SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.53 número159La influencia del Convenio 169 de la OIT en la justiciabilidad de los derechos indígenas a través de la jurisprudencia en los países del nuevo constitucionalismo latinoamericanoLa autonomía municipal y la conservación de la biodiversidad en México índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

Links relacionados

  • No hay artículos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Boletín mexicano de derecho comparado

versión On-line ISSN 2448-4873versión impresa ISSN 0041-8633

Bol. Mex. Der. Comp. vol.53 no.159 Ciudad de México sep./dic. 2020  Epub 21-Ene-2022

https://doi.org/10.22201/iij.24484873e.2020.159.15797 

Artículos

Aspectos da formação jurídica do Estado brasileiro

Aspectos de la formación jurídica del Estado brasileño

Maurício da Cunha Savino Filó* 
http://orcid.org/0000-0002-7436-1664

*Doutor em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) da Universidade Federal de Santa Catarina. Leciona desde agosto de 2011, na Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC). Atualmente é membro do Núcleo Docente Estruturante, sendo que leciona Teoria geral do processo e Prática processual administrativa. Advogado. Correo electrónico: mauriciosavino@hotmail.com.


Resumo:

Neste artigo, objetiva-se rever a formação do Estado e do Direito público brasileiro, a fim de responder ao questionamento de saber qual foi sua matriz jurídica. A análise dos textos constitucionais ocorreu em dois capítulos, um dedicado ao Brasil Império e outro ao Brasil republicano, sem adentrar o texto constitucional de 1988. O método utilizado na abordagem foi o descritivo-sistemático, valendo-se do procedimento analítico de decomposição de um problema jurídico em seus diversos aspectos, relações e níveis, envolvendo pesquisas em dispositivos legais constitucionais e infraconstitucionais. O método de interpretação jurídica foi o tópico sistemático. Conclui-se, em linhas gerais, que no império Brasileiro, utilizou-se abundante matéria prima de direito público romano, sendo que, na transposição ao período republicano, houve grande celeuma sobre como organizar os Poderes Estatais, verificada pelas ingerências e sobreposições de suas instituições.

Palavras-chave: Brasil império; direito público romano; instituições; poder moderador; republicanismo

Resumen:

En este artículo, el objetivo es revisar la formación del Estado y del derecho público brasileño, para responder a la pregunta de conocer su matriz jurídica. El análisis de los textos constitucionales se realizó en dos capítulos, uno dedicado al Brasil imperio y otro al Brasil republicano, sin entrar al texto constitucional de 1988. El método utilizado en el enfoque fue el descriptivo-sistemático, utilizando el procedimiento analítico de descomposición de un Problemática jurídica en sus diversos aspectos, relaciones y niveles, involucrando la investigación en disposiciones legales constitucionales e infraconstitucionales. El método de interpretación jurídica fue el tema sistemático. Se concluye, en líneas generales, que en el Imperio brasileño se utilizó abundante materia prima del derecho público romano, siendo que, en la transposición al periodo republicano, hubo un gran revuelo sobre cómo organizar los poderes del Estado, comprobado por las injerencias y solapamientos de sus instituciones.

Palabras clave: imperio de Brasil; derecho público romano; instituciones; poder moderador; republicanismo

Sumário: I. Introdução. II. As instituições políticas no Brasil império. III. Particularidades da república brasileira. IV. Conclusão. V. Referências.

I. Introdução

O objetivo geral com este artigo é verificar quais foram as bases jurídicas e políticas utilizadas para a formação do Estado brasileiro.

Como a política e o direito estão calcados na história das instituições políticas (Rodrigues 1969, 153-156) e o Estado de direito é consequência de desdobramento e de influências históricas e políticas, que culminam em diversos fatores especiais (Kaplan 1999, 77-79), parte-se da premissa de que há alguns elementos-chave que devem ser analisados neste tipo de pesquisa.

Os substratos utilizados para construções jurídicas fundamentais do constitucionalismo brasileiro -como o poder moderador, que visava à harmonização entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, assim como seu desaparecimento da Ordem Jurídica nacional- ensejam o problema de pesquisa, que se resume na seguinte pergunta: qual foi a natureza da matriz jurídica do Estado brasileiro?

Sem descartar a ligação do direito com o que já se havia produzido na Europa a partir do século XIX, parte-se da hipótese de que há elementos de direito público romano, como se podem verificar nas criações constitucionais sul-americanas.1

Com relação à hipótese levantada, é importante realizar alguns esclarecimentos fundamentais. Ressalte-se que reconhecer o uso de matriz românica não significa que as instituições jurídicas e políticas que surgiram na América do Sul eram as mesmas que as antigas, como, por exemplo, se verifica nas propostas e ideais constitucionais de Bolívar, que produziram inovações genuínas e originais (Catalano 1981, 5; Lobrano 2006). Ao lado disso, cabe mencionar que há certa cautela de alguns estudiosos em cogitar a influência da antiguidade no constitucionalismo construído no Brasil, com o objetivo de não serem reforçados antigos laços de subserviência cultural com o paradigma jurídico eurocêntrico. Todavia, isso não se justifica, pois, conforme Catalano (2004, 329, 331) o próprio direito brasileiro construiu seu direito privado com bases romanistas e o transcendeu a patamares próprios e autênticos pelas obras de Teixeira de Freitas, Clóvis Bevilacqua e Abelardo Lobo. Além disso, o paradigma jurídico que foi construído na Europa descartou, por meio de uma releitura seletiva, muitas experiências e institutos romanistas: houve uma opção seletiva do que se encontrava no Digesto do imperador Justiniano (Paricio e Barreiro 2014, 216). Por fim, a própria revisão e contraposto criteriosa das produções constitucionais ocorridas em tempos distintos permite ao jurista conceber a formalizar novas práticas contemporâneas (Pilati 2017, 17).

Realizados esses esclarecimentos, cabe por fim destacar que, em razão da divisão histórica no Brasil não ser matéria de consenso (Rodrigues 1969, 125-144), optou-se pela periodização histórica de as instituições políticas ocorrerem em duas etapas: Império e República,2 que corresponderão às duas seções de desenvolvimento deste artigo.

O método a ser utilizado na abordagem é o descritivo-sistemático, valendo-se do procedimento analítico de decomposição de um problema jurídico em seus diversos aspectos, relações e níveis, envolvendo pesquisas em dispositivos legais constitucionais e infraconstitucionais, além de obras constitucionais de influentes juristas e políticos, a fim de se chegar à resposta sobre a formação da matriz jurídica de direito público estatal brasileiro. O método de interpretação jurídica é o tópico sistemático.

II. As instituições políticas no Brasil império

A colonização portuguesa no Brasil teve como grande vetor a família, que funcionava como importante unidade produtiva, sendo que, em 1532, caracterizava-se por ser rural ou semirrural e agregava empregados e um número constante de escravos (Freyre 2006). Os grandes senhores de terra possuíam poder fático para manter a ordem e explorar riquezas em seus domínios; aqueles patriarcas, porém, não contribuíram de forma efetiva para a construção de novos institutos jurídicos e políticos.3 O poder dos antigos senhores de terras foi emprestado, de uma fração do poder real, em um sistema de concessão de poder, por meio de capitanias hereditárias e sesmarias,4 que não era nascido da própria estrutura familiar patriarcal, como ocorrera na Antiguidade com o pater familias romano, nem se confundia totalmente com o sistema feudal5 (Faoro 1958, 63).

Posteriormente, aquele sistema de doações, que foi hereditário, a fim de investir aos donatários de uma espécie de soberania proveniente do Reino Português (Miranda 1967, 344), foi substituído pela estrutura latifundiária. Os donos de moinhos de cana atingiram um nível de poder altíssimo, em nova modalidade de colonização, para fortalecer a saúde econômica da Coroa portuguesa, dando ao senhor de engenho um prestígio e um poder de patriarca, de proprietário de terras e de escravos e, posteriormente, o título de comandante de tropas (Freyre 2006, capítulo 3).

De acordo com os aspectos destacados, em linhas gerais, o panorama que se apresentava em terras brasileiras, antes da formação independente de seu Estado, foi caracterizado por uma dependência jurídica e política da metrópole portuguesa e, ao mesmo tempo, uma autonomia extrema dos grandes latifundiários.

A organização do Brasil após a independência começou a ser feita por meio do embate e acordo de forças políticas, e não mediante pressões populares, a fim de se reformar ou modificar a autoridade constituída.6

O constitucionalismo brasileiro nasceu de duas forças políticas: a monarquia liberal portuguesa e os elementos nativos, que buscavam formar uma nova nacionalidade.7 Mas como isso não foi percebido à época, surgiram dois poderes constituintes díspares, o que se repetiria em nossa história constitucional: o poder originário e soberano dos governados, que promulga constituições; e o poder derivado do absolutismo, de ato do príncipe, que outorga cartas (Bonavides 2000, 165-166).

O ponto nevrálgico na formação do Estado brasileiro foi a distribuição de poderes, e não a forma de governo, que já se aceitava monárquica (Mello 1863, 16-21). Dessa forma, na Assembleia Constituinte de 1823, onde inicialmente reinava um ambiente de cooperação, as relações com o governo foram abaladas, pois o Imperador se viu ante um poder soberano que o fiscalizava e pedia modificações de seus atos e respeito à separação de poderes (Mello 1863, 7-13).

