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Cuestiones constitucionales

versión impresa ISSN 1405-9193

Cuest. Const.  no.43 Ciudad de México jul./dic. 2020  Epub 13-Dic-2021

https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2020.43.15192 

Comentarios jurisprudenciales

Caso Marielle Franco - Tensão entre o segredo de justiça e a liberdade de imprensa (proposta de distensionamento entre os princípios constitucionais)

Marielle Franco Case - Tension between the secret of justice and press freedom (proposal for socio-legal dialogue between constitutional principles)

*Professor do Curso de Mestrado e Doutorado da Universidade de Marília - UNIMAR. Brasil. Correo electrónico: artur.souza@trf4.jus.br.


Resumo

A morte da vereadora brasileira do PSOL (Partido Solicialista e Liberdade), Marielle Franco, e de seu motorista, Anderson Gomes, ocorrida em 14 de março de 2018, no Rio de Janeiro, Brasil, ganhou repercussão nacional e internacional, em especial pelas dúvidas existentes quanto à legitimidade do procedimento investigatório realizado pela polícia brasileira. Há suspeita de que o assassinato foi encomendado por inimigos políticos à milícia do Rio de Janeiro, gerando graves danos aos direitos humanos e ao sistema democrático brasileiro. A partir deste caso, pretende-se analisar a proibição de divulgação dos elementos probatórios inseridos no inquérito policial em razão do segredo de justiça decretado pelo magistrado brasileiro que conduz o procedimento criminal, ensejando certa tensão entre os princípios da liberdade de imprensa e do devido processo legal. Ao final, resguardando-se a higidez e a eficácia de ambos os princípios, apresenta-se (sub censura) uma possível solução sócio-jurídica na qual a essência de um dos princípios não seja subjugada pelo outro. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que não se apóia qualquer censura prévia aos meios de comunicação, sustenta-se que a divulgação de conteúdo probatório resguardado pelo segredo de justiça (devido processo legal) pode caracterizar a inutilidade da prova. Para tanto, vale-se de uma metodologia indutiva e de uma revisão bibliográfica de direito comparado como forma de se dar sustentação aos fundamentos apresentados para a solução da questão.

Palavras chave: Marielle Franco; liberdade de imprensa; devido processo legal; prova; inutilidade

Abstract

The death of Brazilian PSOL Councilwoman Marielle Franco and her driver Anderson Gomes on March 14, 2018 in Rio de Janeiro, Brazil, has gained national and international repercussions, especially because of doubts. legitimacy of the investigative procedure carried out by the Brazilian police. It is suspected that the murder was commissioned by political enemies from the Rio de Janeiro militia, causing serious damage to human rights and the Brazilian democratic system. From this case, it is intended to analyze the prohibition of disclosure of the evidential elements inserted in the police investigation due to the secret of justice decreed by the Brazilian magistrate that conducts the criminal proceeding, causing some tension between the principles of freedom of the press and due process. cool. Finally, safeguarding the health and effectiveness of both principles, we present (sub-censorship) a possible socio-legal solution in which the essence of one of the principles is not subjugated by the other. In this sense, while not supporting any prior censorship of the media, it is argued that the disclosure of probative content protected by the secrecy of justice (due legal process) may characterize the uselessness of the evidence. To this end, it uses an inductive methodology and a bibliographic review of comparative law as a way to support the foundations presented for the solution of the question.

Keywords: Marielle Franco; freedom of the press; due process of law; proof; uselessness

Somário: I. Introdução. II. Caso Marielle Franco - tensão entre liberdade de imprensa e o devido processo legal. III. As narrativas favoráveis à liberdade de imprensa. IV. Narrativas favoráveis ao devido processo legal e ao segredo de justiça. V. Da liberdade de imprensa e do devido processo legal - tese para a distensão do conflito com base no resguardo da essência eficacial de cada um dos princípios. VI. Uma proposta de solução mediante a manutenção simultânea da eficácia normativa dos princípios de liberdade de imprensa e de um processo público com todas as garantias. VII. Conclusão. VIII. Bibliografia.

I. Introdução

O assassinato da Vereadora Marielle Franco, juntamente com o seu motorista, Anderson Gomes, ocorrido no Rio de Janeiro, em 14 de março de 2018, comoveu o Brasil e outras nações internacionais, tanto pelo ataque brutal aos direitos humanos, quanto pelo risco imposto à democracia brasileira.

O assassinato ocorreu em um bairro do Rio de Janeiro, quando o veículo da vereadora, conduzido por seu motorista, Anderson Gomes, que também veio a falecer no local, foi literalmente alvejado por diversos tiros de fuzil, ensejando um verdadeiro fuzilamento da vereadora e do seu motorista, num dos mais belos cartões postais brasileiros.

A repercussão da morte da vereadora foi imediata.

Na América Latina, o portal e os noticiários do canal multiestatal teleSUR reforçam que Marielle foi “uma das vozes mais combatentes contra a ocupação militar das favelas do Rio de Janeiro” e que sua morte “comoveu a nação sul-americana por seu inesperado assassinato”. Outros meios alternativos latino-americanos, como oNodal, os argentinos Notas Periodismo Popular, Marcha Noticias e Resumen Latinoamericano, o colombiano Colombia Informa e o uruguaio La Diaria repercutiram com destaque em suas páginas principais. Jornais estrangeiros de diversos matizes políticas também noticiaram o caso. O espanhol El País trouxe no título: “Comoção no Brasil pelo assassinato de Marielle Franco, vereadora e ativista do Rio”; e o, também espanhol, El Confidencial estampa: “Jovem, negra e feminista: Marielle Franco, a vereadora assassinada no Rio de Janeiro”. Já o inglêsThe Guardiannoticiou “Marielle Franco, vereadora e crítica da polícia, morta a tiros em crime encomendado no Rio”; e aBBC, do mesmo país, traz que: “Vereadora do Rio, Franco, morre em tiroteio”. New York Times e Washington Post, dos Estados Unidos, reproduziram nota da Associated Press que, além do texto noticiando o assassinato de Marielle, ilustram com foto da comoção e tristeza daqueles que foram até o local do crime, na noite dessa quarta-feira (15). Na Itália, oRaiNewsapresentou no título: “Ela lutou contra a violência policial nas Favelas: assassinada a ativista do Rio Marielle Franco”. O francês Le Figaro e Le Parisien também trouxeram o assassinato da vereadora socialista em seus sites. 1

As repercussões políticas e sociais da morte da vereadora Marielle Franco ensejam diversas análises institucionais e acadêmicas.

Porém, especificamente à problematização deste trabalho, procedeu-se a um corte epistemológico, restringindo-se o objeto de análise a uma questão sócio-jurídica de extrema importância constitucional.

Pretende-se neste trabalho verificar a proibição de divulgação dos elementos probatórios inseridos no inquérito policial em razão do segredo de justiça decretado pelo magistrado brasileiro que conduz o procedimento criminal, ensejando certa tensão entre os princípios da liberdade de imprensa e do devido processo legal.

Não obstante o subtítulo deste trabalho fale em tensão (razão pela qual pode ser superada), tensão não tem o mesmo significado de conflitos ou atropelamento; assim mesmo, não obstante a tensão, é possível sustentar a manutenção da essência de cada princípios, sem que haja uma submissão de um em relação a outro.

E por que é necessária essa harmonia e compatibilidade? Justamente pelo fato de que os direitos fundamentais (liberdade de imprensa e devido processo legal) têm por finalidade proteger e fazer efetiva a dignidade da pessoa humana. Por isso, entre eles não pode existir nenhum enfrentamento, nem conflito, sem harmonia e compatibilidade.2

Ao final, resguardando-se a higidez e a eficácia de ambos os princípios, apresenta-se (sub censura) uma possível solução (tese) sócio-jurídica na qual a essência de um dos princípios não seja subjugada pelo outro. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que não se apoia qualquer censura prévia aos meios de comunicação, sustenta-se que a divulgação de conteúdo probatório resguardado pelo segredo de justiça (devido processo legal) pode caracterizar a inutilidade da prova.

II. Caso Marielle Franco - tensão entre liberdade de imprensa e o devido processo legal

Como se afirmou, pretende-se analisar a tensão sócio-jurídica constitucional existente no caso Marielle Franco entre a liberdade de imprensa e o devido processo legal (segredo de justiça dos elementos probatórios)

Em determinado momento do caso Marielle Franco, tornou-se evidente a tensão existente entre a liberdade de imprensa e o devido processo legal.

A tensão entre a liberdade de imprensa e o devido processo legal surge a partir do momento em que o magistrado da Quarta Vara Criminal do Rio de Janeiro (juiz encarregado de conduzir o procedimento criminal da vereadora Marielle Franco) deferiu pedido da Divisão de Homicídios da Polícia Civil e do Ministério Público para que uma das maiores emissoras de televisão brasileira, Rede Globo de Televisão, fosse proibida de divulgar o conteúdo probatório de qualquer parte do inquérito policial que apura os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, sob o argumento de que o vazamento do conteúdo dos autos seria prejudicial às investigações, bem como exporia a danos pessoas e testemunhas envolvidas com o caso.

A decisão proferida pelo Juízo da Quarta Vara Criminal do Rio de Janeiro proíbe a emissora de televisão, Rede Globo, de divulgar termos de declarações, mesmo sem a identificação das testemunhas, assim como dados técnicos e procedimentos sigilosos usados na investigação, conteúdos de gravações de áudios de pessoas investigadas ou não; conteúdos telemáticos, ou seja, de áudios e mensagens extraídos de contas de e-mails e telefones das vítimas, testemunhas e investigados, e, ainda, qualquer outro conteúdo do inquérito.

A Rede Globo de Televisão noticiou que iria cumprir a determinação judicial, porém, por considerar excessiva, iria recorrer da decisão, sob o argumento de que a restrição imposta pela justiça feriria gravemente a liberdade de imprensa e o direito de o público se informar, em especial quando o crime investigado é de alto interesse público no Brasil e no estrangeiro.

Não há dúvida de que a tensão entre princípios Constitucionais ficou perfeitamente evidenciada quando o magistrado proíbe de forma peremptória a divulgação de elementos do inquérito policial pela imprensa brasileira, subjugando a liberdade de imprensa em prol do segredo de justiça.

Diante dessa tensão entre princípios Constitucionais, liberdade de imprensa e sigilo de dados inseridos em procedimento de inquérito ou em processo jurisdicional, pretende-se, neste trabalho, avaliar se a decisão proferida pelo juízo da Quarta Vara Criminal do Rio de Janeiro respeito ou não a essência do princípio da liberdade de imprensa e do devido processo legal, e se haveria outra solução possível e plausível para compatibilizar os princípios Constitucionais tensionados no caso Marielle Franco.

III. As narrativas favoráveis à liberdade de imprensa

A imprensa constitui um fenômeno social próprio do mundo moderno, sem precedentes diretos históricos muito mais antigos, tendo em vista que é um fenômeno que depende das condições sociais do mundo moderno.3

A primeira obra clássica em defesa da liberdade de expressão e, por consequência, de imprensa, foi Aeropagítica, escrita por John Milton, em 1664. Trata-se de um escrito dirigido ao Parlamento inglês contra a Ordem de 14 de junho de 1643, que, entre outras questões, instaurou a censura prévia, proibindo-se a importação de livros estrangeiros sem autorização, bem como exigiu prévia permissão para a impressão das obras. John Milton levou em consideração que o ser humano é um ser livre e racional, razão pela qual a liberdade de expressão seria um instrumento para conseguir a verdade. Segundo Milton, a verdade somente poderia ser alcançada a partir do livre contraste de ideias ou aportações com respeito ao contraditório. A ausência de censura na divulgação das ideias e dos fatos seria a garantia de que a verdade é fruto da dialética e não das opiniões que se consideram verdadeiras ‘a priori’ por quem se crê infalível.4

Spinoza, já no século XVII, preconizava no capítulo XX do Tratado teológico político: “Observa-se que num Estado livre é lícito a cada um, não somente pensar o que queira, senão dizer aquilo que pensa”.5

A liberdade de imprensa, portanto, modernamente, pode ser reconhecida como um dos pilares de sustentação do Estado democrático de direito.

Segundo James Curran, analisando o processo democrático na Inglaterra, podem-se apontar cinco narrativas favoráveis aos meios de comunicação em massa, a saber: Na história liberal, o sucesso da liberdade dos meios de comunicação dotou de poderes ao povo. Na história populista, o povo exigiu e obteve o entretenimento que buscava nos meios de comunicação. Na história feminista, os meios de comunicação responderam à crescente libertação da mulher. Nas explicações libertárias e antropológicas, os meios de comunicação chegam a proporcionar uma maior tolerância social e a representar a nação de uma forma mais inclusiva. 6

O respeito à independência dos meios de comunicação em massa e o reconhecimento do direito fundamental de liberdade de imprensa, expressos no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, são elementos essenciais para a transparência e o respeito à lei. Esses princípios são de igual importância em países ricos e pobres, em tempos de guerra e de paz.7

Na realidade, e tal como enfatizou a Declaração de Chapultepec,8 uma imprensa livre é condição fundamental para que as sociedades resolvam seus conflitos, promovam o bem estar e protejam sua liberdade.

A narrativa liberal nos oferece uma visão coerente dos distintos modos pelos quais os meios de comunicação, cada vez mais livre, fortaleceram e fortalecem o processo democrático.

A liberdade de imprensa, por ser um dos pilares da democracia, é reconhecida na jurisprudência de distintos países. Entre as liberdades que a Constituição consagra, “a da imprensa é uma das que possui maior importância, em último caso pode-se dizer que sem sua devida proteção existiria tão somente uma democracia em declínio ou puramente nominal...”. (Corte Suprema Argentina, caso ‘Abal c/ Diário La Prensa’, Fallo 248:291, cons. 25)”).9

Sobre a importância da liberdade de imprensa e, por sua vez, da liberdade de expressão, pronunciou-se o Tribunal Constitucional espanhol na Sentença, 6/81, no sentido de que o artigo 20 da Constituição espanhola, em seus distintos incisos, garante a manutenção de uma comunicação pública livre, sem a qual ficariam viciados de conteúdo real outros direitos que a Constituição consagra, reduzidas a formas vazias as instituições representativas e absolutamente falseado o princípio da legitimidade democrática que enuncia o artigo 1.2 da Constituição espanhola, e que é a base de toda a ordenação jurídica-política... A liberdade de expressão que proclama o artigo 20.1. a) é um direito fundamental de que gozam por igual todos os cidadãos e que lhes protege frente a qualquer ingerência dos poderes públicos que não estejam apoiados na Lei, e inclusive frente à própria Lei quando esta tente fixar outros limites além daqueles que a própria Constituição (arts. 20.4 e 53.2) admite. Outro tanto cabe afirmar em relação ao direito de comunicar e receber informação verdadeira (art. 20.1, d.), fórmula que, como é óbvio, inclui dois direitos distintos, porém intimamente conectados. O direito a comunicar que, em certo sentido, pode considerar-se como uma simples aplicação concreta da liberdade de expressão e cuja explicitação diferenciada somente se encontra em textos constitucionais recentes, é direito de que gozam também, sem dúvida, todos os cidadãos, ainda que na prática sirva, sobretudo, de salvaguarda a quem faz da busca e difusão da informação sua profissão específica; o direito a receber é, a rigor, uma redundância (não há comunicação quando a mensagem não tem receptor possível), cuja inclusão no texto constitucional justifica-se, contudo, pelo propósito de ampliar ao máximo o conjunto dos legitimados para impugnar qualquer perturbação da livre comunicação social.

Não se pode desconhecer, conforme afirmou o ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro, Celso de Melo, que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, entre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar.10

Ainda que muitas vezes a informação apresentada pelos meios de comunicação, e, acima de tudo, pelos singulares órgãos de comunicação em massa seja em parte unilateral e possivelmente distorcida, a liberdade dos meios de comunicação é um valor socialmente muito elevado e que representa uma importante característica da democracia moderna.11

Segundo H. Kury, a liberdade de imprensa está efetivamente reconhecida entre os direitos humanos, sendo que “in Germania è fissata nella Costituzione (Grundgesetz), nell’art. 5 co. 1, a livello europeo nell’art. 10 della Convenzione Europea sui Diritti dell’Uomo, cosí come nell’art. 11 della Carta Europea dei diritti Fondamentali”.12

O direito à liberdade de expressão e, por consequência, de imprensa, é fruto da interpretação formulada ao artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que diz:

La libertad de expresión es una piedra angular en la existencia misma de una sociedad democrática. Es indispensable para la formación de la opinión pública... Es, en fin, condición para que la comunidad, a la hora de ejercer sus opciones, esté suficientemente informada. Por fin, es posible afirmar que una sociedad que no esté bien informada, no es plenamente libre.13

A Convenção Europeia de Direitos Humanos, em seu artigo 10, ns. 1 e 2, garante a liberdade de expressão nos seguintes termos:

1. Toda persona tiene derecho a la libertad de expresión. Este derecho comprende la libertad de opinión y la libertad de recibir o comunicar informaciones o ideas sin que pueda haber inferencia de autoridades públicas y sin consideración de fronteras. El presente artículo no impide que los estados sometan las empresas de radiodifusión, de cinematografía o de televisión a una autorización previa. 2. El ejercicio de estas libertades, que entrañan deberes y responsabilidades, podrá ser sometido a ciertas formalidades, concesiones, restricciones o sanciones, previstas por la ley, que constituyan medidas necesarias en una sociedad democrática, para la seguridad nacional, la integridad territorial o la seguridad pública, la defensa del orden y la prevención del delito, la protección de la salud o de la moral, la protección de la reputación de los derechos ajenos, para impedir la divulgación de informaciones confidenciales o para garantizar la autoridad y la imparcialidad del poder judicial.14

A publicidade, nas palavras de Ferrajoli, é a “alma da justiça”, não só porque é a mais eficaz garantia dos testemunhos, mas principalmente porque favorece a “probidade” dos juízes, servindo como freio a um poder que se torna facilmente alvo de abusos, além de assegurar a confiança do público em seus juízes.15

Em “Chandler vs. Florida” (449 US 560 (1981)), ressalta-se o voto proferido pelo juiz Burger da Suprema Corte americana, relator da decisão da maioria. Nesta decisão, observou-se que não obstante exista certo perigo ao imputado a eventual cobertura jornalística, esse perigo não justifica uma proibição genérica da cobertura televisiva dos julgamentos penais. Salientou-se, também, que a cobertura dos meios de comunicação não interfere com os procedimentos judiciais.16

Na realidade, ao se censurar os meios de comunicação de massa, de certa forma está também limitando a própria liberdade da opinião pública.

Diante dessas considerações, as narrativas favoráveis à liberdade de imprensa deve prevalecer como fundamento para refutar qualquer controle do Poder Judiciário concernente à censura prévia do conteúdo informativo obtido pelos meios de comunicação em massa.

É bem verdade que na sociedade moderna a crítica política realiza-se por meio maciço da comunicação, constituindo-se, muitas vezes, verdadeiras empresas multinacionais que escondem, por detrás de uma máscara que postula a liberdade de imprensa, interesses mesquinhos e totalmente dissociados dos interesses do povo. Mas, mesmo diante desse aspecto, a experiência tem demonstrado que, em muitos casos, deve-se permitir a crítica, ainda que ela esconda interesses escusos, uma vez que assim, pelo menos, há uma mínima possibilidade de controle por parte da opinião pública (no caso: “...Observer and Guardian vs. UK (1991), la Corte Europea de Derechos Humanos consideró precisamente que el papel de la prensa era de controlador público)”. 17

É importante reconhecer que a liberdade de imprensa, qualificada por sua natureza essencialmente constitucional, assegura aos profissionais de comunicação social, inclusive aos que praticam o jornalismo digital, o direito de buscar, de receber e de transmitir informações e ideias por quaisquer meios, ressalvada, no entanto, a possibilidade de intervenção judicial -necessariamente “a posteriori”- nos casos em que se registrar prática abusiva dessa prerrogativa de ordem jurídica, resguardado, sempre, o sigilo da fonte quando, a critério do próprio jornalista (e deste, apenas), ele assim o julgar necessário ao seu exercício profissional.18

IV. Narrativas favoráveis ao devido proceso legal e ao segredo de justiça

O magistrado da Quarta Vara Criminal do Rio de Janeiro (juiz encarregado de conduzir o procedimento criminal da vereadora Marielle Franco) ao deferir pedido da Divisão de Homicídios da Polícia Civil e do Ministério Público para que uma das maiores emissoras de televisão brasileira, Rede Globo de Televisão, fosse proibida de divulgar o conteúdo probatório de qualquer parte do inquérito policial que apura os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, sob o argumento de que o vazamento do conteúdo dos autos seria prejudicial às investigações, bem como exporia a danos pessoas e testemunhas envolvidas com o caso, fez uma opção principiológica, dando prevalência ao princípio do devido processo legal, em razão do segredo de justiça decretado no procedimento investigatório.

A divulgação dos elementos probatórios, muitos deles que poderiam envolver a intimidade ou alguns direitos fundamentais do acusado, poderia de alguma forma comprometer o devido processo legal e o princípio da inocência.

O sacrifício do princípio da liberdade de imprensa, mediante censura prévia, na ótica do juiz do magistrado singular, teve por motivação o resguardo de um processo público com todas as suas garantias.19

A Corte Constitucional italiana, quando chamada a se manifestar sobre a constitucionalidade do artigo 164, inc. I, do Código de Processo Penal de 1930, em confronto com o artigo 21 da Constituição italiana, realçou que a proibição de divulgação dos atos instrutórios asseguraria a serenidade e independência do juiz, protegendo-o de toda e qualquer influência que possa ter a imprensa na investigação, bem como na valoração do resultado, evitando, também, alguns comportamentos estranhos que possam obstaculizar a formação do livre convencimento. É oportuno observar, contudo, que a decisão do tribunal italiano visou, principalmente, ao direito de crítica e não especificamente ao direito de crônica judiciária, uma vez que o problema não é aquele de evitar ou não à imprensa e aos outros meios de difusão do pensamento a divulgação correta e fiel daquilo que no processo foi dito ou feito, mas, sim, aquele de evitar a interferência de um processo jornalístico no processo penal ainda em curso.20

Porém, há outros fatores de natureza sociológica que justifica a decisão proferida pelo magistrado singular, restringindo a liberdade de imprensa em prol do devido processo legal, e que diz respeito ao papel mais significativo dos serviços midiáticos sobre o crime, papel esse que deriva do fato de pertencerem os meios de comunicação em massa ao sistema de ‘controle social’, reproduzindo e representando a ordem social.

Apesar das narrativas favoráveis aos mass media, James Curran afirma que existe uma narrativa contraposta que dificulta o caminho para uma tentadora síntese liberal positiva em favor dos meios de comunicação em massa, isto é: “a história radical dos meios de comunicação. Esta nos conta uma história bem diferente, na medida em que o desenvolvimento dos meios de comunicação trouxe mais trevas que luz”.21

Os modernos meios de comunicação sucumbiram à influência das relações públicas, à publicidade e às grandes empresas. Enquanto que no século XVIII a imprensa facilitava a participação racional num debate público, os novos meios de comunicação em massa propiciaram a apatia do consumidor, apresentando a política como um espetáculo, e oferecendo um pensamento de mera conveniência.

Ocorreu, ainda, segundo James Curran, a incorporação dos meios de comunicação de massa pelas elites, como consequência da alteração da produção periodística artesanal para a produção industrial dos meios de comunicação, aumentando com isso a dependência da publicidade e o desenvolvimento do oligopólio.22

Há, ainda, o mecanismo moderno de controle social realizado pelos dos meios de comunicação em massa, representado pelo etiquetamento das pessoas que possivelmente praticaram ou poderiam praticar uma infração penal, reforça a necessidade da opinião pública em apoiar medidas que servem de instrumentalização e de concretização das políticas desenvolvidas pelo denominado direito penal do inimigo.

Esse etiquetamento midiático é resultado da nova criminologia preconizada pela modernidade tardia, que, nas palavras de David Garland, comercializa com imagens, arquétipos e ansiedades, em lugar de estar fundada em uma análise meticulosa e nos descobrimentos da investigação científica. Ao intentar deliberadamente fazer eco das preocupações públicas e dos preconceitos dos meios massivos de comunicação e sua concentração em ameaças mais inquietantes, esta criminologia, com efeito, resulta ser um discurso político do inconsciente coletivo, ainda quando, em linhas gerais, proclama ser realista e ‘de sentido comum’ frente às ‘teorias acadêmicas’... Com esta imagem, os indivíduos delinqüentes passam a ser visualizados como ‘delinqüentes de carreira’, ‘dependentes das drogas’, ‘jóvens rudes e agressivos’ e ‘violentos’ com poucas possibilidades de se redimirem e escasso valor social. Alguns, particularmente os pedófilos, os ‘predadores sexuais’ e os jóvens ‘superpredadores’ - são evocados de uma maneira em que aparecem como escassamente humanos, sendo essencializada a sua conduta ‘malvada’ ou ‘ignominiosa’ mais além de toda compreensão humana. Comunidades inteiras são anatematizadas; fala-se de uma ‘subclasse’ que nada merece, encerrada em uma cultura e num modo de vida que são tão estranhos como ameaçadores. Estas não são pessoas reais, muito menos categorias criminológicas. São figuras imaginárias que operam como símbolos em um processo político que explora o que Mary Douglas chamou de ‘os usos políticos do perigo’. Os perigos, ao que se percebe, são colocados e inseridos, as ansiedades que geram, a sensação de desamparo que produzem; tudo isso funciona reforçando a necessidade de imposição da ordem e a importância de uma resposta estatal firme. Tampouco são essas figuras representativas dos reais perigos que o delito indubitavelmente pode implicar, já que seu inventário de perigo se concentra quase exclusivamente no delito de rua, esquecendo-se dos sérios danos que produzem as organizações criminosas, os delinqüentes de colarinho branco ou, inclusive, os condutores de automóveis embriagados. Cada figura, alternadamente, é selecionada por sua utilidade como inimigo ‘conveniente’, uma utilidade não somente para a justiça penal estatal em sua forma soberana, senão também para uma política social conservadora que acentua a necessidade da autoridade, dos valores familiares e da ressurreição da moralidade tradicional. 23

O etiquetamento negativo massificado pelos meios de comunicação em massa possibilita a construção daquilo que atualmente os penalistas reconhecem como o “diritto penale del nemico” em contraposição ao “diritto penale dell’amico”. Ao lado dessa perspectiva teórica, mais recentemente já se fala do “nemico del diritto penale”.

Contudo, diante de uma sociedade dita democrática e civilizada não deveria haver nem “nemici”, nem “amici”, “ma soltanto ‘innocenti’ e ‘colpevoli’, secondo un diritto penale e un processo ‘giusti’.24

Em face desse etiquetamento midiático, há uma preocupação dos meios de comunicação em massa não tanto com o fato penal em si e sua correspondência - verdade ou falsidade, e muito menos com a aplicação dos princípios da culpabilidade e presunção de inocência, mas com o imediato etiquetamento do suposto autor do crime, descrevendo-o como sendo uma ameaça constante à ordem sistêmica social e econômica, e sugerindo uma imediata atuação do Poder Judiciário no sentido de segregá-lo do meio social como forma de prevenção geral e especial, pouco importando se futuramente possa chegar-se à conclusão de que se tratava de um inocente.

O que se pretende com a informação midiática massificada pelo fato delituoso por meio dos meios de comunicação em massa é concretizar a teoria funcionalista-consequencial da decisão judicial e promover a eficácia do direito penal do inimigo aplicando uma sanção exemplar, exigindo-se de plano e imediatamente segregação e neutralização do acusado, sem qualquer preocupação com as instâncias dialógico-reeducativas.25 Não havendo uma imediata resposta do órgão jurisdicional nesse sentido, desencadeia-se no âmbito da opinião pública um sentimento de frustração e de perplexidade, a ponto de por em dúvida a própria legitimidade do Poder Judiciário.

Como bem afirmou Vega Ruiz:

En ese sentido, la reiteración de noticias sobre sucesos judiciales importantes, de múltiples formas, supone una lícita y encomiable actividad profesional. El juicio paralelo, por motivos políticos, económicos, sociales o demagógicos, supone un acoso a la labor judicial (recordar el caso ‘Nani’ o el ‘juicio de Alcaser’). El juicio paralelo implica una presión manifiesta sobre los jueces porque dia a dia analiza las pruebas, critica las declaraciones testifícales o los dictámenes periciales. El juicio paralelo trata de suplantar al juez opinando caprichosa, imprudente y alegremente de todo cuanto al juicio real se refiere. El daño es evidente porque aún cuando no influya sobre la decisión de los jueces (al menos no debe influir), sí proyecta un mensaje sobre la sociedad, cuya opinión manipula ostensiblemente. El juez que se sienta presionado debe, si no abandonar la función judicial sí al menos denunciar ante el Consejo General del Poder Judicial tal evento. Mas independientemente de ello, se prejudica la credibilidad en la Justicia si el fallo de los jueces non coincide con el fallo que el juicio paralelo defiende, ampara y protege. Esto es lamentable, ciertamente.26

Para Cristina de Maglie, a prova do sucesso da justiça penal está na modificação e na construção de condições sociais que reconheçam o Eu possível, e não na conquista e na eliminação do ‘outro Eu’.27

Sob o aspecto processual, a massificação dos fatos delituosos e o etiquetamento do acusado previamente estabelecido estimulam, mesmo que de forma subliminar, “certe distorzione in materia di perquisizioni, sequestri, confische, intercettazioni, misure cautelari personali, di garanzie probatorie, in accelerazini dei tempi processuali, in meccanismi di pressione-compensazione verso forme di collaborazione”, em outras palavras, legitimam os meios de combate e de eliminação do suposto inimigo.28

A hiper-efetividade que caracteriza a custódia cautelar, considerada pela doutrina italiana um verdadeiro risco penal, é decorrente dessa influência dos meios de comunicação em massa, e é acompanhada pelo aplauso social que legitima a antecipação do meio processual de fins punitivo.29

Aquelas pessoas cujo fato delituoso não foi objeto de exposição massificada pelos meios de comunicação em massa encontram-se inseridas no denominado “diritto penale del cittadino”, que corresponde ao direito penal normal. Trata-se de um direito penal voltado ao delinqüente “normale”, e que reserva a ele todos os direitos ou “status” de cidadão, não havendo qualquer oposição à sua reintegração no pacto social.30

Já a pessoa cujo fato delituoso é massificadamente exposto pelos meios de comunicação em massa passa a ser etiquetada como “non persona”, porque se coloca fora e contra o ordenamento jurídico-social, passando a ser considerada uma constante ameaça ao pacto social. A partir deste momento, assim como na guerra, não haverá mais um diálogo com o inimigo, mas se propugnará por uma efetiva neutralização de sua pessoa. A imprensa propõe um direito penal que olha para o futuro: ´per neutralizzare la pericolosità del nemico”.31

Os autores de infração penal (inimigos sociais) são tratados pelos meios de comunicação numa perspectiva maniqueísta, orientada pelo paradigma dicotômico (bom-mau) - (nós e eles). O criminoso seria etiquetado, por assim dizer, como um sujeito antropologicamente indecifrável, movido por um instinto anti-social obscuro e profundo. Sobretudo, a transmissão midiática deixa como mensagem a ilusão de que o autor da infração penal não pode ser recuperado socialmente, mas pode e deve ser apenas combatido e encarcerado.32

A mídia, por meio desse processo de etiquetamento, concede aos autores dos crimes contra a pessoa, por exemplo, um tratamento muito deformante, no intuito de os caracterizar como uma figura desumana, para que as pessoas que compõem o círculo social também os vejam desta forma. O paradoxo é que os meios de comunicação valem-se dos casos extremos, os quais não representam de fato o tipo normal de tal criminalidade, mas como tais são propostos pela mídia. Jovens que matam por desvio de comportamento ou por ódio em situações especiais, muitas vezes são inseridos como caso normal de criminalidade.33

O magistrado singular, ao sacrificar o princípio da liberdade de imprensa, resguardou o devido processo legal, mantendo os elementos probatórios em segredo de justiça, tanto para resguardar a eficácia das investigações, como para dar maior significado ao princípio da presunção de inocência, impedindo dessa forma um possível etiquetamento e, conseqüente, um julgamento paralelo por parte dos meios de comunicação de massa.

V. Da liberdade de imprensa e do devido proceso legal - tese para a distensão do conflito com base no resguardo da essência eficacial de cada um dos princípios

O magistrado da Quarta Vara Criminal do Rio de Janeiro (juiz encarregado de conduzir o procedimento criminal da vereadora Marielle Franco), ao fazer opção pelo princípio do devido processo legal, mediante a manutenção em segredo de justiça dos elementos probatórios inseridos no procedimento criminal, eliminou a essência eficacial do princípio da liberdade de imprensa, o que se refuta na tese formulada neste trabalho.34

Essa proibição judicial configura, indubitavelmente, censura prévia ao exercício da liberdade constitucional dos meios de comunicação em massa.

A Constituição Federal brasileira, em seu artigo 220, §§ 1o. e 2o. estabelece:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

O artigo 5.1 da Constituição da República Federal da Alemanha diz expressamente: “No hay censura alguna”, isto é, “no existe una autoridad que, basándose en la ley, limite la libertad de opinión e información, la libertad de prensa y artística realizando una censura previa”.35

Diante das narrativas favoráveis à liberdade de imprensa, e, por consequência, da liberdade de expressão, chega-se à conclusão de que a censura prévia imposta aos meios de comunicação em massa não seria a melhor solução para a resolução do problema surgido no caso Marielle Franco.

Também não seria a melhor solução permitir que os meios de comunicação em massa, violando decisão judicial consubstanciada no devido processo legal (segredo de justiça) pudesse a qualquer momento divulgar o conteúdo probatório, pondo em risco a eficácia das investigações e o princípio da presunção de inocência (etiquetamento e julgamento paralelo).

Não se pode deixar de observar que há nas Constituições democráticas um importante princípio estrutural da democracia, no caso, o direito fundamental a um processo justo e com todas as garantias. E dentre essas prerrogativas, há a garantia de que as provas colhidas em segredo de justiça não serão divulgadas ao público em geral, a não ser por ordem escrita da autoridade competente.

Em um Estado democrático de direito, a solução para o dilema suscitado no presente trabalho deve respaldar-se nos estritos limites das regras democráticas como forma de distensionamento dos princípios envolvidos.

Por isso, transferindo-se a questão para o campo normativo dos princípios constitucionais, podem ser superadas as restrições de ordem social, cultural, econômica e de legitimação institucional, as quais, até o presente momento, tornaram ineficaz a legislação infraconstitucional sobre a proibição de divulgação de conteúdo probatório advindo da “quebra de sigilo” determinada por autoridade competente no processo penal.

É pela dissipação dessa tensão principiológico e pela harmonização e conservação da eficácia jurídica dos princípios constitucionais referentes à liberdade de expressão e de informação e de garantia ao justo processo que se pretende dar uma resposta jurídica-sociológica satisfatória (sempre sujeita a impugnação e refutação) para esse dilema da sociedade moderna: ao mesmo tempo em que há uma regra jurídica proibindo a divulgação de provas que são objeto de segredo de Justiça, consubstanciada no princípio do devido processo legal, essas provas tornam-se públicas pelos meios de comunicação em massa, sob a alegação de que estão respaldados pelo princípio constitucional de liberdade de imprensa.

Por sua vez, todas as vezes que se pretende restringir um princípio constitucional tendo por base a normatização de uma regra jurídica, ainda que consubstanciada em outro princípio, a força normativa do princípio constitucional tende a prevalecer.

Por isso, a única forma de se promover o equilíbrio de forças nesse jogo normativo, é deslocar a questão para o âmbito apenas e tão-somente dos princípios constitucionais.

Sobre a constitucionalização dos princípios fundamentais e a relevância de seu significado jurídico, ensina J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira:

...Por um lado, eles assumem força normativo-constitucional dada a superação definitiva da idéia de Constituição como simples ‘complexo de directivas políticas’ e uma vez rejeitada a idéia de que as normas e princípios constitucionais são meramente programáticos, sem qualquer vinculatividade imediata. Conseqüentemente, toda a Constituição é direito, toda ela é ‘lei positiva’ e todos os princípios nela consagrados possuem alcance jurídico e compartilham da normatividade própria da Lei fundamental. Estes princípios possuem, em geral, duas dimensões: dimensão constitutiva, dado que os princípios, eles mesmos, na sua fundamentalidade, exprimem, indicam e denotam uma compreensão global da ordem constitucional; -dimensão declarativa, pois estes princípios assumem, noutros casos, o carácter de ‘vocábulos designantes’ de ‘fórmulas sintéticas’ utilizadas para designar a ‘soma’ de outros subprincípios e concretizações normativas constitucionalmente plasmados.36

Nessa perspectiva, deve-se ter em mente que tanto o princípio constitucional de liberdade de imprensa e informação quanto o princípio constitucional do processo justo com todas as garantias assumem força-normativa em cada um de seus subsistemas sociais, contribuindo de maneira decisiva para a manutenção da perspectiva autopoietica de cada subsistema.

Evidentemente que a proposta (tese) sugerida neste trabalho é a da manutenção, ao mesmo tempo, da eficácia normativo-constitucional de cada um desses princípios no seu respectivo subsistema social. Essa afirmação, a princípio, poderá gerar certa perplexidade, sob a alegação de que havendo a incidência do princípio concernente à liberdade de expressão e informação, a normatividade do sigilo da prova perderia de plano sua eficácia normativa.

Essa consideração seria válida se a questão estivesse circunscrita ao plano do princípio em relação à regra jurídica. Mas, repita-se, houve um deslocamento de perspectiva; a questão está agora no campo da força normativa dos princípios constitucionais (princípio da liberdade de expressão e princípio do devido processo legal).

Segundo Ronald Dworkin, a diferença entre princípios e regras jurídicas é de natureza lógica, ou seja, os dois conjuntos de padrões apontam para decisões particulares acerca da obrigação jurídica em circunstâncias específicas, contudo distinguem-se quanto à natureza de orientação que oferecem. As regras aplicam-se à maneira de tudo-ou-nada. Uma vez realizados os fatos que uma regra estipula, então ou a regra é válida, e nesta hipótese o resultado que ela fornece deve ser aceito ou não é válida, e nesta hipótese nada se contribui para a decisão.37 Já os princípios são aplicados segundo uma dimensão que as regras não têm, ou seja, a dimensão do peso ou importância.38

A convivência dos princípios é conflitual, a convivência de regras é antinômica:39 os princípios, ao constituírem exigência de optimização, permitem o balanceamento de valores e interesses, sendo que as regras não deixam espaço para qualquer outra solução, uma vez que se uma regra tem validade, deve ser observada exatamente nos seus termos, nem mais nem menos. Os princípios suscitam problemas de validade e peso (importância, ponderação, valia), já as regras estabelecem apenas questão de validade (se elas não são corretas devem ser modificadas).

Para Robert Alexy, o ponto decisivo para a distinção entre regras e princípios é que os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Assim, os princípios são “mandados de optimização”, ou seja, podem ser cumpridos de diferente grau e que a medida de seu cumprimento depende das condições reais e jurídicas. Ao contrário, as regras são normas que somente podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, deve-se fazer exatamente o que ela determina, nem mais nem menos. Isto significa que a diferença entre ambos não é de grau, mas qualitativa.40

Diante dessas considerações, se a questão estivesse circunscrita ao âmbito das regras jurídicas, a prova divulgada pelos meios de comunicação em massa, cuja divulgação vem respaldada pelo princípio constitucional de liberdade de imprensa e informação, tornaria inválida as regras jurídicas processuais penais, consubstanciadas no princípio do devido processo legal, que proíbem a divulgação de provas que estão sob o manto de segredo de Justiça (por exemplo, art. 114, 240 e 329 do Código de Processo Penal italiano; art. 301 e 302 da LECrim. espanhola). Nesse caso, a prevalência do princípio da liberdade de expressão tornaria inválida a regra jurídica do segredo de justiça e eliminaria a essência eficacial do princípio do devido processo legal.

Alterando a perspectiva normativa, agora para o campo da força-normativa dos princípios constitucionais, pode-se afirmar que tanto o princípio de liberdade de expressão, assim como o princípio do processo público com todas as garantias, nesse confronto de forças, nesse campo de “mandados de optimização”, nessa perspectiva de validade e de peso em cada um de seus subsistemas social, devem preservar ao mesmo tempo a sua eficácia normativa. Essa é a tese desenvolvida no presente trabalho.

A proposta inserida no presente trabalho não se enquadra no campo da antinomia de princípios, ou seja, se aplicado um dos princípios o outro automaticamente deve ser considerado ineficaz. A proposta formulada é no sentido de que ambos os princípios tenham eficácia, ou seja, ‘liberdade de imprensa’ e ‘devido processo legal’.

Na simples visão de “mandado de optimização”, a divulgação do conteúdo probatório utilizado no processo de comunicação em massa, com o intuito de construir a realidade social (verità) deste subsistema, está efetivamente amparada pelo princípio constitucional de liberdade de expressão e de imprensa, razão pela qual, a única solução ou resposta para essa questão, na hipótese de se causar algum dano ao réu, deveria ser resolvida no âmbito do direito privado de reparação de danos. Porém, isso não traz uma resposta segura, pois dificilmente o dano ao princípio da inocência ou do devido processo legal pode ser reparado por valor monetário.

Para se afastar da simples reparação monetária do dano, deve-se advogar que os princípios constitucionais do justo processo, da imparcialidade do juiz, do contraditório na aquisição e utilização da prova, da ampla defesa, da presunção de inocência, os quais são densificados e condensados na regra jurídica que veda a divulgação de conteúdo probatório sujeito a segredo de justiça, também mantêm sua eficácia no subsistema do direito processual penal juntamente com a eficácia do princípio da liberdade de imprensa.

Daí por que a necessidade de se buscar uma solução sócio-juridica em que ao mesmo tempo garante-se a liberdade de expressão e de imprensa e um processo justo com todas as suas garantias, mantendo-se a essencial eficacial simultânea a ambos os princípios constitucionais.

Essa é a proposta formulada neste trabalho, ainda que sujeita a críticas ou reformulações.

VI. Uma proposta de solução mediante a manutenção simultânea da eficácia normativa dos princípios de liberdade de imprensa e de um proceso público com todas as garantias

A proposta que se apresenta para a solução dessa problemática sócio-jurídica é inovadora, não obstante possa estar sujeita a críticas.

Em primeiro lugar, rechaçasse qualquer tentativa jurisdicional que vise à censura prévia dos meios de comunicação em massa, inclusive no que concerne a elementos probatórios existentes em procedimento penal, ainda que sujeitos a segredo de justiça.

Em segundo lugar, assim como o princípio da liberdade de imprensa deve ser garantido em toda sua normatividade, também o princípio do devido processo legal deve ter plena eficácia normativa, especialmente quando em jogo o princípio da inocência.

A solução para esse dilema está no fato de que o conteúdo probatório inserido em um procedimento ou em um processo sob o crivo do segredo de justiça, uma vez divulgado pelos meios de comunicação em massa, não poderá mais ser usado como fundamento para um decreto condenatório no processo penal, não obstante ter sido esse conteúdo probatório licitamente advindo de um meio de prova autorizado legitimamente por um juiz competente.

Essa proposta de solução, ao mesmo tempo em que dá eficácia normativa ao princípio da liberdade de imprensa, uma vez que não haverá qualquer censura prévia aos meios de comunicação em massa para publicação de elementos probatórios (que estão sujeito ao segredo de justiça), também confere eficácia plena ao princípio do devido processo legal, ao tornar essa prova ilegítima (e não ilegal) para a solução no processo penal.

A partir do momento em que os meios de comunicação em massa promovem a divulgação de conteúdo probatório que está sujeito ao segredo de justiça, respaldados pelo princípio constitucional da liberdade de imprensa e comunicação, tal circunstância deslegitima a construção da realidade social no subsistema do processo penal, uma vez que a sua utilização pelos meios de comunicação em massa põe em risco a garantia constitucional de um justo processo e o princípio da inocência.

Evidentemente que a publicação do conteúdo probatório que se encontra sob segredo de justiça não configura uma “prova ilícita”, nem um “fruto da árvore envenenada” - (the fruit of the poisonous tree doctrine).41

O termo prova ilícita42 foi introduzido no início do século XX por Beling em sua obra Die beweisverbote als grenzen der Wahrheitserforschung im Strafoprozess (Las prohibiciones probatórias como limites de la investigación de la verdad en el processo penal). Beling considerava que todos os casos que ele denominava “proibições probatórias” constituíam limites ao princípio da averiguação da verdade. Diante das proibições probatórias, o jurista alemão distinguia entre as prescrições (Rechtsätze), as quais impediam decidir sobre um determinado fato (proibições probatórias absolutas) e aquelas que se limitavam a estabelecer a inadmissibilidade de um determinado meio de prova (proibições probatórias relativas).43

Contudo, essa expressão (prova ilícita) não deixa de ter detratores inclusive dentro da própria doutrina alemã. Segundo J. L. Gómez Colomer, o termo ‘prova proibida’ é uma tradução incorreta do alemão, pois a doutrina emprega dito termo sempre no plural, refere-se sempre a ‘proibições’ de prova, dado que existem várias conjecturas e não uma só. De toda forma, como aponta o aludido autor, é um nome cômodo e gráfico para designar aquelas conjecturas nas quais a prova é inadmissível, (ilícita, na terminologia italiana), isto é, não se pode praticar, ou os seus resultados não podem ter aplicação, ser aproveitados no processo.44

O certo é que frequentemente empregam-se diversos termos indistintamente, como por exemplo: “prueba prohibida o prohibiciones probatorias, prueba ilegal o ilegalmente obtenida, prueba ilícita o ilicitamente obtenida, prueba ilegítima obtenida, prueba inconstitucional, prueba nula, prueba viciada, prueba irregular, o incluso el de prueba clandestina”.45

Na doutrina espanhola, distingue-se entre a prueba ilícita e a prueba prohibida. Segundo Gimeno Sendra, a primeira é a que infringe qualquer lei (não somente a fundamental, senão também a legislação ordinária), a “prova proibida”, por sua vez, é a que surge com violação das normas constitucionais tuteladoras dos direitos fundamentais. 46

A doutrina espanhola, na realidade, prefere falar em provas obtidas com violação de direitos fundamentais’, ao invés de ‘provas inconstitucionais’, como faz, por exemplo, a doutrina italiana. Sobre a importância da diferença, ver a Sentença do Tribunal Supremo espanhol (Sala Segunda) de 3 julho de 1999.

A divulgação do conteúdo probatório proveniente de uma prova submetida ao segredo de justiça, como se afirmou, não configuraria uma prova ilícita (uma vez que sua introdução ao processo ou ao procedimento penal foi por autorização de um juiz competente), mas, sim, uma prova inconstitucional, ilegítima, proibida e ineficaz para o subsistema do processo penal, tendo em vista que viola o direito fundamental a um processo justo com todas as garantias (art. 24 da Constituição espanhola), assim como o art. 5o., inc. LIV da Constituição Federal brasileira (ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal).

É possível a existência de prova ilícita quando existe lesão a um direito fundamental, porém, nem sempre que um direito fundamental resulta menosprezado numa atuação processual ou procedimental cabe falar de ilicitude do processo ou do procedimento. Por exemplo, se se da leitura em juízo oral de um informe pericial, levado a cabo no procedimento preliminar sem que a defesa pudesse intervir, e sem que se possa realizar o contraditório, lesiona-se o direito de defesa. Há uma lesão de um direito fundamental e se trata de atividade probatória, porém não há prova ilícita.47

A prova inconstitucional seria, por sua vez, aquela “prove ottenute attaverso modalità, metodi e comportamenti realizzati in dispregio dei fondamentali diritti del cittadino garantiti dalla Constituzione”.48 E dentre esses direitos fundamentais está a garantia de que o processo submetido ao crivo de segredo de justiça não será objeto de conhecimento do público em geral.

A modalidade (quebra de sigilo) é reconhecida pelo ordenamento jurídico, mas o método e comportamento realizados em desprestígio aos direitos fundamentais do cidadão (divulgação massificada pela imprensa do conteúdo probatório, ainda que respaldada pelo princípio da liberdade de imprensa) não, pois, nesse caso, se põe em risco os princípios constitucionais do contraditório na formação da prova e da presunção de inocência49, enfim, coloca em risco o processo justo com todas as garantias.

Não só a presunção de inocência pode ver-se comprometida pela intervenção abusiva dos meios de comunicação, mas também e muito frequentemente a independência e a imparcialidade dos juízes e tribunais, já que a publicação sobre reais e supostos estados de opinião sobre o conteúdo do processo e o sentido da decisão podem influir na decisão judicial. Proporcionar uma proteção eficaz diante dos ‘julgamentos paralelos’ constitui a nova fronteira do que há de ser chamado a necessidade de se redefinir a relação entre justiça e opinião pública. É um motivo de constante preocupação doutrinária (Hernández García; Latorre) que se há estendido para a jurisprudência constitucional (STC 132/1999), fazendo-se eco na doutrina assentada na STEDH de 29 de agosto de 1977, caso Worm v. Áustria.50

Na doutrina espanhola, Vives Antón aduz que somente a verdade obtida com o respeito às regras básicas constituídas pelos direitos fundamentais pode estimar-se como juridicamente válida. Os direitos fundamentais delimitam o caminho a seguir para obter conhecimentos juridicamente válidos. Os obtidos com vulneração a tais direitos haverão, em todo caso, de ser rechaçados: não é somente que a sua verdade resulte suspeita, senão que nem sequer podo ser levada em consideração.51

O Tribunal Constitucional espanhol, na Sentença n. 114/1984, de 29 de novembro, destaca em caráter absoluto a inadmissibilidade processual das provas obtidas por meio de violação de direitos ou liberdades fundamentais. Sustentou-se que a inadmissibilidade dessas provas decorre da superioridade dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico e sua condição de inviolabilidade. Essa decisão está de acordo com “la regra de exclusión”52 prevista no artigo 11.1 de la Ley Orgánica del Poder Judicial53 que diz: “não surtirão efeitos as provas obtidas, direta ou indiretamente, violentando os direitos e liberdade fundamentais”.

A decisão proferida na Sentença 64/1986, manteve a perspectiva:

restritiva ou reducionista do âmbito de aplicação e operatividade do artigo 11.1 da L.O.P.J. Na aludida sentença estabeleceu-se que a doutrina da inadmissibilidade das provas obtidas com violação de direitos fundamentais era aplicável unicamente à ‘vulneração de direitos fundamentais que se cometa ao obter as provas’, porém não à ‘que se produza no momento de suas admissão no processo, ou de sua prática nele, pois, em relação a estes últimos momentos, os problemas que se podem colocar reconduzem-se à regra de ‘interdicción de la indefensión’. Segundo esta interpretação, o âmbito de aplicação do artigo 11.1. L.O.P.J. ficou limitada, portanto, àquelas violações de direitos fundamentais produzidas por ocasião da investigação dos fatos em sede sumarial, isto é, durante o trabalho de busca e captação de fontes de prova. Pelo contrário, quando a vulneração de direitos fundamentais tenha lugar no momento de sua admissão no processo ou de suas prática no ato do julgamento oral será aplicado a disposição do artigo 238.3 da L.O.P.J., que condiciona a nulidade das atuações processuais à produção de efetiva falta de defesa... Esta interpretação constitucional, avalizada por um setor da doutrina, conduz a que a infração de direitos fundamentais durante o procedimento probatório (proposição, admissão e prática da prova) não pode ser alegada pela via do artigo 11.1 da L.O.P.J., devendo-se recorrer ao regime geral da nulidade dos atos processuais...54

Não obstante a divulgação à opinião pública do conteúdo probatório, objeto de “quebra de sigilo”, possa configurar violação ao direito fundamental de sigilo de correspondência e de telecomunicação previsto na Constituição, a argumentação defendida neste trabalho não está inserida no âmbito interpretativo dado pelo Tribunal Constitucional espanhol na decisão n. 64/1986.

Em primeiro lugar, não se sustenta a ilicitude da quebra de sigilo, muito menos a ilicitude de sua divulgação pelos meios de comunicação em massa (respalda-se a liberdade de imprensa em sua máxima eficacial). A princípio, essa argumentação pode parecer contraditória, mas, na sequência da exposição pretende-se harmonizar esses interesses contrapostos.55

Na verdade, diante da autonomia existente entre o subsistema midiático e o subsistema penal e processual penal não haveria restrição ou censura prévia à publicação da prova que se encontra em segredo de justiça pelo subsistema dos meios de comunicação em massa, uma vez que essa publicação estaria amparada pelo princípio constitucional da liberdade de expressão e informação.

Contudo, uma vez publicada, e agora já no âmbito do subsistema do processo penal e do direito penal, ocorreria a inutilizabilidade (inutilidade) dessa prova como fundamento para respaldar um decreto condenatório, uma vez que a violação do segredo de justiça configuraria violação a um direito fundamental, qual seja, ao princípio do contraditório na formação da prova, à imparcialidade do juiz e à ampla defesa. Há, portanto, a necessidade de harmonização desses interesses contrapostos.56

Em segundo lugar, mesmo que a tese aqui defendida estivesse inserida no âmbito de interpretação da Sentença 64/1986, a solução preconizada neste trabalho não estaria em desarmonia com a aludida decisão, uma vez que a obtenção da prova (obtener prova, segundo a expressão do art. 11.1 da LOPJ) em matéria de “quebra de sigilo” não se concretiza apenas no ato processual isolado de autorização do juiz para a quebra de sigilo, mas a sua completude e obtenção em definitivo dependem daquilo que a constituição italiana denomina de contraditório na formação da prova, em outras palavras, a prova somente será considerada obtida e, portanto, legítima, após se dar a oportunidade ao contraditório. Sem contraditório não há prova, sem contraditório não há obtenção de prova.

No caso, a prova colhida licitamente no procedimento ou no processo penal por determinação do juiz, e que se encontra em segredo de Justiça, torna-se imprestável para um decreto condenatório na hipótese de os meios de comunicação divulgarem de forma ilegítima (proibição de mácula a direito fundamental) e não ilícita esse conteúdo probatório.

Nesse sentido, a prova ilegitimamente (ou inconstitucionalmente) divulgada pelos meios de comunicação em massa torna-se inútil para o processo penal.

Conforme bem delineado pela professora de Procedura Penale nell’ Università degli Studi di Milano, Novella Galantini, o instituto da “inutilizzabilità” coincide com a sanção delineada pelo artigo 191 do Código de Processo Penal italiano que compreende tanto a inutilizabilidade patológica como a fisiológica, apesar de o conceito de inutilizabilidade ter significado mais amplo, podendo nesse compreender-se além do aspecto sancionatório, também o aspecto de inutilizabilidade como efeito induzido pela violação de limites probatórios que não integram proibições em sentido próprio. Nessa prospectiva, pode-se afirmar que o conceito é único, caracterizando-se por determinados elementos que necessariamente implica (tal qual a exclusão da prova, ou a ideia de relação que isso sugere), apesar de que as espécies são diversas, sendo a inutilizabilidade referida a situações diversificadas, integradas por vícios ou pelo simples limite do ato.57

Diante dessa distensão entre princípios constitucionais, o conteúdo probatório divulgado pelos meios de comunicação em massa estaria sob o resguardo do princípio da liberdade de expressão e de comunicação, sendo lícita a sua publicação no âmbito restrito e delimitado do subsistema dos mass media. Contudo, para os efeitos jurídicos do subsistema social do processo penal, que é independentemente do subsistema midiático, a prova, que até então era considerada lícita, passou, a partir de sua divulgação pela imprensa, a ser considerada uma prova ilegítima, e, portanto, inútil (inutilizabilidade) para fundamentar um decreto condenatório.

É certo que alguns poderiam por em dúvida essa solução, sob o argumento de que a própria defesa poderia entregar o conteúdo probatório aos meios de comunicação em massa, justamente para caracterizar a imprestabilidade da prova no âmbito do processo penal. Porém, uma vez comprovada má-fé da defesa, como ato atentatório à dignidade da justiça, esse objetivo não poderia ser alcançado em face do princípio geral de direito de que “ninguém pode ser beneficiado da própria torpeza”. Provada a má-fé da defesa, a prova entregue aos meios de comunicação em massa poderia servir de base para um decreto condenatório.

Outros questionamentos que poderiam ser trazidos em relação à tese proposta, diz respeito ao princípio ‘in dubio pro societatis’, efetividade do processo penal e a verdade real, uma vez que a decretação da inutilidade da prova poderia ensejar máculas a esses princípios.

Porém, não há dúvida que o direito fundamental ao ‘devido processo legal’ deve sobrepor-se ao princípio do ‘in dubio pro societatis’, à efetividade da decisão condenatória e mesmo à verdade real, pois a presunção de inocência e a efetividade do contraditório são a garantia de um processo legítimo no Estado democrático de direito.

Além do mais, a tese proposta repassa aos meios de comunicação a responsabilidade social quanto ao destino do processo penal, ou seja, muito embora os meios de comunicação em massa possam divulgar algum elemento de prova sujeito ao crivo do segredo de justiça, amparados na liberdade de imprensa, será de sua total responsabilidade a declaração de inutilidade da prova no processo penal, uma vez que essa divulgação fere direito fundamental do acusado a um processo justo com todas as suas garantias

VII. Conclusão

A decisão proferida pelo Juízo da Quarta Vara Criminal do Rio de Janeiro, ao proibir a divulgação dos dados obtidos pela emissora de televisão, Rede Globo, não observou o princípio constitucional da liberdade de imprensa conjugado com o da liberdade de expressão, uma vez que estabeleceu censura prévia aos critérios informativos futuros que poderiam ser divulgados pelos meios de comunicação em massa.

Em face da plena eficácia do princípio da liberdade de imprensa, fica vedado o controle prévio do Poder Judiciário ao conteúdo informativo obtido pelos meios de comunicação em massa.

Porém, a Constituição Federal brasileira, ao garantir ao réu o direito fundamental ao processo público com todas as garantias, conferiu aos litigantes e aos acusados de modo geral a garantia ao devido processo legal, razão pela qual, os elementos de prova que foram publicados pelos meios de comunicação em massa tornam-se imprestáveis para o subsistema do processo penal.

A tese da inutibilidade da prova é a solução proposta para o distensionamento entre o princípio da liberdade de imprensa e do devido processo legal.

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3 Fontán, Antonio, Prensa, democracia y libertad, Ciudad de Mèxico, Fondo de Cultura Económica, 2017, p. 33.

4 Magdaleno Alegría, Antonio, Los limites de las libertades de expresión e información en el Estado social y democrático de derecho, Madrid, Congreso de los Diputados, 2006, p. 26.

5 Cabrera, Carmen Sáez y Saltor, Carlos Eduardo, “Spinoza y la libertad de opinión”, Revista de la Facultad de Derecho de la Universidad Complutense, Madrid, núm. 91, 1998, p. 267.

6 Curran, James, Medios de comunicación y poder en una sociedad democrática, trad. de Moan Quesada, Barcelona, Hacer Editorial, 2002, p. 55.

7Matsuura, Koichiro, Liberdade de imprensa, UNESCO, Brasília Office, 2004, p. 18.

8Declaração de Chapultepec, 1994 sobre a liberdade de expressão e de imprensa. Foi redigida por 100 especialistas a pedido da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP). O documento ataca a censura prévia e a violencia contra jornalistas.

9 Gullco, Hernán. V. “La libertad de expresión y el discurso basado en el odio racial o religioso”, Libertad de prensa y derecho penal, Buenos Aires, Editores del Puerto, 1997, p. 37.

11 Kury, Helmut, “Mass media e criminalità: l’esperienza tedesca”, trad. Carlo Ruga Riva e Arianna Cremona, La televisione del crimine, a cura di Gabrio Forti e Marta Bertolino, Milano, V&P Università, 2005, p. 325.

12Idem.

13 Bertoni, Eduardo A. “La crítica política y su relevancia para los tribunales internacionales”, Libertad de prensa y derecho penal , Buenos Aires, Del Puerto, 1997, p. 32.

14O n. 2, do artigo 10, da Convenção Européia, prevê que o direito fundamental à liberdade de imprensa pode ser legitimamente limitado quando necessário para garantir a autoridade e imparcialidade do poder judiciário (Bertoni, E. A., ibidem, p. 23).

15Ferrajoli, Luigi, Derechos y garantias. La ley del más débil, Madrid, Trotta, 2001, p. 493.

16Contudo, é importante assinalar que a Suprema Corte voltou a analisar outros casos, e nesses precedentes passou a ter um comportamento diverso. Várias decisões afirmam que a imprensa não tem um direito constitucional de acesso privilegiado às fontes de informação (“Branzburg vs. Hayes”), e que a Constituição não outorga à imprensa um direito de acesso especial à informação distinto da do público em geral (“Pell vs. Procunier”). Igualmente, decidiu-se que nem o público e nem a imprensa podem invocar um direito constitucional de um julgamento público (“Richmond Newspaper Inc. vs. Virginia”), e que não há um direito constitucional de gravar e difundir um testemunho produzido em juízo (“Nixon vs. Warner Communications Inc.”). (Decisões citadas in Bovino, Alberto, “Publicidad del juicio penal: la televisión en sala de audiencias”, Libertad de prensa y derecho penal, Buenos Aires, Del Puerto, 1997, pp. 139 e 140).

17Bertoni, E., op. cit., p. 16.

19No que se refere à incidência do direito a um processo com todas as garantias, ver a Sentença do Tribunal Constitucional espanhol 81/1998, confirmada posteriormente pelas SSTC 49/1999, 94/1999. A doutrina da Sala 2 do Tribunal Supremo espanhol, de 18 junho de 1992 (R. Ar. 6102) declarou no caso Naseiro, que ninguém nega na Espanha a impossibilidade constitucional e legal da valoração da prova obtida com infração aos direitos fundamentais por colidir com o direito a um processo com todas as garantias e a igualdade das partes (art. 24.2 e 14, C.E.).

20 Giostra, Glauco, Processo penale e informazione, 2a. ed., Milano, Giuffrè, 1989, p. 86.

21Curran, J., op. cit., p. 56.

22Idem.

23Garland, David, La cultura del control, trad. Máximo Sozzo, Barcelona, Gedisa, p. 228.

24Mantovani, Ferrando, “Il diritto penale del nemico, il diritto penale dell’amico, il nemico del diritto penale e l’amico del diritto penale”, Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale, Milano, 2/3, apr-sett, 2007, p. 470.

25Ibidem, pp. 471 e 472.

26Vega Ruiz, José Augusto de, Libertad de expresión información veraz juicios paralelos medios de comunicación, Madrid, Editorial Universitas, 1998, p. 61.

27Maglie, Cristina de, Società multiculturali e diritto penale: la cultura defense, Milano, Giuffrè, 2006. p. 222.

28Mantovani, F., op. cit., p. 472.

29Giunta, Fausto, “L’effettività della pena nell’epoca del dissolvimento del sistema sanzionatorio”, Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale, nuova serie - anno XLI, Milano, Giuffrrè, 1998, p. 429.

30Mantovani, F., op. cit.

31Idem.

32Paliero, Carlo Enrico, “La maschera e il volto (percezione sociale del crimine ed ‘effetti penali’ dei media)”, Rivista Italian di Diritto e Procedura Penale, Milano, nuova serie, anno XLIX, 2006, p. 499.

33Ibidem, pp. 501 e 502.

34Por sua vez, se o magistrado tivesse optado por liberar todo o conteúdo probatório à Rede Globo de Televisão, também teria eliminado a essência eficacial do princípio do devido processo legal e do segredo de justiça.

35 Kagelmann, H. Jürgen e Wenninger, Gerd, Psicología de los medios de comunicación. Manual de conceptos básicos, Barcelona, Herder, 1986, p. 359.

36 Canotilho, José Joaquim Gomes e Moreira, Vital, Fundamentos da constituição, Coimbra, Coimbra Editora, 1991, p. 73.

37 Dworkin, Ronald, Levando os direitos a sério, São Paulo, Martins Fontes, 2002, p. 39.

38Ibidem, p. 43.

39 Alexy, Robert, Teoria de los derechos fundamentales, Madrid, Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 88 e 89.

40Ibidem. p. 87.

41Essa teoria tem sua origem na decisão da Suprema Corte norteamericana no caso Lumber Co. vs. US, de 1920.

42Entres os mais conceituados juristas espanhóis que dedicaram um estudo específico sobre prova ilícita encontram-se: Diáz Cabiale, José Antonio, Martín Morales, La garantía constitucional de la inadmisión de la prueba ilícitamente obtenida, Madrid, Civitas, 2001; Pastor Borgñon, B., Eficacia en el proceso de las pruebas ilícitamente obtenidas, Justicia, 1986; Asencio Mellado, J. M., Prueba prohibida y prueba preconstituida, Madrid, 1989; López Barja de Quiroga, L., La escuchas telefónicas y la prueba ilegalmente obtenida, Madrid, Akal, 1989; Gonzáles Montes, J. L., “La prueba obtenida ilícitamente con violación de los derechos fundamentales”, Judicial Protección of Human Rights at the National and Internacional Level, v. II, Milano, Giuffrè, 1991; Miranda Estrampes, M., El concepto de prueba ilícita y su tratamiento en el proceso penal, Barcelona, José María Bosch Editor, 1999.

43 Guariglia, Fabrício, Concepto, fin y alcance de las prohibiciones de valoración probatória en el procedimiento penal. Una propuesta de fundamentación, Buenos Aires, Editores del Puerto, 2005, p. 8.

44 Miranda Estrampes, Manuel, El concepto de prueba ilícita y su tratamiento en el proceso penal, 2a. ed., Barcelona, J. M. Bosch Editor, 2004, p. 17.

45Ibidem, p. 17 e 18; no mesmo sentido: Sabastián Midón, Marcelo, Pruebas ilícitas. Análise doctrinario y jurisprudencial, 2a. ed., Buenos Aires, Ediciones Jurídicas Cuyo, s/d., p. 29; Guariglia, F., op. cit. p. 7. Ada Pellegrini Grinover, por sua vez, afirma que o conceito de ‘prova ilícita’ estaria inserido dentro de uma categoria mais ampla das “provas proibidas”, havendo entre elas uma relação de gênero e espécie (Grinover, Ada Pellegrini, “Pruebas ilícitas”, Derecho penal. Derecho procesal penal, Buenos Aires, Abeledo-Perrot, 1997, p. 306).

46Miranda Estrampes, M., op. cit., p. 18.

47 Díaz Cabiale, José A. y Martín Morales, Ricardo, La garantía constitucional de la prueba ilícitamente obtenida, Madrid, Civitas, 2001. p. 22.

48 Allena, G., “Riflessioni sul concetto di incostituzionalità della prova nel processo penal”, Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale, aprile/giugno, 1989, pp. 506 e seguintes.

49SSTC 127/1996, 54/1996, 86/1995: “El derecho a la presunción de inocencia exige, en último término, que la prueba se realice a través de los medios que sean constitucionalmente legítimos, lo que supone que en su obtención se hayan respectado los derechos fundamentales”. Pero también se ha señalado que el encuadre de la exclusión de las pruebas se encuentra en el derecho al proceso con todas as garantías, artículo 24.2, y a la igualdad de las partes, artículo 14, SSTC 49/1996, 114/1984... (Díaz Cabiale, José A. y Martín Morales, Ricardo, La garantía constitucional de la prueba ilícitamente obtenida, Madrid, Civitas, 2001, pp. 29 e 30).

50 López Ortega, Juan J., “Información y justicia”, Justicias y Medios de Comunicación, Cuadernos de Derecho Judicial, Madrid, XVI, 2006, pp. 119 e 120.

51Vives Antón, Tomás S., “Doctrina constitucional y reforma del proceso penal’ en Jornadas sobre la Justicia Penal en España”, Revista Poder Judicial, número especial II, pp. 125 e 126 - citação em Miranda Estrampes, M., op. cit., p. 56.

52“Aunque hay distintas visiones sobre este particular, considero que los primeros desarrollos de la regla de exclusión en el ámbito de los procesos penales federales se produjeron en 1914 con la sentencia dictada en el caso ‘Weeks v. Unitad States, 232 U.S. 383 (1914); y el punto de máxima extensión de la misma vino con la sentencia ‘Mapp v. Ohio, 367 U.S. 643 (1961)”. (Fidalgo Gallardo, Carlos, Las ‘pruebas ilegales’: de la exclusionary rule estadounidense al artículo 11.1 LOPJ, Madrid, Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2003, p. 18).

53

“Una revisión de los tres volumenes editados en Madrid, 1986, por las Cortes Generales, con el título ‘Ley Orgánica del Poder Judicial. Trabajos parlamentarios, muestra, ante todo, que la cuestión de la ineficacia de fuentes de prueba a causa de la ilicitud en su obtención no es tratada, en ningún sentido, en el Proyecto de Ley enviado por el Gobierno al Congreso de los Diputados. Es la enmienda número 952, presentada por el Grupo Popular, la que propone que, en artículo 11 de dicha Ley Orgánica (LOPJ), aparezca, tras la mención al debido respecto a las reglas de la buena Fe, el siguiente texto: “No surtirán efecto, en ninguna clase de procesos, los medios de prueba obtenidos, directa o indirectamente, de modo contrario a la ética o al Derecho” (vide PP. 527 y 528 del vol. I de ya citada publicación, Ley Orgánica del Poder Judicial. Trabajos parlamentarios).

Esta enmienda no es asumida por la Comisión, pero se mantiene para el Pleno del Congreso, donde, siendo 262 los diputados presentes, se registran 255 votos a favor, 3 en contra y 4 abstenciones. Así, pues, se incorpora al texto de la LOPJ aprobado por la Cámara Baja.

En el Senado, la enmienda número 374, del Grupo Socialista (ibíd., pp,. 1801 y 1802 del vol. II), asumida por la Ponencia, introduce, en lugar del texto que acabo de transcribir, este otro: ‘No surtirán efecto las pruebas obtenidas, directa o indirectamente, violentando los derechos o libertades fundamentales’. La justificación es escueta: ‘...la referencia a las pruebas se acomada a lo declarado por el Tribunal Constitucional en Sentencia dictada en el Recurso 114/84” (De la Oliva Santos, Andrés, Prólogo à obra de Carlos Fidalgo Gallardo, Las “pruebas ilegales”: de la exclusionary rule estadounidense al artículo 11.1 LOPJ, Madrid, Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2003, p. XXIII e XIV).

54Miranda Estrampes, M., op. cit., p. 69.

55“Es preciso no olvidar, que ese enfrentan en esta material muchos puntos de fricción provocados por intereses contrapuestos: de un lado, el interés del Estado en administrar justicia con independencia e imparcialidad, de otro, el interés del individuo en que se respete su esfera de libertad personal, y por último el interés de la opinión pública en estar informada” (Otero Gonzáles, M. P., op. cit., p. 44). No mesmo sentido, Pisapia, Gian Domenico, Il segreto istruttorio nel proceso penale, Milano, Giuffrè, 1960, pp. 40, 220 e 221.

56Essa ponderação de interesses foi assim delineada pelo Tribunal Constitucional espanhol na Sentença 114/1984, de 29 de novembro (RTC 1984, 114): “Hay, pues, que ponderar, en cada caso, los intereses en tensión para dar acogida preferente en su decisión a uno u otro de ellos (intereses público en la obtención de la verdad procesal e interés, también, en el reconocimiento de plena eficacia a los derechos constitucionales”.

57 Galantini, Novella, L’inutilizzabilità della prova nel processo penale, Milano, CEDAM, 1992, p. 25.

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