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Educación química

versión impresa ISSN 0187-893X

Educ. quím vol.19 no.2 Ciudad de México abr. 2008

 

Investigación Educativa

 

"Transformações químicas" e "transformações naturais": um estudo das concepções de um grupo de estudantes do ensino médio

 

"Chemical transformation" and "natural transformation": A study of high school students' conceptions

 

Erivanildo Lopes Silva, Fabio Luis Souza e Maria Eunice Ribeiro Marcondes*

 

* GEPEQ, Instituto de Química USP, São Paulo, Brasil. Correos electrónicos: erilopes@iq.usp.br, fsouza@iq.usp.br, mermarco@iq.usp.br

 

Abstract

Several studies in chemical education have shown that the concept of chemical reaction is more complex than it seems and that many misconceptions are difficult to overcome. This work relates an inquiry carried out with 44 high school students aiming to know their conceptions about chemical reaction and how they classify the chemical reactions that take place in alive organisms in nature (biochemical reactions). Several alternative conceptions in the statements of the students had been found, although they already had studied this subject previously. Only a small part of the students have a correct view of this concept. The majority of the students believe that the natural phenomena that happen in living organisms are not chemical reactions. This misconception is connected to other conceptions pointed out in this research, revealing that the relations involved are really complex.

Key words: Chemical reactions, misconceptions.

 

Resumen

Varios estudios en enseñanza de la química han demostrado que el concepto de reacción química es más complejo de lo que parece y que muchas de las concepciones alternativas son difíciles de superar. Este trabajo relata una investigación realizada con 44 estudiantes del bachillerato, que intenta conocer sus concepciones acerca de las reacciones químicas y cómo clasifican las reacciones químicas que tienen lugar en organismos vivos en la naturaleza (reacciones bioquímicas). Se han hallado variadas concepciones alternativas en las aseveraciones de los estudiantes, aunque ellos han estudiado este tema previamente. Sólo una pequeña parte de los estudiantes tiene una concepción correcta de este concepto. La mayor parte de los alumnos creen que los fenómenos naturales que ocurren en los organismos vivos no son reacciones químicas. Esta concepción está conectada con otras apuntadas en esta investigación, lo que revela que las relaciones involucradas son realmente complejas.

 

Introdução

O estudo do tema transformação química tem sido considerado tanto por pesquisadores e professores como parte fundamental do saber científico no campo da disciplina escolar Química. Importante por ser o eixo principal no desenvolvimento dos conteúdos de química, mas também por ser necessário aos cidadãos para uma melhor compreensão do mundo físico que os rodeia (Brasil, 2002). Um nível de compreensão adequada das transformações químicas, ou seja, saber relacionar os fenômenos (observáveis ou não) a modelos explicativos compreensíveis e coerentes, acoplados à linguagem própria da ciência química permite, ainda, o entendimento de grande parte dos processos que ocorrem ao nosso redor (Johnstone, 1982).

Entretanto a aprendizagem sobre transformação química é complexa, fator que colabora para a manutenção de idéias prévias destoantes dos conhecimentos cientificamente aceitos e o surgimento de concepções alternativas. O entendimento da transformação química requer que o aluno desenvolva competências adequadas para reconhecer e empregar a representação simbólica das transformações químicas, podendo esta possibilitar a transição esperada do plano observável para os modelos explicativos microscópicos, colaborando assim para uma aprendizagem mais significativa.

Muitos estudos sobre concepções alternativas acerca das transformações químicas foram desenvolvidos nas últimas duas décadas (Carbonell e Furió, 1987; Hesse e Anderson, 1992; Ahtee e Varjola, 1998; Barker e Milar, 1999; Furió e Furió, 2000; Galagovsky, Rodríguez, Stamati e Morales, 2003; Cavallo, McNeely e Marek, 2003). A seguir discutem-se alguns desses trabalhos de investigação.

Anderson (1986, 1990) a partir de pesquisas realizadas com 2800 estudantes com idades entre 12 e 15 anos propõe cinco categorias para explicar as transformações químicas. Os estudantes tinham que explicar alguns fenômenos do cotidiano que envolviam transformações químicas. As categorias propostas foram:

1. Desaparecimento: As substâncias originais simplesmente desaparecem.

2. Deslocamento: As novas substâncias aparecem em um dado local porque foram deslocadas para lá.

3. Modificação: As novas substâncias são exatamente as mesmas que havia antes, apenas sofreram modificações em sua aparência ou estado físico.

4. Transmutação: As substâncias se transformam porque seus átomos se transformam. Não há a idéia de rearranjo atômico e sim de transmutação de átomos (ferro em carbono, por exemplo). As substâncias podem se transformar em energia e vice-versa.

5. Interação química: As substâncias originais se transformam nas novas pela recombinação dos átomos, que são conservados neste processo.

Solsona e Izquierdo (1999) investigaram os modelos teóricos ou perfis conceituais de um grupo de 51 alunos de segundo e terceiro ano da escola secundária. As autoras solicitaram aos alunos que escrevessem redações sobre transformações químicas, explicitando os conceitos, dando exemplos e propondo explicações para esses exemplos ao nível microscópico.

A análise da microestrutura semântica dos textos produzidos pelos alunos revelou a existência de quatro modelos teóricos. Os modelos observados foram denominados: incoerente, mecânico, cozinha e interativo.

O primeiro (apresentado por 33% dos estudantes) é caracterizado pela ausência de explicações para as transformações químicas e pela incoerência das declarações. O segundo (33%) tem o foco voltado para explicações microscópicas da transformação, e os exemplos citados são teóricos (experimentos de bancada). O terceiro modelo, denominado cozinha (26%), é constituído de explicações da transformação química ao nível macroscópico e tem como exemplos fenômenos observados pelos alunos sem, entretanto, estabelecer qualquer explicação ao nível microscópico. O último modelo, o interativo (8%) apresenta uma relação coerente e equilibrada entre os níveis macroscópico e microscópico. Neste caso os exemplos dados foram apenas teóricos.

As pesquisadoras concluíram que as explicações dos alunos não eram erradas, mas apenas incompletas ou parciais devendo, então, o ensino das transformações químicas se dar de modo a favorecer a relação de complementaridade das explicações. Sugerem, ainda, que o professor planeje o ensino de maneira que os estudantes possam se tornar conscientes de suas próprias idéias sobre as transformações químicas, e assim, seriam capazes de entender que algumas de suas explicações podem ser complementadas por outras (Solsona et al., 2003).

Os estudos de concepções dos estudantes sobre transformações químicas, em sua maioria, têm utilizado demonstrações ou descrição de fenômenos e de exemplos que não envolvem sistemas biológicos. Alguns trabalhos relatam que os estudantes não vêem processos como a fotossíntese, a respiração e a decomposição como reações químicas (Eskilson e Holgersson, 1999; Ekborg, 2003). A fotossíntese é percebida como uma troca de gases, e poucos estudantes entendem que as plantas absorvem dióxido de carbono e água para produzir substâncias orgânicas (Özay e Öztas, 2003). Muitos estudantes consideram que durante a respiração o oxigênio é convertido em outro gás, o dióxido de carbono (Seymour e Longden, 1991, apud Marmoroti e Galanopooulu, 2006), manifestando uma concepção de transformação química como transmutação. Marmoroti e Galanopoulu (2006) citam que os estudantes apresentam dificuldades em combinar conceitos químicos e biológicos, não conseguindo, por exemplo, tratar o corpo humano como um sistema químico.

O reconhecimento por parte dos estudantes de suas próprias concepções tem sido apontado como um aspecto importante para o aprendizado de conceitos científicos. No clássico modelo de Posner, Strike, Hewson e Gertzog (1982), uma das condições para a mudança conceitual diz respeito à insatisfação do aprendiz com suas concepções já existentes. Segundo Anderson (1990), para que ocorra uma mudança conceitual é necessário que: a) os estudantes sejam conscientizados pelos professores sobre as limitações de suas explicações e achem as explicações dos professores mais compreensíveis e melhores; b) os professores conheçam as concepções alternativas dos estudantes para poder desenvolver estratégias para a mudança conceitual e c) sejam considerados os fatores emocionais envolvidos no processo de mudança conceitual de modo que os estudantes se sintam respeitados e seguros para expor suas idéias.

Moraes, Ramos e Galliazi (2004) apresentam a idéia de aprendizagem como "complexificação" dos conhecimentos científicos, apontam que para que o aluno complexifique o seu conhecimento, deve-se partir do que ele já sabe, das explicações que é capaz de fornecer sobre o assunto em estudo. O modelo de aprendizagem significativa (Ausubel et al., 1978; Moreira, 1999) se baseia na interação de uma nova informação com conhecimentos pré-existentes na estrutura cognitiva do aprendiz. Assim, as concepções que os estudantes têm sobre um dado conceito científico vão funcionar como ponto de ancoragem para as novas idéias e conceitos (Moreira, 1999).

Assumiu-se nesta investigação a posição de que o ensino de química deve ter como foco a reestruturação das idéias que os estudantes já possuem (Trinidad-Velasco e Garritz, 2003), e assim, conhecer as concepções dos estudantes sobre as transformações químicas pode possibilitar a intervenção de forma efetiva na aprendizagem. Desse modo, os objetivos desta investigação foram: conhecer as concepções sobre transformações químicas apresentadas por estudantes do ensino médio e investigar o que pensam sobre as transformações químicas que ocorrem em sistemas reconhecidos como biológicos e como classificam essas transformações.

 

Metodologia

A investigação foi realizada com 44 estudantes do primeiro e segundo ano do Ensino Médio de uma escola da cidade de São Paulo, sendo 22 estudantes de cada série. Eles tinham idades entre 15 e 17 anos e já haviam passado por um ensino formal do tópico "Transformações Químicas", entretanto, os alunos da primeira série ainda não haviam estudado este assunto ao nível microscópico (modelos atômicos e ligações químicas) e simbólico (fórmulas e equações químicas), apenas ao nível macroscópico (fenomenológico).

Foi solicitado aos 44 estudantes que respondessem um questionário (Anexo 1) composto de duas questões. Na primeira questão eles deveriam escrever o que compreendiam por "transformação química" e dar exemplos de fenômenos que considerassem serem transformações químicas e outros que não considerassem serem transformações químicas. A segunda questão apresentava um conjunto de nove fenômenos e era solicitado aos alunos que classificassem cada um deles como transformação química ou não e que justificassem as respostas dadas. Os fenômenos foram selecionados de modo que houvesse:

— Três exemplos de transformações "químicas" não associadas a sistemas biológicos: enferrujamento, queima de carvão e corrosão do mármore por ácido.

— Três exemplos de transformações químicas associadas a sistemas biológicos: digestão de alimentos, fotossíntese, amadurecimento de um fruto.

— Três exemplos de transformações de estado físico: derretimento de um sorvete, evaporação do álcool, liberação do gás de um refrigerante.

Decidiu-se escolher os fenômenos de digestão, fotossíntese e amadurecimento, apesar de serem formados por conjuntos complexos de transformações químicas considerando que esses fenômenos já foram abordados no ensino formal em aulas de biologia e ciências (fotossíntese e digestão) ou porque as evidências de transformações químicas são claras e fazem parte do cotidiano dos estudantes (amadurecimento de uma fruta).

Como as duas classes apresentaram resultados similares, os resultados foram analisados conjuntamente para o grupo dos 44 alunos.

 

Análise das respostas dos alunos

Análise da Questão 1

As respostas dadas à primeira questão foram analisadas de modo a compreender tanto o conceito de transformação química dos estudantes, quanto detectar as concepções alternativas presentes em suas declarações. Qualquer outra forma de análise dos dados teria se mostrado por demais limitada, visto que muitas das declarações dos estudantes ora era um apanhado de concepções alternativas sem que fosse dada qualquer definição objetiva do conceito, ora apresentava uma mescla de definições de conceito e concepções alternativas. Assim, preferiu-se nesta análise qualitativa dos dados olhar para ambas informações, conceito e concepção alternativa. A partir da análise dos dados foram constituídas as categorias e subcategorias mostradas a seguir (tabelas 1 e 2).

Os 4 perfis conceituais (ou modelos teóricos) de Solsona e Izquierdo (1999) para o conceito de transformações químicas (incoerente, mecânico, cozinha e interativo) podem se mostrar um pouco limitados, principalmente nos casos em que o conceito esteja se formando nos estudantes, onde ainda permanece uma série de idéias prévias ou alternativas. Estas idéias são inseridas dentro do perfil incoerente, já que no mecânico e no cozinha considera-se que o estudante tenha apenas uma visão incompleta sobre as transformações químicas, mas não necessariamente errada. Desta forma, em uma turma em que o conceito de transformação química esteja em formação, a maioria das declarações dos estudantes seria simplesmente classificadas como incoerentes, sem que se analisasse de que forma e em que grau se dá esta incoerência. Olhar para as concepções alternativas presentes nas declarações incoerentes dos estudantes possibilita ampliar a visão das causas da incompreensão deles e fornecer elementos necessários para que haja uma intervenção didática efetiva.

Apesar das críticas feitas ao modelo de ensino por mudança conceitual na década de 90, alguns pesquisadores têm assumido uma postura mais conciliadora em relação aos diferentes modelos de aprendizagem (Bastos et al., 2004). Para estes pesquisadores, as críticas aos diferentes modelos de aprendizagem têm sido muito radicais. Eles declaram:

Os processos e contextos que caracterizam o ensino de ciências são complexos e qualquer modelo interpretativo ou norteador da ação que exclua outras alternativas plausíveis é necessariamente empobrecedor da realidade. (...) porém, esse princípio (...) nem sempre é observado pelos pesquisadores da área, e gasta-se um tempo enorme exaltando um dado modelo em detrimento de outro, como se fosse possível estabelecer explicações únicas que contemplassem todas as situações e para sempre; em conseqüência disso, impera a lógica da exclusão: o ensino por mudança conceitual vem para suplantar e substituir o ensino por descoberta, o ensino por pesquisa vem para suplantar e substituir o ensino por mudança conceitual, a noção de perfil conceitual vem para suplantar e substituir a teoria de mudança conceitual (p. 16).

Eles propõem que haja certo pluralismo de interpretação acerca do processo de ensino e aprendizagem em ciências. Para eles é evidente que as pessoas possam formar perfis conceituais (p. 36), que as pessoas possam sofrer mudanças conceituais em diferentes graus de profundidade (p. 38) e mesmo que a formação de perfis conceituais corresponda a uma etapa intermediária em um processo mais amplo de mudança conceitual (p. 38).

Assim, nos parece também cabível esta simbiose entre a teoria de mudança conceitual e a teoria dos perfis conceituais de modo que, na análise dos dados, possa-se ter uma visão mais ampla tanto dos diferentes perfis conceituais demonstrados pelos estudantes quanto de suas concepções alternativas. A tabela 2 apresenta os perfis conceituais e concepções alternativas que foram identificados nas declarações dos 44 estudantes investigados. Algumas vezes apareceram duas concepções alternativas nas declarações de um estudante e, mesmo alguns daqueles que apresentaram declarações aceitáveis (perfil cozinha), apresentaram também concepções alternativas, como vemos nas declarações a baixo:

"Transformações químicas é quando duas substâncias interagem e formam outra diferente. Exemplo do que não é transformação química: derretimento do gelo, só há mudança de estado físico Exemplo de transformação química: queima da madeira: madeira + O2 → CO2 + cinzas".

"Transformação química é quando você junta 2 ou mais materiais e pode aparecer um novo material ou não, ou então pode ou não mudar de estado físico. Exemplo de transformação química: chuva ácida derretendo o mármore (estátuas) que surgiu gesso. Exemplo do que não é transformação química: derreter um sorvete".

Ambas as declarações foram categorizadas como sendo perfis conceituais aceitáveis (cozinha) por enfatizarem a formação de novas substâncias nas transformações químicas. Entretanto, percebe-se ainda a presença da idéia de que para haver uma transformação química é necessário ao menos duas substâncias. Apenas 2 dos 8 alunos que manifestaram perfis aceitáveis (7 cozinha e 1 mecânico) apresentaram também concepções alternativas. Desta forma, a soma das manifestações de perfis conceituais aceitáveis (8), concepções alternativas (34) e declarações confusas (7) é maior do que número de estudantes investigados (44).

 

Análise da Questão 2

Quando comparados os acertos dos estudantes na segunda questão, em que deveriam classificar os fenômenos como sendo ou não transformações químicas e justificar suas respostas, de acordo com o tipo de transformação ocorrida (transformações químicas, naturais e físicas), percebe-se que eles têm mais dificuldade em classificar os fenômenos ligados a sistemas biológicos e físicos (Tabela 3).

O fato de alguns estudantes considerarem as transformações físicas (derretimento de um sorvete, evaporação do álcool e liberação do gás de um refrigerante) como sendo transformações químicas foi observado em diversos trabalhos de pesquisa, que incluem este tipo de explicações na categoria modificação (Anderson, 1986, 1990). Isto significa que muitos estudantes consideram que tenha havido uma transformação química pelo simples fato de haver uma modificação na aparência de um material.

Ao analisar as justificativas da segunda questão, pode-se perceber que muitos estudantes, embora não tenham manifestado na questão 1 a concepção alternativa de que processos naturais não sejam transformações químicas, o fizeram na questão 2. Apenas 4 alunos do 1° ano e 8 do 2° ano classificaram corretamente ao menos dois dos três itens deste tipo de transformação, ou seja, dentre os 44 estudantes, 32 consideraram que as transformações naturais associadas a sistemas biológicos (amadurecimento de uma fruta, fotossíntese e digestão de alimentos) não são transformações químicas.

Comparando-se as respostas dadas a esse tipo de transformações, pode-se verificar uma diferença nítida entre a facilidade dos estudantes em classificar cada fenômeno. Eles apresentaram maior dificuldade em classificar o fenômeno (b) amadurecimento de uma fruta como sendo uma transformação química (Tabela 4).

Analisando as justificativas dadas a essas transformações pode-se perceber a presença de concepções alternativas observadas na Tabela 1.

Grande parte dos estudantes que classificaram erroneamente essas transformações justificou suas respostas apontando que estes eram "um processo natural da planta" ou por que "acontece sozinha (a fotossíntese), sem a ajuda do homem". Este tipo de explicação sugere que a presença da concepção de que fenômenos naturais não são transformações químicas é muito maior do que o que pode ser observado na análise da Questão 1.

Para a questão (b) amadurecimento de um fruto os alunos apresentaram um baixo número de acertos talvez devido ao fato de que eles não consideram que ocorram interações entre diferentes substâncias no interior de uma fruta. Isto pode estar relacionado com a concepção alternativa de que é necessária a existência de duas ou mais substâncias para que ocorra uma transformação química. Esta hipótese se apóia em expressões presentes nas declarações dos estudantes, tais como "Acontece sozinho", "Acontece com o tempo" ou "É um processo natural". Alguns estudantes que erraram o item (b) acertaram os itens (e) fotossíntese e (h) digestão por compreenderem a interação entre diferentes materiais, como pode ser visto nas declarações:

"Porque o estômago libera ácidos e surge um novo material".

"Há contato do CO2 com o O2 e há transformação química".

"Porque a planta transforma o CO2 em O2".

A presença de diferentes materiais interagindo parece ser condição indispensável para que ocorra uma transformação química.

 

Discussão dos resultados

A análise da Questão 2 foi reveladora ao possibilitar conhecer o que os estudantes pensam sobre os processos naturais. Uma série de concepções alternativas se revelou frente aos questionamentos levantados. Concepções que pareciam insignificantes na análise da Questão 1 se mostraram muito marcantes nas declarações dos estudantes, ampliando a visão sobre suas diferentes formas de pensar o tema transformações químicas.

O fato de poder-se perceber um outro espectro das concepções alternativas dos estudantes através da Questão 2 mostra a necessidade de se diversificar os instrumentos de investigação de modo que se possa tanto ter visões amplas de seu objeto de estudo, neste caso as idéias dos estudantes sobre as transformações químicas, quanto ter visões detalhadas de um ponto de interesse, neste caso o que os estudantes pensam sobre os processos naturais.

O fato de muitos estudantes justificarem a classificação dos processos naturais como não sendo químicas, além de estar ligado às concepções alternativas "Necessidade de duas ou mais substâncias para que haja uma TQ" e "Uma substância age sobre outra", também parece revelar uma visão da Química um pouco distorcida. Dizer que um fenômeno não é uma transformação química simplesmente pelo fato de ele ocorrer em um organismo vivo parece transparecer uma visão da química como algo nocivo, danoso ou artificial.

 

Conclusão

Esta investigação possibilitou verificar a diversidade de concepções dos estudantes investigados sobre as transformações químicas. A maioria dessas concepções foi considerada incoerente com o conhecimento químico. Apenas uma pequena parcela dos estudantes (1/5) tinha um entendimento satisfatório sobre as transformações químicas, enquanto o restante ou apresentou idéias alternativas (3/5) ou deu declarações confusas (1/5).

Apesar dos diversos trabalhos de pesquisa realizados nas três últimas décadas sobre as concepções alternativas dos estudantes com relação às transformações químicas, algumas idéias parecem ainda pouco exploradas. Pouco se fala sobre as transformações químicas que ocorrem na natureza, tanto em pesquisas na área de ensino de química quanto no próprio ensino de química ao nível Médio. Isto talvez seja um fator que alimente a impressão dos estudantes de que processos químicos são necessariamente artificiais e que não ocorram transformações químicas em organismos vivos. Conhecer estas diferentes formas de pensar as transformações químicas possibilita desenvolver tanto melhores estratégias de ensino, quanto formas de avaliação mais precisas e justas.

 

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