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Anuario mexicano de derecho internacional

versión impresa ISSN 1870-4654

Anu. Mex. Der. Inter vol.18  Ciudad de México ene./dic. 2018  Epub 27-Mar-2020

https://doi.org/10.22201/iij.24487872e.2018.18.12101 

Doctrina

A Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas e seus impactos no Brasil

The Inter-American Convention on the Forced Disappearance of People and their impacts in Brazil

La Convention Interaméricaine sur la Désapparation des Personnes Forcées et leurs impacts au Brésil

Luciano Meneguetti Pereira* 

* Mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Toledo de Ensino (ITE). Especialista em Direito Público com ênfase em Direito Constitucional pela Universidade Potiguar (UNP). Graduado em Direito pelo Centro Universitário Toledo (UNITOLEDO). Professor titular de Direito Internacional e Direitos Humanos no Curso de Direito do Centro Universitário Toledo (UNITOLEDO), Araçatuba, São Paulo, Brasil. Autor e organizador de obras jurídicas. Advogado.


Resumo

O presente texto tem como objetivo abordar os principais impactos da Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas na ordem jurídica brasileira. Primeiramente se analisa o seu surgimento, sua estrutura e principais aspectos. Em seguida aborda-se a definição convencional do desaparecimento forçado, sua configuração como múltiplas violações de direitos humanos e como crime internacional, inclusive como um crime de lesa humanidade em determinados casos. Por fim, são analisadas as principais implicações domésticas desses instrumentos para o Estado brasileiro.

Palavras-chave: Convenção Interamericana; desaparecimento forçado; direitos humanos

Abstract

This study aims to analyze the main impacts of the Inter-American Convention on the Forced Disappearance of Persons in the Brazilian legal system. Firstly, its appearance, its structure and main aspects are analyzed. The next section addresses the conventional definition of forced disappearance, its configuration as multiple violations of human rights and as an international crime, including as a crime against humanity in certain cases. Finally, the main domestic implications of these instruments for the Brazilian State are analyzed.

Key words: Inter-American Convention; enforced disappearance; human rights

Résumé

Cet article vise à analyser les principaux impacts de la Convention Interaméricaine sur la Disparition Forcée des Personnes dans le système juridique brésilien. Tout d’abord, son apparence, sa structure et ses principaux aspects sont analysés. La section suivante traite de la définition conventionnelle de la disparition forcée, de sa configuration en tant que violation multiple des droits de l’homme et en tant que crime international, y compris en tant que crime contre l’humanité dans certains cas. Enfin, les principales implications nationales de ces instruments pour l’Etat brésilien sont analysées.

Mots-clés: Convention Interaméricaine; disparition forcée; droits de l’homme

Sumário: I. Introdução. II. A Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas (CISDFP). III. O conceito convencional de desaparecimento forçado. IV. O desaparecimento forçado como múltiplas violações de direitos humanos e como crime contra a humanidade na CIS-DFP e na Corte Interamericana de Direitos Humanos. V. Os impactos da Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas no Brasil. VI. Considerações finais. VII. Referências.

I. Introdução

Em 11 de maio de 2016, o Estado brasileiro internalizou um importante tratado internacional de direitos humanos relativo à proteção contra o desaparecimento forçado ou involuntário de pessoas, que passou a integrar o ordenamento jurídico brasileiro com hierarquia de norma supralegal , conforme entendimento atual do Supremo Tribunal Federal. Trata-se da Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas (CISDFP), adotada em 9 de junho de 1994 pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), por ocasião do 24o. Período Ordinário de Sessões, por meio da Resolução n. 1256 (XXIV-0/94).

Com a ratificação e internalização desse instrumento internacional, o Brasil aderiu aos esforços internacionais no sentido de combater o desaparecimento forçado de pessoas, uma preocupação mundial já manifestada há décadas pela ONU, desde a proclamação da Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados (DSPTPCDF) por sua Assembleia Geral, em 18 de dezembro de 1992, por meio da Resolução n. 47/133.

Logo no Preâmbulo desta Declaração as Nações Unidas manifestou sua profunda preocupação com a constatação da persistente e frequente ocorrência dos desaparecimentos forçados em muitos países do globo, situações em que pessoas são presas, detidas ou raptadas contra a sua vontade ou privadas de sua liberdade por qualquer outra forma por agentes do governo, de qualquer setor ou hierarquia, que por sua vez se recusam a revelar o destino ou paradeiro destas pessoas ou se resignam quanto ao reconhecimento da privação da liberdade, subtraindo assim as vítimas de tais atos da proteção da lei (Brasil, 2017).

No âmbito da OEA a preocupação com o desaparecimento forçado de pessoas esteve presente de modo marcante ao longo das últimas décadas, e não sem razão, já que a prática se desenvolveu de modo sistemático, como uma política de Estado em muitos países do Continente Americano entre as décadas de 60 e 80, notadamente. Em 1983 a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Comissão IDH), um dos principais órgãos de proteção aos direitos humanos da OEA, em seu Informe Anual (1982/1983) ressaltou a persistência dos desaparecimentos no Continente, chamando a atenção da organização para várias violações de direitos humanos decorrentes desta prática, tais como a detenção de pessoas sem julgamento, as ações de investigação policial destituídas das garantias mínimas requeridas pela boa administração da justiça, os obstáculos colocados no caminho da liberdade de religião e adoração, bem como as sérias restrições impostas à liberdade de opinião e de expressão.1

Considerando o informe da Comissão, a Assembleia Geral da OEA adotou a Resolução n. 666 (XIII-083), em 18 de novembro de 1983, onde declarou que o “desaparecimento forçado de pessoas sem julgamento é uma prática cruel e desumana que mina o Estado de Direito, enfraquecendo as normas que garantem a proteção contra a detenção arbitrária e o direito à segurança pessoal” (preâmbulo) e resolveu que a sua prática na América “é uma afronta à consciência do hemisfério e constitui um crime contra a humanidade” (art. 4o.).

Esta resolução marcou o início do processo que conduziu a OEA a ser pioneira na elaboração de um instrumento internacional juridicamente vinculante para os seus Estados Membros, relativamente à questão dos desaparecimentos forçados. O rechaço a esta prática vil e desumana no âmbito do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos restou claramente refletido no preâmbulo da CISDFP, onde os Estados americanos afirmaram que “o desaparecimento forçado de pessoas constitui uma afronta à consciência do hemisfério e uma grave ofensa de natureza hedionda à dignidade inerente à pessoa humana”, estando em “contradição com os princípios e propósitos consagrados na Carta da Organização dos Estados Americanos”. Ali também se considerou que o desaparecimento forçado de pessoas “viola múltiplos direitos essenciais da pessoa humana, de caráter irrevogável”, conforme consagrados em importantes documentos de proteção dos direitos humanos.2

O desaparecimento forçado constitui uma das mais odiosas violações de direitos humanos não apenas no Continente Americano, mas ao redor de todo o globo e tem se mostrado de difícil combate ao longo dos tempos, notadamente em razão da relutância dos Estados em compartilhar informações e admitir os desaparecimentos em seus territórios, bem como em punir seus órgãos e agentes envolvidos nos casos dessa natureza. Além disso, a complexidade dos desaparecimentos também se transformou em um fator de retardo para a resposta legal ao fenômeno no plano internacional. Estas são algumas das razões pelas quais não houve, durante muito tempo, qualquer marco jurídico internacionalmente vinculante no tocante ao trato específico da questão. Portanto, não há dúvida de que esse tratado que versa especificamente sobre a proteção das pessoas contra o desaparecimento forçado constitui um importante e valioso marco normativo de abrangência regional na proteção dos direitos humanos nas Américas.

A ratificação desse instrumento internacional por parte do Brasil implica em consequências internacionais para o Estado brasileiro, que poderá ser responsabilizado internacionalmente pelo não cumprimento das disposições convencionais em questão, devendo-se lembrar, inclusive, que o país, por ser Parte na Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (CVSDT), não pode invocar qualquer disposição de seu direito interno para justificar o descumprimento desse tratado (art. 27). Além disso, a internalização desse instrumento internacional, ocorrida recentemente por meio de sua promulgação executiva, também implica em diversas consequências domésticas que precisam ser apontadas e analisadas, já que o país deverá adotar várias medidas com vistas à implementação dos dispositivos convencionais em seu território.

Nesse contexto, o presente texto estabelece inicialmente alguns comentários sobre esse tratado internacional de direitos humanos, abordando-se sinteticamente o seu surgimento, sua estrutura e principais aspectos, visando-se demonstrar a sua importância para a prevenção e combate do desaparecimento forçado nas Américas.

Em seguida se analisa a definição do desaparecimento forçado estabelecida pela CISDFP em cotejo com as definições da Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado (CIPPTPCDF) e do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (ERT-PI), objetivando-se aferir os pontos de contato e também aqueles distintivos entre elas, bem como verificar a influência que a definição convencional pode exercer na tipificação do delito no ordenamento jurídico do Brasil.

Na sequência se analisa o desaparecimento forçado como múltiplas violações de direitos humanos e como um crime internacional, bem como a sua configuração, em certos casos, como crime de lesa humanidade, buscando-se com isso aclarar tais fatores que poderão influenciar as posturas domésticas brasileiras no tratamento da questão, uma vez que o país, ao ratificar a CISDFP, se obrigou a observar os padrões convencionalmente estabelecidos pelo corpus juris interamericano.

Por fim, são abordadas algumas das principais implicações internacionais e domésticas que essa Convenção trará para o Estado brasileiro, problemática central do presente estudo. Neste ponto se objetiva abordar quais as principais obrigações internacionais assumidas pelo Brasil em decorrência da ratificação e internalização da CISDFP, notadamente em relação às posturas domésticas requeridas do governo brasileiro (legislativo, executivo e judiciário) nas questões pertinentes à prevenção e combate do desaparecimento forçado de pessoas.

Na presente pesquisa, de natureza qualitativa, aplicada, exploratória, bibliográfica e documental, visando ao alcance dos objetivos e resultados pretendidos, emprega-se o método dedutivo, lançando-se mão de uma consistente fundamentação teórica, pautada notadamente em ampla pesquisa à doutrina autorizada de índole nacional e internacional, bem como em consultas às jurisprudências brasileira e internacional (com especial destaque para a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos - Corte IDH) sobre o tema analisado e outros correlatos, tudo com vistas a uma adequada formulação, desenvolvimento e conclusão dos pontos abordados no trabalho.

II. A Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas (CISDFP)

O desaparecimento forçado constituiu uma marca registrada dos regimes ditatoriais na América Latina nas décadas de 60, 70, 80 e início de 90.3 Conforme Jean Michel Arrighi, no século XX, as violações mais fundamentais dos direitos humanos foram quase uma constante na América Latina, dentre elas, assassinatos, prisões arbitrárias, torturas e desaparecimentos forçados.4

Operando como instrumento de repressão à toda e qualquer forma de oposição política e como terrorismo de Estado, os desaparecimentos forçados ou involuntários constituíram uma prática sistemática ou generalizada de vários governos nesse período, tendo como principal característica a recusa ou a ocultação de informações sobre o paradeiro da vítima por parte dos agentes perpetradores da conduta. Iniciando-se na Guatemala, a partir de 1962 a prática se estendeu nas décadas seguintes para El Salvador, Chile, Uruguai, Argentina, Brasil, Colômbia, Peru, Honduras, Bolívia, Haiti e México.5

Este quadro gerou uma intensa preocupação da OEA com as múltiplas violações de direitos humanos provocadas pelos desaparecimentos forçados que, somada à mobilização da opinião pública e da sociedade civil, em particular, às iniciativas de organizações não governamentais, conduziu a organização a ser pioneira na elaboração de um documento internacional especializado e juridicamente vinculante sobre o desaparecimento forçado.

Em 1983, a Assembleia Geral da OEA, levando em consideração o Informe Anual da Comissão IDH (1982/1983) deu um importante passo no caminho para a regulamentação dos desaparecimentos forçados, através da adoção de Resolução n. 666 (XIII-083), onde se declarou que o “desaparecimento forçado de pessoas sem julgamento é uma prática cruel e desumana que mina o Estado de Direito, enfraquecendo as normas que garantem a proteção contra a detenção arbitrária e o direito à segurança pessoal” (Preâmbulo) e resolveu, dentre outros pontos, que a sua prática na América “é uma afronta à consciência do hemisfério e constitui um crime contra a humanidade” (art. 4o.). Em setembro de 1987, em seu Informe Anual (1986-1987),6 a Comissão IDH propôs à Assembleia Geral que considerasse a possibilidade de adotar uma Convenção sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas, para prevenir e punir essa abominável prática. Na ocasião, dentre outros pontos, a Comissão afirmou que,

com base na experiência dos últimos anos, poderia se dizer que a política de desaparecimentos forçados se tornou um importante instrumento para a repressão e supressão física de dissidentes em muitos países latino-americanos, o que exige a adoção de medidas especiais, tanto a nível nacional como internacional, para o bem.7

A Assembleia Geral endossou a proposta por ocasião do seu 17o. Período Ordinário de Sessões (9 a 14 de novembro de 1987), em sua décima sessão plenária, realizada em 14 de novembro de 1987, por meio da Resolução n. 890 (XVII-0/87)8 sobre o Informe Anual da Comissão IDH, onde se acordou em convidar os países membros a apresentarem à Comissão, observações e comentários sobre sua positiva iniciativa quanto à elaboração de um projeto de convenção interamericana para prevenir e punir os desaparecimentos forçados. Na mesma ocasião, a Assembleia solicitou à Comissão IDH a elaboração de um projeto de convenção sobre o tema (§ 11).

Para cumprir o mandato recebido, a Comissão IDH discutiu o tema pela primeira vez em seu 72o. Período Ordinário de Sessões (15 a 25 de março de 1988). Durante a preparação do projeto, a Comissão inicialmente levou em consideração os seus próprios relatórios, resoluções e documentos anteriores referentes à tormentosa questão dos desaparecimentos forçados, sendo precisamente a experiência adquirida nos trabalhos realizados anteriormente, que constituíram a sua principal fonte de inspiração na elaboração das disposições contidas no projeto elaborado, que foi aprovado no mesmo período de sessões.9

Em setembro de 1988, em seu Informe Anual (1987 -1988),10 a Comissão IDH apresentou à OEA um projeto particularmente original e completo em seu conteúdo.11 A Comissão de Assuntos Jurídicos e Políticos (CAJP) do Conselho Permanente da OEA criou um grupo de trabalho que passou vários anos examinando o projeto da Comissão IDH à portas fechadas,12 apresentando uma versão preliminar bastante diluída (em relação ao projeto inicial) à Assembleia Geral, por ocasião de seu 22o. Período Ordinário de Sessões (18 a 23 de maio de 1992), em sua oitava sessão plenária, conforme Resolução n. 1172 (XXII-0/92).13

Meses mais tarde, uma coalizão de ONGs, coordenada pelo Grupo de Direito Internacional dos Direitos Humanos, preparou e submeteu à OEA uma análise do projeto elaborado, comentando-o artigo por artigo e levando em consideração as disposições mais progressistas do projeto de declaração que estava sendo elaborado no âmbito das Nações Unidas. Em razão das fortes críticas feitas ao projeto, a CAJP do Conselho Permanente da OEA passou a trabalhar novamente no texto do projeto durante os dois anos subsequentes, mas agora, por recomendação da Assembleia Geral,14 em contato frequente com a coalizão de ONGs, revisando e fortalecendo consideravelmente todo o projeto de convenção, que foi finalmente apresentado à Assembleia Geral em 1994.15

Assim, em 9 de junho de 1994, em Belém do Pará, Brasil, por ocasião do 24o. Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral da OEA (6 a 10 de junho de 1994), por meio da Resolução n. 1256 (XXIV-0/94), foi adotada a CISDFP, que entrou em vigor internacional em 28 de março de 1996, nos termos de seu art. 20 (1), no trigésimo dia seguinte à data do depósito do segundo instrumento de ratificação. Este texto convencional conta atualmente com 15 Estados Partes.16

O Brasil firmou a CISDFP em 10 de junho de 1994, que foi aprovada pelo Congresso Nacional, nos termos estabelecidos pelo art. 49, I, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), por meio do Decreto Legislativo n. 127, em 11 de abril de 2011. O governo brasileiro depositou o instrumento de ratificação junto à Secretaria Geral da OEA em 3 de fevereiro de 2014, sem realizar qualquer reserva ou declaração interpretativa, sendo que no plano jurídico internacional, a Convenção entrou em vigor para o país em 5 de março de 2014, no trigésimo dia a partir da data do depósito do instrumento de ratificação (art. 20, 2). Por meio do Decreto n. 8.766, de 11 de maio de 2016, conforme a prática brasileira, a CISDFP passou a integrar o ordenamento jurídico brasileiro.17

Nesse ponto vale destacar que a ratificação da referida Convenção pelo país se deve, em grande parte, à pressão feita pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) no julgamento do caso Gomes Lund e outros v. Brasil,18 em 24 de novembro de 2010, onde a Corte instou o Brasil a dar prosseguimento à tramitação legislativa (que já ocorria no âmbito do legislativo brasileiro naquela ocasião) e a adotar, dentro de um prazo razoável, todas as medidas necessárias para ratificar a CISDFP (par. 287).

Abrindo-se aqui um breve parêntesis, conforme o relatório final da Comissão Nacional da Verdade,19 durante a ditadura militar brasileira (1964-1985), os desaparecimentos forçados constituíram uma política de Estado praticada de forma sistemática. Dados oficiais apontam a morte e desaparecimento de pelo menos 434 pessoas, bem como aludem que mais de nove mil indígenas foram dizimados pela repressão.20 É nesse contexto que transcorre a história da Guerrilha do Araguaia,21 cenário dos fatos do caso Gomes Lund e outros v. Brasil . Na denúncia feita à Corte IDH, alegou-se a detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas entre os anos de 1972 e 1975, como resultado das operações empreendidas pelo Exército brasileiro nesse período (cf. par. 2o. da sentença da Corte) na região do Araguaia, fatos pelos quais o país foi responsabilizado internacionalmente e condenado pela Corte IDH no ano de 2010.

A CISDFP foi o primeiro instrumento internacional (ainda que de abrangência regional) com força normativa vinculante a tratar do tema relativo ao desaparecimento forçado de pessoas, tendo por antecedente internacional mais importante apenas a DSPTPCDF, anteriormente mencionada. Ela representa um avanço significativo no Direito Internacional dos Direitos Humanos, “especialmente porque prevê pela primeira vez, em um instrumento vinculante, uma definição internacionalmente acordada da ofensa e qualifica a prática sistemática do desaparecimento como crime contra a humanidade”.22

A CISDFP possui um preâmbulo e conta com 22 artigos que preveem, dentre outros pontos, as obrigações assumidas pelos Estados Partes e que deverão ser implementadas em seu direito doméstico, os direitos e as garantias, bem como a cooperação internacional para a prevenção e o combate do desaparecimento forçado de pessoas.

Ela conta em seu texto com disposições positivas e bastante inovadoras no que se refere, v.g., à continuidade do delito de desaparecimento forçado, à exclusão da competência de tribunais militares ou especiais para julgar os casos de crimes de desaparecimento forçado, à imprescritibilidade da ação penal decorrente do desaparecimento forçado e da pena imposta judicialmente ao responsável, bem como à impossibilidade de se alegar a existência de normas domésticas, v.g., leis de anistia ou medidas similares (“circunstâncias excepcionais”), como causas justificativas para o não cumprimento das obrigações previstas na Convenção. De acordo com seus artigos XIII e XIV, a Comissão IDH e a Corte IDH, principais órgãos de proteção dos direitos humanos da OEA, foram incumbidos de realizar o monitoramento e a implementação de suas disposições.

Apesar de seus vários méritos, a CISDFP revela algumas lacunas normativas, que são bem sintetizadas por Tullio Scovazzi e Gabriella Citroni:

Em primeiro lugar, não aborda a questão da prevenção dos desaparecimentos forçados, limitando-se a mencionar algumas obrigações genéricas… Em segundo lugar, deixa de fora a questão das garantias judiciais para as vítimas, seus familiares ou representantes e seu direito de ter suas queixas imediata, minuciosa e imparcialmente investigadas pelas autoridades competentes. Em terceiro lugar, não menciona a obrigação dos Estados Partes de adotar todas as medidas necessárias para proteger contra maus tratos, intimidação e represálias, todas as pessoas envolvidas na investigação de um caso de desaparecimento, incluindo o autor da queixa, os familiares do desaparecido, suas associações e advogados. Em quarto lugar, o artigo XIX da Convenção Interamericana de 1994 permite a apresentação de reservas.23

Mesmo apesar das lacunas mencionadas, a CISDFP exerceu uma influência incontestável na elaboração da CIPPTPCDF e também sobre o ERTPI, pois as suas pioneiras e inovadoras disposições foram em grande parte aperfeiçoadas e incorporadas ao texto da CIPPTPCDF, que também cuidou de preencher as lacunas legislativas por ela deixadas.

III. O conceito convencional de desaparecimento forçado

Na legislação internacional, o desaparecimento forçado de pessoas constitui, ao mesmo tempo, uma forma gravíssima de violação de direitos humanos24 e também um crime internacional.25 Em razão disso poderá ensejar (de modo simultâneo) a responsabilidade internacional do Estado por grave violação de direitos humanos, conforme previsto no âmbito do Direito Internacional dos Direitos Humanos, bem como a responsabilidade internacional penal do indivíduo, de acordo com as previsões normativas do Direito Internacional Penal.

Nos termos do art. 2o. da CISDFP, primeiro tratado internacional que trouxe uma definição de desaparecimento forçado de pessoas, ainda que limitada territorialmente ao contexto interamericano, a prática consiste na

privação de liberdade de uma pessoa ou mais pessoas, seja de que forma for, praticada por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas que atuem com autorização, apoio ou consentimento do Estado, seguida de falta de informação ou da recusa a reconhecer a privação de liberdade ou a informar sobre o paradeiro da pessoa, impedindo assim o exercício dos recursos legais e das garantias processuais pertinentes.

A CIPPTPCDF, que incorporou em seu texto várias disposições da CISDFP, em seu art. 2o., trazendo uma redação semelhante, dispôs que o desaparecimento forçado deve ser entendido como

a prisão, a detenção, o sequestro ou qualquer outra forma de privação de liberdade que seja perpetrada por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas agindo com a autorização, apoio ou aquiescência do Estado, e a subsequente recusa em admitir a privação de liberdade ou a ocultação do destino ou do paradeiro da pessoa desaparecida, privando-a assim da proteção da lei.

Por sua vez, o art. 7o., (2), (i), que combinado com o art. 7o., (1), (i), do ERTPI, tipifica a conduta caracterizadora do desaparecimento forçado como um crime contra a humanidade, também influenciado pela CISDFP, considera crime internacional

a detenção, a prisão ou o sequestro de pessoas por um Estado ou uma organização política ou com a autorização, o apoio ou a concordância destes, seguidos de recusa a reconhecer tal estado de privação de liberdade ou a prestar qualquer informação sobre a situação ou localização dessas pessoas, com o propósito de lhes negar a proteção da lei por um prolongado período de tempo.

Embora os termos precisos utilizados sejam diferentes, as definições acima contêm elementos essencialmente semelhantes e comuns, que inclusive têm sido confirmados pela jurisprudência internacional. Pelas disposições acima transcritas torna-se possível identificar quais são os elementos constitutivos do desaparecimento forçado nos termos convencionais:26 (i) a prisão, detenção, sequestro ou qualquer outra forma de privação de liberdade; (ii) realizadas diretamente por agentes do Estado ou com a autorização/apoio/aquiescência estatal; (iii) seguidas de uma recusa de reconhecimento da privação da liberdade ou da dissimulação do destino do desaparecido; e, (iv) a colocação do desaparecido fora da proteção da lei.

A distinção fundamental existente entre o ERTPI e as CIPPTPCDF e CISDFP é que o primeiro trata o desaparecimento forçado exclusivamente como um crime contra a humanidade e, portanto, só quando for cometido “como parte de um ataque generalizado ou sistemático dirigido contra qualquer população civil”; por outro lado, as segundas destinam-se a resolver qualquer caso de desaparecimento forçado que importem em uma violação de direitos humanos.27 Portanto, embora um tribunal nacional possa ter jurisdição sobre o desaparecimento forçado sob todas as definições (do Estatuto e das Convenções), devido ao princípio da complementaridade, o TPI somente terá jurisdição nas condições estritamente delimitadas previstas em seu Estatuto.28

A definição do art. 7o., (2), (i), contida no ERTPI, também difere das definições de direitos humanos em razão de acrescentar três novos elementos que são: (i) um propósito específico (remover a pessoa da proteção da lei), (ii) um elemento temporal (por um período de tempo prolongado) e (iii) um novo ator (organização política). Portanto, não se deve confundir a proibição do desaparecimento forçado de pessoas dirigida aos Estados, nos termos do Direito Internacional dos Direitos Humanos e potencialmente geradora da responsabilidade internacional do ente estatal por graves violações de direitos humanos, com o crime internacional cuja conduta é tipificada e dirigida a todos os indivíduos, nos termos do Direito Internacional Penal, e que conduz à responsabilidade internacional individual.29

Seja como uma grave violação de direitos humanos ou como crime internacional, na legislação internacional e na doutrina (majoritariamente) o desaparecimento forçado constitui uma violação contínua ou permanente de direitos humanos ou um crime permanente, que somente chega ao fim quando o destino ou o paradeiro da pessoa desaparecida se tornam conhecidos,30 uma vez que o ato de desaparecimento e sua execução têm início com a privação da liberdade da pessoa e com a subsequente falta de informação sobre seu destino, permanecendo enquanto não for conhecido o paradeiro da vítima desaparecida ou identificados, com certeza, os seus restos mortais.

Nesse sentido, a CIPPTPCDF faz menção à “natureza contínua desse crime” (art. 8o., 1, “b”), assim como a CISDFP, ao prever que o “delito será considerado continuado ou permanente, enquanto não se estabelecer o destino ou paradeiro da vítima” (art. 3o.).31 A jurisprudência internacional também tem caminhado nesse sentido desde longa data, a exemplo da Corte IDH32 e, mais recentemente, da Corte Europeia de Direitos Humanos (Corte EDH).33

IV. O desaparecimento forçado como múltiplas violações de direitos humanos e como crime contra a humanidade na CISDFP e na Corte Interamericana de Direitos Humanos

No âmbito do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH), o desaparecimento forçado ou involuntário pode afetar simultaneamente uma série de direitos humanos consagrados em muitos tratados internacionais sobre o tema, tais como o direito à vida, o direito ao reconhecimento da personalidade jurídica de cada ser humano, o direito à segurança pessoal, o direito a não ser arbitrariamente privado da liberdade, o direito à proteção nos termos da lei, o direito a uma representação legal, o direito a um julgamento justo, o direito a condições de detenção humanas, o direito de não ser sujeito a tortura ou a outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. Em determinados casos, o desaparecimento forçado também está relacionado com as violações da liberdade de pensamento, de expressão, de religião e de associação, bem como da proibição geral de discriminação de qualquer natureza.34

O desaparecimento também viola, em geral, o direito ao convívio familiar, o direito a um nível de vida suficiente, o direito à educação e à saúde. Não é difícil de se constatar que o desaparecimento do principal provedor econômico da família, sobretudo em sociedades e famílias desprovidas de maiores recursos, as deixam muitas vezes numa situação socioeconômica de desamparo e desespero. As crianças também são afetadas pelos desaparecimentos, seja direta ou indiretamente, v.g., com a violação do direito a uma identidade pessoal. A perda de um dos pais por efeito de um desaparecimento também consiste numa grave violação dos direitos humanos da criança.35

No preâmbulo da CISDFP os Estados Partes reconheceram que o desaparecimento forçado “viola múltiplos direitos essenciais da pessoa humana, de caráter irrevogável, conforme consagrados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos Humanos”. Sob a ótica internacional, portanto, trata-se de uma conduta pluriofensiva, violadora de uma multiplicidade de direitos humanos protegidos nos tratados internacionais de direitos humanos.

Esse é também o entendimento da Corte IDH, cuja jurisprudência foi precursora da consolidação de uma perspectiva abrangente da gravidade da figura do desaparecimento forçado de pessoas, reiterando em vários julgados que essa abominável prática constitui uma “violação múltipla de vários direitos protegidos pela Convenção Americana, que coloca a vítima em um estado de completa desproteção e acarreta outras violações conexas”, não havendo dúvidas, portanto, no tocante à “caracterização pluriofensiva, quanto aos direitos afetados” pelo desaparecimento forçado de pessoas.36

No plano do Direito Internacional Penal (DIP), em determinadas circunstâncias o desaparecimento forçado pode configurar ainda um crime contra a humanidade. É o que se extrai do art. 7o., 1, (i), c/c art. 7o., 2, (i), do ERTPI, que tratou especificamente dos crimes contra a humanidade, tipificando expressamente o desaparecimento forçado dentre os crimes desta natureza. No preâmbulo da CISDFP os Estados reafirmaram que “a prática sistemática do desaparecimento forçado de pessoas constitui um crime de lesa-humanidade”.37 Já no âmbito global, a CIPPTPCDF trilhou no mesmo sentido ao dispor que “a prática generalizada ou sistemática de desaparecimento forçado constitui crime contra a humanidade, tal como define o direito internacional aplicável, e estará sujeito às consequências previstas no direito internacional aplicável” (art. 5o.).

A exigência de uma prática generalizada ou sistemática é o elemento internacional mais amplamente aceito para distinguir os crimes contra a humanidade dos crimes comuns, que não chegam ao nível dos crimes de Direito Internacional.38 Tratam-se de requisitos alternativos e, conforme explica Alicia Gil Gil, “o primeiro faz referência, em princípio, a uma dimensão quantitativa, enquanto o segundo é um requisito qualitativo”.39

A prática generalizada do desaparecimento forçado, para fins de sua configuração como um crime contra a humanidade, implica no atingimento de uma multiplicidade de vítimas, seja num extenso âmbito geográfico ou em espaços menores,40 excluindo, desse modo um ato desumano isolado, cometido por um autor, agindo por sua própria iniciativa e dirigido contra uma única vítima. Por outro lado, o caráter sistemático do desaparecimento forçado, para que constitua crime contra a humanidade, supõe a prática repetida ou contínua dos atos, seguindo uma política, um padrão ou plano pré-concebido,41 não se tratando, portanto, de eventos isolados ou esporádicos, mas que fazem parte de uma política do governo ou de uma prática estendida ou sistemática de atrocidades toleradas, perdoadas ou reconhecidas por um governo ou por uma autoridade de fato.42 Nesse sentido, o Tribunal Penal Internacional, interpretando o art. 7o., (1), do Estatuto de Roma, afirma que

a expressão “generalizada ou sistemática”, constante do artigo 7º, nº 1, do Estatuto, exclui os atos de violência aleatórios ou isolados. Além disso, o adjetivo “generalizado” refere-se à natureza em grande escala do ataque e ao número de pessoas alvejadas, ao passo que o adjetivo “sistemático”, refere-se à natureza organizada dos atos de violência e à improbabilidade de sua ocorrência aleatória.43

Apesar da categoria dos crimes contra a humanidade ser uma extensão do ius in bello, o atual conceito de crime contra a humanidade é independente da situação de guerra,44 sendo produto de uma larga evolução histórica.45 Atualmente, a definição internacional encontra-se no art. 7o. do ERTPI, que estabelece ser crime contra a humanidade uma diversidade de atos que estão ali descritos, sempre que cometidos no quadro de um ataque generalizado ou sistemático contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque.

Foge aos propósitos desse estudo a análise pormenorizada dos crimes contra a humanidade, tais como previstos no referido dispositivo convencional,46 contudo, a síntese de Antonio Cassese sobre tais crimes, conforme definidos pelo Direito Internacional é precisa:

1. são atos que constituem crimes particularmente abomináveis, uma vez que representam grave lesão à dignidade humana ou uma grave humilhação contra um ou mais seres humanos; 2. não são eventos isolados ou esporádicos, mas fazem parte de uma política do governo, ou uma prática estendida ou sistemática das atrocidades toleradas, perdoadas ou reconhecidas por um governo ou por uma autoridade de fato…; 3. os atos são proibidos e podem, portanto, ser punidos independentemente de serem eles cometidos ou não em tempo de paz ou de guerra. Ao contrário do que aconteceu em 1945, na verdade, o direito consuetudinário não atribui qualquer importância hoje à existência de uma ligação ou conexão entre esses atos e os conflitos armados; 4. a vítima do crime pode ser civil ou, no caso de crimes cometidos durante um conflito armado, aquelas pessoas que não tomam (ou deixaram de tomar) parte em conflitos armados, mas também, de acordo com as normas internacionais consuetudinárias (mas, note-se, não conforme as disposições dos Estatutos do TPIJ, TPIR e da CPI), combatentes inimigos.47

Verifica-se, portanto, que o desaparecimento forçado de pessoas constituirá crime contra a humanidade, sempre que presentes os seus elementos constitutivos, analisados anteriormente, somados à condição de os atos configuradores do desaparecimento terem sido cometidos num quadro de ataque generalizado ou sistemático.

V. Os impactos da Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas no Brasil

A ratificação e a internalização da CISDFP pelo Brasil implicam em consequências domésticas para o país, uma vez que com tais atos, o Estado brasileiro se obrigou a adotar diversas medidas com a finalidade de implementar e efetivar as disposições convencionais em seu território, fato que necessariamente demanda uma atuação conjunta dos poderes e órgãos do governo brasileiro nesse sentido. O art. 1o., “d”, da CISDFP dispõe expressamente que cada Estado Parte deverá “tomar as medidas de caráter legislativo, administrativo, judicial ou de qualquer outra natureza que sejam necessárias para cumprir os compromissos assumidos nesta Convenção”.

De acordo com o art. 26 da CVSDT, “todo tratado em vigor obriga as partes e deve ser cumprido por elas de boa fé”. Esse dispositivo consagra o princípio pacta sunt servanda, a “pedra angular” das relações e do Direito Internacional.48 O princípio consagra o dever de cumprimento de todas as obrigações assumidas por um Estado em decorrência da ratificação de um tratado internacional, devendo ser aplicado a “todos os estágios da vida de um tratado, por exemplo, em relação à sua entrada em vigor, interpretação, aplicação e término”.49 Por isso há o dever de o Estado brasileiro atuar no sentido de efetivar as disposições normativas da CISDFP, implementando-as e concretizando-as em seu território,50 sendo que o descumprimento das obrigações convencionais assumidas e/ou a violação dos direitos previstos na Convenção poderão ensejar um processo internacional contra o Estado Brasileiro no âmbito da OEA, que poderá resultar na responsabilização internacional do país junto à Comissão IDH e à Corte IDH.

1. O dever de efetivar os direitos humanos previstos na CISDFP

Uma das obrigações mais importantes dos Estados Americanos, integrantes da OEA e que são Partes em diversos tratados regionais de direitos humanos adotados no âmbito da organização, consiste no comprometimento de cada Estado em respeitar e efetivar os direitos e liberdades reconhecidos e consagrados em tais tratados, bem como garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição, sem qualquer discriminação por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social, conforme se depreende, v.g., do art. 1o. da CADH, mais importante instrumento de proteção dos direitos humanos no âmbito da OEA.

No preâmbulo da CISDFP, os Estados Americanos afirmaram que “o desaparecimento forçado de pessoas viola múltiplos direitos essenciais da pessoa humana, de caráter irrevogável, conforme consagrados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos…”, constituindo “uma afronta à consciência do Hemisfério e uma grave ofensa de natureza hedionda à dignidade inerente à pessoa humana, em contradição com os princípios e propósitos consagrados na Carta da Organização dos Estados Americanos”. Portanto, uma interpretação sistemática destes e de outros instrumentos interamericanos de proteção dos direitos humanos, revela que uma das principais, senão a mais importante obrigação dos Estados Partes em qualquer tratado adotado no âmbito da OEA, é respeitar e efetivar os direitos humanos neles consagrados, o que faz surgir para o Estado brasileiro o dever envidar seus maiores esforços nesse sentido, notadamente no tocante aos direitos e garantias consagrados na CISDFP.

O art. 1o., (a), da CISDFP estabelece o compromisso dos Estados Partes em não praticar, nem permitir, nem tolerar o desaparecimento forçado de pessoas, nem mesmo em estado de emergência, exceção ou suspensão de garantias individuais”. Em complemento, o art. 10 da CISDFP dispõe que “em nenhum caso poderão ser invocadas circunstâncias excepcionais, tais como estado de guerra ou ameaça de guerra, instabilidade política interna ou qualquer outra emergência pública, para justificar o desaparecimento forçado de pessoas”.

Em razão destas disposições convencionais, nasce para os indivíduos o direito de não serem submetidos a desaparecimentos forçados, surgindo consequentemente para o Estado brasileiro o dever de não praticar, permitir ou tolerar que pessoas que estejam em território sob sua jurisdição sejam submetidas à prática, sendo inclusive vedada a alegação de circunstâncias excepcionais, tais como a guerra ou sua iminência, o estado de emergência, o estado de exceção, instabilidades políticas internas ou suspensão das garantias individuais, como causas justificadoras da prática.

Na eventual vigência de qualquer das circunstâncias descritas acima, a CISDFP estabelece o dever de o país manter o direito a procedimentos ou recursos judiciais que sejam rápidos e eficazes, como meio de determinar o paradeiro de pessoas que foram privadas de sua liberdade, bem como de identificar a autoridade que ordenou a privação de liberdade ou a tornou efetiva. A Convenção dispõe ainda que na tramitação de tais procedimentos ou recursos, de conformidade com o direito brasileiro, as autoridades judiciais competentes deverão ter acesso livre e imediato a qualquer centro de detenção do país e a cada uma de suas dependências, bem como a todo e qualquer lugar onde se possa crer que a pessoa desaparecida possa ser encontrada, inclusive em locais sujeitos à jurisdição militar (art. 10).

Nos termos do art. 11 da CISDFP, o Brasil também deverá garantir o direito de toda pessoa privada de liberdade ser mantida em lugares de detenção oficialmente reconhecidos, bem como o direito de ser apresentada sem demora à autoridade judicial competente, conforme a legislação doméstica do país. Haverá ainda para o Estado brasileiro a obrigação de manter registros oficiais atualizados sobre as pessoas detidas, colocando-os à disposição dos familiares, do Poder Judiciário e outras autoridades, de seus defensores ou de quaisquer outras pessoas que demonstrem interesse legítimo.

Em reforço ao dever de cumprimento das obrigações convencionais assumidas e de efetivação dos direitos previstos na CISDFP, o art. 27 da CVSDT estabelece que, como regra, “uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado”. Mark E. Villiger explica que este dispositivo convencional veda ao Estado a possibilidade de “invocar as disposições do seu direito interno para evitar a responsabilidade pelo cumprimento das suas obrigações decorrentes dos tratados e, em particular, para justificar a sua falha em cumprilas”.51 Trata-se de um dispositivo que reforça e, de fato, é um corolário do princípio pacta sunt servanda, consagrado no art. 26 da mesma Convenção e comentado no início desta Seção.

Portanto, além do Estado brasileiro não poder lançar mão de quaisquer circunstâncias excepcionais para justificar os desaparecimentos forçados em seu território, conforme estabelecido pela CISDFP e comentado supra, também não poderá invocar quaisquer disposições de seu direito doméstico52 para se esquivar das responsabilidades pelo não cumprimento de suas obrigações, ao abrigo da CISDFP, especialmente no tocante à uma eventual falha sua em efetivar os direitos nelas previstos, conforme acima delineados. O dever do país é de todo o contrário, ou seja, adequar seu direito doméstico às disposições convencionais, conforme amplamente estabelecido pelos tratados internacionais, inclusive pela CADH em seu art. 2o.

2. O dever de legislar para a adequação do ordenamento doméstico à CISDFP

Uma das medidas mais comuns previstas nos tratados internacionais em geral é a realização de modificações legislativas no ordenamento jurídico doméstico dos países, com o intuito de adequá-lo à normativa e aos padrões internacionais.53 Portanto, uma das principais obrigações que surge para o Brasil em decorrência da ratificação e internalização da CISDFP é a de legislar, criando ou modificando suas leis domésticas já existentes, para que atendam às disposições normativas convencionais.

Nesse sentido, uma das mais importantes obrigações do Brasil nesse sentido é legislar, tipificando a conduta para fazer com que o desaparecimento forçado constitua crime no país, conforme disposto no art. 3o. da CISDFP, pelo qual o país se comprometeu a

adotar, de acordo com seus procedimentos constitucionais, as medidas legislativas que forem necessárias para tipificar como delito o desaparecimento forçado de pessoas e a imporlhe a pena apropriada que leve em conta sua extrema gravidade. Esse delito será considerado continuado ou permanente, enquanto não se estabelecer o destino ou paradeiro da vítima.

O referido dispositivo convencional consagra um mandado internacional de criminalização, que pode ser entendido como um dispositivo expresso (mandado de criminalização direto) ou implícito (mandado de criminalização indireto) contido em determinado tratado internacional, que cria para o país a obrigação internacional de exercer sua jurisdição prescritiva (prescriptive jurisdiction),54 fazendo com que o comportamento internacionalmente proibido seja tipificado na ordem jurídica nacional, segundo os princípios constitucionais do país, caso se trate de uma conduta atípica no âmbito doméstico.55

Verifica-se que a CISDFP veicula um mandado de criminalização expresso que, forjado a partir da jurisprudência da Corte IDH, especifica elementos essenciais do injusto penal, como o caráter permanente do crime e os elementos importantes para se identificar o injusto específico do comportamento, na medida em que a expressão extrema gravidade, denota a reprovabilidade internacional que recai sobre o delito.

Embora a CISDFP, por meio de uma cláusula geral (“de acordo com seus procedimentos constitucionais”), assegure a liberdade de conformação do legislador nacional em cumprir a obrigação de acordo com seus princípios constitucionais e cultura jurídica internos, no ato da tipificação doméstica do desaparecimento forçado, haverá para o legislador brasileiro o dever de observância das diretrizes fixadas pela Convenção, v.g., considerar o desaparecimento como um crime permanente (art. 3o.),56comum (art. 9o.),57pluriofensivo,58imprescritível (art. 7o.),59 de extrema gravidade (art. 3o.),60passível de extradição (art. 5o.), não político e/ou não conexo a um crime político (art. 5o.), de modo que a tipificação doméstica possa estar uniformizada (quanto ao tipo e pena) aos parâmetros internacionais.61

È importante ainda destacar que nos termos do art. 1o., (b), da CISDFP, no momento da tipificação da conduta, o legislador brasileiro deverá se atentar para o dever de responsabilizar penalmente todos “os autores, cúmplices e encobridores do delito do desaparecimento forçado de pessoas, bem como da tentativa de prática do mesmo”. Além disso, a obediência hierárquica não poderá ser considerada como causa dirimente no crime, por vedação expressa da Convenção, que em seu art. 8o. dispõe que “não se admitirá como causa dirimente a obediência devida a ordens ou instruções superiores que disponham, autorizem ou incentivem o desaparecimento forçado. Toda pessoa que receber tais ordens tem o direito e o dever de não obedecê-las”.

Como no momento de sua ratificação, o Estado brasileiro não apresentou nenhuma reserva ou declaração unilateral interpretativa em face de qualquer das disposições da CISDFP, torna -se forçoso reconhecer que o país se comprometeu integralmente perante as obrigações dela decorrentes, de modo que sob a ótica do Direito Internacional, o Brasil está internacionalmente obrigado a tipificar o desaparecimento forçado em seu ordenamento jurídico doméstico.

Alguns trabalhos no âmbito do Poder Legislativo brasileiro já podem ser verificados. No Anteprojeto do Novo Código Penal, atualmente em trâmite pelo Senado Federal, a Comissão de Juristas encarregada pela sua elaboração se manifestou no sentido de criminalizar a conduta, conforme estabelecido no art. 466 do Anteprojeto (PLS n. 236/2012).62 No Senado Federal também tramitou um Projeto de Lei (PLS n. 245/2011), atualmente em trâmite na Câmara dos Deputados em regime de prioridade (PL n. 6240/2013),63 visando acrescentar no Código Penal Brasileiro em vigor (Decreto-Lei n. 2.848/1940), o art. 149-A, tipificando a conduta de desaparecimento forçado de pessoas como crime (hediondo) no ordenamento jurídico brasileiro.

A tipificação da conduta caracterizadora do desaparecimento forçado de pessoas foi uma das imposições da Corte IDH, por ocasião do julgamento do caso Gomes Lund e outros v. Brasil, ocorrido no ano de 2010. Naquela ocasião, em sua sentença a Corte condenou o país a adotar, dentro de um prazo razoável, as medidas necessárias para tipificar o delito de desaparecimento forçado de pessoas, em conformidade com os parâmetros interamericanos, nos termos estabelecidos no par. 287 da decisão (par. 325, item 15).

3. O dever de investigar, processar e punir

Com a tipificação e criminalização do desaparecimento forçado na legislação penal doméstica brasileira, outra obrigação que surge para o país é a de realizar a persecução penal, que no Brasil envolve a investigação criminal (inquérito penal) e o processo penal (ação penal), conduzindo à justiça para que sejam responsabilizados, todos os indivíduos envolvidos nos casos de desaparecimentos forçados.

Nesse sentido, o art. 1o., (b), da CISDFP estabelece que cada Estado Parte se compromete a “punir, no âmbito de sua jurisdição, os autores, cúmplices e encobridores do delito do desaparecimento forçado de pessoas, bem como da tentativa de prática do mesmo”. Esta disposição convencional impõe ao Estado brasileiro o dever de movimentar a máquina estatal, notadamente os seus órgãos de investigação (polícia e Ministério Público) e judiciais, com o fim de investigar, processar e punir os atos caracterizadores do desaparecimento forçado e todos os responsáveis por tais atos, inclusive na forma tentada. Trata-se de uma obrigação internacional que de longa data vem sendo confirmada e praticada pela Corte IDH, que nos diversos casos de desaparecimentos forçados que julgou, condenou os países envolvidos à realização da efetiva persecução penal e responsabilização dos agentes envolvidos.64

No Brasil o precedente mais importante nesse sentido é o citado caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, em que a Corte IDH, em razão da violação de diversos direitos consagrados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969) pelo Estado Brasileiro, condenou o país, dentre outras coisas, a conduzir eficazmente no âmbito da jurisdição doméstica brasileira, a investigação penal dos fatos relativos ao caso, a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências previstas na lei brasileira, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 256 e 257 da sentença.65

Um dos grandes obstáculos imposto pelo Estado brasileiro ao cumprimento da decisão da Corte nesse sentido e que tem constituído um entrave à plena efetivação e garantia dos direitos das vítimas e seus familiares decorre da Lei n. 6.683/79, conhecida como “Lei de Anistia”,66 que sob a ótica brasileira impede o processamento criminal dos agentes públicos envolvidos na repressão ocorrida durante a Guerrilha do Araguaia. Em sua sentença, a Corte IDH entendeu como objeto de deliberação decidir “se a Lei de Anistia sancionada em 1979 é ou não compatível com os direitos consagrados nos artigos 1.1, 2, 8.1 e 25 da Convenção Americana”.67 Este foi o mais tormentoso ponto deliberativo para a Corte, não apenas em razão da gravidade da questão em apreço como, notadamente, pelas peculiaridades do caso brasileiro em relação a outros por ela decididos anteriormente. Em seu julgamento, a Corte considerou que

a forma na qual foi interpretada e aplicada a Lei de Anistia aprovada pelo Brasil… afetou o dever internacional do Estado de investigar e punir as graves violações de direitos humanos, ao impedir que os familiares das vítimas no presente caso fossem ouvidos por um juiz, conforme estabelece o artigo 8.1 da Convenção Americana, e violou o direito à proteção judicial consagrado no artigo 25 do mesmo instrumento, precisamente pela falta de investigação, persecução, captura, julgamento e punição dos responsáveis pelos fatos, descumprindo também o artigo 1.1 da Convenção. Adicionalmente, ao aplicar a Lei de Anistia impedindo a investigação dos fatos e a identificação, julgamento e eventual sanção dos possíveis responsáveis por violações continuadas e permanentes, como os desaparecimentos forçados, o Estado descumpriu sua obrigação de adequar seu direito interno, consagrada no artigo 2 da Convenção Americana.68

Concluindo, a Corte entendeu que em razão de sua

manifesta incompatibilidade com a Convenção Americana, as disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos carecem de efeitos jurídicos. Em consequência, não podem continuar a representar um obstáculo para a investigação dos fatos do presente caso, nem para a identificação e punição dos responsáveis, nem podem ter igual ou similar impacto sobre outros casos de graves violações de direitos humanos consagrados na Convenção Americana ocorridos no Brasil.69

Tristemente hoje, passados mais de seis anos do julgamento do caso Gomes Lund e outros v. Brasil, torna-se forçoso afirmar que o Estado brasileiro tem falhado na tarefa de dar cumprimento ao dispositivo da sentença que determinada a investigação e processamento penal dos responsáveis, a despeito de louváveis iniciativas para reverter o cenário de impunidade terem ocorrido neste período, como a criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV).70 Criada pela Lei n. 12.528/201171 e instituída em 16 de maio de 2012, a finalidade precípua da Comissão foi apurar e esclarecer as graves violações de direitos humanos que ocorreram durante a ditadura civil-militar brasileira (18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988)72 e constituiu um verdadeiro mecanismo difuso de investigação das perseguições e dos desaparecimentos forçados ocorridos no período.

O art. 3o. da Lei estabeleceu os objetivos da Comissão, consistentes (i) no esclarecimento dos fatos circunstâncias dos casos de graves violações de direitos humanos durante a ditadura; (ii) no esclarecimento circunstanciado dos casos de torturas, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres e sua autoria; (iii) na identificação e publicidade das estruturas, locais, instituições e circunstâncias relacionados à prática de violações de direitos humanos e suas ramificações nos diversos aparelhos estatais e na sociedade; (iv) no encaminhamento aos órgãos públicos competentes de informações obtidas, capazes de auxiliar na localização e identificação de corpos e restos mortais de desaparecidos políticos; (v) na colaboração com todas as instâncias do poder público brasileiro para apuração de violações de direitos humanos; (vi) na recomendação quanto a adoção de medidas e políticas públicas para prevenir violação de direitos humanos, visando a assegurar sua não repetição e a promoção de uma efetiva reconciliação nacional; e, (vii) na promoção da reconstrução da história dos casos de graves violações de direitos humanos, colaborando para que seja prestada assistência às vítimas de tais violações.

Para o atingimento desses objetivos foi prevista por sua legislação criadora (art. 4o.), a possibilidade de a CNV receber testemunhos, informações, dados e documentos a ela encaminhados voluntariamente, assegurada a não identificação do detentor ou depoente quando solicitada; requisitar informações, dados e documentos de órgãos e entidades do poder público, ainda que sigilosos; convocar, para entrevistas ou testemunho, pessoas que pudessem guardar qualquer relação com os fatos e circunstâncias por ela examinados; determinar a realização de perícias e diligências para coleta ou recuperação de informações, documentos e dados; promover audiências públicas; requisitar proteção aos órgãos públicos para qualquer pessoa ameaçada em razão de sua colaboração com a Comissão; promover parcerias com órgãos e entidades, públicos ou privados, nacionais ou internacionais, para o intercâmbio de informações, dados e documentos; bem como requisitar o auxílio de entidades e órgãos públicos.

Durante o período de suas atividades, a CNV efetivamente lançou mão de todos estes expedientes, notadamente em relação aos procedimentos investigatórios dos casos de perseguição e desaparecimento forçado de pessoas, valendo ressaltar nesse sentido os acordos de cooperação técnica celebrados entre a Comissão e outras entidades ligadas direta ou indiretamente com seu trabalho, tais como as Comissões Nacionais da Verdade estaduais, municipais e setoriais, destacando-se nesse ponto o acordo de cooperação técnica internacional celebrado em 2013, com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD),73 cujo objetivo foi a prestação de suporte pelo PNUD, à estruturação da CNV no Brasil, “por meio de assessoria técnica voltada à plena realização dos eixos estruturantes de sua atuação”.74

Também merece destaque a atuação difusa e setorial de vários órgãos componentes do Ministério Público (Federal75 e dos Estados), da Polícia Federal e das diversas Comissões da Verdade estaduais que foram criadas no país.76 Como resultado das ações destes órgãos, até o final de 2016, aproximadamente 290 investigações criminais haviam sido instauradas; 17 ações penais propostas, estando elas em diferentes estágios; além de diversas ações declaratórias cíveis ajuizadas, visando ao esclarecimento de fatos e a determinação da responsabilidade civil em casos de prisões arbitrárias, tortura, morte e desaparecimentos forçados ocorridos durante o período ditatorial brasileiro.77

Além disso, novos processos internacionais foram instaurados junto à Corte IDH, a exemplo do caso que se encontra atualmente em trâmite perante o Tribunal, em que se pede a responsabilização internacional do Brasil pela morte do jornalista Vladimir Herzog, que teria sido preso arbitrariamente, torturado e morto por agentes do Estado na época da ditadura. Esse julgamento será de significativa importância em caso de uma potencial condenação do Brasil, especialmente no sentido de consolidar o entendimento adotado no caso Gomes Lund e outros v. Brasil, quanto à necessidade de abertura de investigações para processar e punir pessoas ainda vivas, pagamento de indenização aos familiares do jornalista, promoção de mudanças nas leis penais do país e até mesmo ocasionar uma revisão na política de segurança pública brasileira.

4. O dever de estabelecimento da jurisdição

De acordo com o art. 4o. da CISDFP, os atos constitutivos do desaparecimento forçado de pessoas serão considerados delitos em qualquer Estado que delas seja Parte. Como consequência, cada Estado deverá adotar as medidas necessárias para estabelecer a sua jurisdição sobre as causas que envolvam o crime de desaparecimento forçado nos seguintes casos: a) quando o crime (ou qualquer de seus atos constitutivos) for cometido em qualquer território sob a jurisdição do Estado ou a bordo de um navio ou aeronave que estiver registrado no referido Estado; b) quando o acusado, suposto autor do crime, for um nacional do Estado; c) quando a pessoa desaparecida ou outra vítima for um nacional do Estado, e este assim considerar apropriado.

Como ocorre em geral na legislação e na prática internacional, a CISDFP confia o primado da responsabilização dos indivíduos por atos de desaparecimento forçado à jurisdição doméstica dos Estados. Desse modo, a Convenção impõe ao Estado brasileiro não apenas a obrigação de criminalizar o desaparecimento forçado no seu direito doméstico, mas também o dever de fazer atuar de maneira efetiva a sua jurisdição sobre os atos configuradores do crime em questão.

Contudo, a história mostra que os Estados geralmente não estão dispostos a investigar, processar e punir os indivíduos responsáveis por desaparecimentos forçados, principalmente quando se trata de seus nacionais (como tem ocorrido com o Brasil no citado caso Gomes Lund e outros). Diante desse fato, a CISDFP prevê também que cada Estado Parte deverá tomar as medidas necessárias para estabelecer a sua jurisdição sobre o crime de desaparecimento forçado quando o acusado for um estrangeiro que se encontre em território sob sua jurisdição, salvo se decidir extraditá-lo a outro Estado, de conformidade com suas obrigações internacionais (art. 4o.).

Com esta previsão, a CISDFP consagra objetivamente a denominada jurisdição universal obrigatória, um princípio de Direito Internacional Público segundo o qual “todo e qualquer Estado tem jurisdição para julgar determinadas infrações”,78 perseguindo seus autores, coautores e partícipes, mesmo que elas não tenham nenhuma ligação com o Estado em questão, seja por não terem sido cometidas em território sob sua jurisdição (extraterritorialidade), seja pelo fato de nenhum de seus nacionais estarem envolvidos na condição de autor ou vítima.79 Esta previsão é de absoluta relevância para os casos de desaparecimento forçado de pessoas, uma vez que conforme o Direito Internacional consuetudinário relativo à criminalização dos desaparecimentos forçados como um crime contra a humanidade, a jurisdição universal é permissiva e não obrigatória.80

Surge assim para o Brasil o dever de realizar a persecução penal de estrangeiros que se encontrem em território brasileiro, suspeitos de terem cometido o crime de desaparecimento forçado, caso não venha a extraditá-los para outros Estados. Com isso o Estado brasileiro garantirá que tais crimes não permaneçam impunes.

5. O dever de cooperação internacional

No contexto de um mundo globalizado, que se encontra profundamente interconectado física e eletronicamente, onde o fluxo de pessoas e capitais entre as fronteiras nacionais é cada vez mais intenso, a cooperação internacional assume importância ímpar e se torna absolutamente necessária para a o alcance da plena efetivação dos direitos humanos.81

Atenta a essa necessidade, a CISDFP dispôs sobre a obrigação dos Estados Partes “cooperar[em] entre si a fim de contribuir para a prevenção, punição e erradicação do desaparecimento forçado de pessoas” (art. 1o., “c”), bem como estabeleceu o dever de “cooperação recíproca na busca, identificação, localização e restituição de menores que tenham sido transportados para outro Estado ou retidos neste em consequência do desaparecimento forçado de seus pais, tutores ou guardiães” (art. 12).

Nota-se que a Convenção estabelece um dever de cooperação internacional destinado a contribuir para a prevenção, punição e erradicação do desaparecimento forçado de pessoas, com especial atenção voltada às crianças, dever este que deverá ser observado pelo Brasil nas questões relativas à temática.

Em síntese e exemplificativamente, ao abrigo da CISDFP, surge para o Brasil o dever de cooperação com outros Estados Partes em diversas situações, tais como: a) nos casos de persecução penal que envolvam crimes de desaparecimento forçado, inclusive no tocante à produção e fornecimento de provas relacionadas ao delito; b) na prestação de efetiva assistência às vítimas de desaparecimento forçado; c) envidando seus maiores esforços na busca, localização e libertação de pessoas desaparecidas que supostamente estejam em seu território; d) nos casos de morte das vítimas, exumálas, identificá-las e restituir seus restos mortais aos familiares que se encontram no exterior; e) empreendendo seus maiores esforços na busca, localização, identificação e restituição de menores que tenham sido trazidos para o seu território em consequência do desaparecimento forçado de seus pais em outro país; f) recebendo e processando pedidos de extradição que tenham como fundamento o crime de desaparecimento forçado cometido em outros Estados.82

6. O dever de formação e educação de pessoal para lidar com o desaparecimento forçado

O art. 8o. da CISDFP prevê que os Estados Partes deverão velar “para que, na formação do pessoal ou dos funcionários públicos encarregados da aplicação da lei, seja ministrada a educação necessária sobre o delito de desaparecimento forçado de pessoas”. Este dispositivo convencional demonstra a preocupação da Convenção com o aperfeiçoamento e fortalecimento das capacidades institucionais dos Estados Partes, mediante a capacitação de agentes estatais e do pessoal que lida com casos de desaparecimentos forçados, notadamente quanto aos princípios e normas de proteção dos direitos humanos. A finalidade preventiva dessa norma é muito clara no sentido de se evitar as múltiplas violações de direitos humanos que podem decorrer de um desaparecimento forçado.

A eficácia e o impacto da implementação de programas de educação em direitos humanos no âmbito das instituições estatais são cruciais para que se possa gerar nos países as “garantias de não repetição” de fatos ensejadores de desaparecimentos forçados e consequentes violações de direitos humanos. Além disso deve-se destacar que esses programas podem contribuir significativamente para a erradicação da discriminação étnica e racial, de estereótipos étnicos e raciais, da tortura e outros tratamentos desumanos e degradantes, bem como contribuir para a diminuição da violência e truculência que muitas vezes são empregadas pelos agentes estatais.

O dispositivo convencional acima descrito impõe ao Brasil, especificamente no âmbito do Poder Executivo, um dever de treinamento de pessoal para lidar com as situações que envolvam o desaparecimento forçado de pessoas, propiciandolhes o devido conhecimento e uma educação específica nesse sentido. Nesse contexto, o Estado brasileiro deverá implementar programas de capacitação e educação em direitos humanos no âmbito de suas instituições governamentais, sejam elas civis ou militares, visando à preparação e a especialização de todos os agentes públicos e de quaisquer outras pessoas que de algum modo estejam envolvidas com a custódia e tratamento de pessoas encarceradas e em casos de desaparecimento forçado.

Esta norma convencional guarda uma perfeita sintonia com a jurisprudência da Corte IDH, que tem condenado os Estados responsáveis por desaparecimentos forçados a implementar programas e cursos permanentes e obrigatórios sobre educação em direitos humanos e sobre direito internacional humanitário para todo o pessoal das forças armadas, em todas as esferas (marinha, exército e aeronáutica) e níveis hierárquicos, cujo conteúdo programático deve contemplar inclusive questões específicas sobre o desaparecimento forçado e controle de convencionalidade.83

VI. Considerações finais

No presente trabalho se analisou a problemática do desaparecimento forçado de pessoas enquanto uma preocupação internacional que culminou na elaboração e adoção da Convenção Interamericana sobre o Desaparecimen-to Forçado de Pessoas, um tratado pioneiro que preencheu uma importante lacuna na legislação internacional dos direitos humanos.

Num primeiro momento analisou- se o extenso e difícil processo de elaboração da Convenção, abordando-se sinteticamente as suas diversas etapas, para em seguida tecer breves considerações sobre sua estrutura e principais aspectos, devendo-se concluir que em razão de suas várias disposições pioneiras e inovadoras, representa um marco normativo internacional de extrema importância e um grande avanço do Continente Americano rumo à prevenção e ao combate do desaparecimento forçado de pessoas.

Em seguida, ao abordar-se a questão da definição em termos convencionais, aferiu-se que para a configuração de um desaparecimento forçado será sempre necessária uma prisão, detenção, sequestro ou qualquer outra forma de privação de liberdade, realizados diretamente por agentes estatais ou com a autorização/apoio/aquiescência do Estado, comportamentos estes seguidos de uma recusa de reconhecimento da privação da liberdade ou da dissimulação do paradeiro do desaparecido, com a consequente colocação da vítima fora do âmbito de proteção legal. Pelo padrão internacional analisado, constatou-se que o desaparecimento forçado constitui um delito permanente ou continuado, comum, pluriofensivo, imprescritível, de extrema gravidade, passível de extradição e que não pode ser considerado como crime político ou conexo a um crime político.

Verificou-se que a prática do desaparecimento forçado constitui forma gravíssima de múltiplas violações de direitos humanos e também um crime internacional, que será considerado um delito de lesa humanidade sempre que sua prática for generalizada ou sistemática, ou seja, sempre que os casos de desaparecimentos implicarem no atingimento de uma multiplicidade de vítimas, independentemente da extensão geográfica afetada ou sempre que a prática repetida ou contínua de seus atos caracterizadores seguirem uma política, um padrão ou plano pré-concebido pelo Estado ou por um governo de fato.

Por fim, ao se analisar os principais impactos que deverão ser produzidos pela Convenção no âmbito do Estado brasileiro, constatou-se que em razão do princípio pacta sunt servanda, pedra nuclear do Direito Internacional, o Brasil ao ratificar e internalizar referido tratado de direitos humanos, assumiu perante a OEA e os demais Estados Partes, a obrigação de tomar diversas medidas necessárias à implementação e efetivação de suas disposições, sob pena de sua responsabilização internacional. Em síntese, pode-se concluir que as principais obrigações assumidas pelo país consistem:

  1. No dever de concretizar os direitos humanos nelas previstos, não praticando, permitindo e nem mesmo tolerando tal prática em seu território.

  2. No dever de legislar para a adequação do ordenamento jurídico brasileiro às diretrizes estabelecidas pela Convenção, especialmente no tocante ao mandado internacional de criminalização do desaparecimento forçado de acordo com os vetores convencionalmente instituídos.

  3. No dever realizar a persecução penal, colocando em movimento a máquina estatal, notadamente seus órgãos de investigação e judiciais, a fim de investigar, processar e punir toda pessoa que cometa, ordene, solicite ou induza a prática de um desaparecimento forçado, tente praticá-lo, seja cúmplice, partícipe ou encobridor do ato; em especial nesse ponto verificou-se que o país tem falhado no cumprimento de obrigações internacionais, fato constatado pela análise do caso Gomes Lund e outros v. Brasil, julgado pela Corte IDH no ano de 2010.

  4. No dever de estabelecer a sua jurisdição sobre as causas que envolvam o desaparecimento forçado quando o crime for cometido em qualquer território sob sua jurisdição; quando o acusado, suposto autor do crime, for um nacional brasileiro; quando a pessoa desaparecida ou outra vítima for um nacional brasileiro e o país considerar apropriado; e quando o acusado for um estrangeiro que esteja em território brasileiro, salvo se o país decidir extraditá-lo.

  5. No dever de cooperar com outros Estados Partes na Convenção, notadamente no tocante à persecução penal que envolva o crime de desaparecimento forçado; na prestação de assistência às vítimas; na busca, localização e libertação de pessoas desaparecidas; nos casos de morte das vítimas, tomando as providências para devolver seus restos mortais aos familiares; na busca, localização, identificação e restituição de menores e nos pedidos de extradição feitos por outros Estados Partes.

  6. No dever de implementar programas de capacitação e educação em direitos humanos no âmbito de suas instituições governamentais (civis e militares), com o intuito de promover a especialização de todos os agentes públicos e de quaisquer outras pessoas que estejam envolvidas com a custódia e tratamento de pessoas encarceradas e em casos de desaparecimentos forçados.

Sob a ótica do Direito Internacional, conclui-se que o descumprimento de qualquer destas obrigações convencionais assumidas ao abrigo da CIS-DFP, poderá ensejar um processo internacional contra o Estado Brasileiro no âmbito da Organização dos Estados Americanos que poderá, em última análise, resultar na responsabilização internacional do país.

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1 Organization of American States, General Assembly, Proceedings, vol. I: Certified Texts of the Resolutions, Washington, D. C., 1983, disponível em: https://goo.gl/APi4iD (acesso em: 3 de janeiro de 2017).

2Tal como na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948, na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (DADDH), também de 1948, e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), de 1969.

3Perrone-Moisés, Cláudia, “Leis de anistia face ao direito internacional: «desaparecimentos» e «direito à verdade»”, em Piovesan, Flávia, Direitos humanos, globalização econômica e integração regional: desafios do direito constitucional internacional, São Paulo, Max Limonad, 2002, p. 288; Ambos, Kai e Böhm, María Laura, “La desaparición forzada de personas como tipo penal autónomo”, em Ambos, Kai (coord.), Desaparición forzada de personas. Análisis comparado e internacional, Bogotá, Temis, 2009, p. 198; Ambos, Kai, Treatise on International Criminal Law, vol. II: The Crimes and Sentencing, Oxford, Oxford University Press, 2014, pp. 108 e 109.

4Arrighi, Jean Michel, OEA: Organização dos Estados Americanos, Barueri, Manole, 2004, p. 99.

5Alflen da Silva, Pablo Rodrigo, “Capítulo II. Brasil”, em Ambos, Kai (coord.), Desaparición forzada de personas. Análisis comparado e internacional, Bogotá, Temis, 2009, p. 42.

6Inter-American Commission on Human Rights, Annual Report of the Inter-American Commission on Human Rights 1986-1987, disponível em: https://goo.gl/ighVyL (acesso em: 3 de janeiro de 2017).

7Disponível em: https://goo.gl/SOEkIH (acesso em: 3 de janeiro de 2017) (tradução nossa).

8Disponível em: https://goo.gl/SmPsdl (acesso em: 3 de janeiro de 2017).

9Disponível em: https://goo.gl/IkPR5J (acesso em: 3 de janeiro de 2017).

10Idem.

11Scovazzi, Tullio e Citroni, Gabriella, The Struggle against Enforced Disappearance and the 2007 United Nations Convention, Leiden, Martinus Nijhoff Publishers, 2007, p. 252.

12As organizações não governamentais foram inicialmente excluídas das discussões e trabalhos preparatórios do projeto pelo grupo de trabalho criado. No entanto, posteriormente, por recomendação da Assembleia Geral da OEA, foram admitidas no processo de elaboração do projeto da convenção (Brody, Reed e González, Felipe, “Nunca más: An Analysis of International Instruments on «Disappearances»”, Human Rights Quaterly, vol. 19, n. 2, maio de 1997, p. 375).

13O novo projeto foi fortemente criticado por vários governos, incluindo Argentina, Canadá e Chile, por não fornecer uma proteção efetiva contra os desaparecimentos forçados e aceitar a “obediência devida” de ordens superiores como uma defesa para a responsabilidade criminal (Brody, Reed e González, Felipe, op. cit., p. 375). Tullio Scovazzi e Gabriella Citroni chamam a atenção para o fato de que durante as negociações no âmbito do grupo de trabalho criado, o projeto inicial perdeu alguns dos seus elementos mais protetivos (op. cit., p. 252).

14Conforme estabelecido pelo § 4o. da Resolução n. 1172 (XXII-0/92) da Assembleia Geral.

15Brody, Reed e González, Felipe, op. cit., p. 375.

16Disponível em: https://goo.gl/GTpPkx (acesso em: 3 de janeiro de 2017).

17Disponível em: https://goo.gl/TUHcm8 (acesso em: 4 de janeiro de 2017). Para uma visão detalhada do processo de ratificação e internalização da Convenção pelo Brasil, vide Oliveira, Marcus Vinícius Xavier, Tipificação do desaparecimento forçado de pessoas no direito brasileiro, Porto Alegre, Editora Fi, 2016, pp. 385-387.

18Disponível em: https://goo.gl/0HVFBF (acesso em: 4 de janeiro de 2017).

19Disponível em: http://www.cnv.gov.br/ (acesso em: 4 de janeiro de 2017).

20Brasil, Comissão Nacional da Verdade, Relatório final, Brasília, 2014, vol. 1, t. 1, p. 329, e vol. 2, pp. 197-256.

21Para uma visão abrangente da Guerrilha do Araguaia, vide livro-relatório intitulado Direito à memória e à verdade, fruto do trabalho da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, instituída pela Lei n. 9.140/95, que foi o primeiro ato oficial brasileiro de reconhecimento da morte de pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979 (Brasil, Secretaria Especial de Direitos Humanos, Direito à memória e à verdade, Brasília, 2007, pp. 195-270).

22Scovazzi, Tullio e Citroni, Gabriella, op. cit., p. 253.

23Ibidem, pp. 253 e 254 (tradução nossa).

24Lindo Rojas, Nubia Stella, “La desaparición forzada”, em Magallón Anaya, Mario e Mora Martínez, Roberto (coords.), Historia de las ideas: repensar la América Latina, México, UNAM, 2006, p. 43. Para alguns autores, o termo desaparecimento forçado constitui um “eufemismo” para descrever uma série de graves violações dos direitos humanos (Maogoto, Jackson N., “Now You See, Now You Don’t: The Duty of the State to Investigate and Prosecute «Disappearances and Extra Judicial Executions»”, Australian International Law Journal, n. 10, 2002, p. 182).

25O “Direito Internacional Penal engloba todas as normas que estabelecem, excluem ou de algum de modo regulam a responsabilidade por crimes no Direito Internacional. Crimes no Direito Internacional são quaisquer crimes que envolvam a responsabilidade individual direta no âmbito do Direito Internacional… Para que uma infração seja de Direito Internacional Penal é preciso que atenda a três condições: primeiro, deve implicar na [imputação] de reponsabilidade individual e ser objeto de penalização. Segundo, a norma deve pertencer ao Direito Internacional. Três, a infração deve ser punível independentemente de ter sido internalizada pelo direito nacional” (tradução nossa). Werle, Gerhard e Jessberger, Florian, Principles of International Criminal Law, 3a. ed., Oxford, Oxford University Press, 2014, pp. 31 e 32.

26Vide nesse sentido: Corte IDH, Caso Gudiel Álvarez e Outros (“Diário Militar”) v. Guatemala (Sentença de 20 de novembro de 2012, par. 193); Caso Miembros de la Aldea Chichupac y Comunidades Vecinas del Municipio de Rabinal v. Guatemala (Sentença de 30 de novembro de 2016, par. 133); Pérez Solla, María Fernanda, Enforced Disappearances in International Human Rights, Jefferson, McFarland Publishers, 2006, pp. 12-20; Bassiouni, M. Cherif, Crimes Against Humanity: Historical Evolution and Contemporary Application, Cambridge, Cambridge University Press, 2011, pp. 451 e 452.

27McCrory, Susan, “The International Convention for the Protection of All Persons from Enforced Disappearance”, Human Rights Law Review, n. 3, 2007, p. 551. Na obra citada, a autora aponta ainda outras distinções, principalmente entre o ERTPI e a CIPPTPCDF (ibidem, p. 552).

28Ibidem, p. 551; Gil Gil, Alicia, “Art. 7: Crimes Contra a Humanidade”, em Steiner, Sylvia Helena e Caldeira Brant, Leonardo Nemer, O Tribunal Penal Internacional: comentários ao Estatuto de Roma, Belo Horizonte, Del Rey, 2016, p. 168.

29Triffterer, Otto e Ambos, Kai, The Rome Statute of the International Criminal Court: A Commentary, 3a. ed., München, C. H. Beck-Hart-Nomos, 2016, p. 286.

30Idem; Ambos, Kai (coord.), Desaparición forzada de personas. Análisis comparado e internacional, cit., passim.

31Embora haja na legislação de diversos países uma distinção entre o crime continuado e o crime permanente, tal não ocorre nas Convenções, que utilizam as expressões “natureza contínua” e “continuado ou permanente”, para fazer referência a uma situação específica e muito clara, isto é, a um estado de prolongamento da violação ou delito do desaparecimento forçado, que não cessará enquanto não for conhecido o paradeiro das pessoas desaparecidas ou identificados os seus restos mortais.

32Corte IDH, Caso Velásquez Rodríguez v. Honduras (Sentença de 29 de julho de 1988, pars. 155-157); Gomes Lund e Outros (“Guerrilha do Araguaia”) v. Brasil (Sentença de 24 de novembro de 2010, pars. 101-104); Contreras e Otros v. El Salvador (Sentença de 31 de agosto de 2011, pars. 80-84); Gudiel Álvarez e Outros (“Diário Militar”) v. Guatemala (Sentença de 20 de novembro de 2012, par. 191); Osorio Rivera e Familiares v. Perú (Sentença de 26 de novembro de 2013, par. 113); Caso Miembros de la Aldea Chichupac y Comunidades Vecinas del Municipio de Rabinal v. Guatemala (Sentença de 30 de novembro de 2016, pars. 20 e 133-135).

33Corte EDH, Obadasi v. Turquia (1994); McDaid & others v. United Kingdom (1996); Jecius v. Lithuania (2000); Çakici v.Turquia (2000); Varnava e outros v.Turquia (2009); Beksultanova v. Rússia (2012). No caso Varnava e outros v. Turquia, a Corte destacou ser “importante notar que o reconhecimento internacional dos atos de desaparecimento forçado como uma ofensa contínua enquanto os perpetradores continuam a ocultar o destino e o paradeiro das pessoas desaparecidas tem o objetivo de dissuadir os Estados a realizarem tais práticas” (tradução nossa).

34Scovazzi, Tullio e Citroni, Gabriella, op. cit., p. 1; Vitkauskaite-Meurice, Dalia e Zilinskas, Justinas, “The Concept of Enforced Disappearances in International Law”, Jurisprudencija: Mokslo Darbai, n. 2, 2010, pp. 198-200.

35Para uma análise aprofundada sobre os direitos violados no contexto de um desaparecimento forçado, vide Pérez Solla, María Fernanda, op. cit., pp. 32-182; Claude, Ophella, “A Comparative Approach to Enforced Disappearances in the Inter-American Court of Human Rights and the European Court of Human Rights Jurisprudence”, Intercultural Human Rights Law Review, vol. 5, 2010, pp. 433-460. Vide também nesse mesmo sentido, decisão pioneira da Corte IDH no citado caso Velásquez Rodríguez v. Honduras (par. 155).

36Vide, v.g., Caso Velásquez Rodríguez v. Honduras (par. 155); Caso Chitay Nech e outros v. Guatemala (pars. 81-87); Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña v. Bolívia (par. 60); Caso Gomes Lund e outros v. Brasil (par. 103), dentre muitos outros.

37A CISDFP foi o primeiro instrumento jurídico vinculante no plano internacional a prever a prática do desaparecimento forçado como um crime contra a humanidade. Vide Ambos, Kai, Treatise on International Criminal Law, vol. II, cit., p. 109.

38Triffterer, Otto e Ambos, Kai, op. cit., p. 167.

39Gil Gil, Alicia, op. cit., p. 168.

40Triffterer, Otto e Ambos, Kai, op. cit., pp. 168 e 170. Assim se posiciona o Tribunal Penal Internacional: TPI, The Prosecution v. Germain Katanga and Mathieu Ngudjolo Chui, “Decision on the Confirmation of the Charges”, ICC-0l/04-0l/07-717, 30 de setembro de 2008, pars. 394 e 395;TPI, Decision Pursuant to Article 61(7)(a) and (b) of the Rome Statute on the Charges of the Prosecutor Against Jean-Pierre Bemba Gombo, 15 de junho de 2009, ICC-0l/05-01/08-424, par. 83.

41TPI, The Prosecution v. Germain Katanga and Mathieu Ngudjolo Chui, “Decision on the Confirmation of the Charges”, ICC-0l/04-0l/07-717, 30 de setembro de 2008, par. 397.

42Cassese, Antonio, Lineamenti di diritto internazionale penale, vol. I: Diritto sostanziale, Bologna, Società Editrice il Mulino, 2005, p. 79.

43TPI, The Prosecution v. Germain Katanga and Mathieu Ngudjolo Chui, “Decision on the Confirmation of the Charges”, ICC-0l/04-0l/07-717, 30 de setembro de 2008, par. 394 (tradução nossa).

44Mettraux, Guénaël, International Crimes and the Ad Hoc Tribunals, Oxford, Oxford University Press, 2005, pp. 156-161; Cassese, Antonio, op. cit., p. 79.

45Gil Gil, Alicia, op. cit., pp. 161-163.

46Para um estudo aprofundado sobre a definição e os elementos do tipo dos crimes contra a humanidade, conforme estabelecido pelo Estatuto do Tribunal Penal Internacional, vide Gil Gil, Alicia, op. cit., pp. 165-193; Triffterer, Otto e Ambos, Kai, op. cit., pp. 242-294.

47Cassese, Antonio, op. cit., pp. 79 e 80 (tradução nossa).

48Villiger, Mark Eugen, Commentary on the 1969 Vienna Convention on the Law of Treaties, Leiden, Martinus Nijhoff Publishers, 2009, p. 363.

49Ibidem, p. 365.

50Mark E. Villiger destaca que uma vez ratificado, o tratado deve ser aplicado por todos os órgãos do Estado pelos quais os direitos e obrigações nele previstos serão postos em prática. Ibidem, p. 366.

51Ibidem, p. 371.

52Conforme aponta Villiger, por direito doméstico deve-se entender não apenas a Constituição do Estado, mas também toda a sua legislação ordinária e estatutária. Ibidem, p. 372.

53Meneguetti Pereira, Luciano, “A importância do direito internacional no combate à corrupção no Brasil”, O Brasil e o direito internacional: temas contemporâneos, Birigui, Boreal, 2016, pp. 59-65.

54A jurisdição, entendida como o poder geral do governo de um país, de exercer autoridade sobre todas as pessoas e entidades dentro do seu território, está estreitamente relacionada com os princípios internacionais da soberania do Estado, da igualdade soberana e da independência dos Estados, em relação à não ingerência nos seus assuntos internos. Essa jurisdição abrange (i) o direito do Estado legislador de criar, emendar ou revogar sua legislação, ao que pode se chamar de competência prescritiva ou prescriptive jurisdiction (poderes legislativos); (ii) o direito do Estado de fazer cumprir esta legislação através, v.g., da polícia e do Ministério Público, investigando um crime e prendendo um suspeito, ao que pode se denominar jurisdição de execução ou enforcement jurisdiction (poderes executivos); e, por fim, (iii) a competência das cortes nacionais, juízes e outros órgãos ou pessoas que exercem funções judiciais, de ouvir, conhecer e decidir sobre questões que lhes são levadas, ao que pode se chamar de competência jurisdicional ou adjudicative jurisdiction (poderes judiciais).

55Oliveira, Marcus Vinícius Xavier, op. cit., pp. 227 e 228.

56Conforme analisado na Seção 3 supra.

57Em seu art. 9o., a Convenção afasta expressamente a possibilidade de os suspeitos dos atos constitutivos do delito do desaparecimento forçado serem julgados por jurisdições especiais, particularmente a militar.

58Conforme visto na Seção 4 supra, o desaparecimento forçado, não raras as vezes, culmina na violação de diversos bens juridicamente protegidos , notadamente por meio de torturas, mortes e ocultação de cadáveres. Nessa linha, a Corte IDH tem afirmado que o desaparecimento forçado é “configurado por uma pluralidade de comportamentos que, voltadas conjuntamente para um único propósito, violam de forma permanente, enquanto subsistir, distintos direitos protegidos” (Caso Gomes Lund e outros v. Brasil, pars. 101-111; Caso Miembros de la Aldea Chichupac y Comunidades Vecinas del Municipio de Rabinal v. Guatemala, par. 134).

59Haverá para o legislador o dever de considerar imprescritível o crime de desaparecimento forçado quando sua prática for generalizada ou sistemática, configurando assim crime contra a humanidade, nos termos estabelecidos pelas Convenções em análise e pelo Direito Internacional aplicável. Vide também art. 8o. da CIPPTPCDF e art. 7o. da CISDFP.

60O que importa na sua inserção no rol dos crimes hediondos, previsto pela Lei n. 8.072/90.

61No julgamento do caso Osorio Rivera y familiares v. Peru, a Corte IDH condenou o país a adequar seu Código Penal às disposições da CISDFP, notadamente no tocante à tipificação do delito (pars. 269-271).

62Disponível em: https://goo.gl/8bBzVU (acesso em: 4 de janeiro de 2017).

63Disponível em: https://goo.gl/YxozAM (acesso em: 4 de janeiro de 2017).

64Vide nota 39 supra.

65Corte IDH, Caso Gomes Lund e outros v. Brasil, par. 325, item 9.

66Disponível em: https://goo.gl/gjfL3y (acesso em: 5 de janeiro de 2017).

67Corte IDH, Caso Gomes Lund e outros v. Brasil, par. 126.

68Ibidem, par. 172.

69Ibidem, par. 174.

70Deve-se aqui ressaltar que a criação da CNV não foi uma determinação direta da Corte IDH no caso Gomes Lund e outros v. Brasil, embora a sentença prolatada nesse caso tenha exercido grande influência nos trabalhos da Comissão (Torelly, Marcelo, “Gomes Lund vs. Brasil cinco anos depois: histórico, impacto, evolução jurisprudencial e críticas”, em Piovesan, Flávia e Prado Soares, Inês Virgínia (coords.), Impacto das decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos na jurisprudência do STF, Salvador, JusPODIVM, 2016, pp. 553 e 554). Informações detalhadas sobre a CNV, sua criação, instituição, atividades desenvolvidas e relatórios elaborados podem ser encontradas em seu próprio sítio na internet. Disponível em: http://www.cnv.gov.br/ (acesso em: 5 de janeiro de 2017).

71Disponível em: https://goo.gl/ePyDky (acesso em: 5 de janeiro de 2017).

72Período anistiado nos termos do art. 8o. do ADCT da CRFB.

73Disponível em: https://goo.gl/fy5TkM (acesso em: 5 de janeiro de 2017).

74Brasil, Comissão Nacional da Verdade, Parcerias, disponível em: https://goo.gl/8gDMPT (acesso em: 5 de janeiro de 2017).

75Após a decisão da Corte IDH no caso Gomes Lund e outros v. Brasil, a Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal estabeleceu um Grupo de Trabalho sobre justiça de transição, com a finalidade de dar cumprimento a sentença internacional, bem como oficializou uma posição favorável à persecução penal das graves violações contra os direitos humanos cometidas pelo regime militar. Vide “Crimes da Ditadura Militar”. Relatório sobre as atividades de persecução penal desenvolvidas pelo MPF em matéria de graves violações a DH cometidas por agentes do Estado durante o regime de exceção, disponível em: https://goo.gl/sfFRHb (acesso em: 26 de agosto de 2017).

76Vários Estados federados brasileiros também instauraram Comissões da Verdade com o fim de investigar as graves violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura brasileira, dentre elas, os casos de desaparecimento forçado de pessoas. A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” desempenhou um importante papel na investigação de torturas, mortes e desaparecimentos forçados. Informações detalhadas sobre sua atividade podem ser encontradas em seu sítio na internet. Disponível em: https://goo.gl/uZ5rVo (acesso em: 5 de janeiro de 2017).

77Meyer, Emilio Peluso Neder, “Judicialização da justiça de transição: impactos a partir e sobre o constitucionalismo contemporâneo”, em Piovesan, Flávia e Prado Soares, Inês Virgínia (coords.), Impacto das decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos na jurisprudência do STF, Salvador, JusPODIVM, 2016, pp. 124 e 125.

78Shaw, Malcolm N., Direito internacional, São Paulo, Martins Fontes, 2010, p. 488.

79Sobre o princípio da jurisdição universal vide: Crawford, James, Brownlie’s Principles of Public International Law, Oxford, Oxford University Press, 2012, pp. 467-471; Brichambaut, Marc Perrin de et al., Leçons de droit international public, 2a. ed., Paris, Dalloz, 2011, pp. 74-77.

80Anderson, Kirsten, “How Effective is the International Convention for the Protection of All Persons from Enforced Disappearance Likely to Be in Holding Individuals Criminally Responsible for Acts of Enforced Disappearance?”, Melbourne Journal of International Law, vol. 7, n. 2, 2006.

81Para um estudo mais aprofundado sobre a cooperação internacional vide: Meneguetti Pereira, Luciano, “A cooperação jurídica internacional no Novo Código de Processo Civil”, Revista CEJ, Brasília, ano XIX, n. 67, setembro-dezembro de 2015, pp. 20-24.

82O art. 5o. da CISDFP prevê um regime próprio sobre a extradição, enquanto mecanismo de cooperação internacional em matéria de desaparecimento forçado.

83Vide, v.g., Caso Gomes Lund e outros v. Brasil, pars. 281 -283; Caso Osorio Rivera e Familiares v. Perú, pars. 272-274; Caso Miembros de la Aldea Chichupac y Comunidades Vecinas del Municipio de Rabinal v. Guatemala, pars. 310-313.

Recebido: 05 de Janeiro de 2017; Aceito: 25 de Setembro de 2017

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