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Anuario mexicano de derecho internacional

versão impressa ISSN 1870-4654

Anu. Mex. Der. Inter vol.20  Ciudad de México Jan./Dez. 2020  Epub 19-Mar-2021

https://doi.org/10.22201/iij.24487872e.2020.20.14478 

Doctrina

A Corte Interamericana de Direitos Humanos nos anos 80: Uma “Corte” Pedro Nikken?

The Inter-American Court of Human Rights in the 1980s: A “Court” Pedro Nikken?

La Cour Interaméricaine des Droits de l’Homme dans les années 80: une “Cour” Pedro Nikken?

Siddharta Legale* 

* Professor de Direito Constitucional da Universidade Federal do Rio de Janeiro.


Resumo:

A história da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) permite identificar perfis diferentes que se alteraram ao longo do tempo. Nos anos 80, os primeiros casos submetidos a sua apreciação revelam uma Corte tipicamente consultiva que avança em direção a uma corte mais contenciosa e interveniente nos anos 90. A judicatura e a presidência do magistrado Pedro Nikken permitem traçar uma metonímia do comportamento da Corte IDH durante nesse período, devido as suas obras enquanto jurista e de suas decisões enquanto juiz. O contexto histórico de ascensão dos Direitos Humanos e a ideia de desenvolvimento progressivo traz o plano de fundo no qual se insere a proposta de uma “Corte Pedro Nikken” que analisa criticamente a expansão da jurisdição contenciosa Corte IDH. As opiniões consultivas e os casos contencioso julgados pela Corte IDH demonstram etapas diferentes de desenvolvimentos e formação da própria identidade da Corte.

Palavras-chave: Pedro Nikken; Direitos Humanos; Corte Interamericana de Direitos Humanos; Opinião Consultiva

Abstract:

The Inter-American Court of Human Rights (IACHR) changes over time. In the 1980s, the main cases were submitted to Advisory Opinion that moves towards a more Decisions and judgements in a interventional way at the Court Caselaw in 90´s. Judicature and the Presidency of Pedro Nikken allows a company to have the freedom of decision during the period, as their own laws while preparing for justice. The historical context of the rise of human rights and an idea of progressive development is the most qualified background of the proposal of “Court Nikken” that critically analyzes the expansion of the contentious jurisdiction IACHR. The advisory companies and contentious cases judged by the IACHR have demonstrated stages of development and formation of the Court’s own identity.

Key words: Pedro Nikken; Human Rights; Inter-American Court of Human Rights; Advisory Opinion

Résumé:

L’histoire de la Cour Interaméricaine des Droits de l’Homme (CIDH) permet d’identifier les différents profils qui ont changé au fil du temps. Dans les années 80, les premières affaires soumises à leur appréciation révèlent un tribunal typiquement consultatif qui avance vers un tribunal plus contentieux et intervenant dans les années 90. La prócedure judiciaire et la présidence du magistrat Pedro Nikken permettent de retracer une métonymie du comportement de la Cour IDH au cours de cette période, en raison de ses œuvres en tant que juriste et de ses décisions en tant que juge. Le contexte historique de l’ascension des Droits de l’Homme et l’idée de développement progressif apportent le plan de fond dans lequel s’insère la proposition d’une “Cour Pedro Nikken”, qui analyse de manière critique l’expansion de la juridiction contentieuse devant la Cour de la CIDH. Les avis consultatifs et les affaires contentieuses jugés par la CIDH démontrent différentes étapes du développement et de la formation de la propre identité de la Cour.

Mots-clés: Pedro Nikken; Droits de l’homme; Cour Interaméricaine des Droits de l’Homme; avis consultatif

Sumário: I. Introdução. II. Pedro Nikken, os direitos humanos e o desenvolvimento progressivo. III. A Corte IDH nos anos 80: uma Corte de opiniões consultivas. IV. O ciclo de casos hondurenhos e a competência contenciosa da Corte IDH. V. Apontamentos finais. VI. Referências bibliográficas.

I. Introdução

Existem diversos artigos sobre as opiniões consultivas e sobre os casos contenciosos clássicos da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) durante anos 80. Nenhum deles, porém, investigou a existência de uma identidade comum no perfil decisório dos magistrados e dos fundamentos dominantes empregados nessa época. Investiga-se se existe uma Corte IDH coerente e com um perfil claramente definido a partir de uma metodologia de estudo de casos,1 que constrói um catálogo exaustivo de todas as decisões para por meio da análise delas compreender as características dessa jurisdição internacional em sua primeira década de funcionamento.

A hipótese é que existe uma tendência comum nessa década que difere das décadas posteriores em relação ao exercício da competência consultiva e contenciosa. A identidade ou perfil decisório dessa época desvela-se no fato de a Corte IDH ser mais consultiva do que contenciosa. Nos últimos anos, a situação se inverteu: a Corte IDH tornou-se mais contenciosa. Nos sete primeiros anos de sua atuação,2 porém, foram expedidas 4 opiniões consultivas e nenhum caso contencioso. Como o mandato dos magistrados tem duração de seis anos, a “Primeira Corte Interamericana” expirou por assim dizer sem apreciar a responsabilidade internacional de nenhum Estado.3 Até 1989 foram 10 opiniões consultivas e 4 casos contenciosos.

Há, ainda assim, nestes casos contenciosos, uma Corte IDH mais autocontida do que interveniente na soberania dos Estados. A sua jurisdição opta por uma fundamentação decisória pautada mais no desenvolvimento progressivo do que nas normas de jus cogens; e um processo de responsabilização que busca um acordo entre o Estado e as partes lesionadas mesmo na fase de responsabilização e custas; e, ainda, o conceito de “indenização justa” se circunscreve mais a aspectos pecuniários do que em obrigações de fazer em sentido amplo.

A esse conjunto de características da jurisprudência da Corte IDH nos anos 80 denominaremos de “Corte” Pedro Nikken, tomando como referência teórica esse ex-magistrado da Corte IDH, cuja judicatura foi exercida entre 1980 a 1989, tendo sido Presidente da mesma entre 1983-85.4 Seus textos e obras são bastante representativas dessa visão predominante na jurisprudência internacional nessa época. A sua principal obra, por exemplo, aposta num desenvolvimento progressivo do direito internacional dos direitos humanos,5 que resvalam numa postura menos ativista do que a dos magistrados dos anos 90, como Cançado Trindade, cuja ênfase será no acesso à justiça.

Pedro Nikken pode ser mobilizado, por isso, como uma verdadeira metonímia na Corte da IDH. Nesse acervo inicial, essa identidade se fez presente, consciente ou inconscientemente, como será apresentado nas três partes centrais do presente texto: (i) o marco teórico na produção de Pedro Nikken; (ii) a função consultiva da Corte IDH em termos teóricos e de conteúdo das OC proferidas; e (iii) os casos contenciosos em especial o ciclo de casos hondurenhos.6

II. Pedro Nikken, os direitos humanos e o desenvolvimento progressivo

A concepção teórica de Pedro Nikken será abordada em quatro partes: (i) o contexto histórico da Corte IDH; (ii) o papel das opiniões consultivas; (iii) o conceito de direitos humanos; e (iv) o conceito de desenvolvimento progressivo, previsto no art. 26 da CADH e muito utilizado pela jurisprudência interamericana, que o magistrado foi o principal teórico a lapidar em seu clássico livro, “A proteção internacional dos direitos humanos: seu desenvolvimento progressivo”.7

2. Contexto histórico da “Corte” Pedro Nikken

A Corte IDH não começou a funcionar da noite para o dia. Declarações foram aprovadas, convenções foram assinadas e algumas práticas antecederam a construção desse mecanismo judicial para fazer prevalecer a paz contra a força e resolver as violações aos direitos humanos pelo Estado. Em 1948, oito meses antes da aprovação da Declaração Universal de Direitos Humanos da ONU, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem (DADDH) foi aprovada em abril na OEA, tornando-se, oficialmente, o primeiro documento do pós-guerra a enunciar de forma mais ampla a necessidade de proteção geral e irrestrita aos direitos humanos. Vale destacar que, embora tenha sido aprovada como uma Resolução da Assembleia-Geral da OEA, a OC-10/89 reconheceu que seus princípios são obrigatórios por se integrarem à Carta da OEA.

Em 1959, a Resolução VIII da Reunião de Consulta dos Ministros de Relações Exteriores estabeleceu a Comissão Interamericana de Direitos Humanos originalmente destinada a ser um órgão de consulta para questões urgentes. Progressivamente, a CIDH foi se institucionalizando. A Resolução IX da VIII reunião da Consulta de Ministros das Relações Exteriores de 1962 recomendou emendar o Estatuto. Em 1965, a Resolução XXII ampliou os poderes da CIDH para receber petições ou comunicações sobre violações a direitos humanos. Em 1967, o Protocolo de Buenos Aires de Reformas à Carta da OEA erigiu a CIDH a categoria de órgão principal, determinando que a CIDH velaria por seus princípios até a entrada em vigor da CADH.8

Em 1969, foi aprovada a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica. A CIDH deve velar pela sua aplicação e produzir relatórios, contendo informações sobre o progresso na realização dos objetivos da DADDH. Na época, a CIDH chegou a conclamar os Estados a incorporarem em suas Constituições certas categorias de direitos para se harmonizar com as convenções e recomendações de direitos humanos da ONU, da OEA e da OIT.9

Em 1978, a CADH entra em vigor, constituindo um divisor de águas entre a antiga e a atual CIDH, que passou a se fortalecer institucionalmente. Em 1988, foi aprovado o Protocolo de São Salvador em matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ao sistema interamericano, que entraria em vigor apenas em 1999.

Na década de 80, foram julgados apenas 4 casos contenciosos. Três deles são oriundos de Honduras, razão pela qual se optou por batizá-los como o “ciclo de casos hondurenhos” da Corte IDH. O primeiro caso com manifestação da Corte IDH, porém, é Viviana Gallardo e outros vs Costa Rica (1981 e 1983). Embora revele o perfil mais autocontido típico da Corte IDH da época, não merece um papel de destaque. É singular em demasia. O site da Corte erra, chegando a enquadrá-lo/indexá-lo no site da Corte IDH equivocadamente como uma estranha espécie de “opinião consultiva zero” -seja lá o que isso for-.

A Costa Rica, no caso, acionou diretamente a Corte IDH e pretendia, a um só tempo, renunciar ao esgotamento dos recursos internos e ao procedimento na CIDH para submeter à jurisdição contenciosa o assassinato de Viviana Gallardo na cela e às lesões causadas às suas companheiras de cela por um policial da Costa Rica.10 A decisão de 13 de novembro de 1981, em síntese, esquivou-se do pronunciamento sobre a questão do esgotamento e remeteu a questão à CIDH.

O então professor Antonio Augusto Cançado Trindade afirma que, em 1978, chegavam a 3200 os casos examinados pela CIDH, enquanto, posteriormente, somente em 1980 foram recebidas 3402 denúncias, totalizando 6756 denúncias recebidas, que chegaram a originar na época 437 resoluções. A década de 70 e 80 foi de um reinado pleno da CIDH. Embora Cançado Trindade não realize tal contraste, causa espanto com os olhos de hoje que, das 6756 denúncias presentes na CIDH exclusivamente no ano de 1980, apenas 4 casos tenham sido efetivamente julgados pela Corte IDH em uma década inteira.

É preciso destacar que, a despeito de eventuais questões políticas e institucionais, um fator jurídico influenciou bastante nesse cenário: o baixo número de países que haviam reconhecido a jurisdição obrigatória da Corte IDH. Embora muitos países tenham assinado a CADH na década do 60, 70 e 80, o mesmo não ocorreu com relação ao aceite da competência obrigatória da Corte IDH. Em toda a década de 80, apenas nove países o fizeram: Costa Rica (02/07/1980), Peru (21/01/1981), Honduras (09/09/1981), Argentina (05/09/1984), Equador (13/08/1984), Uruguai (19/04/1985), Colômbia (21/06/1985), Suriname (12/11/1987), Guatemala (09/03/1987).11

A América Latina vivia uma instabilidade política generalizada, decorrente das ditaduras militares que se aparelharam por meio de práticas sistemáticas de detenções arbitrárias, execuções extrajudiciais, torturas e desaparecimento forçado de pessoas. Diversas ditaduras militares na América Latina utilizaram o desaparecimento forçado para gerar medo e controlar a população, como os governos de Juan María Bordaberry no Uruguai (1973-1976), Jorge-Videla na Argentina (1976-1983), Hugo Nanzer na Bolívia (1971-1978), Augusto Pinochet no Chile (1974-1990), Alfredo Stroessner no Paraguai (1954-1989), Alberto Fujimori no Peru (1990-2000) e a ditadura militar no Brasil, especialmente nos governos Humberto Castello Branco (1964-1967) e Arthur da Costa e Silva (1967-1969).12

O “ciclo de casos hondurenhos”, formado pelos Velasquez Rodrigues vs Honduras (1988), Fairen Garbi vs. Honduras (1989), Godínez Cruz vs. Honduras (1989), até por esse contexto político, é uma metonímia não só que que viria a ser outros casos da própria Corte IDH na década de 90 e 2000, mas se revelam muito representativos do que se vivia à época na América Latina como um todo.

2. O papel das opiniões consultivas

A opinião consultiva como modalidade decisória da Corte IDH tem uma vantagem no contexto dos direitos humanos de tornar politicamente mais fácil fazer o governo aderir e cumprir seus conteúdos, já que ela, como destaca Thomas Buergenthal “não estigmatiza o estado como um violador de direitos e permite que o governo delinquente apareça como um cumpridor voluntário de tais atos”.13

O pensamento de Pedro Nikken a respeito, por sua vez, segue uma linha um pouco diferente. Concorda, inicialmente, com a afirmação de Faúndez Ledesma ao tratar dessa competência: “ela opera como uma espécie de tribunal constitucional encarregado de interpretar a Convenção ou qualquer outro tratado de direitos humanos”.14 Em seguida, contextualiza melhor as afirmações das opiniões consultivas, de modo a reconhecer a natureza jurisdicional e vinculante das OCs, ou seja, adota uma concepção que fortalece a obrigatoriedade da função consultiva, já que elas poderão fundamentar em casos contenciosos a responsabilidade internacional.

A afirmação da OC-1/82 é ressignificada de que as opiniões consultivas de que “não têm o mesmo efeito vinculante que se reconhece para suas sentenças em matéria contenciosa”. Pedro Nikken esclarece que a possível ambiguidade da Corte deve ser vista como uma decisão contingente e contextual para esclarecer que uma OC não gera responsabilidade internacional do Estado, embora os seus efeitos jurídicos sejam obrigatórios para o sistema interamericano. Na OC, fixou que pode ser objeto de consulta qualquer tratado de direitos humanos de caráter bi ou multilateral.

Quanto à afirmação na OC-03/83, solicitada pela CIDH de que, neste plano, cumpre “funcción assessora”, Nikken esclarece que a expressão serve para evitar um incidente à objeção da Guatemala na opinião consultiva, que vivenciava um contexto de possível aplicação da pena de morte. A Guatemala chegou a suspender a execução de pessoas condenadas à pena de morte em seu território. Foi nesse delicado contexto que foram apresentadas as diferenças entre as funções contenciosas e consultivas, de modo que a decisão não fosse interpretada pelo Governo da Guatemala como uma provocação para precipitar as execuções. Uma redação que soasse mais como uma sugestão do que como uma imposição seria, nesse contexto, mais palatável ou diplomática ao Estado.

Esta posição favorável à obrigatoriedade dos efeitos da opinião consultiva de Pedro Nikken, portanto, é a mais consistente com uma leitura que fortalece à CADH. Isso porque interpreta e descreve à eficácia das decisões da Corte IDH de acordo com o objetivo do artigo 2o. da CADH, segundo o qual os Estados devem adotar normas de direito interno que respeitem os direitos humanos. A propósito, vale destacar a OC-07/86 que envolveu o direito humano fundamental de retificação ou resposta, consagrado no art. 14 da CADH. Solicitada pela Costa Rica, a Corte IDH fixou o dever de o Estado respeitar tal direito, bem como de adotar procedimentos constitucionais, legislativos e outros para tornar efetivo o direito de resposta do art. 14 e 2º da CADH. Decidiu, ainda, que apenas por lei é possível restringir tal direito.

3. O conceito de direitos humanos

Pedro Nikken, como afirmado anteriormente, foi escolhido por sua compreensão dos direitos humanos retratar fielmente o espírito e a visão predominante de uma época, especialmente nos magistrados da Corte IDH. O conceito de direitos humanos, apresentado neste item, é a sua compreensão teórica.

Em primeiro lugar, direitos humanos, para o magistrado, são direitos inerentes à pessoa humana, flertando com um estoicismo e um jusnaturalismo que se contrapunha às barbáries cometidas na segunda guerra mundial.15

Em segundo lugar, estes direitos são oponíveis aos Estados, mais especificamente ao poder público e, portanto, estariam fora do âmbito de discricionariedade do Estado. De forma mais precisa, existem, para ele, “direitos legais” e “direitos programa”. Os primeiros constituem imediatamente limites à ação estatal em decorrência da possibilidade de controles judiciais ou quase-judiciais. Já os da segunda espécie seriam controlados apenas por órgãos técnico-políticas a partir da situação socioeconômica do país.16

Sua matriz surge do processo de constitucionalização de direitos e garantias fundamentais que alçaram relevo internacional em detrimento sua importância acima dos pode político do Estado. Surge pela primeira através da consolidação de direitos civis e políticos, sendo esta chamada de primeira geração. São direitos tipicamente individualistas que buscam garantir a proteção contra o arbítrio estatal e a sua não interferência na esfera pessoal de cada indivíduo.

Posteriormente, ganha especial importância a ideia de condições dignas de vida da pessoa, que pressupões a capacidade do ser humano de desenvolver necessidades básicas de vida. Essa foi a noção de direitos econômicos, sociais e culturais que chamada de direitos humanos de “segunda geração”. Tais direitos partem da ideia de insuficiência da simples previsão de direitos. É necessário que o estado proporcione mecanismo eficazes de concretizações desses direitos sob pena violação desses mesmos direitos.

Apesar de igualmente importantes e oponíveis ao estado, os direitos dessa geração se diferenciam em relação a sua exigibilidade. Os primeiros podem ser exigidos a qualquer tempo, devendo o Estado dar-lhe cumprimento imediato. Já os segundos, possuem certa margem de discricionariedade do poder público. Sua sindicabilidade judicial não depende apenas do seu descumprimento, mas também dos standards técnicos e das políticas públicas adotadas.17

Tem-se cogitado a possibilidade de se falar em uma “terceira geração” de direitos humanos, que seriam aqueles direitos conhecidos como “coletivos”, como, por exemplo, o direito a paz e ao meio ambiente saudável.

Essas “gerações” de direitos humanos são apenas divisões epistemológicas que representam momentos de surgimento e maior relevância de alguns direitos em relação a outros. Não obstante, relacionam-se de forma construtiva agregando novos conceitos a proteção dos direitos humanos. Isso significa que a superação de uma geração não implica na mitigação de sua importância, mas sim o advento de novos direitos que irão agregar e reforçar a proteção da pessoa Humana.

4. O desenvolvimento progressivo

A noção de desenvolvimento progressivo surge exatamente dessa perspectiva dos direitos humanos que avançam de maneira gradativa e incremental em determinados contextos sem negar os anteriores. São resultados de lutas que culminaram na emancipação de grupos sociais historicamente oprimidos.18 Em linhas gerais, envolve a tendência a tornar o conjunto de meios de proteção do direito internacional mais amplo, completo e eficaz. Isso significa, segundo Pedro Nikken, (i) tornar mais precisos o alcance e conteúdo dos direitos protegidos; (ii) dotar de eficácia vinculante o dever do Estado de respeitá-los; e (iii) criar de instituições e mecanismos com a finalidade de verificar o seu cumprimento das obrigações internacionais.191

Quanto à primeira ideia, é possível destacar os seguintes elementos: (i) o rol de direitos constitucionais não deve ser considerado taxativo, ou seja, deve ser enunciativo; (ii) a ideia de direitos “inerentes a pessoa humana” não se esgota nas previsões constitucionais; (iii) todos os direitos constitucionalmente previstos, via de regra, devem ser considerados como “inerentes a pessoa humana”; (iv) todo direito “inerente a pessoa humana” poderia ter sido positivado no texto constitucional expressamente; (v) uma vez reconhecido como direito “inerente a pessoa humana”, o fato de não estarem previstos literalmente no texto constitucional não deve significar a diminuição de sua importância.20

Quanto ao segundo elemento, Pedro Nikken sustenta a importância da difusão do direito internacional dos direitos humanos e de ampliar a sua força vinculante. Em primeiro lugar, essa expansão deve se dar no próprio plano internacional, reforçando compromissos existentes. Por exemplo, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem nasce como declaração e, portanto, formalmente desprovida de efeito vinculante, mas, progressivamente, a DADDH passa a ser invocada por outras convenções, como a própria Carta da OEA, adquirindo esse caráter, como reconhece da OC-10/87.21 Os direitos humanos, nessa concepção, devem ser integrados com o direito interno dos Estados como uma forma de ampliar os horizontes de proteção da pessoa e consolidar seus mecanismos de defesa. Esse reconhecimento posterior da força obrigatória pode igualmente decorrer de um costume que insere no tratado normas de jus cogens.

Quanto ao terceiro, é preciso notar que não raro as convenções são complementadas por outros protocolos. Não raro essa evolução posterior pode ser resultado de cláusulas facultativas colocadas nos tratados. Nessa linha, por exemplo, é a cláusula da CADH que prevê a facultatividade do aceite da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Da mesma forma, competências dos órgãos de supervisão podem ser exercidos em diferentes graus, em razão do contexto ou da complexidade da relação entre esses órgãos, como a dinâmica que varia entre a Corte IDH e a CIDH.

Nessa linha, Nikken chega até mesmo a falar em uma “competência progressiva”, exemplificando com a Comissão Interamericana que foi criada pela Conferência da V Reunião de Ministros das Relações exteriores de 1959 em Santiago do Chile sem apoio em um tratado formal e, gradativamente, foi se institucionalizando, notadamente a partir da Carta da OEA depois da Reforma de Buenos Aires de 1967 e da entrada em vigor da CADH em 1978.

Em qualquer uma dessas dimensões, Nikken destaca uma dupla dimensão da progressividade em estabelecer uma garantia ou piso mínimo ao qual os Estados estão obrigados, assim como a impossibilidade de interpretar as disposições do tratado de direitos humanos de forma menos ampla, já que essa é uma imposição da cláusula do artigo 29, da norma mais favorável ao ser humano. Trata-se de realizar uma interpretação evolutiva ou humanitária que vede retrocessos.

Por isso, o desenvolvimento progressivo dos direitos humanos pode estar presente em termos gerais ou específicos. No primeiro caso, implícita ou explicitamente, ocorre quando há previsão de conceitos indeterminados, como “ordem pública”, “bem-estar geral” ou “saúde pública”. A segunda via resulta de termos específicos, como quando a CADH prevê no artigo 4o. que os Estados que aboliram a pena de morte não podem restabelecê-la.

III. A Corte idh nos anos 80: uma corte de opiniões consultivas

A função consultiva da Corte IDH está prevista no artigo 64 da CADH.22 Para esclarecê-la dividiremos este item em duas partes. Muitas questões operacionais relacionadas às OCs constam do art. 60 e seguintes do Regulamento da Corte Interamericana, bem como em uma construção jurisprudencial da própria Corte IDH.23

Em linhas gerais, qualquer membro da OEA -faça ou não parte da CADH- poderá solicitar um parecer da Corte IDH.24 O indivíduo, em que pese os avanços promovidos pelas reformas ao Regimento Interno da Corte, ainda não está legitimado explicitamente pela CADH a submeter um caso a Corte por esse dispositivo.25 A própria Corte IDH também não possui legitimidade para iniciar uma opinião consultiva de ofício. Não obstante, uma vez iniciado o procedimento, a desistência do Estado não vincula a Corte IDH (OC-15/97). A Corte IDH entende, ainda, pela possibilidade de reformular as perguntas apresentadas (OC-7/86).26

Vale enfatizar: apenas os Estados podem pleitear especificamente a análise da compatibilidade entre a legislação interna com a CADH. Essa possibilidade tem um interesse prático para que essa função interpretativa auxilie o cumprimento pela legislação interna e por tratados fora do marco interamericano a partir dos direitos humanos previstos no sistema interamericano (OC-01/82).

Os órgãos e os organismos da OEA também podem consultar à Corte IDH. Eles estavam originalmente enumerados no Capítulo X da Carta da OEA, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, como dispõe o artigo 64. Atualmente, porém, depois de outras reformas do Pacto,27 eles estão presentes no Capítulo VII, no artigo 53: Assembleia-geral, Reunião da Consulta dos Ministros das Relações Exteriores, Conselhos, a Secretaria-geral, a Comissão Interamericana dos direitos Humanos (CIDH), as Conferências Especializadas e os Organismos Especializados.28 Como bem destaca a OC-03/83, nesse caso, a OC deve ser relevantes para assistir e orientar o solicitante no cumprimento de sua missão”. Thomas Buergenthal, à época da aprovação da CADH, destacou que, por incluir tais entes e não apenas os Estados, a competência consultiva era uma das mais amplas competências consultivas estabelecidas até então.29

O objetivo central da OC, segundo a própria Corte IDH, é “desentranhar o sentido, propósito e razão das normas internacionais sobre direitos humanos” (OC-16/99 e OC-17/02). Não servem para resolver questões de fato, já que a proteção de direitos e liberdades das pessoas cabe a jurisdição contenciosa, que não pode “resolver casos abstratos” (OC-14/94). Como não existem propriamente demandados ou atores, não se coloca como requisito a defesa do Estado no procedimento (OC-03/83). Ao fixar os sentidos válidos para interpretação antes de um litígio concreto, a Corte IDH acaba por realizar um controle de convencionalidade prévio ao caso contencioso.

As primeiras opiniões consultivas envolvem predominantemente aspectos relacionados ao próprio funcionamento do sistema interamericano. Por exemplo, das 15 primeiras, pelo menos estas 7 centram-se em questões relacionadas ao acesso, eficácia e competência formal da Corte: OC-1/82 (objeto da função consultiva), OC-2/82 (efeito das reservas à CADH), OC-6/86 (significado da expressão leis no artigo 30 da CADH), OC-10/89 (a DADDH), OC-11/90 (esgotamento aos recursos internos), OC-12/91 (compatibilidade de projeto de lei com a CADH), OC-13/93 (atribuições da CIDH).

Nessa fase, da década de 80 e início dos anos 90, a Corte IDH parece centrada em montar as suas próprias engrenagens. É claro que existem exceções nos dois contextos contrapostos. No primeiro cenário, algumas opiniões consultivas também delimitaram sentidos da Convenção, como a OC-3/83 (pena de morte), OC-4/84 (naturalização) e OC-5/85 (associação não obrigatória).

No segundo cenário posterior, por outro lado, também existem considerações sobre as engrenagens da Corte IDH, como, por exemplo, OC-19/05 (legalidade de atos da CIDH) e OC-20/09 (utilização de juízes ad hoc). No entanto, como tendência amplamente predominante, é real a passagem de uma Corte IDH mais autocentrada na definição de suas próprias competências e nas atribuições do sistema interamericano nos anos 80 para uma Corte IDH mais ativista e interveniente de meados dos anos 90 em diante.

É possível dizer, lendo essas características das opiniões consultivas a partir do pensamento de Pedro Nikken, que houve uma aposta num desenvolvimento progressivo das competências para só posteriormente, ocorrer uma tutela mais ativa de direitos pela Corte IDH. Vejamos as OCs em ordem cronológica.

A OC-01/82 decidiu que a Corte pode ser consultada sobre qualquer dispositivo de direitos humanos em qualquer tratado internacional bilateral ou multilateral, independentemente de ser constituído sob o sistema interamericano ou de que Estados não americanos sejam Partes. Apenas por decisão motivada poderá deixar de exercer a jurisdição consultiva quando o pedido verse, essencialmente, sobre obrigações assumidas por um Estado não americano ou sobre a estrutura ou operação de órgãos internacionais fora do sistema interamericano, bem como quando dele resulte alteração ou enfraquecimento do sistema estabelecido pela CADH, em detrimento do indivíduo.30

No primeiro eixo, a OC-02/82 esclareceu o momento a partir da qual a Corte IDH é competente para julgar o Estado. Decidiu que a CADH entra em vigor, obrigando os Estados que a ratificam ou aderiram, com ou sem reservas, na data do depósito do instrumento de ratificação ou de adesão. A partir desse momento, o indivíduo desfrutará da proteção da jurisdição internacional, caso seus direitos humanos sejam violados. A própria Corte IDH observou, a propósito, que os tratados de direitos humanos, como a CADH, não são tratados multilaterais clássicos que buscam benefícios mútuos. Destacou que os tratados direitos humanos almejam proteger seres humanos sob e para além da jurisdição do Estado.31

A OC-3/83, solicitada pela CIDH, abordou as restrições à pena de morte, previstas no artigo 4o. da CADH. Após refutar objeções preliminares interpostas pela Guatemala, a Corte afirmou, unanimemente, que a CADH impõe uma proibição absoluta de ampliar as hipóteses de aplicação da pena de morte para além dos casos já previstos na lei interna após a entrada em vigor da CADH. Mesmo que o Estado tenha feito uma reserva ao art. 4.4, isso não lhe confere o direito de aplicar penas de mortes para crimes que anteriormente à vigência da CADH, o Estado não aplicara tal penalidade. Trata-se de uma posição da Corte para estimular a abolição progressiva da pena de morte.

Na OC-4/84, Costa Rica solicitou uma opinião da Corte IDH sobre a compatibilidade com a CADH de uma proposta de emenda à Constituição Política da Costa Rica relacionada com a naturalização. A Corte IDH decidiu que a proposta de emenda não afetava o direito à nacionalidade garantido pelo art. 20 da CADH, pois ela busca apenas restringir a concessão de naturalização, o que está dentro da atuação aceitável do Estado. Defende, unanimemente, que a simplificação da naturalização para centro-americanos, ibero-americanos e espanhóis também não indica discriminação e que dar esse tratamento preferencial apenas a indivíduos natos também não é discriminatório. Por fim, entende que o tratamento preferencial dado às esposas para fins de naturalização viola à igualdade e à não discriminação, sendo incompatível com os artigos 17 (4) e 24 da CADH.

A OC-05/85, solicitada pela Costa Rica, dispunha sobre a compatibilidade da sua Lei doméstica que exigia a associação obrigatória para o exercício da profissão de jornalista com os artigos 13 e 29 da CADH. A Corte IDH entendeu que a obrigatoriedade viola o artigo 13 da CADH, por impedir o pleno uso dos meios de comunicação, tanto na dimensão referente à liberdade de expressão, quanto na difusão da informação. A Lei Orgânica da Associação de Jornalistas da Costa Rica, portanto, é incompatível com o sistema interamericano.32

Essa OC-5/85 é emblemática, porque a Corte IDH começa a tatear as suas competências materiais de forma menos tímida ao definir o conteúdo jurídico da liberdade de associação e de expressão contida na CADH, utilizando-se de uma interpretação a partir do princípio pro persona como uma interpretação extensiva dos direitos humanos, que é um componente fundamental na argumentação do desenvolvimento progressivo33 A Corte IDH acaba por apresentar o gérmen da noção do controle de convencionalidade -ainda sem utilizar o termo-. O pedido de verificação da compatibilidade da legislação da Costa Rica com a CADH partiu do próprio Estado, o que torna a acomodação dessa função consultiva, prevista no art. 64 da CADH menos delicada e menos intrusiva à soberania, seja pela competência estar expressamente prevista na CADH, seja pela solicitação ter partido do próprio Estado. Contudo, ao observar a sua utilização na prática, verifica-se que, utilizando ou não o termo, realiza-se um controle de convencionalidade.

A OC n. 6/86, por sua vez, foi requisitada pelo Uruguai e dispõe sobre o alcance da expressão “lei” no artigo 30 da CADH, que versa sobre as restrições permitidas aos direitos humanos. Admitiu restrições a tais direitos, mas não a supressão dos mesmos. O governo Uruguaio questionou se a exigência de “leis” para restrição de direitos deve ser interpretada em seu sentido formal, ou seja, apenas como aquela norma jurídica aprovada pelo Parlamento e promulgada pelo Poder Executivo. Em outras palavras, questionou se poderiam ser objeto de interpretação as leis no sentido material ou amplo, que abrigue outras espécies normativas do ordenamento jurídico, que não passaram por um processo legislativo. A Corte IDH decidiu que a expressão “leis” do artigo 30 da CADH designa norma jurídica de caráter geral, emanada dos órgãos legislativos democraticamente eleitos e elaborada segundo o procedimento estabelecido pelas Constituições dos Estados partes para a formação de leis. Lei, portanto, não é qualquer ato normativo. A Corte IDH não invalidou, nessa oportunidade, uma lei estatal por uma restrição convencionalmente inválida. Apenas traçou os parâmetros a partir dos quais apreciará as restrições.

Na OC-07/86, a Corte IDH se autoconteve. Afirmou que seria necessária uma lei em sentido formal para restringir o direito de resposta, mas a Corte IDH se recusou, apesar do pedido expresso da Costa Rica, a apreciar a forma como esse direito de resposta seria aplicado no direito interno por ser uma questão a cargo de cada Estado. Portanto, essa OC, típica da década de 80, revela uma postura comedida ou menos interveniente da Corte IDH. Mesmo com o Estado solicitando uma opinião de como regular o direito de resposta no plano interno, a Corte IDH não ingressou em um domínio próprio da atividade soberana do Estado de legislar. Apenas interpretou o sentido da CADH, em seu artigo 30, no sentido de que a expressão “lei” para restringir direitos deve ser compreendida lei em sentido formal, aprovada pelo Poder Legislativo.

A OC-08/87, solicitada pela CIDH, versava sobre a suspensão do Habeas Corpus no caso de estado de exceção. A Corte IDH opinou pela impossibilidade de se realizar tal suspensão, por conta dos procedimentos jurídicos consagrados nos artigos 25.1 e 7.6 da CADH. O artigo 27.2 prevê inclusive que as garantias judiciais indispensáveis para proteger direitos e liberdades não podem ser suspensas. Esclareceu que o habeas corpus é essencial para verificar a legalidade da prisão e garantir o respeito ao direito à vida e à integridade física. Consignou que garantias como essa não podem ser suspensas por atentar contra o princípio democrático. Quando se desvincula do exercício da democracia, a suspensão torna-se ilegítima e viola inclusive o artigo 3o. da Carta da OEA.

A OC-9/87 dispôs sobre as garantias judiciais nos estados de emergência, previstas nos artigos 27.2, 25 e 8 da CADH.34 O Uruguai questionou qual seria o alcance da proibição de suspensão de garantias judiciais indispensáveis, determinado pela CADH, mais especificamente se mesmo em caso de guerra, de perigo público ou de outra emergência que ameace a independência ou segurança do Estado parte a suspensão seria impossível? Pretendeu, com isso, definir quais são as indispensáveis garantias? A Corte IDH entendeu, seguindo a mesma linha da OC-8/87, que são os procedimentos judiciais para garantir plenamente direitos e liberdades, tal como o habeas corpus. O artigo 27.1 da CADH exige que os meios sejam idôneos para o controle das disposições no estado de emergência, adequem-se às necessidades da situação e não excedam os limites da CADH. Enfatizou, ainda, que o artigo 1.1 prevê o dever de o Estado respeitar direitos e liberdades, assim como que haja um recurso efetivo e rápido a tribunais competentes nos termos do art. 25.1 para fazer valer os direitos asseguradas tanto na Constituição nacional, quanto na CADH.

A OC-10/89, por sua vez, foi solicitada pela Colômbia sobre a interpretação da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem (DADDH) de acordo com o artigo 64 da CADH.35 A questão era se a Corte IDH poderia dar opinião consultiva sobre a interpretação da DADDH ou tomá-la por base, já que a Declaração não é um Tratado. Respondeu-se positivamente à questão com base em três argumentos. Em primeiro lugar, o artigo 29 da CADH faz referência expressa à DADDH. Em segundo, a DADDH contém e define direitos humanos essenciais mencionados pela Carta da OEA, razão pela qual não se pode desconsiderar pura e simplesmente as suas disposições. Em terceiro lugar, a DADDH, mesmo não sendo um tratado no sentido conferido pelas CVDT, constitui importante fonte de obrigações em razão da evolução costumeira do direito internacional contemporâneo. Portanto, a DADDH também é parâmetro de interpretação para a Corte IDH que tem competência para interpretá-la aos Estados.

As OCs do início dos anos 90 ainda continuam com um perfil semelhantes. A OC-11/90, por exemplo, fixou uma compreensão material do esgotamento das instâncias internas, permitindo introduzir exceções. A OC-12/91 fixou a impossibilidade de acessar a Corte pela via consultiva, quando o pedido de OC for um disfarçado caso contencioso. A OC-13/93, por exemplo, dispôs que a CIDH pode reconhecer violações à CADH, mas não à legislação interna a cada Estado.

Vale notar as OCs da Corte IDH até aqui acabam por dispor mais sobre as engrenagens da própria Corte IDH ou do sistema interamericano em geral do que sobre o conteúdo material de direitos para limitar condutas estatais. Há exceções, é claro, como as OCs 3 (pena de morte), 4 (naturalização) e 5 (associação dos jornalistas). Seja como for, esse processo de definição de suas competências não deixa de ser uma espécie de opção pelo desenvolvimento progressivo das mesmas que intensifica a função consultiva em detrimento da contenciosa em um momento de desabrochar da Corte IDH.

IV. O ciclo de casos hondurenhos e a competência contenciosa da corte IDH

O “ciclo de casos hondurenhos” é composto por três casos fundacionais do sistema interamericano de proteção de direitos humanos: Velasquez Rodrigues vs Honduras (1988), Fairen Garbi vs Honduras (1989), Godínez Cruz vs Honduras (1989). São casos envolvendo o desaparecimento forçado de pessoas.36 O desaparecimento forçado possui, segundo a jurisprudência da Corte IDH, um caráter complexo, múltiplo, permanente, continuado e pluriofensivo aos direitos humanos, protegidos pela CADH, como a vida (art. 4), liberdade pessoal (artigo 7), integridade pessoal (artigo 5) e reconhecimento da personalidade jurídica (artigo 3).

A noção de privação da liberdade aparece na jurisprudência da Corte IDH como privação ou “subtração da proteção da lei”.37 No caso específico de Honduras, uma breve apresentação do contexto histórico ajuda a compreender melhor essa violação de direitos humanos que ocorre em diversos países da américa latina. A América Central passava por uma forte instabilidade política e social, tanto interna, quanto externa, resultantes das disputas de poder em um cenário de guerra fria.

Em 1982, uma nova Constituição foi promulgada, tentando reverter o cenário autoritário, embora democracia tenha vindo com pautas neoliberais de diminuição do Estado e contenção de gastos. Roberto Suazo Córdova chega ao poder, tendo que lidar, de um lado, com os conflitos entre Guatemala e El salvador e, de outro, com a “ajuda econômica” e a pressão norte-americana, que colocava Honduras em uma “posição precária”, como bem qualificou Thomas M. Leonard.38 Apenas em 1985, o governo conseguiu, por exemplo, expelir os “Contras” do Hospital e escritório que possuíam em Tegucigalpa, capital de Honduras.

O simples fato de os três primeiros casos serem do mesmo país já é interessante por si só. Contudo, a unidade de sentido e a construção de significados relevantes sobre o desaparecimento forçado de pessoas torna os casos ainda mais relevantes, seja por dar início ao acesso à justiça internacional no sistema interamericano, seja para proteção de direitos humanos (vida, integridade física e liberdade) contra ditaduras regimes autoritários que assolavam a América Latina e utilizavam essa prática nefasta de forma generalizada para difundir medo e controlar a população. Há trechos idênticos nesses relevantes leading cases a demonstrar a harmonia e unidade de sentido sobre o tema na jurisdição contenciosa da Corte IDH. Esses casos são retratos de uma época, mas também o espelho de uma instituição em seu nascedouro.

Esses são alguns fatores que contribuíram para formar a unidade de sentido presente nestas decisões, a ponto de ser possível considerá-las um verdadeiro ciclo. Em primeiro lugar, todos os casos foram levados simultaneamente à Corte IDH pelo CIDH no dia 24 de abril de 1986.39 Em segundo, é verdade que as sentenças foram proferidas pela Corte IDH em diferentes datas entre 1988 e 1989. Contudo, a composição da Corte IDH foi essencialmente a mesma: a Presidência e a vice-presidência foi integrada ora por Thomas Buergenthal, ora de Rafael Nieto Navia,40 assim como a composição como um todo possui magistrados com formas de pensar bem parecidas, como Rodolfo Piza Escalante, Pedro Nikken e Héctor Fix-Zamudio. Chegou a haver um voto dissidente no caso Velasquez Rodriguez, mas, como será abordado, a discordância não foi substancial quanto ao mérito da decisão. Envolveu uma importante questão, mas de caráter procedimental quanto ao papel da CIDH e das vítimas perante à Corte IDH.

1 . O caso Velasquez Rodriguez vs Honduras (1988)

O caso Velasquez Rodriguez vs. Honduras (1988)41 foi submetido à jurisdição da Corte IDH no dia 24 de abril de 1986 pela CIDH. Envolveu a possível violação pelo Estado de Honduras do direito à vida (art. 4), integridade pessoal (artigo 5o.) e liberdade pessoal (artigo 7o.) da CADH do senhor Ángel Manfredo Velásquez Rodríquez. A sentença foi proferida em 29 de julho de 1988, sendo precedida de algumas medidas provisionais. Esse caso entrou para a história do sistema interamericano como a primeira sentença propriamente dita da Corte IDH e uma das mais importantes já proferidas pelos parâmetros traçados permanecerem como padrão decisório em sua jurisprudência, como, por exemplo, a noção de que nenhuma atividade do Estado pode se fundar sob o desprezo da dignidade humana.42

Consta nos informes que Manfredo Velásquez Rodriguez foi detido de forma violenta, sem que houvesse ordem judicial por pessoas ligadas ao governo, relacionados à Direção Nacional de Investigação e a grupos de inteligência das forças armadas. Após a captura, de acordo com testemunhas, a vítima foi levada para uma cela na II Estação das Forças de Segurança Pública, em Tegucigalpa. Foi vítima de agressões, tortura e outras formas de tratamento desumano e degradante. O motivo estaria ligado a suposta prática de crimes políticos. As autoridades negaram todos os fatos, inclusive a sua detenção.43

Estima-se que entre 1981 e 1984 desapareceram cerca de 130 pessoas devido às atuações clandestinas das forças armadas para perseguir pessoas consideradas “perigosas” para o estado. A irmã de Manfredo, a senhora Zenaida Velásquez, concedeu seu depoimento como testemunha ocular do presente caso. Segundo ela, no dia 12 de setembro de 1981, Manfredo estava em um estacionamento de veículos no centro de Tegucigalpa, quando homens fortemente armados, vestidos de civil, usaram um carro sem placa para capturar o seu irmão.

A Corte IDH considerou provados os fatos acima apontados pela CIDH, bem como a responsabilidade do Estado de Honduras pela violação da CADH. Destacou o fato de que, apesar de não existir previsão expressa sobre a qualificação do delito de desaparecimento forçado, vem trabalhando de forma reiterada com seu enquadramento como um crime de lesa-humanidade, inclusive como destaca a Assembleia Geral da OEA na Resolução n. 666. Trata-se de um procedimento cruel que constitui uma detenção arbitrária, que viola o direito à segurança jurídica e integridade física, nos termos da Resolução no. 742. Nesse ponto, destacou a existência de grupos de trabalho e resoluções no âmbito da ONU, notadamente na Comissão de Direitos Humanos, bem como no âmbito da OEA.

Nos pontos resolutivos, a Corte IDH julgou improcedente a alegação do não esgotamento dos recursos internos e declarou, por unanimidade, que o Estado de Honduras violou os deveres de respeito aos direitos (artigo 1.1), à liberdade pessoal (artigo 7o.), à integridade pessoal (artigo 5o.) e à vida (artigo 4o.). Decidiu, ainda, por seis votos a um, que Honduras deve pagar indenização compensatória aos familiares da vítima a ser fixada pela Corte IDH, se não houver acordo entre o Estado e a CIDH. Posteriormente, na decisão que se esclareceu o valor da indenização da pensão mais elevada para a viúva do Senhor Manfredo Velasquez Rodriguez e estabeleceu um subsídio para educação de seus filhos, uma casa de uma família de classe média e a indenização compensatória aos filhos e à cônjuge.

Em voto dissidente, o magistrado Piza Escalante argumentou que seu voto não é contrário propriamente ao mérito da sentença, aos fundamentos ou a participação da CIDH na negociação da indenização. Contudo, problematizou e divergiu da questão intitulada pela Corte IDH no ponto “partes do processo” em relação à CIDH. Em sua opinião, as únicas partes ativas do processo, em sentido substancial, são as vítimas e os seus representantes. A CIDH possuiria, em sua opinião, uma função meramente instrumental e imparcial, como uma espécie de Ministério Público do sistema de proteção interamericano de direitos humanos. É uma parte sui generis a qual não caberia atuar como destinatária de qualquer direito material.

Vale destacar a importância do voto separado: trata-se da primeira tentativa institucionalizada de empoderar e ampliar o papel do indivíduo como sujeito no sistema interamericano perante a Corte IDH. O próprio magistrado enfatizou não caber negar o status de parte ativa às vítimas pelo simples fato de não poderem acessar diretamente a Corte IDH em função das regras da CADH. Destacou que, pelo contrário, essa negativa da condição de parte é que contraria uma gama de princípios da CADH. A autonomia processual das vítimas como partes do processo jamais pode ser suplantada pela atuação da CIDH, já que a sua função é meramente processual, funcionando de maneira auxiliar.

2. O caso Godínez Cruz vs. Honduras (1989)

O caso Godínez Cruz vs. Honduras (1989), por sua vez, foi levado à Corte IDH pela CIDH em 24 de abril, pedindo a condenação do estado de Honduras por violar os artigos 4o. (direito à vida), 5o. (direito à integridade Pessoal) e 7o. (direito à Liberdade Pessoal) da CADH, em face do senhor Saúl Godínez Cruz, que atuava como dirigente sindical e já havia participado de muitas greves. Na época do seu desaparecimento, segundo a sua esposa, ele estava se preparando para liderar uma nova greve.

Tudo indica que o senhor Godínez Cruz desapareceu no dia 22 de julho de 1982, depois de ter saído de casa em uma motocicleta às 6:20 a.m. rumo ao Instituto Prevocacional “Julia Zelaya” em Monjarás de Choluteca, onde trabalhava como professor. Testemunhas afirmaram que Godínez Cruz foi abordado por uma pessoa vestida com uniforme militar e outras duas pessoas em vestes civis comuns. Após ser agredido e amarrado, ele foi jogado em um carro sem placa. Afirmaram, ainda, que a sua rotina vinha sendo vigiada alguns dias antes do seu desaparecimento.

Estimou-se que, entre 1981 e 1984, desapareceram entre 140 e 150 pessoas, vítimas desse contexto de perseguição. Testemunhas relataram que havia um grupo chamado de “os quatorze”, comandado pelo Major Adolfo Díaz, adstrito ao Estado Maior das Forças Armadas. Posteriormente, foram denominados de “os dez”, comandados pelo Capitão Alexander Hernández e, finalmente, foi identificado um grupo especializado em sequestro, execução e controle ligado ao 316 Batalhão. Esses grupos atuavam disfarçados de civis em carros sem placa e de vidros polarizados. O motivo das perseguições se dava por razões ideológicas, políticas e sindicais.

A Corte IDH considerou não haver razões para desacreditar as alegações da CIDH atribuídas ao Governo de Honduras, como, por exemplo, o desaparecimento de Saúl Godínez. Enfatizou, ainda, que provas circunstanciais, indícios e presunções podem ser utilizadas pelos tribunais internacionais, de modo menos formal do que pelos tribunais internos, para chegar a conclusões sobre os fatos levados a seu juízo. Enumerou algumas vítimas do desaparecimento que, geralmente, eram pessoas tidas, como “perigosas” pelo Estado. As armas empregadas eram reservadas às autoridades militares e à polícia. Os veículos utilizados possuíam insulfilme no vidro, o que requer uma autorização especial. As pessoas foram levadas para locais secretos e ilegais de detenção. Os corpos foram enterrados em cemitérios clandestinos. As autoridades militares, policiais, governo ou poder judiciário se negavam ou eram incapazes de prevenir, investigar ou sancionar os fatos.

A Corte IDH reiterou que o desaparecimento significa uma “ruptura radical” com a CADH e implica um abandono dos valores que emanam da dignidade da pessoa humana e dos princípios do sistema interamericano. Após citar as resoluções da ONU e da OEA sobre o tema, registrou que a prática do desaparecimento importa o desconhecimento do dever de o Estado de se organizar para respeitar direitos (artigo 1.1) e viola os direitos à vida (artigo 4o.), à integridade (artigo 5o.) e às garantias de liberdade (artigo 7o.). Por si só, o desaparecimento forçado como prática sistemática cria um clima incompatível com as garantias dos direitos humanos e esvazia as normas mínimas de segurança, facilitando a impunidade dos corpos de segurança de violaram tais direitos.

A Corte IDH julgou procedente, por isso, a reparação por pagamento de justa indenização pelas consequências do ocorrido as partes lesionadas. Na sentença dedicada à reparação e às custas, o perfil menos interveniente da Corte IDH nos anos 80 fica evidente. A viúva, Enmidida Escoto Godínez, chegou a pedir que fosse determinada uma série de medidas ao Estado, como investigação dos 150 desaparecimentos, um ato público reconhecendo as violações aos direitos das vítimas, a obrigatoriedade de mover ações contra os responsáveis e a criação de um fundo para os pais e filhos dos desaparecidos. Contudo, a Corte IDH afirma que, segundo o artigo 63.1 da CADH, a violação aos direitos seja reparada mediante uma “indenização justa”. Por indenização justa, a Corte IDH entendeu apenas a indenização compensatória à cônjuge, à filha e aos familiares. Entendeu inexistir a indenização com base na lógica “dos danos punitivos” no direito internacional como estratégia para desestimular o Estado a deixar de violar direitos humanos, embora houvesse pedidos expressos dos advogados nesse sentido.

3. O caso Fairen Garbi vs. Honduras (1989)

O caso Fairen Garbi vs. Honduras (1989), por fim, foi submetido à Corte IDH pela CIDH, sob o fundamento de que o Estado de Honduras violou os direitos à vida (artigo 4o.), à integridade pessoal (art. 5o.), à liberdade pessoal (artigo 7) da CADH de Francisco Fairén Garbi e de Yolanda Solís Corrales. O caso envolve o desaparecimento dos costarriquenhos Francisco Fairén Garbi -um estudante e empregado público- e Yolanda Solís Corrales -uma educadora-. Ambos desapareceram em Honduras enquanto viajavam com destino ao México no dia 11 de dezembro de 1981.

A controvérsia sob julgamento envolveu, principalmente, o fato de Francisco e Yolanda terem ou não ingressado no território de Honduras, bem como se houve o crime de desaparecimento forçado de pessoas pelo Estado de Honduras. O Estado negou em diversas ocasiões que houvesse qualquer tipo de documento que comprovasse o ingresso das vítimas em seu território e, portanto, que tivesse ocorrido o crime de desparecimento forçado. A CIDH, porém, arrolou testemunhas que afirmaram haver um quadro reiterado de pessoas vinham sendo sequestradas e desaparecidas entre os anos de 1981 e 1984. Estimou-se que, entre 100 e 150 pessoas, desapareceram por conta de atividades relacionadas às entidades ligadas ao governo do estado ou que atuavam com sua aquiescência.

No mérito, a Corte IDH considerou provado o ingresso no território de Honduras por conta de um talão com a assinatura de Fairen Garbi, relativo à entrada do veículo no país. Reconheceu a existência de um contexto de desaparecimentos forçados em Honduras. Esclareceu que o desaparecimento forçado ou involuntário constitui uma forma complexa de “violação múltipla e continuada de inúmeros” direitos humanos. Enfatizou a necessidade de enxergar os direitos humanos de maneira integral e o dever do Estado de protegê-los.

A Corte IDH, contudo, entendeu não ser possível imputar responsabilidade internacional ao Estado. Chegou a destacar que foi encontrado um cadáver em um sítio chamado “La Montañita”, em Honduras. De um lado, os familiares das vítimas destacaram que poderia ser os restos mortais de Fairén Garbi, já que havia no local um histórico de vítimas encontradas em condições semelhantes. De outro, o Estado alegou que, em virtude do tempo transcorrido, não era mais possível proceder com a exumação do cadáver encontrado em La Montañita. A área inclusive havia sofrido deslizamentos naturais de terra tornando impossível indicar o local exato onde foi sepultado.

Nos pontos resolutivos, a Corte IDH indeferiu a alegação de não esgotamento dos recursos internos. Declarou que o desaparecimento no território não é suficiente para demonstrar que o desaparecimento de Fairen Garbi e Yolanda Corrales se deu por causa do Estado de Honduras.

4. Uma comparação entre os casos do ciclo hondurenho

Vale comparar as decisões presentes em Velasquez Rodrigues, Godínez Cruz e Fairen Garbi. Perceba-se que esse verdadeiro ciclo de casos hondurenhos revela uma Corte IDH mais comedida ou menos interveniente na jurisdição interna nessa época do que a postura adotada nas décadas seguintes. A despeito do discurso de proteção de direitos humanos presente na fundamentação dos casos hondurenhos, constata-se uma forte dose de autocontenção nos pontos resolutivos e, principalmente, nas diferentes questões em que a opção foi por decidir não decidindo.

No caso Velasquez Rodriguez, por exemplo, a indenização foi, inicialmente, deixada a cargo de uma negociação entre as vítimas, o Estado e a CIDH. Isso é algo inimaginável para um magistrado que integre a Corte IDH nas décadas seguintes. O contraste dessa postura com a jurisprudência mais recente é evidente: a Corte se acostumou a condenar o Estado pelos ilícitos internacionais e a declarar a sua responsabilidade internacional, exercer o controle de convencionalidade das leis, recomendar a modificação das mesmas ou até mesmo sugerir a modificação do entendimento das decisões de Cortes Constitucionais. Em relação ao caso Loayza Tamayo vs Peru (1997), isso fica evidente, quando a Corte IDH determina de pronto na própria sentença, que o Peru adote medidas de restituição, pague a indenização de 167 mil dólares a título de compensação e realize outras formas de reparação, como reincorporar a senhora Maria Elena Loayza Tamayo ao serviço docente em instituições públicas.

No caso Godínez Cruz, apesar dos pedidos de outras formas de indenização para além do aspecto material, como, por exemplo, as de caráter punitivo e da investigação dos demais casos de desaparecimento forçado, a Corte IDH se ateve às indenizações de natureza compensatória pelos danos materiais, lucros cessantes e custas com a ação para serem pagas à cônjuge, à filha e aos familiares. Essa foi a lógica para preencher o conceito de “indenização justa”, prevista no artigo 63.1. da CADH. A visão de uma justiça mais formal passará por uma profunda transformação na década de 90, quando se adotará uma visão mais substantiva de reparação integral dos danos.

A Corte IDH nas décadas seguintes reconheceu com naturalidade danos imateriais e determinou condenações para além de medidas pecuniárias. Determinou não só a obrigação de investigar e punir responsáveis pelas violações, como realizado no caso Velasquez Rodriguez vs Honduras (1989),44 mas diversas medidas que vão afastando cada vez mais a jurisdição da Corte IDH tanto do perfil da jurisdição clássica da Corte Internacional de Justiça mesmo na época, quanto do perfil construído pela própria Corte IDH na década de 80.

Se comparadas tais decisões em relação à jurisprudência da Corte IDH posterior à década de 1990, o ciclo de casos hondurenhos é perceptivelmente bem menos interveniente na soberania do Estado. A Corte IDH passará a atuar de forma bastante criativa nas décadas seguintes, ao construir os sentidos possíveis da “justa indenização”, prevista no artigo 63.1 da CADH. No paradigmático caso Aloeboete vs Suriname (1993), por exemplo, a jurisdição deu início a mudança de perfil, ao determinar a adoção de indenizações pecuniárias e não pecuniárias que culminassem em uma restituição integral (in integrum restitutio), levando em conta o cenário ao anterior às violações, ou sejam e restabelecimento do status quo ante. No caso, determinou a indenização de cerca de 450 mil florins holandeses como reparação as pessoas ou herdeiros, a criação de uma Fundação para auxiliar a comunidade Saramaca que teve seus direitos violados, bem como reabrir a Escola Gujaba dotando-a de pessoal docente e administrativo para que funcionasse permanentemente.

Essa expansão do reconhecimento das indenizações pelos danos causados pelo Estado do mero pagamento de uma soma em dinheiro para obrigações concretas de fazer invocou como fundamento a possibilidade de se reconhecer danos morais, tal como fixado pelos casos hondurenhos. Ocorre que, uma observação mais atenta, revela a criatividade judicial e a expansão da jurisdição da Corte IDH operada por um processo informal de interpretação do artigo 63.1 da CADH.

O contraste com casos posteriores da Corte IDH, portanto, evidencia o perfil mais ativista da década de 90 e 2000 em comparação ao estilo mais autocontido da década de 80. Mesmo quando em anos mais recentes a Corte IDH tem optado por tratar o descumprimento parcial como cumprimento parcial, afirmando reconhecer o esforço do Estado para estimular o cumprimento de suas decisões, ainda assim, a jurisprudência revela-se bem mais interveniente na jurisdição interna e bem mais ativista na utilização dos procedimentos e na efetivação dos direitos humanos do que essa “primeira Corte IDH”. A fundamentação para reconhecer a responsabilidade do Estado também se mostrou mais ativista.

De um lado, essa jurisprudência hondurenha lança as bases para a Convenção contra o Desaparecimento Forçado de 1994 e, de outro, os casos posteriores fortalecem o combate a esse crime de lesa-humanidade, como é qualificado o desaparecimento forçado pelo preâmbulo da citada Convenção. O ciclo de casos hondurenhos é, por isso, representativo das violações de direitos humanos na época da Guerra Fria para além do âmbito local em Honduras e para além dos dilemas da América Central.

V. Apontamentos finais

A concepção teórica de Pedro Nikken revelou-se não apenas um bom guia para compreender a Corte IDH nos anos 80, mas um arcabouço teórico bastante representativo da sua identidade dos magistrados, da jurisprudência e da própria maneira de enxergar a América Latina nesse momento.

De forma didática, foi possível colocar em quatro partes: (i) o contexto histórico da Corte IDH; (ii) o papel das opiniões consultivas; (iii) o conceito de direitos humanos; e (iv) o conceito de desenvolvimento progressivo, previsto no art. 26 da CADH e muito utilizado pela jurisprudência interamericana, que o magistrado foi o principal teórico a lapidar em seu clássico livro, “A proteção internacional dos direitos humanos: seu desenvolvimento progressivo”.45

Pedro Nikken compreende os direitos humanos de acordo com um certo espírito da época. Define os são direitos inerentes à pessoa humana, flertando com um jusnaturalismo que se contrapunha às barbáries cometidas na segunda guerra mundial. Estes direitos são oponíveis aos Estados, mais especificamente ao poder público e, portanto, estariam fora do âmbito de discricionariedade do Estado. De forma mais precisa, existem, para ele, “direitos legais” e “direitos programa”. Os primeiros constituem imediatamente limites à ação estatal em decorrência da possibilidade de controles judiciais ou quase-judiciais. Já os segundos seriam controlados apenas por órgãos técnico-políticas a partir da situação socioeconômica do país.

Em seguida, coloca o desenvolvimento progressivo a partir dos seguintes elementos: (i) tornar mais precisos o alcance e conteúdo dos direitos protegidos; (ii) dotar de eficácia vinculante o dever do Estado de respeitá-los; e (iii) criar de instituições e mecanismos com a finalidade de verificar o seu cumprimento das obrigações internacionais.46 Essa é a base teórica que nos permite enxergar os motivos da opção pelo maior uso da função consultiva no período, assim como da fundamentação e decisão mais comedida no exercício da competência contenciosa.

Pedro Nikken contextualiza bem as afirmações das opiniões consultivas, de modo a reconhecer a natureza jurisdicional e vinculante das OCs, ou seja, adota uma concepção que fortalece a obrigatoriedade da função consultiva, já que elas poderão fundamentar em casos contenciosos a responsabilidade internacional. Na prática, porém, as primeiras opiniões consultivas envolvem predominantemente aspectos relacionados ao próprio funcionamento do sistema interamericano.

Por exemplo, das primeiras, pelo menos estas 7 centram-se em questões relacionadas ao acesso, eficácia e competência formal da Corte: OC-1/82 (objeto da função consultiva), OC-2/82 (efeito das reservas à CADH), OC-6/86 (significado da expressão leis no art. 30 da CADH), OC-10/89 (a DADDH), OC-11/90 (esgotamento aos recursos internos), OC-12/91 (compatibilidade de projeto de lei com a CADH), OC-13/93 (atribuições da CIDH). Nessa fase da década de 80 e início dos anos 90, a Corte IDH parece centrada em montar as suas próprias engrenagens, desenvolver progressivamente as suas competências.

Já no âmbito contencioso, verifica-se um “ciclo de casos hondurenhos” é composto por Três casos fundacionais do sistema interamericano de proteção de direitos humanos: Velasquez Rodrigues vs Honduras (1988), Fairen Garbi vs Honduras (1989), Godínez Cruz vs Honduras (1989). São casos envolvendo o desaparecimento forçado de pessoas.47 O desaparecimento forçado possui um caráter complexo, múltiplo, permanente, continuado e pluriofensivo aos direitos humanos, protegidos pela CADH, como a vida (artigo 4), liberdade pessoal (artigo 7), integridade pessoal (artigo 5) e reconhecimento da personalidade jurídica (artigo 3).

A América Latina vivia uma instabilidade política generalizada, decorrente das ditaduras militares que se aparelharam por meio de práticas sistemáticas de detenções arbitrárias, execuções, torturas e desaparecimento. Diversas ditaduras militares na América Latina utilizaram o desaparecimento forçado para gerar medo e controlar a população. O “ciclo de casos hondurenhos”, por isso, é uma metonímia não só que que viria a ser outros casos da própria Corte IDH na década de 90 e 2000, mas se revelam muito representativos do que se vivia à época na América Latina como um todo.

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1 Yin, Robert K., Estudo de caso: planejamento de métodos, Porto Alegro, Bookman, 2001.

2A Corte IDH se instala na Costa Rica em 3 de 1979 e, em 1980, complementam os trabalhos referentes ao acordo de sede negociado. Sobre o tema, as duas das obras mais detalhadas, profunda e completas são Cançado Trindade, Antônio Augusto, El ejercicio de la función judicial internacional: Memorias de la Corte Interamericana de Derechos Humanos, Belo Horizonte, Del Rey, 2013; e Ramos, André de Carvalho, Direitos humanos em juízo, São Paulo, Max Limonad, 2002 Para uma visão geral, existem diversos trabalhos, cfr. Pereira, Antônio Celso Alves, “Apontamentos sobre a Corte Interamericana de Direitos Humanos”, Revista da EMERJ, 2009, v. 12, no. 45. Disponível em: http://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista45/Revista45_87.pdf. Menezes, Wagner, Tribunais internacionais: jurisdição e competência, São Paulo, Saraiva, 2013, pp. 188-192. Bolfer, Sabrina Ribas, “Corte Interamericana de direitos Humanos”, in: Piovesan, Flávia (coord.), Direitos Humanos, vol. I, Curitiba, Juruá, 2006, pp. 621 e ss. Machado, Isabel Penido de Campos, “Sistema interamericano de proteção dos direitos humanos: comissão e corte interamericana de direitos humanos”, in: Oliveira, Bárbara da Costa Pinto e Silva, Roberto Luiz (orgs.), Manual de direito processual internacional, São Paulo, Saraiva, 2012.

3A Corte chegou a admitir inicialmente o caso “Viviana Gallardo”, referente à uma auto-denúncia da Costa Rica, inclusive com renúncia ao esgotamento dos recursos internos. O processo foi posteriormente remetido à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) por se entender que não é possível levar um caso contencioso à Corte sem que o mesmo sequer passe pela CIDH. É curioso ver que o caso se encontra indexado, atualmente, como uma espécie de opinião consultiva n. 0 (zero) da Corte Interamericana em seu site. Confira-se: http://www.corteidh.or.cr/cf/Jurisprudencia2/busqueda_opiniones_consultivas.cfm?lang=es. Buergenthal, Thomas, “Recordando los inicios de la Corte Interamericana de Derechos Humanos”, disponível em: http://www.corteidh.or.cr/tablas/R06729-1.pdf.

4Informações do site da própria Corte IDH, disponível em: http://www.corteidh.or.cr/tablas/PNI.pdf.

5 Nikken, Pedro, La protección internacional de los derechos humanos: su desarrollo progresivo, Madrid, Instituto Interamericano de Derechos Humanos, 1987.

6Nos dois anos, não incluímos na contagem a supervisão de cumprimento de sentença e as medidas provisórias, o que aumentaria a contagem. Por “casos contenciosos”, o buscador da Corte IDH registra apenas sentenças e interpretações de sentenças ou de exceções preliminares.

7 Nikken, Pedro. La protección internacional…, cit.

8Procotolo de Buenos Aires de 1967, artículo 112 “Habrá una Comisión Interamericana de Derechos Humanos que tendrá, como función principal, la de promover la observancia y la defensa de los derechos humanos y de servir como órgano consultivo de la Organización en esta materia. Una convención interamericana sobre derechos humanos determinará la estructura, competencia y procedimiento de dicha Comisión, así como los de los otros órganos encargados de esa materia”.

9 Cançado Trindade, Antônio Augusto, A proteção internacional dos direitos humanos, Rio de Janeiro, SBERJ, 1988, pp. 67 e ss.

10Ibidem, pp. 198 e 199.

11Dados extraídos da base de dados da CEJIL para construir o gráfico próprio, disponível em: http://jurisprudencia-sidh.cejil.org/instruments/.

12Cfr.Burgorgue-Larsen, Laurence e Torres, Amaya Úbeda, The Inter-american Court of Human Rights, New York: Oxford University Press, 2011, p. 299.

13O trecho é tradução livre da passagem do artigo de Buergenthal, Thomas, “The Advisory Practice of the Inter-American Human Rights”, The American Journal of International Law, 1985, vol. 79, no. 1, p. 26.

14O trecho é tradução livre da passagem do artigo de Pedro Nikken, que se dedica especialmente ao alcance e aos efeitos das opiniões consultivas, cfr. Nikken, Pedro, La función consultiva de la Corte Interamericana de derechos humanos, disponível em: http://bibliohistorico.juridicas.unam.mx/libros/5/2454/10.pdf, acessado em: 18 de julho de 2016. Aparentemente no mesmo sentido, cfr.Pereira, Antônio Celso Alves, “A Competência consultiva da Corte Interamericana de Direitos Humanos”, in: Mello, Cleyson de Moraes et al., O direito em movimento, Juiz de Fora, Editar, 2015, p. 28.

15 Nikken, Pedro, La protección internacional…, cit., p. 29.

16Ibidem, p. 45.

18 Nikken, Pedro, La protección internacional…, cit., p. 12.

19Ibidem, p. 59.

20Ibidem, p. 6.

21 Bastos Netto, Cláudio Cerqueira, A Opinião Consultiva no. 10/89 da Corte IDH: a força da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, Disponível em: https://nidh.com.br/a-opiniao-consultiva-n-10-da-corte-idh-a-forca-da-declaracao-americana-de-direitos-e-deveres-do-homem/.

22Comitê jurídico interamericano também serve como corpo consultivo da OEA para assuntos jurídicos. Difere, porém, da competência consultiva da Corte IDH em três aspectos. O Comitê pode por iniciativa própria realizar estudos, trabalhos e sugerir a realização de conferências jurídicas especializadas. O Comitê pode ser solicitado apenas pela Assembleia-geral, Reunião de consulta de Ministros das Relações exteriores e Conselhos da Organização. Note-se: os Estados-membros da OEA não podem formular consultas a este órgão. Por fim, o Comitê não atua como órgão judicial, quase-judicial ou arbitral. Sua função circunscreve-se a opinar sobre um tema, que sequer precisa ser de direitos humanos. Poderá proferir opiniões sobre “assuntos jurídicos” de caráter internacional, desprovidas de efeito vinculante aos Estados ou aos órgãos da OEA. Sobre o tema, cfr. Correia, Theresa Rachel Couto. Corte Interamericana de direitos humanos: Repercussão jurídica das opiniões consultivas, Curitiba, Juruá, 2008, p. 136.

23Nesse sentido, cfr. Roa, Jorge Ernesto, La función consultiva de la Corte Interamericana de Derechos Humanos, Bogotá, Universidade Externado de Colombia e Instituto de Estudios Constitucionales, 2015, pp. 67 e ss. Para um comentário ao dispositivo com os trechos mais importantes de cada OC da Corte IDH, cfr. Piovesan, Flávia, Código de Direito Internacional dos Direitos Humanos, São Paulo, DPL Editora, 2008, pp.1306 e ss.

24 Piovesan, Flávia, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, São Paulo, Saraiva, 2007, p. 238.

25Ibidem, p. 103.

26O fundamento foi de que, mesmo inexistindo regras específicas, é possível aplicar por analogia o direito de reter o caso, previsto para a competência contenciosa. Sobre o tema, vale conferir: Salvioli, Fabián, “La competencia consultiva de la Corte Interamericana de Derechos Humanos: marco legal y desarrollo jurisprudencial”, in: Homenaje y Reconocimiento a Antônio Cançado Trindade, t. II, Brasilia, Porto Alegre, Sergio Fabris, 2004, pp. 417-472.

27Protocolo de Cartagena das índias (1985), Protocolo de Washington (1992) e Protocolo de Managua (1993).

28Exemplos de organismos especializados: Organização Pan-americana da Saúde, Instituto Interamericano da criança, Comissão Interamericana das Mulheres, Instituto Pan-americano de geografia e história, Instituto Indigianista Americano e Instituto Interamericano de Cooperação para a agricultura.

29 Buergenthal, Thomas, “The Inter-American Court of Human Rights”, The American Journal of International Law, vol. 76, no. 2, 1982, p. 242.

30Para mais detalhes, cfr. Legale, Siddharta. Causanilhas, Tayara, “A Opinião Consultiva n.01/82 da Corte IDH: Uma «Metaopinião»?”, disponível em: https://nidh.com.br/a-opiniao-consultiva-n-1-82-da-corte-idh-uma-metaopiniao/.

31Para uma reflexão mais detalha, cfr. Barretto, Rafael Zelesco, “A Opinião Consultiva n. 02/82 da Corte IDH: as reservas à Convenção Americana de Direitos Humanos”, disponível em: https://nidh.com.br/a-opiniao-consultiva-n-02-82-da-corte-idh-as-reservas-a-convencao-americana-de-direitos-humanos/.

32Legale, Siddharta e Causanilhas, Tayara, “A Opinião Consultiva N. 05/85 da Corte IDH: dimensões e restrições da liberdade de expressão”, disponível em: https://nidh.com.br/oc5/.

33Legale, Siddharta; e Cerqueira, Cláudio, “O papel do princípio pro persona na Corte Interamericana de direitos humanos: esse enigmático desconhecido”, in: Menezes, Wagner (org.), Tribunais Internacionais: extensão e limites de sua jurisdição, Belo Horizonte, Arraes Editores, 2018, p. 412.

34Legale, Siddharta e Marcolino, Danilo Sardinha, “As Opiniões Consultivas OC-08/87 e OC-09/87 da Corte IDH: a suspensão de habeas corpus e de outras garantias judiciais em estados de emergência”, disponível em: https://nidh.com.br/as-opinioes-consultivas-oc-08-87-e-oc-09-87-da-corte-idh-a-suspensao-de-habeas-corpus-e-de-outras-garantias-judiciais-em-estados-de-emergencia/.

35Bastos Netto, Cláudio Cerqueira, “A Opinião Consultiva no. 10 da Corte IDH: a força da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem”, disponível em: https://nidh.com.br/a-opiniao-consultiva-n-10-da-corte-idh-a-forca-da-declaracao-americana-de-direitos-e-deveres-do-homem/.

36Há quem opte pela terminologia casos hondurenhos de desaparecimento, cfr. Pasqualucci, Jo M., The Practice and Procedure of the Inter-American Court of Human Rights, New York, Cambridge University Press, 2013, p. 7.

37Para uma abordagem mais ampla da jurisprudência sobre o tema, envolvendo diversos países, como Peru, Bolívia, Uruguai, Brasil, Paraguai, entre outros. Cfr. Nash, Claudio e Porto, Humberto A. Sierra, Cuadernillo de Jurisprudencia de La Corte Interamericana de Derechos Humanos n. 5: desaparición forzada, São José: Corte IDH, 2015.

38 Leonard, Thomas M., The History of Honduras, Denver, Greenwood, 2011, p. 157.

39André de Carvalho Ramos prefere tomar como referencial o protocolo do caso na CIDH, razão pela qual considera Fairen Garbi o primeiro caso da Corte IDH. No entanto, optou-se por começar pelo caso Velasquez Rodriguez, por um lado, porque a sentença foi improcedente e, por outro, tendo em vista o fato de o caso Velasquez Rodriguez ter sido recebido na Corte IDH na mesma data, ter sido o primeiro caso de uma condenação do Estado na Corte IDH e que foi o caso com maior impacto na literatura especializada. Cfr., Ramos, André de Carvalho, Direitos humanos em juízo, São Paulo, Max Limonad, 2002, p. 116.

40Em Velasquez Rodriguez, Buergenthal foi presidente e Navia foi vice. Em Godinez Cruz, nas exceções preliminares a dupla se manteve, mas na sentença a Presidência e vie-presidência passou para Rafael Navia e Rodolfo Piza escalante. No caso Fairen Garbi, Navia foi Presidente e Hector Gross Espiel foi vice.

41Todos os casos do ciclo hondurenho estão disponíveis em: http://www.corteidh.or.cr/

42Para uma análise da definição da dignidade humana, relacionada ao direito a vida como valor intrínseco do ser humano no caso Velaquez Rodriguez, cfr. Legale, Siddharta e Val, Eduardo Manuel, “Dignidade da pessoa humana e a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos”, Revista Direitos Fundamentais e Justiça, no. 34, 2017, disponível em: https://www.academia.edu/35764799/A_Dignidade_e_a_jurisprud%C3%AAncia_da_Corte_Interamericana_de_Direitos_Humanos_Revista_direitos_Humanos_e_justi%C3%A7a_QUALIS_A2_.

43Existe um documentário no Canal no YouTube no canal UTUNAH com depoimentos da família a respeito. Vale a pena conferir: “Manfredo Velásquez: Yo que te quise tanto”, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=sXfs2KOZad8.

44Velasquez Rodriguez vs. Honduras (1988).

45 Nikken, Pedro, La protección internacional…, cit.

46Ibidem, p. 59.

47Há quem opte pela terminologia casos hondurenhos de desaparecimento. Cfr. Pasqualucci, Jo M., The Practice and Procedure of the…, cit., p. 7.

Recebido: 20 de Novembro de 2018; Aceito: 03 de Outubro de 2019

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