas sociais universais. Basta observar, por exemplo, que, no Brasil, as aposentarias acima de um salário mínimo aparecem no Atlas do Bolso dos Brasileiros (dados organizados com base no PNAD/2008), da FGV (Fundação Getúlio Vargas), como um fator relevante da renda das pessoas mais pobres.29

Isso não quer dizer, obviamente, que o salário mínimo brasileiro seja suficiente. É um salário que sacrifica demais os indivíduos. Ou seja, uma família que recebe, como aposentadoria ou renda do trabalho, o salário mínimo vive uma situação de enorme sofrimento social. Essas pessoas necessitam de roupas, remédios, alimentos, vestuários e habitação. Como é possível adquirir esses bens de primeira necessidade com um salário desse montante (aproximadamente 240 dólares por mês em 2008). Não há outra opção senão viver em moradias precárias, muitas vezes sem saneamento, sem água tratada. É claro que não é possível suprir, com o salário mínimo, nem sequer a alimentação básica. Por isso persiste, no país, uma desnutrição crônica entre as crianças mais pobres.

E, o dado mais grave é que o modelo econômico no Brasil, onde há, como afirmava Raymundo Faoro (1991; 1994; 1999a; 2001), um capitalismo totalmente dependente do Estado, drena uma parte expressiva da riqueza social (captada através de impostos) para o favorecimento de um modelo que concentra renda. Essa mesma família que já tem os ganhos diminutos (seja esse rendimento oriundo de aposentaria, pensão e/ou trabalho) ainda não tem escola de qualidade, saúde, remédios, saneamento, moradia entre outras coisas essenciais. A precariedade das áreas sociais está estreitamente ligada à forma de distribuição dos recursos captados pelo Estado. Os segmentos mais pobres, geralmente, não possuem formas de pressionar o Estado para que ele distribua melhor a renda através de políticas públicas, de fato, eficientes. Os segmentos mais ricos possuem várias formas de pressionar o Estado para que este canalize em favor deles, através de financiamentos, subsídios e créditos uma parte expressiva da riqueza social. Gerar, então, participação efetiva dos segmentos mais pobres, conforme sugerem os RDHs, é, no Brasil, um desafio incomensurável.

No Brasil, quando se observam os dados apresentados pelo PNAD/2008, antes de atestar uma diminuição significativa das desigualdades, é necessário olhar com cuidado para a persistência da não-distribuição expressiva da renda nos últimos 20 anos. Ainda que se leve em conta somente a renda do trabalho e de benefícios sociais e não se computem as rendas do capital, não se pode atestar que se está constatando uma reversão inconteste das desigualdades. Os 10% mais ricos ainda permanecem concentrando 42,7% de toda renda nacional. Considera-se que os RDHs não se atêm, suficientemente, a dados como esses.

Celso Furtado (1992; 2001; 2002; 2002a) afirmava que a diminuição das desigualdades exige mudanças nos parâmetros estruturais da sociedade, tais como a desconcentração da terra, da renda e das oportunidades sociais. No caso do Brasil, tem sido este um grande desafio que persistirá no decorrer do século XXI. "Na verdade, a tendência à heterogeneidade social e estrutural é uma marca do subdesenvolvimento. Só podemos enfrentá-la com procedimentos políticos" (Furtado, 2002a: 33). Entre os procedimentos políticos redistributivos podem-se colocar as políticas sociais de caráter universal capazes, a longo e médio prazo, de transfigurar a feição dos países latino-americanos. Os RDHs estão, de modo explícito e/ou implícito, desafiados pelos padrões de organização social e de domínio que vão acumulando barreiras que impedem avanços substantivos no combate duradouro contra as desigualdades.

 

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Notas

1 "Para aferir a longevidade, o indicador utiliza números de expectativa de vida ao nascer. O item educação é avaliado pelo índice de analfabetismo e pela taxa de matrícula em todos os níveis de ensino. A renda é mensurada pelo PIB (Produto Interno Bruto) per capita, em dólar PPC (paridade do poder de compra, que elimina as diferenças de custo de vida entre os países). Essas três dimensões têm a mesma importância no índice, que varia de zero a um" (PNUD, 2010: 1)

2 Produto Interno Bruto.

3 "Uma concepção adequada do desenvolvimento deve ir muito além da acumulação de riqueza e do crescimento do Produto Nacional Bruto e de outras variáveis relacionadas à renda. Sem desconsiderar a importância do crescimento econômico, precisamos enxergar muito além dele" (Sen, 2005: 29).

4 Observe-se que os RDHs constatam índices precários de acesso à saúde básica em diversas partes do mundo. Nos países intitulados, por eles, "Menos Desenvolvidos," a situação tende a ser caótica. Tyler Fainstat, diretor do programa Médicos Sem Fronteira (MSF), afirma: "Na Somália, instalações hospitalares são praticamente inexistentes, é uma área muito carente. A situação de saúde da população é precária" (Fainstat, 2011: 14).

5 O relatório de 1993 citava, como exemplo, os grupos de pessoas que se uniam para trabalhar, "obter créditos, comprar bens em conjunto, promover e desenvolver formas mais sustentáveis de agricultura" (RDH, 1993: 96).

6 Houve, no Brasil, nas décadas de 1980 e 1990, um debate substantivo sobre as (im)possibilidades, os percalços e os desafios de descentralização de poder e recurso. Ver: (Souza, 1996; Cohn, 1992; Draibe & Henrique, 1988)

7 Ver sobre isto: (Edwards, 2007).

8 Bob Jessop (1990) considera que está havendo uma transformação do conceito de governo para o de governança e de governação. Tais noções sintetizam, segundo ele, formas de conceber a vida política e o Estado na atualidade. A ideia de governança retira o Estado do lugar central e responsabiliza vários outros agentes pela realização das tarefas que antes eram tidas como obrigação do Estado. A noção de governação supõe, no entender de Jessop, um certo recuo do Estado.

9 'Além de defenderem (...) projetos de desenvolvimento [e neles se envolverem] as ONQ estão a assumir papéis mais diretos na tomada de decisão e monitorização locais e a desenvolver novas formas cooperativas de governação. (...) Em Porto Alegre, Brasil, e noutros sítios, os processos orçamentais já envolvem consultas a grupos da sociedade civil. No Reino Unido, o grupo do Orçamento das Mulheres foi convidado a analisar as propostas orçamentais do governo" (RDH, 2005: 5).

10 "Mas, em muitos países, novas liberdades de imprensa e tecnologias estão a permitir aos meios de comunicação contribuir mais para a política democrática, abrindo debates públicos e denunciando a corrupção e os abusos. A transparência dos resultados das eleições de Gana de 2000 foi ajudada pelos esforços das muitas estações de rádio privadas do país. Essas estações dificultaram a falsificação dos votos, dando credibilidade aos resultados anunciados" (RDH, 2002: 6).

11 Segundo o RDH de 2002, o aprofundamento da democracia supõe: "1) Um sistema de representação, com partidos políticos e associações de interesse a funcionarem bem. 2) Um sistema eleitoral que garanta eleições livres e justas, bem como o sufrágio universal. 3) Um sistema de fiscalização baseado na separação de poderes, com ramos judiciais e legislativos independentes. 4) Uma sociedade civil vibrante, capaz de monitorizar negócios governamentais e privados e de fornecer formas alternativas de participação política. 5) Meios de comunicação livres e independentes. 6) Controle civil eficaz das forças armadas e de outras forças de segurança" (RDH/2002: 4).

12 "Os desequilíbrios dos recursos e do poder político subvertem frequentemente o princípio de uma pessoa, um voto e o objetivo das instituições democráticas. E os processos judiciais e as instituições reguladoras serão minados se as elites os dominarem à custa das mulheres, das minorias e dos que não têm poder" (RDH, 2002: 4).

13 Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.

14 Fundo Monetário Internacional.

15 Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento que compõe o Banco Mundial.

16 Os Objetivos do Milênio são: 1)- erradicar a pobreza extrema e a fome; 2)- atingir o ensino básico universal; 3)-promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; 4)- redução da mortalidade infantil; 5)- melhorar a saúde materna; 6)- combater o HIV/Aids, a malária, a tuberculose, entre outras doenças; 7)- Garantir sustentabilidade ambiental; 8)- estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento (UMA VISÃO a partir da América Latina e do Caribe apud Folha Informativa ODM, PNUD/CEPAL, 2005).

17 Raymundo Faoro (1976; 1978; 1994) afirma "que há, no país, institucionalizada, uma forma de poder que se configura como patrimonialismo estatal que é capaz de implodir continuamente qualquer processo redefinidor da vida social e política. Isto porque o estamento que dirige o Estado acaba por exercer uma pressão contundente sobre todas as demais forças sociais, até mesmo, sobre os segmentos preponderantes. Desmantela-se, assim, seguidamente, a possibilidade de emergência de agentes sociais capazes de afrontar as tecnocracias que comandam, renovando-se em relação a pessoas, mas não em relação a propósitos, procedimentos e ações, o aparelhamento estatal" (Rezende, 2006: 36).

18 Sônia Draibe (1994: 274) afirma que, no Brasil, a partir de 1930, "as políticas sociais ganham as características mínimas que permitem defini-las como um Estado de bem-estar social".

19 Gosta Esping-Andersen (1991) apontou o quão difícil era para os diversos modelos teóricos (liberal, conservador, social-democrata) construir uma definição precisa e, minimamente, consensual, do que caracterizaria, de fato, o wefare state.

20 O documento brasil em desenvolvimento (2009: 529) que faz um balanço das políticas públicas no Brasil, no governo Lula, afirma o seguinte: "Em termos dos resultados referentes à condição nutricional das crianças beneficiadas pelo programa, não há indícios de efeito significativo do PBF (Programa Bolsa Família), nem no nível nacional nem nas regiões".

21 Há diversas posições sobre a crise do Estado de bem-estar social na Europa hoje, ver: (Bauman, 2008; Esping-Andersen, 2007; Giddens, 2007; Dworkin, 2007; Midgley, 2007).

22 A "interpenetração da escola e da sociedade multiplica os pontos de aplicação das forças educativas, proporcionando à escola um instrumento de ação contínua, intensa e penetrante sobre todas as camadas e instituições sociais" (AZEVEDO, 1958: 18).

23 O Relatório do Desenvolvimento Humano do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), de 2007, mostra que o Brasil está entre os 10 países mais desiguais do mundo. Entre os 10 mais desiguais estão: Namíbia, Ilha Comores, Botsuana, Haiti, Angola, Colômbia, Bolívia, África do Sul, Honduras e Brasil.

24 Ver ainda: (BRASIL em números, 2009).

25 Josué de Castro (1908-1973) foi um dos intelectuais mais importantes do Brasil. Suas obras Geografia da fome, Geopolítica da fome e Livro negro da fome tiveram grande repercussão no mundo. Ele foi presidente da FAO/ONU (Food and Agriculture Organization) e deputado federal na década de 1950.

26 Celso Furtado afirmava que nas décadas de 1950 e 1960 ele já tinha clareza que "o desenvolvimento econômico e sua mola principal, a industrialização, eram condição necessária para resolver os grandes problemas da sociedade brasileira: a pobreza, a concentração da renda, a desigualdade regionais" (Furtado, 2001: 20). A industrialização era concebida como uma maneira de vencer alguns obstáculos estruturais que impediam não só o combate à pobreza, mas também à concentração da renda.

27 Ver: (58% dos municípios falham contra a pobreza, 2009; estudo indica desafio antipobreza no Brasil, 2007; MUNDO deve atingir ODM da pobreza, América Latina não, 2007).

28 Vejam-se esses dados em: (Desigualdade cai; renda e emprego avançam. 2009).

29 Veja esses dados em: (Alagoas é o Estado que mais depende de benefícios, diz FGV. 2009).

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