O constituinte José Joaquim Carneiro de Campos -Marquês de Caravelas-, em 26 de junho, defendeu que sua majestade tivesse ingerência sobre o Poder Legislativo, pois, como se estava pretendendo um governo monárquico-constitucional-representativo, o monarca não poderia ser mero executor de leis (Rodrigues 1974, 64-65, 273).

A dissolução da Constituinte no dia 12 de novembro de 1823 não impediu que seu projeto -ainda em forma de esboço, mas carregado de princípios liberais- fosse continuado pelos novos redatores que levantavam objetivos absolutistas (Mello 1863, 16-21).

Como todo poder exercido em território brasileiro provinha da realeza lusitana e sua legitimidade foi declarada como pertencente ao primeiro Imperador do Brasil, nos trabalhos iniciais dos constituintes (Homem de Mello 1863, 7), a Carta Constitucional do 25 de março de 1824, naturalmente, confirmou tal assertiva (Brasil 1824).

Carneiro de Campos foi um dos principais redatores da Carta outorgada, quando prevaleceram seus projetos já expostos e defendidos em assembleia, que concederiam o poder de veto ao monarca (Rodrigues 1974, 64-67).

A figura do imperador passou a representar a nação brasileira que se constituía e, para desempenhar sua missão, o artigo constitucional 98 estabeleceu um quarto poder, que não se enquadrava na teoria da tripartição de Montesquieu: “Artigo 98. O Poder Moderador é a chave de toda a organização política, e é delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da Independência, equilíbrio, e harmonia dos mais Poderes Políticos” (Brasil 1824, grifos nossos).

A Carta brasileira consolidou um império que, em seu primeiro título, afirmava ser uma associação política entre os cidadãos brasileiros, que formava uma nação, cujo governo seria hereditário, onárquico, constitucional e representativo.

Tendo o princípio de que a divisão e a harmonia dos poderes seria a melhor forma de se tornarem efetivas as garantias constitucionais, o poder moderador, que se definia como “a chave de toda a organização política”, somente poderia ser exercido pelo Imperador que seria o chefe, primeiro representante8 e defensor perpétuo9 da nação, a fim de melhor equilibrar e harmonizar os poderes.10

O imperador constitucional era pessoa sacra e inviolável, não podendo recair sobre ele qualquer responsabilidade. Além de exercer o Poder Executivo, ele tinha ingerência nos outros dois poderes (artigos 99 e 100 da Carta brasileira de 1824), concentrando, em si, a soberania,11 que foi um conceito que se confundiu com o próprio poder.12

A indelegabilidade do quarto poder constituía um de seus princípios basilares, pois a tarefa de dar equilíbrio aos demais poderes era concedida somente ao imperador, chefe supremo da nação e seu primeiro representante.

Além do Poder Moderador, havia o Conselho de Estado (artigos 138-144), composto de, no máximo, dez membros vitalícios, nomeados pelo Imperador sob voto de fidelidade (Brasil 1824).

Os conselheiros se manifestavam em todas as questões graves e em todos os momentos em que se utilizasse o Poder Moderador, à exceção da nomeação e demissão dos ministros de Estado.

Credita-se a criação do poder moderador -que possibilitou a união nacional diante de projetos pessoais de poder dos produtores rurais- aos discursos de Constant, pelo fato de esse autor sugerir uma monarquia constitucional (Faoro 1958, 143-145).

A ideia de um poder moderador surgiu, inicialmente, com Clermont Tonnere,13 sendo, posteriormente, incrementada e divulgada por Constant, que entendia ser necessário à sua geração conturbada um princípio constitucional conservador (Franco 1957, 245; Vianna 1970, 132).

O governo monárquico, ao ser dotado de previsão constitucional para atuar, fá-lo-ia como um poder neutro, não podendo ser responsabilizado se atuasse em seus limites, a fim de que

[...] pudesse desfazer, sempre dentro de uma linha conservadora, os conflitos surgidos entre os demais poderes, estabelecendo uma espécie de equilíbrio entre o espírito de movimento e o de conservação [...]. Seria um órgão chamado a desempenhar no governo parlamentar, papel correspondente àquele de que aos poucos, graças ao gênio de alguns de seus juízes, se investiria a Suprema Corte dos Estados Unidos (Franco 1957, 245).

Dom Pedro I, entretanto, não introduziu o “instituto de Constant” em 1824 (e, quando consagrado Rei de Portugal e Algarves, repetiu o feito em Portugal, em 1826) buscando atingir a neutralidade entre os três poderes, mas, sim, para aumentar os poderes reais (Franco 1957, 246), razão pela qual Franco (1978) o chamou de “chave de cúpula de toda a organização política”.

A maior concentração de poder na América Latina ocorreu no Brasil, que refutou Constituições republicanas e o controle de constitucionalidade, dando início a uma original ditadura constitucional, pois o corregedor dos demais poderes era quem promovia o absolutismo (Bonavides 2000, 166-167).

Na verdade, Benjamin Constant nunca falou em Poder Moderador, e, sim, em pouvoir royale, pouvoir neutre (poder real, poder neutro) (Franco 1981, 106), tratando-se de uma criação brasileira (Rodrigues 1974, 65).

Os princípios liberais foram sobrepujados pelo caráter absolutista presente no texto constitucional; logo, não se implementou a teoria de Constant, que pressupunha neutralidade para fiscalizar e julgar os demais poderes (Bonavides 1987, 9-10).

Segundo Franco e Pila (1999, 33), pela análise dos fatos e dos depoimentos registrados, o parlamentarismo imperial brasileiro foi uma falácia, se comparado ao que era considerado como um sistema parlamentar de governo, com base na prática inglesa e no que foi fixado nas teorias constitucionais da Europa continental.

A mesma opinião com relação ao regime político é a de Ferreira (2003, 47), no sentido de que não houve um parlamentarismo propriamente dito, como o inglês,14 porque a maleabilidade da Carta permitia que o regime transcorresse como o imperador desejasse, o que afastou ainda mais sua neutralidade.

Essa situação exacerbou a figura monárquica no segundo reinado,15 por isso, D. Pedro II tolerou um “parlamentarismo”, que foi pendular entre liberais e conservadores (Ferreira 2003, 47, Octaciano 2015, 31-33).

A instituição do Poder Moderador no constitucionalismo brasileiro, portanto, foi única no mundo, fazendo com que o governo parlamentar adquirisse sentido diverso do que significava (Franco e Pila 1999, 33), pois o rei reinava e governava por meio de seus ministros (Octaciano 2015, 31-33).

Em seu exercício constitucional, o Poder Moderador, segundo o artigo 101 da Carta brasileira, possuía o alcance de nomear senadores (que eram vitalícios); convocar a Assembleia Geral (formada pelos deputados e senadores); dar força de lei a decretos e resoluções da assembleia pela sanção, assim como aprovar e suspender resoluções das províncias; prorrogar ou adiar a Assembleia Geral. Para salvar o Estado, poderia dissolver -a fim de substituir- a Câmara dos Deputados, nomear ministros de Estado, suspender juízes em razão de queixas, assim como perdoar e moderar as penas que fossem aplicadas e conceder anistia, a bem do Estado.

Mas se o quarto poder não proveio das teorias liberais do século XVIII/XIX, onde se buscou a matéria-prima jurídica para criá-lo? Em que se baseou o instituto que permitiu a D. Pedro I realizar reformas políticas e manter o país unido, e que mais tarde foi retomado por D. Pedro II?

Como ponto de partida, cabe mencionar que o conceito de império civil,16 em vez de reinado, surgiu na década de 1760, com o marquês de Pombal, a fim de fortalecer o reinado de José I e secularizar as instituições portuguesas. Para isso, defendeu-se que o rei possuía imperium17 como os antigos cônsules, que, pela concepção romana, não admitiria oposição, nem mesmo eclesiástica (Oliveira 2005, 46).

A terminologia romana é verificada quando se afirma que o Império se tratava de uma “associação política de cidadãos brasileiros”, não se utilizando a palavra sociedade brasileira, em continuação a um conceito jurídico presente em Cícero (Poletti 1994, 146).

Na formação do império brasileiro, uniu-se a concepção de organização por meio de associação de pessoas que concederiam, em aclamação, o poder a um rei sob a aprovação divina, mediante sagração, da razão e da vontade humanas (Oliveira 2005, 53-54).

O poder de censura (nomear senadores), que aquilatou o Poder Moderador, e o auxilium tribunício,18 previsto para aqueles apenados de forma excessiva ou desumana e aos necessitados de anistia, são provas do romanismo em nosso constitucionalismo, pois se basearam nos institutos da censura e do tribunato romanos.

O uso do termo “Império” na Constituição brasileira de 1824, portanto, foi um sinal de originalidade com novo uso de elementos jurídicos antigos, e não uma experimentação de ideais de teóricos liberais franceses, sendo que a nomenclatura “imperador”, em vez de “rei”, tinha também o objetivo de transmitir a impressão de união entre a aclamação e a vontade popular (Catalano 1988, 12).

O substrato do absolutismo do império brasileiro é encontrado, precisamente, em um texto de Ulpiano presente no Digesto (D.1.4.1pr.), que confundiu a vontade do monarca com a lei e, ao mesmo tempo, serviu para modificar a teoria de vontade geral de Rousseau, baseada na experiência republicana do Tribunato da Plebe.19

O criador do Poder Moderador na Carta de 1824, José Joaquim Carneiro de Campos (apud Rodrigues 1974, 65) fez referência aos Tribunos da Plebe, a fim de definir esse poder e defender sua concessão ao defensor da nação:

Ele é sua primeira autoridade vigilante, guarda nossos direitos e da constituição. Esta suprema autoridade que constitui a sua pessoa sagrada e inviolável e que os mais sábios publicistas deste tempo têm reputado um poder soberano, distinto do poder executivo por sua natureza, fim e atribuições, esta autoridade, digo, que alguns denominam Poder Neutro ou Poder Moderador, e outros tribunício, é essencial nos governos representativos.

Confrontando o preâmbulo da Carta de 1824 com aquele antigo texto, verifica-se a intenção de induzir o entendimento de que o poder e o império foram concedidos pela vontade popular ao seu defensor. Dessa forma, conseguiu-se unir a força da lex imperium à tribunicias potestas, presentes no quarto poder e no título de defensor perpétuo do Brasil (Poletti 1994, 146).

A explicação de Bueno (1857, 204-205) de que o Poder Moderador não seria um poder real, imperial ou conservador, mas, sim, a suprema inspeção da nação (soberania), fundamenta-se no direito desta de inspecionar o que fazem os outros poderes.

As construções e as inovações na ordem constitucional, entretanto, visaram à centralização do poder, em um paternalismo expresso na figura do Imperador protetor, que não produziu instrumentos que conseguissem incrementar a democracia.

Tal fato pode ser comprovado ao se verificar que se defendia que o quarto poder somente poderia ser exercido por um Imperador, pois essa posição colocaria qualquer um acima de interesses particulares (neutros) e proporcionaria virtudes que impediriam ferir a ordem constitucional (Bueno 1857, 205).

Se a Bolívia possuiu um libertador, ao se inspirar na interpretação da Res Publica de Rousseau, o Brasil, inspirando-se na estratégia de Augusto, passou a ser governado pelo seu defensor, dotado de um quarto poder pessoal, à época em que republicanismo e monarquia se apresentavam como forma de governo (Catalano 1988, 13).

Surgiram, entretanto, ataques à figura do Monarca que, no fundo, revelaram o problema que afetava o Brasil imperial: a ausência de “vontade popular” e a “verdade eleitoral”, pois, geralmente, quando o grupo político dominante perdia a eleição, seduzia o candidato eleito com futuros cargos e vantagens (Faoro 1958, 200).

Vasconcellos (1862, 98-90), líder liberal, por iniciar grande crítica ao poder pessoal do Imperador, foi acusado de “tribuno e de turbulento”, por defender limites, a fim de que o parlamentarismo se concretizasse de fato.20

Vasconcellos reeditou, em 1862, a obra de Bastos (1938, 29), denunciando que todos os erros que afligiam o governo não poderiam ser responsabilidade dos ministros ou de partidos, porque procediam “[...] de um princípio político afetado de raquitis, de uma ideia geradora e fundamental: a onipotência do estado, e no estado a máquina central, e nesta máquina certas e determinadas rodas que imprimem movimento ao grande todo”.

Com base em discurso conhecido por “sorites”, em 17 de julho de 1868, Joaquim Nabuco sentenciou a inevitável queda do Império e a vinda da República. O Poder Moderador, ao violar a vontade dos cidadãos expressa nos votos, não seria mais admissível; ainda mais quando era quase consenso de que não havia um sucessor à altura de D. Pedro II.21

III. Particularidades da república brasileira

Após a elaboração de um anteprojeto, a Constituição do 24 de fevereiro de 1891 (Brasil 1891) foi a mais concisa de todas as brasileiras, com 91 artigos e 8 disposições transitórias, sendo considerada literal por Baleeiro (2015, 11-13), em alusão ao estilo de seu principal revisor, Rui Barbosa.22

Tentou-se, no preâmbulo, dar a ideia de que, naquele momento, seria o povo, por seus representantes, que constituiriam a república, e não os representantes dos Estados Unidos do Brasil (Santos e Maximiliano 2005, 123). Conforme observa Vieira (2010, 69-72 e 166), contudo, não houve consolidação de partidos políticos, talvez em razão de a república ter surgido de forma aquartelada.

Estabeleceu-se que o presidente, como chefe do Executivo, até 1926, somente poderia vetar o projeto de lei como um todo; e não poderia mais “[...] dissolver a Câmara dos Deputados, nem era obrigado a escolher Ministros de sua confiança desta ou exonerá-los se perdessem essa confiança [...]” (Baleeiro 2015, 30).

O artigo 42 é, conforme apontado por Santos e Maximiliano (2005, 463), dispositivo original do constitucionalismo brasileiro. Apesar de ter sido descumprido por Floriano Peixoto, em sua sucessão a Deodoro da Fonseca, ele impedia que o vice-presidente exercesse a Presidência da República, caso o eleito no sufrágio fosse impedido antes de completar vinte e quatro meses.23

O artigo 4324 (caput e § 1) é próprio de uma transição entre um regime monárquico para um regime republicano, quando se quer evitar que haja longos momentos de exercício de poder e a “[...] hipertrofia do poder pessoal” (Santos e Maximiliano 2005, 465).

A soberania, conforme Santos e Maximiliano (2005, 131), reproduzia o entendimento de 1918, pois era percebida como o summum imperium ou a potestas suprema, indicando um poder sem rival.25

A soberania não poderia ser divisível, como teria demonstrado o malogrado sistema dos 13 Estados na América do Norte e o próprio constitucionalismo brasileiro, que limitava, ainda mais, a atuação política de seus entes, impedindo-os de legislar sobre matérias civis, penais e comerciais (Santos e Maximiliano 2005, 132-133).

Conforme o artigo 15 do texto constitucional, os três poderes seriam órgãos da soberania, mas não a soberania em si, devendo ser exercidos harmonicamente. Mas o principal ponto do novo constitucionalismo era o presidencialismo (Ferreira 2003, 67).

A partir de 1926, em razão de conflitos internos e disputas entre o Executivo e o Legislativo, houve um fortalecimento do poder na figura do presidente da república, por meio da Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926 (Baleeiro 2015, 49-50; Santos e Maximiliano 2005, 90-97).

Além disso, como os atos do presidente eram discutidos no Congresso Nacional, desde as comunicações com seus ministros até seus atos privativos -onde lhes era proibida a entrada-, criou-se a figura de seu intermediário nas duas Casas, designados pelo próprio chefe do Executivo, conhecido por líder da maioria ou representante autorizado. Essa figura, sem previsão constitucional, alterou o equilíbrio dos poderes (Ferreira 2003, 89).

Na década de 1930, iniciou-se o declínio da república velha. A Revolução de 193026 deixou como herança um regime discricionário e interventor e, em contraponto, a Revolução de 193227 legou o desejo de um novo regime constitucional (Ferreira 2003, 98).

O governo provisório28 determinou a criação de uma comissão para elaborar o anteprojeto constitucional, por meio do Decreto 21.402/1932 (Brasil 1932a), ficando estabelecida sua presidência pelo ministro da Justiça e Negócios Interiores; a não limitação de membros para estarem representadas as correntes organizadas de opinião e de classe, a juízo do chefe do governo; eleições à Assembleia Constituinte em 3 de maio de 1933.

Mas em 1o. de novembro de 1932, diante da necessidade de acelerar o andamento dos trabalhos, regulou-se novamente a Comissão, por meio do Decreto 22.040/1932 (Brasil 1932b), assinado por Afrânio de Melo Franco e Getúlio Vargas.

Dessa forma, foi nomeado um segundo presidente da Comissão para, em exercício, exercer todas as funções e direitos do primeiro presidente e criando uma subcomissão para formular um projeto constitucional como base de debates em assembleia, com 1/3 dos membros da Comissão.

Afrânio de Melo Franco, ministro das Relações Exteriores, foi o presidente de fato daquela comissão composta de elementos com formação ideologicamente diversificada,29 que ganhou o nome de “Comissão do Itamaraty”, em razão do local de sua reunião (Horta 1986, 16; Poletti 1986, 72).

Ao se elaborar o anteprojeto constitucional de 1933, um dos pontos cruciais foi a discussão da concepção de Federação, pois o objetivo era fortalecer a União em detrimento dos estados, que perderiam o comando de suas polícias militares (Poletti 2015).

O Poder Moderador, composto, por sua vez, de reminiscências da ideia de intercessio e do veto do Tribunato -que foi a possibilidade do imperador intervir, auxiliar e vetar atuações do Poder Público em benefício da nação ou do povo-, sedimentou a ideia de um Defensor do Povo no regime republicano (Poletti 2007, 222).

Em razão disso e para evitar um retorno ao regime imperial, o anteprojeto pretendia o unicameralismo, mediante a supressão do Senado, e a criação de um Conselho Supremo (Poletti 2007, 222).

Pelo artigo 68 do Anteprojeto, verifica-se que aquele Conselho teria funções políticas e administrativas, a fim de manter a administração pública nacional funcionando adequadamente. Quando fosse consultado pelo poder público, emitira pareces e, em casos de sua competência, deliberaria.

No artigo 67, verifica-se que os conselheiros teriam de residir, obrigatoriamente, na capital da União e teriam imunidades, como os antigos Tribunos da Plebe romanos, que não poderiam se afastar em demasia da urbe.

Das competências previstas no artigo 69, destaca-se a autorização da intervenção nos estados, quando a decisão coubesse exclusivamente ao presidente; opinar sobre atos do executivo; vetar a nomeação de ministros de Estado e do prefeito do Distrito Federal; rever, ao menos de cinco em cinco anos, por meio de projeto de lei a tributação nacional, a fim de se evitar o bis in idem e conciliar interesses econômicos e tributários; propor modificação na tributação a favor das populações dos estados; resolver, em caso de estado de sítio, a detenção política superior a 30 dias; publicar, anualmente, relatório de suas atividades acerca do que houvesse sido tratado no ano anterior.

Como se pode verificar, havia necessidade de um instituto que pudesse moderar a atuação do governo, sendo que o Conselho Supremo ainda poderia propor qualquer projeto de lei, convocar a Assembleia Nacional e acusar o presidente e seus ministros por crime de responsabilidade.

A influência do direito público romano foi imensa no Anteprojeto, pois se propôs a inserção de elementos de atuação dos tribunos adquiridos em seu combate ao imperium.

Uma das justificativas do Conselho Supremo foi realizada por João Mangabeira, que entendia que onde vigora o bicameralismo, “[...] a tendência sempre foi para o predomínio de uma das Câmaras, sendo que a Câmara Alta indicava, de forma invariável, um resquício da aristocracia do patriciado” (Poletti 1986, 80).

A existência de representantes dos estados se justificaria no momento da formação do federalismo, e não após seu surgimento, pois à Corte Suprema cabe a defesa dos entes federados (Poletti 1986, 81).

Apesar de o unicameralismo que se pretendia não ter sido aprovado, concedeu-se ao Senado certa função, política e jurídica, compatível com o Poder Moderador, já que poderia, inclusive,30 suspender a execução de regulamentos expedidos pelo governo (Poletti 2015).

Todavia, isso não ocorreu, e os problemas de técnica constitucional oriundos da rigidez do dogma da tripartição foram deixados sem solução (Miranda 1967, 273).

Colocou-se, então, o Senado num dilema: ser um autêntico quarto poder (superórgão) e/ou colaborar com a Câmara dos Deputados em funções legislativas (Ferreira 2003, 97). Entretanto, como os dispositivos discutidos no Anteprojeto de 1934 foram esquecidos, mal resolvidos e pulverizados na Constituinte, o Senado atuou como uma casa parlamentar e, consequentemente, “[...] o Exército e, depois, as Forças Armadas exerceriam esse poder moderador” (Poletti 2006, 71).

Além disso, o fato de o Senado funcionar permanentemente (Secção Permanente) e a atuação das câmaras dos deputados e do Poder Judiciário revelavam desconfiança com o chefe do Executivo e a desfiguração do presidencialismo (Ferreira 2003, 99; Miranda 1967, 273).

Provavelmente, a Constituição de 1934 -a mais completa antes de 1988-31, após ser vítima de caudilhismos de algumas representações estaduais, logo foi substituída em 10 de novembro pelo texto de 1937 (Miranda 1967, 315).

Da noite para o dia, sem revolução sangrenta,32 em meio a aclamações anunciadas nos meios de comunicação, surgiu nova Carta constitucional, que outorgava nova Ordem Jurídica e exaltava ao máximo os poderes presidenciais no “Estado Novo” (Ferreira 2003, 101-104).

33O criador daquela Carta -também conhecida como “Polonesa”- foi Francisco Luís da Silva Campos, o “Chico Ciência”. Nela, os procedimentos democráticos foram somente formais, pois não chegam a assegurar a democracia substantiva. O objetivo principal foi institucionalizar o regime do Estado Novo (Ciotola 2010, 94-106).

A maior parte dos juristas brasileiros, em vez de comentar sua anatomia, repudiava seu caráter fascista e suas imprecisões conceituais entre plebiscito e referendo (Porto 2015).

Conforme Franco (1987, 127), existe “[...] um fosso intransponível entre a Constituição de 1937 e o regime do Estado Novo”, pois aquele texto foi construído com a consciência de que não seria aplicado, o que descarta sua importância jurídica e política.

Ignorou-se o elemento autoritário em nome da agregação, da paz social e da integração nacional (Miranda 1967, 315). Todavia, não deixou de ser um documento para justificar uma ditadura, pois o plebiscito que ia “referendá-la” jamais ocorreu e “[...] se declarou o país em estado de emergência, durante o qual juízes e tribunais não poderiam conhecer dos atos durante e em virtude dele praticados”.34

Miranda (1938 apud Porto 2015, 10) realizou os comentários mais profundos, demonstrando que a atividade legislativa estava sendo coordenada e exercida, por meio dos decretos-leis, pelo presidente e que a “superstição moderna” do “princípio da separação e da independência dos poderes” não era uma realidade constitucional.

As soluções que se esperavam com a Constituição de 1937, como ausência de cooperação entre os poderes (delegação legislativa), foram suplantadas pelo pensamento fascista do texto e de sua interpretação (Pontes de Miranda 1967, 273).

O presidente tornou-se legislador e executor da Ordem Jurídica, por meio dos decretos-leis, nos recessos parlamentares ou em caso de dissolução da Câmara, o que se tornou insustentável após a queda dos regimes fascistas europeus (Ferreira 2003, 104).

A Lei Constitucional 9, de 1945 (Brasil 1945a), suprimiu as prerrogativas do presidente, previstas nos artigos 74 e 75, como coordenar a atividade parlamentar de grau superior, indicar um dos candidatos à sua sucessão para uma eleição indiretae dissolver a Câmara dos Deputados, quando o exigisse a declaração do estado de emergência ou do estado de guerra.

Pelas novas redações da alínea b do artigo 74 e do artigo 14, não poderia mais o chefe do Executivo se autorregular por meio de decretos-leis e necessitaria ter seus atos referendados pelos ministros de Estado (artigo 76).

Por meio de um decreto-lei, que lhe autorizava o artigo 180 da Constituição de 1937, o presidente da república já havia autolimitado seus poderes, que já previa a republicação do texto constitucional, que seria “resultante das modificações feitas por esta e pelas leis constitucionais anteriores” (Brasil 1945a).

Pela penúltima justificativa daquele decreto-lei, argumentou-se que parlamentares com poderes especiais poderiam, se julgassem conveniente, reformar o texto constitucional, e que o plebiscito do artigo 187, implicitamente, tolheria a liberdade dos representantes em dispor de matérias constitucionais.

Diante de uma Carta que ampliava sobremaneira os poderes do Executivo e que não era capaz de opor-lhe força, vários juristas que a confeccionaram e a defenderam passaram a demoli-la, até a deposição do ditador.35

Sem qualquer anteprojeto,36 a Constituinte de 18 de setembro 1946 foi promulgada em 18 de setembro, após o fim da Segunda Guerra Mundial, pelo que se quis retirar a exagerada centralização de poder da presidência da república (Baleeiro e Sobrinho 2015), reprimindo-se qualquer forma de delegação legislativa.37

A criação da justiça eleitoral foi uma forma de se dar credibilidade à democracia brasileira, sendo que a maior conquista da Constituição de 1946, conforme Baleeiro e Sobrinho (2015, 37) teria sido o artigo 134, que (com exceção dos analfabetos, dos que não soubessem o idioma nacional e daqueles privados de direitos políticos) estabelecia, para ambos os sexos, o sufrágio universal, o voto secreto e a representação proporcional dos partidos políticos.

Após haver uma restauração democrática (Ferreira 2003, 165), o Poder Executivo voltou a ser fortalecido na Constituição de 1967, que em seu artigo 83 reservava como competências privativas do presidente: a iniciativa parlamentar (nos casos previstos), o veto a projetos de lei, e, pelo artigo 49, V, a emissão de decretos-leis (Brasil 1967a; Cavalcanti; Brito; Baleeiro 2015).

A Constituição de 24 de janeiro de 1967 (Brasil 1967a) demonstrou que o federalismo foi impedido (amortecido) pelo sentimento nacionalista de unidade, adquirido na colonização portuguesa,38 que utilizou a tradição, a língua, a religião e o direito para impedir o desenvolvimento daquela forma de Estado, que soava separatista (Cavalcanti; Brito; Baleeiro 2015; Vianna 1970, 296.).

Um dos problemas mais discutidos pela doutrina era a repartição de competências e delegações de poderes, uma vez que a rigidez anatômica constitucional39 gerava uma espécie de personificação dos três poderes (Miranda 1967, 543-555).

Naquele ano, aproximando-se o fim do governo de Castelo Branco, dois novos diplomas que tratassem sobre a segurança nacional e a reforma administrativa ainda surgiriam, a fim de fechar a reforma do ordenamento jurídico brasileiro (Vianna Filho 1975, 477-480).

O conhecido Decreto-Lei 200, do 25 de fevereiro de 1967 (Brasil 1967b), surgiu para dispor a respeito da nova organização da administração federal, estabelecendo linhas gerais para a reforma administrativa que regularam entidades descentralizadas, com personalidade jurídica própria, a fim de cumprir suas finalidades legais.40

O cidadão -como era entendido aquele que possuía título de eleitor- poderia ir de encontro aos atos da máquina pública pessoalmente, a fim de anular atos considerados lesivos ao patrimônio público,41 entendidos como “[...] os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético ou histórico”, § 1º do artigo 1o. da Lei 4.717, do 29 de junho de 1965 (Brasil 1965a).

Essa ação popular é um instituto legado pelo direito romano, que foi criado quando se percebeu que, em casos específicos os pressupostos exigíveis para a proteção judiciária (“interesse pessoal atual e direcionado à disputa”) poderiam não ser observados. Isto ocorreria quando os interesses da comunidade latina autorizassem a legitimação de qualquer cidadão, mesmo alheio ao conflito, a mover uma ação que controlasse o exercício do poder (Tafaro 2012).

Como a Lei 4.717/1965 foi recepcionada pela Constituição de 1967 (Brasil 1965b), manteve-se a possibilidade de qualquer cidadão manejar uma ação de controle contra os autores de ato lesivo ao patrimônio dos entes federados e de suas administrações descentralizadas. Tal fato, todavia, ocorreu sem que se admitisse a análise do mérito administrativo, pois o critério de conveniência e oportunidade não cabia ao povo, conforme dispunha o constitucionalismo brasileiro, fazendo com que todos pudessem ser fiscais dos elementos do ato administrativo,42 ao lado do Ministério Público, que, posteriormente, atuaria diretamente baseando-se na Lei 7.347/1985.

O Decreto-Lei 314, do 13 de março de 196743 -reformulado diversas vezes-, definiu o que seriam os crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social, completando o que o governo entendeu como vital para o direito (Vianna Filho 1975, 485).

Tratou-se de uma “Constituição-instrumento” cujas poucas contribuições democráticas do Congresso Nacional (que a elaborou de severamente limitada) não ia durar muito tempo (Franco 1987, 132-133).

Após embates com o Legislativo, o Executivo, em nome do comando revolucionário, editou a Emenda 1, de 1969 (Brasil 1969), dando início a um novo texto constitucional que suspendeu o de 1967.

Houve o apagamento do Poder Legislativo diante do Supremo Comando Revolucionário, que se fez detentor do Poder Constituinte e deu ao chefe do Executivo a competência para a intervenção federal (Rosah 1977, 258-264).

A Constituição de 1969 não foi uma constituição propriamente dita, mas, sim, novo instrumento, imposto, que deu “[...] fisionomia jurídica a um regime de poder de fato”, que deveria ser substituído a fim de se reinstalar o regime democrático (Franco 1987, 134).

IV. Conclusão

Quando houve a formação do Estado brasileiro, diversas foram as discussões a respeito de como deveriam ser os institutos jurídicos e políticos no Estado nacional.

Indo em sentido oposto ao que foi estabelecido na América Latina, no Brasil foram utilizados substratos do antigo direito romano republicano, notadamente os poderes que se encontravam nos cônsules, nos censores e nos tribunos da plebe, para justificar a existência de novo império.

Como ocorreu na fase imperial da Roma antiga, o Estado brasileiro também necessitou de um fator de união entre os cidadãos, a fim de que seus associados legitimassem uma força unificadora. Esse fator foi conseguido por meio de elementos do antigo Tribunato da Plebe, que permitiram que o Poder Moderador e uma espécie de Defensor do Povo forjassem a figura do Imperador brasileiro.

Não obstante o uso desses antigos elementos jurídicos republicanos, foi gerado novo absolutismo -naquele momento o único no constitucionalismo ocidental-, promovido e camuflado no original instituto do poder moderador, que -ressalte- não se confundiu com a sugestão de um poder neutro de Benjamin Constant.

Pode-se afirmar, portanto, que no início da experiência política do Brasil não se consagrou a teoria da tripartição dos poderes, tampouco a teoria de Constant, mas, sim, instituiu-se o quarto poder, com a base teórica do poder do imperium, camuflado pelo Tribuno da Plebe (Defensor do Povo).

Foi uma estratégia habilmente concebida que, na verdade, reprisou uma tática antiga para dar validade e garantir o funcionamento constitucional das instituições brasileira.

Ocorre que, após o fim da monarquia brasileira, permaneceu o hábito de se utilizar a força militar para resolver problemas políticos no Brasil. Tal fato se comprova pelos próprios textos constitucionais, que revelam que se depositou nas Forças Armadas a missão de suprir a carência de instituições democráticas, cujo Poder Executivo, reiteradamente, fortaleceu-se perante os poderes Legislativo e Judiciário.

Pode-se concluir que, durante o período republicano analisado, a grande dificuldade foi harmonizar a relação entre as funções estatais previstas na teoria de Montesquieu, fazendo com que fossem utilizados (de forma camuflada) elementos estranhos a essa própria teoria da tripartição de poderes.

Estudos sobre o constitucionalismo brasileiro devem ser mais aprofundados, a fim de serem analisadas a fundo suas instituições jurídicas e políticas de forma a identificar, em sua fundamentação teórica, a possível origem de esquizofrênicos comportamentos institucionais.

V. Referências

Baleeiro, A. 2015. 1889. 3a. ed. Brasília. Senado Federal. Edições Técnicas. Coleção Constituições Brasileiras, 2. [ Links ]

Baleeiro, Aliomar, Lima Sobrinho, Barbosa. 2015. 3a. ed. Brasília. Senado Federal, Edições Técnicas. Coleção Constituições Brasileiras, 5. [ Links ]

Barreto, Tobias. 1977. A questão do poder moderador e outros ensaios brasileiros. Petrópolis, RJ. Vozes. [ Links ]

Bastos, A. C. Tavares. 1938. Cartas do solitário. 3a. ed. São Paulo. Companhia Editora Nacional. [ Links ]

Bonavides, Paulo. 1987. “A Constituição do Império”. Revista de Informação Legislativa, 94, 5-16. Brasília. [ Links ]

Bonavides, Paulo. 2000. “A evolução constitucional do Brasil”. Conferência feita pelo autor na Academia Piauense de Letras em 27 de julho de 2000. Estudos Avançados, São Paulo, 14 (40), 155-176. http://www.scielo.br/pdf/ea/v14n40/v14n40a16.pdf . Acesso em: 22 jan. 2019. [ Links ]

Bonavides, Paulo. 2001. Ciência política. 10a. ed. São Paulo. Malheiros. [ Links ]

Bonavides, Paulo. 2008. Teoria constitucional da democracia participativa: por um direito constitucional de luta e resistência, por uma nova hermenêutica, por uma repolitização da legitimidade. São Paulo. Malheiros. [ Links ]

Bonavides, Paulo, Andrade, Paes de. 1991. História constitucional do Brasil. 3a. ed. Rio de Janeiro. Paz e Terra. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1824. “Constituição Política do Império do Brasil. Manda observar a Constituição Politica do Imperio, offerecida e jurada por Sua Magestade o imperador”. Coleção de Leis do Império do Brasil. Rio de Janeiro, 24 mar. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1891. “Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil”. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, 24 fev. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao91.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1926. “Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926. Emendas à Constituição Federal de 1891”. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, 4 set. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc%20de%203.9.26.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1932a. “Decreto nº 21.402, de 14 de maio de 1932. Fica o dia três de maio de 1933 para a realização das eleições à Assembléia Constituinte e cria uma comissão para elaborar e anteprojeto da Constituição”. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, 17 maio. http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-21402-14-maio-1932-518100-publicacaooriginal-1-pe.html . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1932b. “Decreto nº 22.040, de 1º de novembro de 1932. Regula os trabalhos da comissão encarregada de elaborar o anteprojeto da futura Constituição brasileira”. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, DF, 4 nov. http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-22040-1-novembro-1932-502838-publicacaooriginal-1-pe.html . Acesso em 1o. fev. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1934. “Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil”. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, 16 jul. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao34.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1937. “Constituição dos Estados Unidos do Brasil”. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, 10 nov. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao37.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1942. “Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”. Diário Oficial da União . Rio de Janeiro, 9 set. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657.htm . Acesso em: 15 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1945a. “Lei Constitucional nº 9, de 28 de fevereiro de 1945. Altera a Constituição Federal de 1937”. Diário Oficial da União . Rio de Janeiro, 1o. mar. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCT/LCT009.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1945b. “Lei nº 16, de 30 de novembro de 1945. Revoga o art. 186 da Constituição”. Diário Oficial da União , Rio de Janeiro, 30 nov. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCT/LCT016.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1965a. “Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965. Regula a ação popular”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 5 jul. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4717.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1965b. “Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965. Institui o novo Código Florestal”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 16 set. http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1960-1969/lei -4771-15-setembro-1965-369026-publicacaooriginal-1-pl.html . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1967a. “Constituição da República Federativa do Brasil”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 24 jan. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao67.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1967b. “Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sôbre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 27 fev. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0200.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1967c. “Decreto-Lei 201, de 27 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores, e dá outras providências”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 27 fev. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0201.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1968. “Ato Institucional 5 (AI-5), de 13 de dezembro de 1968. São mantidas a Constituição de 24 de janeiro de 1967 e as Constituições Estaduais; O Presidente da República poderá decretar a intervenção nos estados e municípios, sem as limitações previstas na Constituição, suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais, e dá outras providências”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 13 dez. 1968. http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/AIT/ait-05-68.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1969a. “Emenda Constitucional de 20 de outubro de 1969. Edita o novo texto da Constituição Federal de 24 de janeiro de 1967”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 20 out. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc01-69.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1969b. “Emenda Constitucional 1, de 17 de outubro de 1969. Edita o novo texto da Constituição Federal de 24 de janeiro de 1967”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 20 out. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc01-69.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Brasil. Presidência da República. 1983. “Lei 7.170, de 14 de dezembro de 1983. Define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências”. Diário Oficial da União . Brasília, DF, 15 dez. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7170.htm . Acesso em: 20 abr. 2019. [ Links ]

Bueno, José Antônio Pimenta. 1857. Direito publico brazileiro e analyse da Constituição do Imperio. Rio de Janeiro. Typographia Imp. e Const. de J. Villeneuve e C. [ Links ]

Catalano, Pierangelo. 1981. “Tribunado, censura, disctadura: conceptos constitucionales bolivarianos y continuidade romana en América”. Quaderni Latinoamericani: rivoluzione bolivariana: instituzioni, lessico, ideologia, 8: 440-454. Napoli. [ Links ]

Catalano, Pierangelo. 1988. “Le concept de dictadure de Rousseau à Bolivar: essai pour une mise au point politique sur la base du droit romaino”. Dictatvres, Actes de la Table Ronde Réunie à Paris les 27 et 28 Février 1984. Paris. De Boccard. [ Links ]

Ciotola, Marcello. 2010. “O pensamento autoritário de Francisco Campos”. Direito, Estado e Sociedade, 37: 80-112. Rio de Janeiro. http://direitoestadosociedade.jur.puc-rio.br/media/Artigo4%20Marcelo.pdf . Acesso em: 25 mar. 2019. [ Links ]

Faoro, Raymundo. 1958. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. Porto Alegre. Globo. [ Links ]

Ferreira, Luis Pinto. 1987. “A Constituição brasileira de 1934 e seus reflexos na atualidade”. Revista de Informação Legislativa , 93: 15-30, jan./fev./mar. Brasília. Senado Federal. Subsecretaria de Edições Técnicas, [ Links ]

Ferreira, Waldemar Martins. 2003. História do direito constitucional brasileiro. Edição fac-similar Brasilia. Senado Federal. [ Links ]

Franco, Afonso Arinos de Mello. 1957. Estudos de direito constitucional. Rio de Janeiro. Freitas Bastos. [ Links ]

Franco, Afonso Arinos de Mello. 1978. O pensamento constitucional brasileiro: ciclo de conferencias realizado pela Universidade de Brasília no periodo de 24 a 26 de outubro de 1977. Brasília. Câmara dos Deputados. [ Links ]

Franco, Afonso Arinos de Melo e Pila, Raul. 1999. Presidencialismo ou parlamentarismo? Brasília. Senado Federal, Conselho Editorial. [ Links ]

Franco, Afonso Arinos de Melo. 1981. Afonso Arinos na UNB: conferências, comentários e debates de um seminário realizado de 7 a 9 de abril de 1981. Brasília. Universidade de Brasília. [ Links ]

Franco, Afonso Arinos de Melo. 1987. Direito constitucional: teoria da Constituição, as Constituições do Brasil. 3a. ed., Rio de Janeiro. Forense. [ Links ]

Freyre, Gilberto. 2006. Casa-grande e senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51a. ed. São Paulo Global. [ Links ]

Grossi, Paolo. 2004. Mitologias jurídicas da modernidade.Tradução de Arno Dal Ri Júnior. Florianópolis. Fundação Boiteux. [ Links ]

Horta, Raul Machado. 1986. “Reflexões sobre a Constituinte”. Revista de Informação Legislativa , 89: 5-32, jan./fev./mar. Brasília. [ Links ]

Justiniano I, Imperador do Oriente. 2005. Digesto de Justiniano. Tradução de Hélcio Maciel França Madeira. São Paulo. Revista dos Tribunais, Livro 1: Introdução ao direito romano/imperador do Oriente. [ Links ]

Kaplan, Marcos. 1999. “El Estado de derecho: una perspectiva histórico-estructural”. Boletín Mexicano de Derecho Comparado, 94. México, UNAM. https://revistas.juridicas.unam.mx/index.php/derecho-comparado/article/view/3576/4298 . Acesso em: 3 out. 2019. [ Links ]

Lobrano, Giovanni. 2006. “Dottrine dela ‘inesistenza’ dela costituzione e il ‘modello del diritto pubblico romano’”. Dirito@Storia: Rivista Internazionale di Scienze Giuridiche e Tradizione Romana, Sássari, 5. http://www.dirittoestoria.it/5/Memorie/Lobrano-Inesistenza-costituzione-modello-diritto-pubblico-romano.htm . Acesso em: 3 nov. 2020. [ Links ]

Lobrano, Giovanni. 2016. “Mezzi per la difesa della libertà” e “forme di governo”, em Segundas Jornadas Ítalo-Latinoamericanas de Defensores Cívicos y Defensores Del Pueblo. Università di Torino Dipartimento di Giurisprudenza Instituto Latinoamericano del Ombudsman-Defensor del Pueblo Unità di Ricerca ‘Giorgio La Pira’ del CNR Università di Roma ‘La Sapienza’ Tribunado: Poder Negativo y Defensa de Los Derechos Humanos en Homenaje al Profesor Giuseppe Grosso, Torino 8-9. [ Links ]

Maranca, Filippo Stella. 1982. Il Tribunato dela Plebe: dalla “Lex Hortensia” alla “Lex Cornelia”. Con una nota di lettura di Gérard Boulvert. Napoli. Jovene. [ Links ]

Meira, Silvio Augusto de Bastos. 1983. “O tribunato da plebe em face do direito romano”. Informativo Legislativo, 20: 80; 383-400. Brasília. [ Links ]

Mello, Francisco Ignácio Marcondes Homem de (Barão). 1863. A Constituinte perante a história. Rio de Janeiro. Typographia da Actualidade. [ Links ]

Miranda, Francisco Cavalcanti Pontes de. 1938. Comentários a Constituição Federal de 10 de novembro de 1937. Rio de Janeiro. Pongetti. [ Links ]

Miranda, Francisco Cavalcanti Pontes de. 1967. “Comentários a Constituição de 1967”. Revista dos Tribunais, 1. São Paulo. [ Links ]

Octaciano, Nogueira. 2015. 1824. 3a. ed. Brasília. Senado Federal. Coordenação de Edições Técnicas (Coleção Constituições Brasileiras, 1). [ Links ]

Oliveira, Eduardo Romero de. 2005. “A ideia de império e a fundação da monarquia constitucional no Brasil (Portugal-Brasil, 1772-1824)”. Tempo, 18: 43-63. Rio de Janeiro. http://www.scielo.br/pdf/tem/v9n18/v9n18a03. Acesso em: 13 jan. 2019. [ Links ]

Paricio, Javier e Barreiro, A. Fernander. 2014. História del derecho romano e su recepción europea. 10a. ed. Madrid. Marcil Pons. [ Links ]

Pilati, José Isaac. 2017. Audiência pública na Justiça do Trabalho. 2a. ed., Rio de Janeiro. Lumen Juris. [ Links ]

Poletti, Ronaldo Rebello de Britto. 1994. “Repercussão do direito público romano no constitucionalismo brasileiro”. Colóquio Russo-Latino de História do Direito Público Romano: Tribunato e Constituição. Moscou, 30 de maio a 1o. de junho 1994. Rivista Internazionale di Scienze Giuridiche e Tradizione Romana. http://www.dirittoestoria.it/iusantiquum/articles/polet.pdf. Acesso em: 10 nov. 2019. [ Links ]

Poletti, Ronaldo Rebello de Britto. 2006. “Otaviano Augusto: o imperium Populi: o império do Brasil”. Panóptica, Vitória, ano 1, 2: 60-72. http://www.panoptica.org/seer/index.php/op/article/view/Op_1.2_2006_60-72 . Acesso em: 14 jan. 2019. [ Links ]

Poletti, Ronaldo Rebello de Britto. 2007. Elementos para um conceito jurídico de império. 2007. 315 f. Tese (Doutorado em Direito). Brasília. Universidade de Brasília. http://repositorio.unb.br/handle/10482/2186 . Acesso em: 16 jan. 2019. [ Links ]

Poletti, Ronaldo Rebello de Britto. 2015. 1934. 3a. ed. Brasília. Senado Federal. Coordenação de Edições Técnicas. Coleção Constituições Brasileiras, 3. [ Links ]

Poletti, Ronaldo. 1986. “A Constituição de 1934”. Revista de Informação Legislativa , 23, 89: 63-102, jan./fev./mar. Brasília. [ Links ]

Poletti, Ronaldo. 2005. “Assembleias populares e democracia direta”. Tavares, Ana Lúcia de Lyra, Camargo, Margarida Maria Lacombe e Maia, Antônino Cavalcanti (orgs.). Direito público romano e política. Rio de Janeiro. Renovar: 79-90. [ Links ]

Porto, Walter Costa. 2015. 1937. 3a. ed. Brasília. Senado Federal. Coordenação de Edições Técnicas. Coleção Constituições Brasileiras, 4. [ Links ]

Rodrigues, José Honório. 1969. Theoria da história do Brasil: introdução metodológica. 3a. ed. São Paulo. Companhia Editora Nacional. [ Links ]

Rodrigues, José Honório. 1974. A Assembléia Constituinte de 1823. Petrópolis. Vozes. [ Links ]

Rousseau, Jean-Jacques. “O contrato social”. Morris, Clarence (org.). 2002. Os grandes filósofos do direito: leituras escolhidas em direito. São Paulo. Martins Fontes. [ Links ]

Santos, Carlos e Maximiliano, Carlos. 2005. Comentários à Constituição brasileira de 1891. Edição fac-similar. Brasília. Senado Federal. [ Links ]

Tafaro, Sebastiano. 2011-2012. “Democrazia e controllo del potere”. Diritto @ Storia: Rivista Internazionale di Scienze Giuridiche e Tradizione Romana , 10. http://www.dirittoestoria.it/10/contributi/Tafaro-Democrazia-controllo-po tere.htm . Acesso em: 12 dez. 2019. [ Links ]

Valditara, Giuseppe. 2008. Lo stato nell’Antica Roma. Soveria Manelli. Rubbettino. [ Links ]

Vasconcellos, Zacarias de Góes e. 1862. Da natureza e limites do poder moderador. 2a. ed., Rio de Janeiro. Laemmert. [ Links ]

Vianna Filho, Luís. 1975. O governo Castelo Branco. 2. ed. Rio de Janeiro. José Olympio. [ Links ]

Vianna, Hélio. 1970. História do Brasil. 8a. ed. São Paulo, Melhoramentos, 2: Monarquia e República. [ Links ]

Vieira, Reginaldo de Souza. 2010. Partidos políticos brasileiros. Criciúma. Unesc. [ Links ]

1 Tratando-se das criações constitucionais realizadas na ocasião da independência da América do Sul, verifica-se, dentre outras influências, forte apelo a Rousseau (2002, cap. V, Livro Quatro), que resgatou muito da experiência constitucional da antiga “República dos Romanos”, em especial o uso do instituto jurídico do Tribunato da Plebe, como forma de resistência a governos tidos como representantes do povo (Lobrano 2016, 24; Catalano 1977, 454).

2O periodo republicano brasileiro é tradicionalmente dividido em três períodos: 1) República velha, de 1889 a 1930; 2) República nova ou Era Vargas, de 1930 a 1945; 3) República contemporânea, de 1945 até os dias atuais. Não obstante isso, faz-se um recorte neste último periodo, excluindo desta análise a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que demandaria outro tipo de análise.

3Não houve previsão jurídica nas Ordenações Filipinas, vigentes em território brasileiro de 1603 até o Código Civil de 1916, pois o patriarca deveria manter a ordem em sua família, mas sem um poder jurídico tão explícito quanto na Antiguidade. Todavia, isso não significa que, em razão da distância entre as propriedades e da natureza da colonização, tal poder se demonstrasse maior do que o texto legal previsse.

4Os donatários (também chamados de capitães ou governadores) eram chefes de guerra e se obrigavam à defesa interna e externa de suas capitanias e, recebendo ínfima porção destas, deviam distribuí-las entre outros cristãos (Faoro 1958, 54).

5Para Pontes de Miranda (1967, 343), o Brasil nasceu sendo uma mescla de medieval (religião, direito de propriedade e dominação) e algo moderno, dos séculos XVI e XVII, uma vez que, ao não ser inicialmente uma colônia como as africanas, havia, pelo regime das capitanias, certa ligação, como súdito e extensão da própria metrópole.

6Toda a legislação da Metrópole foi mantida até 1831, para se tentar traçar (de cima para baixo) a harmonização teórica entre a nova dinastia e os anseios populares (Faoro 1958, 142-143).

7Para Bonavides (2000, 165), a identidade e independência brasileira “[...] tinha raízes nas lutas coloniais de expulsão dos invasores, passava pela Inconfidência e subia de ponto nos sucessos da Revolução Pernambucana de 1817 até chegar ao momento culminante da Assembléia Nacional Constituinte”.

8O sustentáculo teórico desta delegação ao Imperador pode-se encontrar no entendimento de que a nação não poderia representar-se a si própria e que seria necessária uma fiscalização sobre os abusos dos demais poderes, por meio da direção da soberania política ao Imperador (Faoro 1958, 147, 185).

9Pela Lei 234, do 23 de novembro de 1841, o título também foi concedido a dom Pedro II.

10A Constituição de 1824 foi a que mais perdurou no constitucionalismo brasileiro e, sendo escrita, somente não superava em antiguidade o texto constitucional norte-americano; alguns autores atribuem sua durabilidade à possibilidade de ser adaptável a qualquer circunstância política (Octaciano 2015, 9-11). Todavia, não se pode ignorar a seguinte conclusão de Vieira (2010, 166, grifos do autor): “Ao investigar a história partidária no Período Colonial e Imperial, percebeu-se que não se pode denominar as organizações que lutaram pela independência ou a manutenção do vínculo com a Coroa Portuguesa, ou as facções que buscavam os favores da Coroa Brasileira como partidos políticos. Eram acima de tudo organizações de homens, sem vínculos programáticos e ideológicos. A existência delas dependia da vontade do Imperador, o qual, através de seu Poder Moderador, era quem verdadeiramente exercia o poder de decisão política. As maiorias ou minorias no Parlamento eram constituídas de acordo com o interesse do Monarca”.

11O que se comprova ao se verificar que o poder moderador não foi causa, mas consequência do Império brasileiro (Faoro 1958, 198), e que tal poder não pôde ser exercido nas mesmas condições pelos Regentes, após a abdicação de D. Pedro I, pelo que muitos consideram que foi a Regência o prelúdio da República brasileira (Vianna 1970, 133).

12Segundo Barreto (1977, 140), jurista da época do Império, “soberania não é um direito, é um fato. Quem diz soberania, diz poder supremo, absoluto, independente; e dizer-se isto é o mesmo que dizer força absoluta, irresistível. Soberania e força são termos correlatos. Onde há força, há soberania; onde falta força, a soberania é frase, é nula”.

13A espécie de mecanismo de equilíbrio entre os outros poderes do Estado apareceu no livro de Benjamin Constant, de Direito constitucional; todavia o autor suíço confessa que a ideia não lhe era original, mas sim de Clermont-Tonerre (Franco e Pila 1999, 27).

14Defendeu-se que o próprio povo brasileiro demoraria para ter confiança em si mesmo, a fim de atingir o self-government dos ingleses, o que impediria, naquele momento, a adoção da tripartição de poderes (Barreto 1977, 89).

15 Faoro (1958, 199), ao tecer consideração sobre as atuações de D. Pedro II, que parecia se posicionar acima de qualquer interesse pessoal, mas utilizando suas convicções pessoais: “Nume tutelar do povo, árbitro das dissenções e lutas, juiz dos movimentos econômicos e políticos —assim se caracterizava a vontade augusta. [...] Não lhe importou a consideração de desorganizar ou aniquilar a agricultura; o trono era mais poderoso que a estrutura econômica do país— a superestrutura comandava, soberanamente, o ritmo da infraestrutura. Toda a autoridade emanava do calor irradiado da Coroa; [...] Quem afrontasse a opinião augusta tornava-se ‘incompatível’, arruinando as possibilidades de ascensão”.

16Segundo Oliveira (2005, 49), “as concepções de poder político, de sociedade e de Estado são assim formuladas em torno da noção de império civil, com a finalidade de legitimar a monarquia portuguesa e consubstanciar projetos de atuação política”.

17O imperium (Império) foi o poder máximo na república romana.

18Quando os plebeus sofriam uma grave penalidade, havia um magistrado que se chamava “Tribuno da Plebe” que tinha o poder de auxiliar a ordem plebeia. Utilizava a intercessio contra um decreto ou o auxilium, após um apelo de um plebeu ao Tribunato e, posteriormente, chegou a beneficiar até mesmo patrícios. Entretanto, era utilizado o auxilium muito mais nos processos criminais, na pronúncia ou após a sentença (Maranca 1982, 83; Meira 1983, 394; Valditara 2008, 116).

19“Soberania do povo” seria um conceito teológico-metafísico, que desconsideraria o que os romanos definiram como maiestas (princeps legibus solutus est) (Barreto 1977, 142).

20Na verdade, a questão central, proposta por Vasconcellos (1862, 254), era sobre o Brasil poder “reger-se a si mesmo”. Conclui o autor que, se a resposta fosse negativa, dever-se-ia abandonar a Carta de 1824. Em caso positivo, o regime parlamentar estabelecido deveria ser respeitado.

21D. Pedro II tentou por diversas formas transferir seu carisma pessoal para seu genro e filha, mas sem sucesso (Santos 2005, 59-68; Baleeiro 2015, 11-13; Nabuco 1949; Octaciano 2015, 35).

22Fruto da união de três anteprojetos, o Ministro Rui Barbosa elaborou revisão minuciosa, quando melhorou sua redação e modificou sua estrutura (Vianna 1970, 224).

23“Artigo 42. Se no caso de vaga, por qualquer causa, da Presidência ou Vice-Presidência, não houverem ainda decorrido dois anos do período presidencial, proceder-se-á a nova eleição” (Brasil 1981).

24“Artigo 43. O Presidente exercerá o cargo por quatro anos, não podendo ser reeleito para o período presidencial imediato. § 1º O Vice-Presidente que exercer a Presidência no último ano do período presidencial não poderá ser eleito Presidente para o período seguinte” (Brasil 1981).

25Muito da força militar estava com os proprietários de terras, que formavam a Guarda Nacional, por meio da Lei de 18 de agosto de 1831 —que extinguiu os corpos de milícias, guardas municipais e ordenanças—, mas, como esse poder também lhes havia sido delegado, não lhes era originário. Portanto, aquela força retornou, gradativamente, ao Estado que se fez republicano.

26O movimento que depôs o Presidente Washington Luís preparou a tomada de poder pelo seu líder, Getúlio Vargas, em 3 de novembro de 1930. Por meio do artigo 1o. do Decreto 19.398, de 11 de novembro de 1930, estabeleceu-se que o governo provisório exerceria “[...] discricionariamente, em toda sua plenitude, as funções e atribuições, não só do Poder Executivo, como também do Poder Legislativo, até que, eleita, a Assembleia Constituinte estabeleça esta a reorganização constitucional” (Brasil 1930). Sendo dissolvidas as casas parlamentares federais, estaduais e municiais, nomearam-se interventores federais nos Estados e nos Municípios, a fim de acabar com a “política dos governadores”, enfraquecer “excessos do federalismo” e os dissídios partidários (Vianna 1970, 284, 287).

27A demora na reconstitucionalização e a reação contra interventores federais causaram a fratricida Revolução Constitucionalista de São Paulo, de julho a setembro de 1932 (Vianna 1970, 285).

28Assinaram o Decreto Getúlio Vargas, Francisco Campos, José Fernandes, Leite de Castro, Oswaldo Aranha, Protógenes P. Guimarães, Afrânio de Melo Franco, Joaquim Pedro Salgado Filho, Mário Barbosa Carneiro, Fernando Augusto d’Almeida Brandão.

29“Não será difícil, a partir dos nomes da Comissão, desenhar o conteúdo ideológico dos debates, que poderiam ir desde uma inclinação fascista, presente nos espíritos revolucionários mais jovens, até uma postura fortemente esquerdista. Mas de feição democrática, na presença de João Mangabeira, jurista, orador brilhante e cultor de Rui Barbosa. Góes Monteiro exprimia um nacionalismo militarista. Desconfiado das tradições liberais e da técnica da democracia clássica. Oliveira Vianna, discípulo de Alberto Torres, vinha impregnado de concepções sociológicas de cunho aristocrático e autoritário e revelava a grande crítica à República, cuja Constituição lhe parecera distante da realidade nacional. Como Alberto Torres, era também um desiludido com a forma adotada pela República. José América e Oswaldo Aranha tinham aspirações a uma justiça social fundada num Estado forte, à moda européia. Antônio Carlos indicava o equilíbrio, que de forma candente iria manifestar-se na presidência da Constituinte. Themistocles Cavalcante estava no início de sua brilhante carreira, como cultor do direito público. Arthur Ribeiro era magistrado, membro do Supremo Tribunal Federal. Carlos Maximiliano, nome que dispensa qualquer comentário, já havia sido Consultor-Geral da República e era uma grande expressão da Ciência do Direito no Brasil. Mais tarde. à Comissão vieram integrar-se Castro Nunes, Agenor de Roure e Oto Prazeres” (Poletti 1986, 73).

30Conforme se verifica nos incisos II, III e V, do artigo 91 da Constituição de 1934, ao Senado competia: “II. Examinar, em confronto com as respectivas leis, os regulamentos expedidos pelo Poder Executivo, e suspender a execução dos dispositivos ilegais; III. Propor ao Poder Executivo, mediante reclamação fundamentada dos interessados, a revogação de atos das autoridades administrativas, quando praticados contra a lei ou eivados de abuso de poder; V. Organizar, com a colaboração dos Conselhos Técnicos, ou dos planos dos Conselhos Gerais em que eles se agruparem, os planos de solução dos problemas nacionais” (Brasil 1934).

31Pôde-se no início da década de 1930 “[...] realizar a convivência dos fatores políticos (a revolução) com a inteligência constitucional brasileira (a Comissão do Itamaraty e os ilustres da Constituinte) [...]” além de se conseguir “[...] conciliar tendências as mais variadas no ambiente político nacional, sem perda do conteúdo e da eficiência técnico-juridica”. Entretanto, seus dispositivos não impediram chegada de 1937, permanecendo como “[...] um repositório valioso de temas constitucionais e como um marco relevante de nosso constitucionalismo republicano” (Poletti 1986, 100).

32Sob o argumento de um plano comunista para a tomada do poder no Brasil, gestou-se o plano do Estado Maior Militar Getulista, que adentrou o país em uma ditadura, na qual a organização político-partidária foi proibida; foi até mesmo vetada a instituição de um partido de caráter fascista que pretendeu fazer frente ao estamento militar brasileiro (Vieira 2010, 167).

33Conforme a Carta de 1937: “Artigo 186. É declarado em todo o País o estado de emergência. Artigo 187. Esta Constituição entrará em vigor na sua data e será submetida ao plebiscito nacional na forma regulada em decreto do Presidente da República” (Ferreira 2003, 109).

34Conforme o texto de 1937: “Artigo 12. O Presidente da República pode ser autorizado pelo Parlamento a expedir decretos-leis, mediante as condições e nos limites fixados pelo ato de autorização; artigo 13. O Presidente da República, nos períodos de recesso do Parlamento ou de dissolução da Câmara dos Deputados, poderá, se o exigirem as necessidades do Estado, expedir decretos-leis sobre as matérias de competência legislativa da União, excetuadas as seguintes [...]” (Brasil 1937).

35Conseguida, sem guerrilhas, a saída do chefe do Executivo, Getúlio Vargas, que ocupou como líder pessoal o poder por quase quinze anos, a Lei 16, do 30 de novembro de 1945 (Brasil 1945b), revogou o artigo 186, que declarava o estado de sítio em todo o país. (Miranda 1967, 315)

36Ressalte-se que o texto de 1934 foi utilizado pelas subcomissões que recebiam seus textos de forma parcial, para elaborar o chamado “projeto primitivo”, exposto em 27/5/1946, que, após 4.000 emendas gerou o “projeto revisto”, publicado em 8/8/1946, que, por sua vez, deu origem à Constituição de 1946.

37Determina o artigo 36, § 2º, do texto constitucional de 1946: “São Poderes da União o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, independentes e harmônicos entre si. [...] § 2ºÉ vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições” (Miranda 1967, 274).

38 Freyre (2006) ressalta que a unidade das colônias portuguesas se manteve por meio do catecismo, das Ordenações, da liturgia católica e da língua portuguesa, e que, desde a colonização, tolerou-se o regionalismo, porém, jamais se tolerou o separatismo. Segundo Pontes de Miranda (1967, 334) o universalismo português gerou a catequese mais eficiente de todas, não necessitando apelar a morticínios, como os espanhóis realizaram com os judeus em 1547.

39A exclusão da jurisprudência e da doutrina como fontes jurídicas por juristas do início do século XX encontra suporte em motivos de interpretação constitucional, a fim de não lesionar sustentação do Estado moderno, cuja coluna está no princípio da divisão de poderes (Grossi 2004, 117).

40Ao controle ministerial da União, de sua administração indireta, uniu-se o controle maior da atuação dos atos de prefeitos e vereadores, por meio do Decreto-Lei 201, do 27 de fevereiro de 1967 (Brasil 1967c), que tipificou com maior rigor condutas criminosas de agentes públicos municipais e revogou a Lei 3.528, do 3 de janeiro de 1959, que, em seu artigo 4o., parágrafo único, estabelecia: “Quando não dispuser de outra forma a legislação estadual, o Julgamento incumbirá à Câmara dos Vereadores, que só poderá proferir sentença condenatória pelo voto de dois têrços dos seus membros; e da sentença caberá recurso de oficio, com efeito suspensivo, para a Assembléia Legislativa”.

41Pela redação original: “Artigo 1o. Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista, de sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos” (Brasil 1965a).

42Conforme disposto na Lei 4.717/1965: “Artigo 2o. São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência” (Brasil 1965a).

43A Lei 7.170, do 14 de dezembro de 1983 —vigente (Brasil 1983)— revogou a Lei 6.620, do 17 de dezembro de 1978, que havia substituído o Decreto-Lei 898, do 29 de setembro de 1969, que, por sua vez, havia revogado o Decreto-Lei 314, do 13 de março de 1967, primeira Lei de Segurança Nacional do regime militar que se iniciou em 1964.

Recebido: 26 de Fevereiro de 2020; Aceito: 23 de Novembro de 2020

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons