SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número66II Simposio Iberoamericano de Historia de la CartografíaLa gala de Gea, la madre Tierra índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Investigaciones geográficas

versão On-line ISSN 2448-7279versão impressa ISSN 0188-4611

Invest. Geog  no.66 Ciudad de México Ago. 2008

 

Notas y noticias

 

I Colóquio Brasileiro de História do Pensamento Geográfico

 

Rita de Cassia Martins de Souza Anselmo *

 

Uberlândia, Brasil, 27 e 30 de abril de 2008.

 

* Instituto de Geociências, Universidade Federal de Uberlândia.

 

As pesquisas em Historia do Pensamento Geográfico vêm se avolumando nas últimas três décadas, no Brasil. Esta produção, no entanto, tem encontrado relativamente poucos espaços para ser debatida adequadamente. Poucos têm sido os eventos específicamente voltados para o tratamento do tema e a congregação desses pesquisadores, sendo o último evento, de caráter nacional, aquele realizado em 1999, na Universidade Estadual Paulista–UNESP, de Rio de Claro (I°. Encontro Nacional de História do Pensamento Geográfico).

O I Colóquio Brasileiro de História do Pensamento Geográfico, realizado entre os dias 27 e 30 de abril de 2008, veio atender uma intensa angústia de todos os que se debruçam sobre a história da Geografía, em particular, mas também daqueles que procuram compreender o pensamento geográfico em sentido mais amplo, passados, como se vê nove (9) anos da primeira iniciativa.

Realizado na Universidade Federal de Uberlândia–UFU (Instituto de Geografía), portanto em um dos centros de excelência de pesquisa no Brasil, embora localizada na cidade de Uberlândia–MG,1 um centro de importância intermediária na rede urbana brasileira, o evento congregou em torno de 180 participantes, entre professores, pesquisadores, estudantes de graduação e pós–graduação. É de se destacar a participação de professoras da Universidade de Buenos Aires–UBA, dando continuidade aos trabalhos conjuntos iniciados em Rio Claro.

O Colóquio foi organizado tendo em mente três frentes de trabalho complementares. Primeiramente as Mesas Redondas procuraram recobrir os acontecimentos e a renovaçáo da Geografía nos anos de 1980, no Brasil, e isto remete justamente ao aparecimento mais intensivo das discussões em torno da HPG2 em nosso meio. Os principais horizontes teórico–metodológicos: a lógica formal, o humanismo, a fenomenologia e a crítica radical marxista, foram abordados em sua influencia direta sobre o campo disciplinar da Geografía por professores e pesquisadores que sofreram diretamente seus impactos e por outros que a estudaram a fundo. A chamada Geografía Física foi também contemplada ñas varias influencias que sofreu durante esse período sendo abordada por estudiosos comprometidos com a compreensão teórica desse campo. Deste modo, foram compostas quatro mesas assim distribuídas:

1. Perspectiva lógico–formal. Uma nova geografia para pensar o Brasil.

Profa. Dra. Vera Lucia Salazar Pessoa–UFU; Prof. Dr. Archimedes Perez Filho–UNICAMP; Prof. Dr. Paulo Roberto Albuquerque Bomfim–USP.

2.  Perspectiva humanista. O resgate do lugar pela geografia no Brasil.

Profa. Dra. Marlene Terezinha de Muno Colesanti–UFU; Prof. Dr. Werther Holzer–UFF; Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho–PUCMINAS.

3.  Perspectiva crítico–radical. Urna geografia nova para (re)pensar o Brasil.

Profa. Dra. Vânia Rubia Farias Vlach–UFU; Prof. Dr. Ruy Moreira–UFF; Prof. Dr. Antonio Carlos Robert Moraes–USP.

4.  Perspectivas da geografia física. A natureza na geografia produzida no Brasil.

Profa. Dra. Rita de Cassia Martins de Souza–UFU; Prof. Dr. Luis Antonio Bittar Venturi–USP; Prof. Dr. João Osvaldo Rodrigues Nunes–UNESP–PP.

Os anos correspondentes à renovação da Geografia no Brasil foram extremamente tumultuados e talvez por isso mesmo tenham tornado possível a recepção das idéias novas e da oxigenação da "velha" Geografia regional francesa, desgastada e incapaz de responder aos reclamos dos novos tempos. Os governos militares (1964–1985) implementavam um desenvolvimento econômico acelerado à custa de empréstimos impagáveis após as crises do petróleo. Um país que procurava modernizar o campo e estender direitos trabalhistas via Estatuto da Terra ou do Estatuto do Trabalhador Rural, mas que, no entanto, enfrentava paralelamente a dura reação dos grandes proprietários de terra e dos empresários urbanos. O crescimento grandioso e desordenado das cidades enquadrava–se num contexto de boom econômico nacional e internacional. As coisas mudavam desenfreadamente.

A absorção dos métodos quantitativos e da Teoria dos Sistemas pela geografia brasileira desses anos pode ser entendida no esforço de adequação aos novos tempos, à adesão à lógica formal conforme vinha sendo proposta principalmente nos EUA, o novo modelo a ser seguido. A crise mundial dos anos de 1970 levou inevitavelmente à reavaliação dos métodos dessa interpretação da realidade e permitiu o desenvolvimento de outras abordagens metodológicas, principalmente as ligadas ao materialismo histórico, mas também de algumas frentes chamadas humanísticas.

O maior desafio para aqueles que compuseram as Mesas Redondas citadas foi justamente fazer uma revisão do que foram as propostas apresentadas àquele tempo e de quais as principais transformações sofridas pela geografia praticada no Brasil, desde o tempo da redemocratização em 1985, com o fim do período militar.

Paralelamente às Mesas Redondas ocorreram os Grupos de Discussão levando em conta as várias frentes ligadas à História do Pensamento Geográfico que vêm se constituindo no Brasil nos últimos anos, demonstrando uma preocupação muito significativa em relaçáo a urna historiografía da disciplina. Algumas frentes têm se ocupado es–sencialmente com o pensamento social e a atuação dos intelectuais brasileiros no sentido de construir um pensamento geográfico, independentemente de sua área de formação. São destaques desse Grupo de Discussáo as questóes ligadas à Geografia e Literatura, à Geografia pré–institucional, à Geografia académica propriamente dita e à Geografia e outros profissionais. Este eixo de trabalho foi denominado Geografia e pensamento social brasileiro (onze trabalhos), e coordenado pelo Prof. Dr. Paulo R. Albuquerque Bomfim (CEFET–SP) e pelo Prof. Dr. Paulo R. T. de Godoy (UNESP–RC).

Outra frente tem se preocupado com as instituições e as formas de elaboração e de sistematização de um saber geográfico. Neste sentido, nao somente sao levados em conta os cursos de Geografia, mas também outras instituições de pesquisa imbuídas da idéia de construir um pensamento de ordem espacial ou geográfica. São aqui consideradas como fontes de pesquisa: universidades, sociedades geográficas, órgáos técnico–administrativos, agencias estatais, revistas e congressos de Geografia. O Grupo de Discussão Espaços institucionais do saber geográfico (oito trabalhos) foi coordenado pelo Prof. Dr. Sergio Nunes Pereira (UFF) e pela Profa. Dra. Perla B. Zusman (UBA); ligados aos estudos diretamente institucionais aparecem aqueles específicamente direcionados para urna geografia escolar, ou seja, para a produção de um conhecimento acerca da adoção e da aplicação (ou transmissáo) de urna Geografia ñas escolas, seja no nível básico, médio ou superior. São fontes básicas destas pesquisas: legislação, programas curriculares oficiáis, livros didáticos, bem como podem servir de aportes interessantes os escritos de professores e alunos, os registros em cadernos, e a história de vida de professores. O Grupo de Discussão História da geografía escolar brasileira (seis trabalhos) foi coordenado pelo Prof. Dr. Sérgio L. Miranda (UFU) e pela Profa. Dra. Vânia R. F. Vlach (UFU).

A partir dos trabalhos recebidos3 o eixo Epistemología da Geografía (como foi denominado no I Encontro Nacional de Rio Claro) foi desdobrado em três (3) novos eixos: Epistemología e historiografia do pensamento geográfico (dez trabalhos), coordenado pelo Prof. Dr. Eliseu Savério Spósito (UNESP–PP), no qual foram discutidas principalmente as bases epistemológicas de autores, conceitos como tempo e teoria e aportes disciplinares. A pluralidade das bases teóricas e metodológicas dos trabalhos sinaliza a importância do mantenimento de um grupo de discussão voltado essencialmente para as questões dessa ordem.

Conceitos e técnicas da Geografia (nove trabalhos), coordenado pela Profa. Dra. Maria Laura Silveira (USP), esteve focado principalmente sobre espaço e território, diferenciação espacial, região, territorialidade, paisagem e natureza. A preocupação central é a de percorrer a história dos conceitos e debates próprios à disciplina, problematizando justamente a atualidade e a pertinência ou não das categorías e conceitos da tradição geográfica e daqueles incorporados pela Geografia.

Matrizes do pensamento geográfico (oito trabalhos), coordenado pelo Prof. Dr. Werther Holzer (UFF), está centrado na discussão acerca da delimitação e da incorporação das diversas matrizes pelo pensamento geográfico, bem como sua introdução no Brasil, de forma a possibilitar o aprofundamento da pesquisa epistemológica. A indefinição metodológica e o excessivo ecletismo na utilização dos métodos de pesquisa empobrecem o trabalho científico em geral e manifestam–se na produção geográfica impondo a necessidade de urna reflexáo mais concisa e seria elevando o nivel das discussões.

A terceira frente de trabalho do Colóquio esteve composta pelas conferências magnas dando coerência ao evento. A Conferência de Abertura foi oferecida pelo Prof. Dr. Silvio Carlos Bray, um dos primeiros a pesquisar e orientar dissertações e teses sobre o pensamento geográfico no Brasil, em meio às grandes contestações à Geografia na década de 1980. A Conferência sobre "Humanismo na geografia: a contribuição brasileira", foi ministrada por urna figura muito expressiva na academia brasileira da década de oitenta: a Prof. Dra. Lívia de Oliveira foi uma das introdutoras no Brasil das discussões sobre a percepção do meio ambiente sob o enfoque piagetiano e dos textos de Yi–Fu Tuan. A Conferência de Encerramento intitulada "A história do pensamento geográfico no Brasil: Perspectivas", oferecida pelo Prof. Dr. Manoel Fernandes Sousa Neto, um dos mais jovens pesquisadores da HPG no Brasil centrou suas atenções nas mais recentes possibilidades da exploração do tema.

Finalmente, cabe destacar o sucesso alcançado com este evento no sentido de consolidar efetivamente as pesquisas iniciadas no Brasil acerca da Historia do Pensamento Geográfico. O caráter incipiente desse campo de pesquisa entre nós destoa de vários outros países no mundo em que estas pesquisas encontram–se bem estruturadas. É necessário reconhecer que foram empreendidos vários esforços desde os anos de 1980, quando começaram a aparecer as primeiras dissertações e teses acerca da temática. O I Encontro Nacional de Historia do Pensamento Geográfico, como já destacado, foi de fundamental importância, inclusive porque vários dos pesquisadores e interessados no assunto estiveram aqui presentes, participando e apresentando suas contribuições.

Muito embora não se tenha conseguido arregimentar as forças necessárias para organizar outro evento de igual porte até aqui, o esforço permaneceu. Prova disso, são os grupos de discussão mantidos durante os Encontros Nacionais de Geógrafos da Associação Brasileira de Geógrafos–AGB e no Encontro da Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Geografia–ANPEGE.

A Revista Terra Brasilis, de História do Pensamento Geográfico no Brasil, cujo número mais recente (7/8/9) foi lançado neste Colóquio, pode ser considerada também como baluarte desse esforço. O volume integra um grupo de trabalhos de autores do mundo acadêmico, especialmente convidados e reconhecidos especialistas, que representam a Península Ibérica e de uma parte significativa da América Latina.

Contam–se ainda as dissertações de mestrado defendidas à época do I Encontro Nacional que se desdobraram em teses de doutoramento e passaram a alimentar linhas de pesquisa mais consistentes em vários pontos do território brasileiro, e, portanto, só agora podemos começar a colher os frutos.

Notável ainda é que todos esses esforços contaram sempre com um grupo de pesquisadores sérios e comprometidos com a compreensão e deslindamento da história do pensamento geográfico no Brasil.

Enfim, o I Colóquio Brasileiro de História do Pensamento Geográfico atingiu os objetivos propostos. Fica ainda a missão de prosseguir na consolidação das discussões desenvolvidas em torno dos eixos temáticos e, nesse sentido, ficou agendado o próximo Colóquio para maio de 2010, nesta mesma instituição, encontro que, espera–se, sirva de base local para os futuros Encontros Nacionais.

 

Notas

1 A cidade de Uberlândia está localizada no chamado Triângulo Mineiro e conta com uma população de 608.369 habitantes, sendo um centro econômico voltado para o processamento de grãos, carnes, frutas e laticínios, bem como para o segmento de biotecnologia animal e vegetal. Entretanto o grande destaque para a cidade dá–se na função de centro atacadista e varejista, sendo ponto de entroncamento ou de interligação entre as áreas mais dinâmicas da economia nacional (São Paulo e Rio de Janeiro) com as áreas mais interiorizadas do território (Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e a capital do país, Brasília).

2 Siglas utilizadas: HPG: Historia do Pensamento Geográfico; UFU: Universidade Federal de Uberlândia; UBA: Universidade de Buenos Aires; UNESP–RC: Universidade Estadual Paulista–Rio Claro; UNESP–PP: Universidade Estadual Paulista–Presidente Prudente; USP: Universidade de São Paulo; CEFET: Centro Federal de Educação Tecnológica de São Paulo; UFF: Universidade Federal Fluminense; UNICAMP: Universidade Estadual de Campinas; PUCMG: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

3 Os textos relativos aos trabalhos aceitos para apresentação no Colóquio foram divulgados com antecedência no site do evento http://www.ig.ufu.br/coloquio/index.htm permitindo assim a leitura prévia pelos participantes. Vale destacar que os anais completos com os textos das mesas e das conferências bem como a apresentação também estão disponíveis nesse mesmo site.

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons