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Boletín mexicano de derecho comparado

versão On-line ISSN 2448-4873versão impressa ISSN 0041-8633

Bol. Mex. Der. Comp. vol.52 no.155 Ciudad de México Mai./Ago. 2019  Epub 28-Fev-2021

https://doi.org/10.22201/iij.24484873e.2019.155.14959 

Estudos legislativos

Ensaio crítico sobre os meios alternativos de resolução de conflitos*

Eugênio Facchini Neto** 
http://orcid.org/0000-0001-9978-886X

**Doutor em Direito Comparado pela Università Degli Studi di Firenze/Itália; Professor titular dos cursos de graduação, Mestrado e Doutorado da Escola de Direito da PUC/RS, em Porto Alegre/Brasil; Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul/Brasil. Correo electrónico: facchini@tjrs.jus.br, eugenio.facchini@pucrs.br.


Sumário: I. Introdução. II. Origem do movimento. Objetivos e Ideologia. III. A experiência europeia. IV. O caso norte-americano. As primeiras experiências. V. Tipologia básica das ADR. VI. Dimensão subjetiva das ADR. Quem são os atores? VII. Técnicas de ARD endoprocessuais e extraprocessuais. VIII. Alterações legislativas mais recentes. IX. Argumentos favoráveis ao movimento das ADR. X. Críticas ao movimento das ADR. XI Considerações finais. XII. Referências bibliográficas.

I. Introdução

Uma das queixas mais comum, frente à justiça tradicional, numa escala quase que planetária, é no sentido de ser demasiadamente cara e lenta para poder fazer frente ao aumento das demandas judiciais. Isso explica porque boa parte dos conflitos nem mesmo chega ao sistema judiciário formal. Ou as demandas simplesmente não são ajuizadas, ou as partes procuram outras formas de dirimir seus conflitos.

Permanência e generalização das queixas fizeram com que surgisse um interesse crescente nas últimas décadas pela busca de alternativas ao modelo judicial tradicional. Embora universal, o fenômeno é mais nítido e perceptível no cenário norte-americano. Lá, mais do que em qualquer outro país, é acentuada a tendência de se implementar meios alternativos de resolução de litígios, denominados genericamente de A.D.R. - Alternative Dispute Resolution, expressão cujo sentido pode ser traduzido como “meios alternativos de resolução de conflitos”.

Este ensaio tem por objetivo expor algumas experiências que vêm sendo vivenciadas em diversos países, com destaque especial aos Estados Unidos, e que não são tão difundidas entre nós. Advirta-se que o estudo não é laudatório. Procura-se a neutralidade na exposição, buscando-se a descrição de uma situação, com a menção aos seus resultados positivos, mas também com referência às críticas que se fazem a tal sistema.

Nos próximos capítulos, discorrerei sobre a origem do movimento, seus objetivos, a ideologia subjacente, a experiência europeia, a norte-americana, os principais tipos de meios alternativos em uso nos Estados Unidos, os argumentos favoráveis e a crítica que se faz a essa tendência.

Ao final, dedicarei algumas reflexões sobre a experiência brasileira nessa área, discorrendo sobre a arbitragem e a mediação, bem como sobre o impacto do novo código de processo civil sobre o tema.

II. Origem de movimento. Objetivos e ideologia

Em 2003, a Universidade de Florença promoveu um seminário internacional sobre meios alternativos de resolução de conflitos. Dos relatórios nacionais então apresentados, extraiu-se a conclusão de que havia uma “crescente incapacidade dos sistemas institucionais de administração da justiça civil para fazer frente à demanda de justiça proveniente dos mais diversos sujeitos, sobre matérias diversificadas e novas, incapacidade essa devida aos limites da justiça estatal, normalmente ineficiente, custosa e incerta, e talvez não apta, em alguns setores, a garantir uma satisfatória composição das lides” (Varano 2007, XI/XII).

Dentre os fatores principais que explicam a expansão do movimento em direção a formas conciliadoras de solução de controvérsias, lembrados por D. Smith (1978, 142), destacamos dois:

  • 1) A dificuldade de acesso à justiça ordinária pelos mais carentes, e o custo e duração do processo ordinário para aqueles que podem pagar por tal acesso.

  • 2) Uma crescente insatisfação com o formalismo e tecnicismo imperante no ambiente judiciário, conjuntamente com a valorização de um papel mais ativo das próprias partes na tomada de decisões que dizem respeito à sua vida privada.

Esta espécie de ‘fuga da jurisdição’ em direção a formas alternativas de resolução de conflitos não segue um paradigma único. Ao contrário, são diversificadas as experiências em curso.

Frequentemente estas iniciativas são descritas com expressões diversas. Cada uma delas tende a por em evidência um ou outro aspecto que se entende mais relevante; fala-se, assim, em A.D.R. (Alternative Dispute Resolution) como técnica de “justiça informal” (para sublinhar sua simplicidade), ou então se fala em “procedimentos sumários” (para destacar sua celeridade), ou então de procedimentos que facilitam o “acesso à justiça” (para realçar sua reduzida onerosidade ou até a sua gratuidade), ou então como uma espécie de “justiça menor” (apontando para o fato de que esses meios alternativos se ocupam de questões de módico valor).

O que unifica todas essas experiências é o objetivo comum: trata-se de resolver litígios com o uso de técnicas processuais simplificadas, menos custosas e mais céleres (Alpa 1997, 291-292).

Vittorio Denti (1980, 492) identifica duas tendências relativamente ao movimento em direção a formas alternativas de resolução de litígios: uma tendência à desformalização e outra tendente à deslegalização.

Quanto à primeira tendência -no sentido de uma desformalização-, funda-se ela na tomada de consciência no sentido de que a acentuação das garantias formais no direito processual civil contemporâneo conduziu a um aumento do custo e da duração do processo, “tornando-o um instrumento inadequado para certos tipos de lide que exigem uma rápida intervenção na composição dos conflitos”. Por outro lado, também é consensual a constatação de que é “impossível resolver o problema do acesso à justiça dos jurisdicionados carentes através do aumento generalizado de assistência judiciária gratuita”, por causa do seu custo intolerável. Além disso, segundo Denti, o aumento quantitativo e a maior complexidade do trabalho do juiz moderno não podem ser enfrentados mediante o simplório aumento constante do quadro de magistrados. Há limites orçamentários não ultrapassáveis, diante da necessidade do Estado social contemporâneo direcionar os recursos limitados para obras sociais que aliviem o presente e transformem o futuro (educação, saúde, saneamento básico, obras de infraestrutura, etc), em vez de aumentar ilimitadamente a verba direcionada a um setor do Estado que se ocupa em dirimir conflitos passados. Ou seja, exige-se que haja ganho de eficiência, fazendo-se mais e melhor com a verba orçamentária disponível. Essa é outra razão pela qual se sustenta que a diminuição do volume de trabalho dos magistrados deve passar também pela composição extrajudicial de lides de menor complexidade, reservando-se o recurso à justiça tradicional, com suas inerentes garantias, às causas de maior importância e complexidade (Harzheim e Facchini 2016).

A outra tendência apontada por Denti (1980, 422) -aquela referente à delegalizzazione das controvérsias- não é um fenômeno propriamente novo. Realmente, diz ele, “na origem da criação dos ‘escritórios de paz e de conciliação’ (bureaux de paix et de conciliation), logo após a Revolução francesa, encontrava-se a fé iluminista na razão natural do homem em desfavor da artificial reason dos juristas e dos juízes”, bem como uma desconfiança em relação à profissão forense e ao mundo dos juristas. Deslegalização significa, nesse contexto, desde as origens históricas do fenômeno, a busca de uma solução não legalista das controvérsias, e, portanto, com maior ênfase na prevalência da composição da lide do que na definição do certo e do errado (Alpa 1980, 426-427; Harzheim e Facchini 2016).

Em suma, como afirma E. Silvestri (1999b, 327-328):

A difusão dos métodos alternativos do tipo conciliatório representa uma evidente rejeição da ‘cultura da decisão’ em proveito daquela que se poderia definir como uma ‘cultura do compromisso’. A tendência em direção à deregulation atinge também a administração da justiça: ao processo visto como instrumento através do qual são implementados os valores incorporados nas normas do ordenamento, prefere-se uma ‘gestão privada’ da solução das controvérsias. Isto significa que é reconhecida às partes uma substancial liberdade para escolher seja o procedimento tido como o mais adequado para atingir um acordo, seja o conteúdo em si do acordo. Nesse contexto, a autonomia privada pode permitir às partes a definição da controvérsia de acordo com critérios mais flexíveis, não suscetíveis de serem adotados por um juiz, vinculado que está ao princípio da legalidade.

Se é um menor rigorismo e formalismo que se deseja, então se poderia pensar seriamente em uma reforma processual que concedesse uma maior flexibilidade ao juiz para conduzir o processo, adotando-se efetivamente um modelo de tutela diferenciada de resolução de litígios. Além disso, poder-se-ia permitir ao juiz faculdades mais amplas de uso da equidade (o Código Civil brasileiro de 2002 acolheu essa tendência),1 além de incentivá-lo a aplicar a lei com maior liberdade interpretativa, não só quanto à resolução do conflito mas igualmente em relação ao próprio procedimento, com a adoção de mecanismos adequados de materialização do processo e sumarização da jurisdição.

Outro campo propício à expansão de um modo consensual de resolução de conflitos é aquele que os sociólogos chamam de “total institutions”, isto é, instituições como escolas, hospitais, grandes empresas, ofícios burocráticos, condomínios, nas quais as pessoas são compelidas a conviver juntas e a manter contato diário com seus colegas, vizinhos, etc. Em tais situações, a técnica da chamada avoidance (to avoid = evitar), ou seja, o afastamento daqueles ambientes quando surge um conflito importante, é mais difícil, às vezes impossível, pois envolveria a necessidade de mudar de trabalho, profissão, escola, cidade ou bairro, etc. -alternativas essas que não se podem adotar tão facilmente. Nestes casos, torna-se evidente que uma solução em moldes tradicionais do conflito, no sentido de examinar retrospectivamente o litígio e indicar qual das partes tem razão e quem está errado, em vez de resolver o conflito, acaba por exacerbá-lo ainda mais. A solução melhor, em tais condições, é a que olhe o conflito em termos prospectivos, mirando o futuro, buscando manter as relações pessoais e serenar os espíritos por meio de uma conciliação.

Um dos meios alternativos de resolução de conflitos mais em voga no direito comparado é a mediação.2 Cornu e Foyer (1996, 54) explicam que a mediação representa um ‘apelo à participação’, no sentido que o mediador não tem nem o poder, nem o dever de resolver o conflito. Sua tarefa é aquela de auxiliar as partes a elaborar um projeto próprio de solução do conflito, ou, no máximo, ajudá-las a identificar os pontos de desacordo insuperáveis. Evidentemente que isso pressupõe que as partes estejam dispostas a encontrar uma solução para seu conflito em bases cooperativas.

De acordo com Christopher W. Moore (1998, 324), numa perspectiva internacional, “sistemas que utilizam a mediação têm sido desenvolvidos para lidar com grandes números de disputas de emprego, acusações de discriminação, queixas de consumidores e controvérsias ambientais”.

O sucesso da mediação depende muito da posição do mediador relativamente às partes. Quanto maior for sua autoridade, tanto maior será a probabilidade de êxito da composição amigável. Por outro lado, se é verdadeiro que o conhecimento das normas jurídicas não é tão relevante quanto no sistema tradicional de justiça, permanece o fato de que as regras jurídicas desempenham um grande papel para o esclarecimento da matéria controvertida. Da conjugação destes dois fatores resulta que o juiz é considerado quase sempre como o melhor mediador (Cappelletti 1993, 54), desde que tenha uma preparação adequada para desempenhar tal papel (Harzheim e Facchini 2016).

De fato, as experiências norte-americana e alemã mostram que as perspectivas de uma resolução consensual são muito mais favoráveis quando é o próprio juiz encarregado de resolver o conflito que indica às partes os possíveis desenlaces para o conflito (Shlosser 1995,1021).

A seguir, veremos algumas experiências em curso no direito comparado.

III. A experiência europeia

Observa-se uma preocupação específica com a proteção do consumidor no âmbito da União Europeia (Chiarloni 1995, 135), como se percebe do memorandum apresentado pela Comissão europeia ao Conselho da Europa, em 4 de janeiro de 1985 (“A proteção jurídica dos consumidores”, suplemento 2/75 do Boletim da Comissão Europeia, Luxemburgo, 1985). Parte-se da premissa que se deve garantir aos consumidores uma eficiente tutela de seus direitos fundamentais conexos a relações de consumo, com especial ênfase à proteção da saúde. Ressaltou-se, em tal documento, que o reconhecimento de tais direitos não é pleno se não for efetivo, e que a efetividade só é alcançada se for facilitado o acesso à justiça. O memorando divide a matéria em quatro perspectivas: a disponibilização de procedimentos judiciais simplificados, o reconhecimento de legitimação processual a entidades representativas de interesses difusos e coletivos, maior uso de técnicas de conciliação e arbitragem, e criação de centros de assessoria jurídica. As propostas do conhecido memorando foram acolhidas pelo Conselho da Europa com a resolução de 25 de junho de 1987. Mais tarde, em 1993, a Comissão europeia aprovou o chamado “Livro Verde” dispondo sobre o acesso dos consumidores à justiça, prevendo o uso harmônico e não excludente de procedimentos judiciais e extrajudiciais (Alpa 1997, 299).

Em 1999, na reunião de Tampere, o Conselho da Europa convidou os países membros a instituir procedimentos extrajudiciais para garantir um melhor acesso à justiça. Em razão disso, a Comissão da União Europeia apresentou, em 2004, uma proposta de diretiva a esse respeito, com ênfase no mecanismo da mediação. Tal proposta foi aprovada em março de 2007, pelo Parlamento Europeu e resultou na Diretiva n. 52, de 21 de maio de 2008, que define mediação como um processo estruturado no qual duas ou mais partes em litígio tentam, voluntariamente, alcançar por si mesmas um acordo sobre a resolução de seu litígio, com a ajuda de um mediador.

Ainda no âmbito internacional, os Principles of Transnational Civil Procedure, aprovados em conjunto pela American Law Institute e pelo UNIDROIT, em 2004, que pretendem ser um modelo para as legislações nacionais, também tratam do tema. O principle 24.2 dispõe que: “The court should facilitate parties’s participation in nonbinding alternative dispute-resolution procedures at any stage of the proceeding” (em tradução livre: “o juízo deverá facilitar a participação das partes em procedimentos alternativos de resolução de conflitos, de natureza facultativa, em qualquer estágio do procedimento”).

A partir de uma análise de direito comparado, constata-se que todos os ordenamentos contemporâneos procuraram resolver o problema da chamada ‘informal justice’. Todavia, os caminhos escolhidos nem sempre foram iguais. Nos sistemas romano-germânicos predominou a tentativa de enfrentar o problema com reformas processuais tendentes a simplificar o procedimento, encorajar soluções consensuais, ampliar tutelas cautelares e antecipatórias, aumentar os poderes do juiz para que ele possa agir no sentido de uma mais rápida solução do litígio e buscar o reequilíbrio processual de partes materialmente desiguais. Esses mecanismos endoprocessuais foram adotados com o intuito de manter sob o controle do judiciário o sistema de composição dos litígios, afastando-se do modelo norte-americano, que tendencialmente rompe com o modelo estatal de monopólio da jurisdição. Como variável, constata-se a uma revalorização do instituto da arbitragem.3

Inúmeros fatores atuam para frear o desenvolvimento de sistemas de informal justice na Europa. Antes de tudo, o peso de uma tradição milenar a favor da justiça togada. Em segundo lugar, o conexo mito da unidade da jurisdição, que faz ver com extrema desconfiança qualquer tentativa de erosão do monopólio atribuído aos juízes estatais. Um ulterior motivo, provavelmente o mais significativo, é o fato de que o procedimento formal regular dos sistemas judiciários europeus ocasiona menos problemas relativamente a custos e complexidade técnica, do que aquilo que acontece com o adversary system (Visintini 1996, 699) norte-americano (Harzheim e Facchini 2016).

P. Schlosser (1989, 1006-1008) refere que o movimento em direção a alternativas ao processo judicial é mais forte nos Estados Unidos do que na Europa porque aquele país, desde o final da segunda guerra mundial, é o principal mercado para as novas idéias, inclusive no campo jurídico. Além disso, o direito processual norte-americano, por causa da pretrial discovery, é bem mais custoso e demorado do que o congênere europeu. Em terceiro lugar, o fato de que, salvo exceções expressamente previstas em lei, não há previsão de ressarcimento de despesas processuais, ou seja, não é adotado o instituto da sucumbência em solo norte-americano. Ainda que vencendo a causa, a parte vencedora gasta ingentes somas que normalmente não lhe são reembolsadas. Em quarto e último lugar, o juiz de common law não está habituado a se envolver ativamente no processo. Em seu papel clássico, ele comporta-se como um árbitro neutro, somente levando em consideração o que as partes lhe apresentam. É verdade, porém, que as reformas mais recentes, especialmente nos últimos 25 anos, vêm sendo no sentido de tornar o juiz processualmente mais ativo, inclusive conferindo-lhe poderes conciliatórios. Mas também isso, porém, lá é visto como uma forma de alternative dispute resolution (endoprocessual, no caso) (Facchini 2014).

Por outro lado, não se pode esquecer que, nos Estados Unidos, aproximadamente 95% das causas são compostas diretamente pelas partes (ou melhor, por seus advogados), antes da sentença final. Assim, em realidade, o movimento em direção às ADR não significa tanto uma tentativa de “afastar as partes do ambiente forense, mas sim de compeli-las a uma mais precoce tentativa de resolução do litígio” já no início do processo. E isso para tentar evitar que o acordo seja alcançado apenas “on the courthouse steps” (nas escadarias do tribunal), somente depois que elevadas somas já tenham sido gastas na fase do pretria (Varano 2007, IX). Este elevado índice de extinção de processos por acordo alcançado pelas partes, antes da sentença, não se verifica em outros sistemas judiciários. Este contexto não pode ser desconsiderado em qualquer tentativa de imitar formas de ADR fora dos Estados Unidos (Harzheim e Facchini 2016).

No continente europeu o ritmo do desenvolvimento de sistemas de informal justice é muito mais lento e restrito a situações particulares, embora dando sinais de aceleração nos últimos tempos, como resultado de imitação da experiência norte-americana. Conflitos familiares, tutela dos trabalhadores e especialmente dos consumadores parece ser o setor em que o fenômeno é mais evidente (Facchini 2014).

Na Inglaterra, houve um recente impulso às formas alternativas à jurisdição. Inúmeras organizações envolvidas com procedimentos extrajudiciais foram criadas, como o Centre for Dispute Resolution (CEDR), o British Academy of Experts, a Chartered Institute of Arbitrators, o IDR Europe Limited (especializada em mediação), o Royal Institute of Chartered Surveyors, a Society for Construction Arbitrators, o Forum for Initiatives in Reparations and Mediation (FIRM), etc. (Cappelletti 1993, 293-294)

Ulterior impulso ocorreu após a grande reforma processual de 1998, que revolucionou o processo civil inglês com as Civil Procedure Rules (que substituíram as Rules of the Supreme Court, de 1965, e as County Court Rules, de 1981). Uma das alterações consistiu na introdução dos chamados “pre-action protocols”, com o declarado propósito de forçar as partes a tentarem acordos antes de proporem uma ação.

Na Alemanha, o aumento do volume de processos fez com que os Secretários de Justiça dos Estados (Länder), que são os responsáveis pela organização administrativa do sistema judiciário, buscassem estratégias para convencer os jurisdicionados a tentarem resolver suas disputas out of court. Segundo as estatísticas, tiveram sucesso na empreitada. Estima-se, por exemplo, que mais de 70% de todo o potencial contencioso civil relativo a seguros vem sendo resolvido fora do sistema ordinário de justiça, principalmente por atuação dos advogados e das companhias de seguro. Os modelos mais utilizados seriam aqueles da tradicional arbitragem e da conciliação extrajudicial. Na esfera judicial, a difusão do chamado Stuttgart Model permitiu uma sensível redução do tempo de tramitação dos processos, pois já em 1997 uma causa padrão estava sendo decidida numa média de seis a nove meses junto às cortes estaduais (Gottwald 1997).4 Interessante notar que a arbitragem, na Alemanha, está regulada amplamente no próprio Código de Processo Civil alemão (Zivilprozessordnung-ZPO), entre os parágrafos (como lá são denominados os artigos do código) 1.025 e 1.066. Merece destaque seu parágrafo 1.030, segunda seção, que refere ser nulo o acordo de arbitragem relativo a locações residenciais.

Uma área em que ocorreu um notável deslocamento em direção à mediação é aquela relativa aos conflitos familiares. Sirva de exemplo a figura do médiateur francês, que integra associações especializadas em tal setor, recebe uma preparação multidisciplinar específica e está submetido a um código deontológico próprio (Harzheim e Facchini 2016).

Segundo Loïc Cadiet (2007, 70), na França os Modes Alternatifs de Règlement des Conflits-MARC, como são lá chamados, começaram a surgir na metade da década de noventa e “são menos uma categoria jurídica e mais um estado de espírito” a designar “o conjunto de procedimentos dirigidos a uma solução amigável dos conflitos”. Explica o professor da Sorbonne que também na França dividem-se os MARCs em judiciais e extrajudiciais. Os judiciais abrangeriam a conciliação judicial, a mediação judiciária e a amigável composição judiciária. Já os MARCs extrajudiciais envolveriam a conciliação extrajudicial e a mediação extrajudicial, sendo que esta se subdividiria em mediação espontânea, mediação institucional e mediação instituída. Esta última sofreria uma ulterior subdivisão em mediação em matéria pública e mediação em matéria privada (com as variáveis: mediação individual e mediação coletiva).

Interessante notar que a lei francesa sobre mediação, que prevê que tal atividade deverá se desenvolver em ambientes criados apropriadamente para isso, denominados de “Maison de justice et du droit”, refere, em seu artigo 1º, que “La Maison de justice et du droit tend à revaloriser le droit et à faciliter son accès”, ou seja, através da mediação pretende-se a revalorização do próprio direito!

Em razão da Diretiva 58 da União Europeia, a Itália editou a Lei nº 69, de 18 de junho de 2009, que autorizou o autorizou o Governo a emitir Decreto Legislativo sobre mediação e conciliação em matéria civil e comercial, observando as prescrições emanadas do Direito Comunitário.

Tal Regulamento foi publicado o Decreto Legislativo nº 28/2010, que traz os seguintes conceitos:

Art. 1 Definizioni. 1. Ai fini del presente decreto legislativo, si intende per:

a) mediazione: l’attivita, comunque denominata, svolta da un terzo im-parziale e finalizzata ad assistere due o piu’ soggetti sia nella ricerca di un accordo amichevole per la composizione di una controversia, sia nella formulazione di una proposta per la risoluzione della stessa;

b) mediatore: la persona o le persone fisiche che, individualmente o colle-gialmente, svolgono la mediazione rimanendo prive, in ogni caso, del potere di rendere giudizi o decisioni vincolanti per i destinatari del servizio medesimo;

c) conciliazione: la composizione di una controversia a seguito dello svol-gimento della mediazione

Para manter o foco, deixarei de analisar a situação na América Latina, limitando-me a referir que a Argentina dispõe, desde outubro de 1995, de uma interessante Ley de Mediación y Conciliación Civil y Comercial (Ley 24573), cujo art. 1º impõe genericamente a obrigação das partes submeterem-se à mediação prévia (‘con carácter obligatorio’) antes de ajuizaram uma ação. No art. 2º, porém, excetuam-se doze tipos de procedimentos (causas penais, pretensões não patrimoniais de direito de família, causas sucessórias, e outras) (Facchini 2014).

Como a experiência norte-americana é incomparavelmente mais rica do que a europeia, a ela agora dedicarei maior atenção.

IV. O caso norte-americano. As primeiras experiências

A complexidade, o tecnicismo, além dos custos elevados, do tradicional processo judicial norte-americano, inspiraram diversas tentativas orientadas a encontrar um modo mais econômico e rápido de solução dos litígios. Muitos são os defensores de tal orientação. O último Presidente da Suprema Corte americana, por exemplo, avalia positivamente esse movimento, no qual vê um antídoto aos excessos do denominado adversary procedure (sistema processual acusatório, utilizado na common law). Partindo da premissa de que nem todas as causas necessariamente precisam ser veiculadas e discutidas no âmbito de um procedimento formal e completo, ele percebe no juiz uma espécie de manager (administrador, gerente, dirigente) processual, que teria, além de suas tradicionais atribuições, a função de encaminhar as demandas ao tipo de procedimento (alternativo) mais adaptado às suas peculiaridades (Rehnquist 1993; Facchini 2014).

Nos Estados Unidos costuma-se referir que o início do movimento a favor dos modelos alternativos ao processo clássico coincide com um simpósio jurídico ocorrido em 1976, para celebrar o septuagésimo aniversário do conhecido discurso de Roscoe Pound, um dos maiores juristas da primeira metade do século XX, sobre o tema “The Causes of Popular Dissatisfaction with the Administration of Justice” (“As causas da insatisfação popular com a administração da justiça”). Observou-se, naquele evento, que a despeito de todos os aperfeiçoamentos introduzidos no sistema judiciário e inobstante as inúmeras alterações e inovações no âmbito do processo civil, nos setenta anos transcorridos desde o discurso de R. Pound, persistia o baixíssimo índice de aprovação popular em relação ao funcionamento do poder judiciário e ao serviço por ele prestado. Diante de tal percepção, defendeu-se, no referido simpósio, que talvez pouco adiantasse reformar o processo civil tradicional. A coisa correta a fazer, foi então sustentado, seria “afastar do judiciário algumas espécies de controvérsias, que deveriam ser desviadas para órgãos alheios ao aparato judicial, de natureza particular, e que operassem segundo um procedimento mais flexível e informal” (Silvestri 1999, 323). Com isso, seria mantido o processo civil clássico da Common Law para as demandas mais complexas, de maior valor econômico e envolvendo partes capazes de enfrentar o custo mais elevado de tais demandas.5

As primeiras tentativas nesse sentido surgiram no final dos anos 70, de modo empírico. O juiz federal T. Lambros, do Distrito Norte do Estado de Ohio, criou o summary jury trial, enquanto os seus colegas do Distrito Norte da Califórnia implantaram a early neutral evaluation (ENE), sobre os quais falaremos mais adiante.

Em 1985, o Congresso decidiu financiar oito programas ‘pilotos’ de arbitragem endoprocessual obrigatória. Posteriormente, em 1988, o Judicial Improvements and Access to Justice Act (Lei sobre aperfeiçoamento judicial e acesso à justiça) não somente autorizou o prosseguimento das experimentações, mas inclusive as incentivou e ampliou (Harzheim e Facchini 2016).

Dois anos depois, o Civil Justice Reform Act (Lei sobre a reforma da justiça civil), de 1990, favoreceu enormemente a afirmação e o desenvolvimento das ADRs dentro da justiça federal (De Palo y Guidi 1999, 19).

O conceito formal das ADR foi assim formulado pela lei federal conhecida como Alternative Dispute Resolution Act of 1998: “For purposes of this chapter, an alternative dispute resolution process includes any process or procedure, other than an adjudication by a presiding judge, in which a neutral third party participates to assist in the resolution of issues in controversy, through processes such as early neutral evaluation, mediation, minitrial, and arbitration…”.6

Uma área em que já há muito tempo os serviços de mediação vinham sendo utilizados envolve a de conflitos familiares. Informa Cappelletti (1993, 290) 7 que uma National Family Conciliation Council (NFCC) foi instituída em 1982, sem fins lucrativos. Dez anos depois, a essa associação já haviam se filiado mais de cinquenta organizações. Em 1986 foi criada a Family Mediators Association (FMA), voltada especificamente à mediação de conflitos familiares. Ambas as organizações fornecem um curso de treinamento aos seus mediadores.

A crescente importância do tema relativo às A.D.R nos Estados Unidos pode ser percebida também pelo fato de que com certa frequência casos envolvendo A.D.R. chegam até à mais alta corte de justiça do país. Exemplificativamente, somente no ano judiciário 1994-95 (o ano judiciário americano inicia em setembro em vai até junho do ano seguinte), a Suprema Corte decidiu nada menos do que quatro casos relativos a ADR (o que, diante do escasso volume de processos julgados a cada ano, representa em torno de 4% dos casos apreciados naquele período), e em todos eles reafirmou sua posição favorável a essa técnica (de acordo com Guill 1997).

Os meios alternativos de resolução de conflitos nos Estados Unidos não seguem um padrão único. Há uma grande variedade de “modelos”, que se encaixam em algumas classificações elementares. É o que veremos a seguir.

V. Tipologia básica das ADR

Alguns dos procedimentos de ADR possuem caráter obrigatório,8 enquanto outros -a maioria- são facultativos. Ressalte-se, todavia, que ainda quando obrigatória a ativação de algumas formas de ADR, o seu resultado nunca é vinculante, pois a parte interessada pode sempre requerer um novo julgamento pela justiça ordinária. Trata-se substancialmente de uma simples “condição de procedibilidade da ação civil” (De Palo y Guidi 1999. 7).

Além da classificação das ADR em obrigatórias/facultativas, uma diversa classificação permite distinguir os modelos conciliatórios (consensual-oriented model) dos modelos decisionais (decision-oriented model).

O primeiro deles-modelo conciliatório-visa a compor a controvérsia através de uma solução acordada entre as partes. Várias técnicas inserem-se nesse modelo, como é o caso da mediation, da early neutral evaluation e do summary jury trial.

Já o modelo decisional (decision-oriented) procura a solução dos conflitos através de uma decisão emanada de um terceiro, que não o juiz estatal. O arquétipo desse último modelo é a arbitragem.

O modelo dito conciliatório foi o que obteve muito maior sucesso na nação norte-americana.

A summa divisio que se pode traçar a respeito da ADR, porém, distingue, de um lado, uma “justiça alternativa privada”, reconhecendo-se a autonomia das partes em litígio para dirigirem-se a qualquer uma das numerosas organizações privadas que fornecem esse tipo de serviço nos Estados Unidos e, por outro lado, uma “court-annexed ADR” (também denominada de court-ordered, court-sponsored, ou ainda court-managed ADR). Trata-se de uma “justiça alternativa pública” (De Palo y Guidi 1999; Harzheim e Facchini 2016).

À guisa de demonstração do interesse sobre o tema, refira-se que todas as Faculdades de Direito norte-americanas vêm introduzindo em seus currículos regulares disciplinas e cursos relativos à negociação de causas e outras técnicas necessárias ou convenientes para uma resolução alternativa das controvérsias (Re 1986, 316), principalmente as de natureza consensual. E isso ocorre porque a expansão da utilização dos procedimentos de ADR mudará também o paradigma profissional do advogado americano, que passará de ‘adversarial advocate’ a ‘legal counselor’ (Guill 1997, 1313) (de “advogado litigioso” a “conselheiro jurídico”). Isso significa que, nesse novo paradigma, exige-se um advogado que não esteja preparado somente para o modelo “the winner takes all” (“o vencedor leva tudo”), mas que esteja também capacitado para analisar globalmente a situação de ambos os contendores (e não somente os interesses do seu cliente) de modo a poder identificar uma solução que seja razoável para ambos, evitando o conflito ou superando-o com menor custo, tempo e desgaste (Facchini 2014).

Algumas das ADR são vinculadas à própria justiça estatal. Outras são dela independentes. É o que veremos a seguir.

VI. Dimensão subjetiva das ADR. Quem são os atores?

É praticamente impossível fazer um inventário de todas as formas de ADR em uso nos Estados Unidos, uma vez que, além daquelas que de alguma maneira estão vinculadas ao poder judiciário, existem inúmeras outras que são desprovidas de qualquer ligação. Segundo um recente levantamento, contam-se mais de mil ADR brokers (corretores de ADR), os quais buscam oferecer um ‘produto’ diferenciado, levando em conta o tipo de controvérsia que as partes pretendem definir (Facchini 2014).

Além dos serviços de arbitragem, conciliação e mediações oferecidas pela American Arbitration Association (a mais antiga e potente associação operante no setor dos métodos alternativos) e pelo seu mais agressivo concorrente, o JAMS (Judicial Arbitration and Mediation Services - uma sociedade de capital privado que detém o monopólio das ADR em alguns dos Estados), existe uma miríade de associações, organizações, entidades e profissionais que oferecem seus serviços nessa verdadeira ‘indústria’ dos métodos alternativos (Silvestri 1997, 325).

Não por acaso, precisamente no auge do liberalismo anti-estatatizante da era Reagan, foi fundada, nos Estados Unidos, a empresa “Judicate, Inc.”, instituindo e administrando o “Sistema Nacional de Cortes9 Privadas” (The National Private Court System). Trata-se de uma organização integralmente privada, que se dispõe a decidir as controvérsias, com base na legislação estatal e não simplesmente por equidade, desde que as partes interessadas estejam de acordo e se comprometam a aceitar a decisão final. Trata-se de verdadeiras unidades de arbitragem, normalmente presididas por juízes aposentados10 (em 1996 já alcançavam o número de 725), que usam togas, ouvem testemunhas sob juramento e atuam sob o princípio do contraditório - ou seja, vestem-se como juízes, agem como juízes, decidem como juízes, mas não são (ou não são mais) juízes. Esses “juízes particulares” são relativamente bem remunerados - de US$150 a US$300 a hora de trabalho (Abraham 1998, 156).11

Todavia, afora essa experiência, que posteriormente foi expandida, a maior parte dos modelos alternativos de justiça atualmente em uso nos Estados Unidos possui ligação com o aparato Judiciário. É o modelo chamado “endoprocessual” (Facchini 2014).

VII. Técnicas de ARD endoprocessuais e extraprocessuais

J. Resnik (1997, 699) indica as seguintes mais conhecidas técnicas alternativas de resolução de conflitos nos Estados Unidos, que serão analisadas mais abaixo: a court-annexed arbitration, a mediation, o summary jury trial, o minitrial, a early neutral evaluation, e as judicial settlement conferences.

A esses procedimentos O. Chase (1988, 942-943) acrescenta ainda a “final-offer arbitration” (no qual o árbitro deve escolher entre uma das hipóteses de composição do litígio proposta por cada uma das partes. Isso estimula ambas as partes a propor soluções razoáveis, pois se uma delas apresentar uma proposta exorbitante ou desarrazoada, o árbitro poderá escolher a proposta ofertada pela parte contrária), e a “one-way arbitration” (onde somente uma das partes fica vinculada ao laudo arbitral. Por exemplo, nos litígios envolvendo consumidores, o comerciante pode assumir o compromisso de se submeter à decisão de um árbitro, ainda que o consumidor não faça o mesmo) (Facchini 2014).

Além dessa diversidade, a legislação em vigor ainda autoriza os juizados federais distritais a implementarem as variações que se fizerem necessárias para adaptá-las às peculiaridades locais, de modo que nas local rules editadas pelas district courts encontram-se diferentes versões de modelos como a os modelos12 como a court-annexed arbitration, a court-annexed mediation, o summary jury trial, o minitrial, a early neutral evaluation - ENE, a settlement conference e a appellate mediation. Diante da limitação de espaço, deixamos de aprofundar cada um desses modelos.

VIII. Alterações legislativas mais recentes

Nos últimos anos, as regras que disciplinam o uso das Alternative Dispute Resolution foram novamente revistas. Em 1993, por exemplo, a Rule 16 das Federal Rules of Civil Procedure sofreu nova alteração, buscando fixar, com maior precisão, o papel do juiz na condução do procedimento na fase do pre-trial, no controle da Discovery,13 e no auxílio que deve prestar às partes para se alcançar a resolução consensual dos litígios. Essas alterações, em seu conjunto, foram no sentido de se atribuir um papel muito mais ativo ao juiz. Isso porque o modelo clássico de juiz da common law, na condução do processo, era aquele de um juiz substancialmente passivo na condução do processo. No modelo antigo, protagonistas do processo eram apenas os advogados, não o juiz. Esse era visto como um árbitro que agia no processo apenas quando solicitado expressamente pelas partes, para fazer observar as “regras do jogo” e que no final limitava-se a proclamar o vencedor.

Além disso, as alterações levadas a efeito na reforma processual de 1993 redefiniram o conceito de ADR, que uma década antes fora qualificada como conjunto de ‘procedimentos extrajudiciais’. A reforma de 1993 definiu as técnicas de ADR como ‘procedimentos especiais para a assistência na resolução das controvérsias, nos casos autorizados pela lei ou pelas normas locais’.

Em 30 de outubro de 1998 entrou em vigor a Alternative Dispute Resolution Act of 1998, que pôs fim à fase de experimentação em matéria de ADR. Cada um dos juizados federais foi instado a integrar dentro do sistema processual, de modo estável e permanente, os procedimentos de resolução alternativa dos litígios. Essa lei federal destacou a importância da conciliação dentre os demais modelos de ADR. No caso da arbitragem, eliminou a possibilidade de imposição de pena à parte que viesse a requerer o trial de novo, ainda que não obtivesse uma sentença mais vantajosa do que o resultado indicado no laudo arbitral endoprocessual” (De Palo y Guidi 1999,122).

Passada, assim, a fase de experimentações, ficou definitivamente afirmada a ADR no âmbito da justiça federal, estando atualmente institucionalizada e disciplinada legalmente (Resnik 1997, 704-706).

IX. Argumentos favoráveis ao movimento das ADR

Embora o locus natural para solução de conflitos sociais em um sistema como o nosso seja o processo judicial, não se pode deixar de reconhecer que esse instrumento não mais tem a aptidão de outrora para atingir os resultados a que sua criação visou alcançar: a composição justa e tempestiva dos conflitos (Lima 2003, 246). Daí a busca de alternativas à jurisdição.

São de duas espécies os argumentos esgrimidos a favor do movimento das ADR, uma de natureza quantitativa, outra de natureza qualitativa.

O argumento de natureza quantitativa é o mais invocado. Segundo ele, a ADR deveria ser incentivada porque é uma maneira mais eficiente de solução das disputas, de menor custo e muito mais rápida. Invocando-se a experiência inglesa, desde 1999 (quando entraram em vigor as reformas introduzidas pelo novo ‘código de processo civil’ (Civil Procedure Rules - CPR, que estimula o uso dos meios alternativos de resolução de conflitos bem como o uso de procedimentos sumários para causas de menor valor) e até 2010, a maior utilização das ADR acarretou a diminuição de 21% do volume de causas judicializadas (Andrews 2012, 348).

O segundo argumento, ‘qualitativo’, parte de uma abordagem segundo a qual a ADR possibilita uma maior participação das partes no desenvolvimento do processo e permite a elas um maior controle sobre o resultado do processo -afinal, são elas que definem esse resultado-, bem como permite manter em sigilo certos fatos que, eventualmente, um processo regular tenderia a publicizar. Além disso, sustenta-se que a ADR oferece uma maior possibilidade de reconciliação entre as partes, garantindo uma melhor comunicação entre elas, aumentando assim a probabilidade de manutenção ou recuperação das relações interpessoais (Menkel-Meadow 1997, 1871-1872). Segundo esta visão, enquanto o processo judicial ordinário “olha para o passado” da relação litigiosa, a ADR “olha para o futuro”, ficando mais próxima da idéia de justiça coexistencial de que falava Cappelletti.

Uma outra e importante vantagem é a possibilidade de se alcançar soluções dificilmente alcançáveis pela via de um processo regular. Uma ilustração dessa possibilidade é dada por Neil Andrews (2012), envolvendo uma ação de reparação de danos movida pelos genitores de uma criança falecida, cujos órgãos internos haviam sido retirados para fins de transplante, sem conhecimento e autorização dos pais. A ação fora movida contra o hospital. Após uma longa tramitação, o juiz que presidia o processo recomendou que as partes fossem submetidas a uma mediação, que resultou exitosa. As partes chegaram a um acordo que estabelecia uma indenização modesta, mas que também previa que o hospital construiria um memorial para o filho dos autores e outras crianças com as quais também havia ocorrido o mesmo, além de um formal pedido de desculpas por parte dos médicos envolvidos, e outras obrigações acessórias. Alcançou-se, assim, uma solução mais satisfatória para os pais, do que a simples transferência de um valor econômico que nem sempre representa o que as partes efetivamente buscam (Harzheim e Facchini 2016).

X. Críticas ao movimento das ADR

Mesmo nos Estados Unidos, onde o fenômeno surgiu há cerca de 40 anos, aparentemente já foi superada a fase de máxima expansão. Segundo alguns doutrinadores, a abordagem, atualmente, é mais crítica do que laudatória.14

Alguns são mais cautelosos e moderados nas críticas, como é o caso de Mauro Cappelletti (1993, 282-295), abordando o tema em escala internacional. O processualista italiano, como é sabido, foi um pioneiro ao sustentar a idéia de uma justiça coesistenziale, fundada mais sobre a conciliação dos espíritos e sobre a preservação das relações, do que sobre a perspectiva do rigth-or-wrong ou do tudo ou nada. O mesmo saudoso professor enquadra o movimento da ADR na terceira onda do seu conhecido projeto de acesso à justiça, revelando também a tendência de certa privatização da justiça e um maior recurso à equidade. Porém, também ele alerta para o risco de uma justiça de segunda classe, por causa da falta de garantia de independência do juiz que opera naqueles sistemas, pelo seu menor preparo técnico e pela redução das garantias processuais. Tudo isso, porém, deve servir de alerta, segundo ele, e não de desencorajamento.

Também Andrews (2012, 355), embora entendendo que os meios alternativos devem ser incentivados e produzem bons resultados, numa apreciação global, refere que há situações em que as A.D.R. não são convenientes. É o caso, por exemplo, de quando uma das partes realmente tem um claro direito a respeito de algo - nesse caso, tal direito não deve ser ‘neutralizado’ por meio de um acordo em que ele abra mão de tal direito. Além disso, a opção pelo processo formal deve ser usada no caso de ‘ilícitos graves’.

Já outros são mais céticos e contundentes em suas críticas. Estes costumam ressaltar dois outros motivos que contribuiriam para explicar o entusiasmo dos defensores da ADR, ainda que não abertamente sustentados por esses.

Primeiramente, haveria o interesse de liberar os órgãos regulares de justiça dos chamados garbage cases (casos-lixo), ou seja, daqueles casos de modesto valor econômico, escassa relevância jurídica, tendentes a serem repetitivos e pouco úteis para o progresso da ciência jurídica. Com isso, a justiça ordinária ficaria liberada para tratar dos casos mais importantes, de interesse para a elite política e econômica (establishment) (Facchini 2014).

Em segundo lugar, haveria o desejo de frear o ativismo judicial que vinha se manifestando em certas áreas muito importantes para o establishment, como exemplificativamente aquela concernente à tutela do consumidor (Silvestri 1999, 324). De fato, um acordo realizado entre duas partes em conflito tem muito menos impacto social do que uma decisão proferida por um juiz togado. Esta tem muito maior potencial de alteração da realidade social, quer chamando a atenção da imprensa, quer através da técnica dos precedentes vinculantes, caso emanada por um tribunal superior. Assim, quando certos grupos econômicos percebem que os juízes perfilham uma orientação desfavorável aos seus interesses, procuram eles afastar o conhecimento de tais demandas pela justiça ordinária.

Na Europa, como já assinalado, a adesão às formas de ADR é menos entusiástica do que nos Estados Unidos, em razão da consciência das peculiaridades do ambiente originário, o que significa no mínimo ser inoportuno um simples ‘transplante’ de alguns mecanismos alternativos de solução das controvérsias (Harzheim e Facchini 2016).

Realmente, a premissa básica de muitos defensores das ADR consiste em ver o acordo obtido pelas partes como uma antecipação do resultado final que seria obtido através de um processo judicial, com notável economia de tempo e dinheiro. Ou seja, parte-se da idéia que o único objetivo da jurisdição seja o de compor a lide. Porém, sabe-se que este não é o único objetivo visado pela administração da justiça (Silvestri 1999, 328). Segundo C. Dinamarco (1987, 206), a jurisdição possui objetivos sociais (a pacificação das partes em conflito, mediante a aplicação de critérios de justiça) escopos políticos (a participação da parte interessada, atuando processualmente, na resolução da controvérsia; afirmação da autoridade do Estado; educação do cidadão relativamente aos seus direitos), além daquele jurídico de atuação da “vontade concreta do direito”.

Além disso, lembra E. Silvestri (1997, 328) que a difusão dos procedimentos de informal justice fez com que ressurgissem algumas preocupações que o modelo judicial clássico já havia enfrentado e resolvido. Pergunta-se, por exemplo, se a ausência de formalidades, característica de muitos procedimentos alternativos, não possa significar também ausência de garantias para a mais débil das partes em litígio. Isto porque o processo clássico e garantista pode propiciar à parte mais fraca certa proteção, ao atribuir ao juiz uma série de poderes cujo exercício teria por fim assegurar uma efetiva paridade de armas entre as partes (Facchini 2014).

O prof. Owen Fiss (1984) em seu conhecido ensaio intitulado emblematicamente “Against Settlement” (Contra o Acordo),15 afirma que o encorajamento da conciliação é particularmente prejudicial no caso das controvérsias envolvendo public law, e que os tribunais deveriam preocupar-se em articular e implementar princípios de justiça, e não de impelir as partes a aceitar qualquer acordo apenas para pôr fim ao litígio.

Outros argumentos contrários ao uso intenso das ADR são referidos nos já citados ensaios de J. Resnik (1997, 713) e Oscar G. Chase (1988, 940), onde se referem também outros autores que são reticentes a respeito de tal movimento, por considerá-lo “politicamente conservador”, já que “se propõe reservar as cortes regulares para as controvérsias empresariais impedindo o acesso ao juiz ordinário às classes sociais mais débeis”.

Também sob o perfil da eficiência existem objeções às Alternative Dispute Resolution (ADR). Em 1992, a Judicial Conference16 encomendou à RAND Corporation um estudo para avaliar os efeitos das iniciativas adotadas pelos vários órgãos da justiça federal no campo da ADR. Após quatro anos de análises e pesquisas de campo, a rAnd Corporation apresentou, em 1996, o resultado de seus estudos, que a muitos pareceu desencorajante. De fato, ainda que não sinalizasse efeitos negativos, o estudo exclui a existência de motivos que justificassem recomendações em favor da adoção de programas de ADR no âmbito da justiça federal, porque os projetos-pilotos experimentados até então não teriam tido um grande impacto na economia de tempo e dinheiro (De Palo y Guidi, 1999 113).

Apesar disso, contudo, a Judicial Conference, baseando-se nos dados fornecidos por um estudo independente do Federal Judicial,17 reconheceu os efeitos positivos de alguns aspectos do programa experimental das ADR e acabou por adotar uma via intermediária: nem estender a obrigatoriedade da adoção de programas de ADR para todas as 94 cortes federais de primeira instância, nem tampouco eliminar a ADR endoprocessual. Baseado nessa orientação é que foi encaminhada e aprovada a lei sobre resolução alternativa das controvérsias (ADR) de 1998.

O Circuit Judge H. T. Edwards pensa ter encontrado um ponto de equilíbrio ideal entre o espaço próprio da justiça ordinária e aquele adequado às diversas ADR:

Some would respond that judges are generalists and yet we trust our state and federal judiciary to resolve a broad range of disputes. This argument, however, is deceptive because judges are specialists in resolving issues of law. Law aims to resolve disputes on the basis of rules, whereas alternative dispute resolution mechanisms turn to nonlegal values. If disputes are to be resolved by rules of law, the legal experts designated by our state and federal constitutions - that is, the judges - should resolve them. If nonlegal values are to resolve disputes, we should recognize the need for substantive expertise (Edwards 1986, 683-684).18

Além disso, olvida-se que nem sempre é suficiente a obtenção de um acordo para que a harmonia e concórdia entre as partes sejam definitivamente restabelecidas. Isso porque frequentemente surgem problemas e discordâncias na fase de execução do acordo. No caso norte-americano, por exemplo, costuma-se referir que muitas das atividades do lá chamado managerial judge (juiz-gerente ou juiz-dirigente - no sentido de juiz que se envolve efetiva e ativamente na condução do processo) são desempenhadas exatamente na fase do post-trial (fase subseqüente ao julgamento, não ainda necessariamente em fase de cumprimento da sentença propriamente dita) (Silvestri 1999, 328-329).

Não se pode, por isso, considerar os procedimentos alternativos de resolução de controvérsias (ADR) como se fossem uma panacéia. Ao contrário, os analistas têm chamado a atenção para os seguintes aspectos:

  • 1) do ponto de vista social e filosófico, justificou-se o surgimento das ADR a partir de uma dimensão quase que idílica e utópica de justiça, onde se realça o mecanismo da “conversação-negociação” entre os interessados, em busca da resolução consensual do conflito. Acontece, porém, que as ADR -tanto quanto a justiça ordinária- encontram-se a operar no âmago de uma realidade não simples nem harmônica, mas complexa e fortemente caracterizada pela explosão da litigiosidade, animosidade e desconfianças recíprocas;

  • 2) do ponto de vista de justiça social, algumas das suas técnicas podem contribuir para a manutenção das desigualdades socioeconômicas, quando envolvem partes econômica e socialmente desiguais (Campelletti 1993, 419). Exemplo desta possibilidade nos é fornecido por M. H. Lazerson (1984, 119-160), no ensaio em que descreve o funcionamento da Housing Court de New York, instituída com o objetivo de resolver informalmente os conflitos entre inquilinos e locadores. Segundo este autor, o movimento dos inquilinos era fraco e desorganizado e por isto não conseguia obter melhorias substanciais de sua situação, via legislação. A composição informal dos conflitos individuais, por outro lado, não criava as condições necessárias para fazer avançar a situação global da categoria. Uma melhoria efetiva desta situação tornou-se possível somente quando a atuação mais crítica e politicamente orientada dos membros dos Legal Services (categoria que abrange, dentre outros, tanto os defensores públicos quanto os profissionais que se dedicam a uma advocacia pro bono) deslocou a arena de luta para a justiça ordinária, com todo o seu formalismo e garantismo processual. Só nessa sede o conflito social subjacente às controvérsias individuais pode eventualmente se revelar e ser levado em consideração. Em virtude da técnica do precedente, utilizada nos Estados Unidos, as decisões judiciais não só resolvem os conflitos individuais mas também estabelecem parâmetros jurídicos a serem observados nas relações sociais futuras e indeterminadas, além de orientar mudanças na legislação.

  • 3) Além disso, a “justiça particular” naturalmente acaba seguindo a lógica e as regras de mercado. A “justiça pública”, porém, tem força, condições e competência para fundamentar suas decisões em valores diversos, desempenhando uma função mais em conformidade com os princípios constitucionais e com as expectativas dos cidadãos (Alpa 1986, 623).

Richard Abel (1982, 307), avaliando e referendando as conclusões de um seminário sobre sistemas informais de justiça, por ele organizado nos Estados Unidos, mostrou-se bastante cético em relação a tais sistemas. Ele tem dúvidas, por exemplo, se os sistemas informais de justiça podem efetivamente ajudar a desonerar o orçamento público. Segundo ele, esses sistemas complementam - e não substituem- os sistemas ordinários de justiça. Trata-se, portanto, de um gasto adicional e não de uma efetiva alternativa mais econômica. Além disso, como o custo operacional de uma unidade de justiça informal é menor (fundamentalmente porque o pessoal que ali atua tem uma qualificação profissional mais baixa e recebe, portanto, uma remuneração menor), fatalmente o sistema tenderá a multiplicar-se, anulando, assim, as economias obtidas.

Outro aspecto evidenciado por R. Abel consiste em que os sistemas informais de justiça, ao contrário do que se possa imaginar, não diminuem, mas sim aumentam, os controles estatais sobre a sociedade. Segundo ele, esses sistemas informais, por tenderem a estar disseminados por todas as camadas sociais, tendem a abranger conflitos que de outra forma jamais seriam submetidos a um aparato estatal formal (como a polícia e as cortes de justiça). Além disso, tais sistemas não estão sujeitos a muitos daqueles controles formais que ao longo do tempo surgiram, como decorrência do aumento das garantias dos direitos dos cidadãos frente ao aparato estatal.

Um dos principais motivos de preocupação consiste no fato de que os sistemas informais de justiça tendem a tornar triviais as queixas individuais, frustrando, assim, as respostas coletivas. A mensagem oculta desse sistema, sempre segundo R. Abel, consiste em convencer o cidadão comum de que pequenos problemas sociais podem ser resolvidos dentro do próprio sistema, sem que haja necessidade de colocar em discussão as estruturas sociais básicas. Em outras palavras, cada cidadão deve estar em condições de resolver sozinho (com a ajuda do sistema) o seu problema individual, não havendo necessidade de respostas globais. Assim, esses sistemas não percebem-ou fingem não perceber - que muitos litígios individuais, na verdade, nada mais são do que concretizações atomizadas de disfunções ínsitas a certas estruturas sociais.

Desta forma, tais disfunções existentes no campo macro, tendem a se manter e a se multiplicar no campo micro. Uma justiça que vise somente a compor amigavelmente os litígios individuais corre o risco de deixar intactas e incontroversas essas estruturas. Em certas hipóteses, é necessário o exercício da autoridade formal do juiz para evidenciar a existência de conflitos sociais latentes subjacentes ao litígio individual, trazê-los à tona, discuti-los e procurar remediá-lo à luz dos princípios e valores da justiça, individual e social (Harzheim e Facchini 2016).

Nesse sentido, citando Jean-Pierre Bonafé-Schimitt, Bolzan de Morais (Morais 1999, 109) refere que “a justiça deve prevalecer antes que a paz” e que “considerar a equivalência entre um acordo firmado e uma sentença proferida seria reduzir a função social da decisão jurisdicional a mera resolução de conflitos privados, o que privaria os tribunais de emitirem interpretações acerca de textos legais e a sociedade de ter a seu alcance autênticos critérios de justiça”.

Atualmente, portanto, o debate doutrinário sobre as alternativas ao processo judicial concentra-se sobre o problema de como conciliar a busca de formas procedimentais que assegurem uma justiça mais rápida e mais acessível que a ordinária, com a exigência de salvaguardar as garantias da defesa (Facchini 2014).

XI. Considerações finais

Como se viu do presente ensaio, o movimento das Alternative Dispute Resolution ainda não está completamente sedimentado, embora se perceba claramente que se está avançando nessa direção.

As avaliações que se fazem quanto à sua operacionalidade e aos resultados obtidos não são unânimes. Ao lado dos seus defensores encontram-se muitos críticos.

No direito comparado, reconhece-se que a justiça informal oferece flanco a críticas, mas também é portadora de valores positivos: a preferência pela harmonia ao conflito; mecanismos que oferecem igualdade de acesso a muitos, em vez de custosos privilégios a poucos; mecanismos que funcionam de forma célere e econômica, permitindo aos jurisdicionados participar diretamente do processo de tomada de decisão, em vez de simplesmente entregar a solução do caso aos profissionais do direito; alternativas que buscam alcançar a justiça substancial, em vez de frustrá-la em nome das formas.

A questão, portanto, não deve ser encarada de forma maniqueísta. O problema é complexo e não exige soluções extremadas de adesão integral ou de franca repulsa. Talvez o mais conveniente seja identificar os setores nos quais é indispensável a intervenção de uma magistratura profissional, pública, organizada de forma independente, que opere mediante procedimentos formalizados. A esta forma de exercício de jurisdição, que necessariamente tem um custo orçamentário mais imponente, deveria ser encarregada de resolver somente os conflitos que não podem ou não devem ser solucionados mediante controles administrativos prévios (com atuação de agencias regulatórias autônomas e que efetivamente se comportem como agentes da sociedade, e não como defensoras de grupos de interesses), ou mediante procedimentos de mediação e de resolução alternativa de conflitos, por árbitros/mediadores não estatais. Esses outros agiriam como uma espécie de justiça complementar, alternativa, talvez “menor”, mas não necessariamente contraposta à justiça togada.

Afinal, um dos motivos principais que pode levar um potencial usuário do sistema de justiça a procurar sistemas mais informais reside na preferência por uma justiça mais econômica e célere. Todavia, também é verdade que, muitas vezes, o fator “justiça” é mais importante que o fator “celeridade” - e o cidadão, muitas vezes, está disposto a pagar o preço.

O fato é que a ADR não veio para substituir o processo judicial tradicional, mas sim para colocar-se como opção ao seu lado. Pode também haver uma interação, no sentido que o deslocamento momentâneo de certas causas para as técnicas de ADR acabará por diminuir o fluxo das demandas judiciárias. Com uma menor carga de trabalho, os juízes tenderão a resolver mais rapidamente os processos ao seu encargo. E uma maior celeridade da justiça comum tornará novamente atraente a via judicial, chegando-se, destarte, a um novo ponto de equilíbrio (Facchini 2014).

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1No campo da responsabilidade civil, por exemplo, o Código Civil de 2002 expressamente autorizou o julgamento por equidade, em inúmeras situações. No novel estatuto, o julgamento eqüitativo comparece às vezes como exceção ao princípio da reparação integral (como nos casos de responsabilidade extracontratual previstos nos arts. 928; 944, parágrafo único; 952, parágrafo único; bem como, no plano contratual, nos arts. 413; 738, parágrafo único), e às vezes como princípio autônomo (como é o caso do art. 953, parágrafo único; art. 954; e em todos os demais casos de arbitramento dos danos não patrimoniais) (Facchini 2014).

2Essa tendência também é válida para a Inglaterra, segundo Neil Andrews (2012, 50): “A discussão sobre os meios alternativos para resolução de conflitos tem mostrado certa tendência a considerar mediação como uma forma ligeiramente mais aconselhável”.

3Na Inglaterra, a lei de arbitragem é de 1996 (Arbitration Act). Segundo Andrews (2012, 50), as principais razões pelas quais as partes de um litígio comercial —onde ela é mais frequente— optam pela arbitragem, além da sua maior celeridade, é a confidencialidade e controle das partes (que envolve a possibilidade de escolher o árbitro, ao contrário da justiça formal em que não se escolhe o juiz, bem como a possibilidade escolha das regras de fundo e do procedimento mais adequado ao caso).

4Sobre o chamado Stuttgart Model veja-se Bender, (1979, 431 e segs.) Esse modelo procura combinar os modelos opostos do procedimento oral e do procedumento escrito. Baseia-se na premissa de que o papel do conciliador (no caso, o juiz), é bastante facilitado quando ele conhece os fatos da causa. Assim, na primeira fase, segue-se o procedimento escrito: à introdução da demanda segue-se a resposta e uma réplica. Depois, os autos são conclusos ao juiz, que marca uma audiência em curto prazo. Nesta audiência, o juiz monocrático (ou colegiado), que já conhece os fatos e os pontos controvertidos, propõe uma solução. As partes se afastam para falar com seus advogados e em seguida voltam para manifestar-se sobre a proposta. Se a conciliação não ocorre, parte-se para a instrução do feito. Depois de ouvir as testemunhas, o juízo novamente propõe um acordo, que, desta vez, reveste o caráter de uma “proposta do juízo”, ou seja, a corte manifesta às partes qual será o possível êxito da causa. Em vista desta proposta, muitas vezes as partes resolvem conciliar (Facchini 2014).

5Apoiado em Jerold Auerbach (Justice Without Law), Oscar G. Chase lembra, porém, uma profunda raiz histórica para o fenômeno, pois “a existência de formas alternativas de resolução de disputas é um traço constante em toda a evolução norte-americana”, remontando à época da colonização britânica. De fato, “os colonos se pautavam por uma utopia religiosa em cuja composição ideológica se conferia papel central à comunidade... Em seu espírito... estava a religião... o estilo era consensual, e não adversarial. Nesse contexto, o litígio era explicitamente desencorajado e se esperava que as disputas fossem solucionadas pela comunidade, preferentemente mediante mediação”. Raízes diversas, mas igualmente antigas, teria a arbitragem. “Sua aceitação se deu inicialmente no âmbito de outra comunidade - a classe dos comerciantes”. Os colonizadores holandeses, que inicialmente fundaram e colonizaram a “Nova Amsterdam”, que depois viria a ser conquistada pelos ingleses, dando origem a Nova Iorque, “estabeleceram a arbitragem como uma alternativa à litigância e os seus benefícios se tornaram tema comum no contexto empresarial” (Chase 2014, 143-144).

6Em tradução livre: “Para os fins desse capítulo, um processo de resolução alternativa de litígios abrange qualquer processo ou procedimento, não presidido nem julgado por um juiz togado, em que uma terceira parte neutra participa para auxiliar na resolução de questões controvertidas, através de procedimentos como análise precoce e neutra, mediação, mini-julgamento, e arbitragem…”.

7 Cappelletti (1993, 291) refere que também no Canadá foi desenvolvida uma técnica de mediação especificamente destinada aos conflitos familiares. Esta mediação ocorre tanto em bases voluntárias, como de forma obrigatória para as partes, desenvolvendose junto a mediadores judiciais que integram o staff do juízo, ou através de mediadores particulares.

8Ressaltando que a lei federal de 1998, antes citada, excluiu a hipótese de arbitragem endoprocessual obrigatória na justiça federal, em virtude das observações contidas no relatório Rand de 1996 (que será referido mais adiante) e no parecer da Judicial Conference sobre a sua escassa eficácia (Facchini 2014).

9Esclareça-se que o vocábulo “Court”, nos sistemas que integram a Common Law, tem o amplo significado de unidade jurisdicional, seja de que instância for. Conforme o contexto, seu significado, no caso concreto, poderia ser traduzido, em linguagem adaptada ao nosso sistema, por juízo, juizado, vara, tribunal, turma ou câmara julgadora, etc (Facchini 2014).

10Interessante notar que em agosto de 2014 a Escola Nacional da Magistratura (ENM), da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), entidade que congrega a quase totalidade dos magistrados brasileiros promoveu o primeiro curso de “Mediação e Conciliação para Magistrados Aposentados”, visando capacitá-los para essas novas funções. Ou seja, trata-se de mais um exemplo de circulação de modelos ou de transplante jurídico, no jargão dos comparatistas (Facchini 2014).

11Para os padrões brasileiros, seria uma boa remuneração. Todavia, para os padrões norte-americanos, seria apenas uma razoável remuneração, quando se lembra que os melhores advogados norte-americanos já ultrapassaram a barreira dos mil dólares a hora de trabalho (Facchini 2014).

12Essa liberdade de experimentação integra um mais amplo programa de litigation management (gerenciamento processual ou de litígios), concedendo-se também mais amplos poderes processuais ao juiz, no sentido de poder ele adaptar o procedimento às peculiaridades específicas do litígio sub judice - sobre a questão v. Silvestri (1997). Para uma informação mais detalhada dessas modificações locais, consulte-se as diversas tabelas que se encontram no livro de De Palo e Guidi (1999, 81-90) Risoluzione alternativa delle controversie (ADR)..., especialmente a tabela V (“Altre pratiche e procedure di ADR”) (Facchini 2014). Tecnicamente, discovery significa a “disclosure by a party to an action, at the other party’s instance, of facts or documents relevant to the lawsuit” (vocábulo “discovery”, no Dictionary of Modern Legal Usage. Em vernáculo: “revelação feita por uma parte no processo, a pedido da outra, sobre fatos ou documentos relevantes para o litígio judicial”. No glossário fornecido por Neil Andrews (2012, 21), no início de sua obra, refere-se ao Discovery ou Disclosure, como uma “atividade consistente em as partes exibirem, uma à outra, as provas e as informações de que dispõem e que usariam em um futuro eventual trial - em O moderno processo civil”. Trata-se de uma peculiaridade do sistema processual norte-americano, em

13Tecnicamente, discovery significa a “disclosure by a party to an action, at the other party’s instance, of facts or documents relevant to the lawsuit” (vocábulo “discovery”, no Dictionary of Modern Legal Usage. Em vernáculo: “revelação feita por uma parte no processo, a pedido da outra, sobre fatos ou documentos relevantes para o litígio judicial”. No glossário fornecido por Neil Andrews (2012, 21), no início de sua obra, refere-se ao Discovery ou Disclosure, como uma “atividade consistente em as partes exibirem, uma à outra, as provas e as informações de que dispõem e que usariam em um futuro eventual trial - em O moderno processo civil”. Trata-se de uma peculiaridade do sistema processual norte-americano, em que uma das partes pode exigir que a outra lhe apresente (diretamente, sem a mediação do juiz) todos os fatos e documentos de que dispõe sobre o caso, antes da audiência de instrução, pois a parte tem o direito de não ser surpreendida por provas ou documentos novos, por ocasião do day in court (Facchini 2014).

14Esta é a opinião de E. Silvestri (1999, 323) ressalvando, porém, que “tudo leva a prever que, nos próximos anos, a multibilionária indústria dos métodos alternativos continuará a proliferar, pelo menos até que os consumidores se conscientizem que o produto oferecido a um preço de “hard discount” não é necessariamente o que de melhor se pode obter no mercado”.

15Uma tradução desse artigo foi incluída na coletânea da produção acadêmica do prof. Owen Fiss, traduzida em português e editado entre nós sob a coordenação do prof. Carlos Alberto de Salles, com o título: Um novo processo civil: estudos norte-americanos sobre jurisdição, constituição e sociedade (2004).

16Criada em 1922, a Judicial Conference of the United States é o órgão máximo da administração judiciária federal norte-americana. É presidido pelo Presidente da Suprema Corte e é composto por todos os presidentes (Chief Judges) das Federal Court of Appeals (13), da Court of International Trade, e por um District Judge para cada um dos 13 Federal Circuits, eleitos pelos seus pares para um mandato de três anos. A Judicial Conference desempenha suas atividades principalmente através de numerosas comissões internas (em número aproximado de Compete a ela não somente providenciar no provimento e transferência dos servidores da justiça federal, como também resolver problemas administrativos da justiça federal, fazer recomendações ao Congresso relativamente à legislação de interesse do sistema judiciário federal, bem como preparar as regras processuais para a justiça federal. Desempenha ainda funções de orientação em matéria administrativa, relativamente aos órgãos judiciários de primeiro e segundo graus. Também é competente para aprovar o orçamento anual do sistema judiciário federal, com exceção da Suprema Corte. Além disso, a Conference também tem competência disciplinar em relação aos juízes. Sobre tal órgão, consulte-se “Bureaucratization of the Federal Judiciary” (Hall 2005, 103) e Bassiouni (1983). recomendações ao Congresso relativamente à legislação de interesse do sistema judiciário federal, bem como preparar as regras processuais para a justiça federal. Desempenha ainda funções de orientação em matéria administrativa, relativamente aos órgãos judiciários de primeiro e segundo graus. Também é competente para aprovar o orçamento anual do sistema judiciário federal, com exceção da Suprema Corte. Além disso, a Conference também tem competência disciplinar em relação aos juízes. Sobre tal órgão, consulte-se “Bureaucratization of the Federal Judiciary” (Hall 2005, 103) e Bassiouni (1983).

17O Federal Judicial Center (Centro da Justiça Federal), foi criado em 1967 com o propósito, dentre outros, de “educating and training Federal judges and court personnel” (instruir e treinar juízes federais e serventuários da justiça). O Centro organiza seminários para juízes recém-nomeados e cursos de atualização para juízes veteranos. Esse Centro também funciona como órgão de pesquisa sobre aspectos práticos da jurisdição, elaborando, por exemplo, sugestões práticas aos juízes em atividade sobre como otimizar recursos, racionalizar procedimentos, ganhar produtividade, etc. Sirva de exemplo a edição das standardized procedures for handling mass tort cases (trad. livre: “procedimentos padrões para direção processual de casos de responsabilidade civil de massa”), ou o Guide to Judicial Management of Cases in ADR, editado originariamente em 2001. Mais informações sobre o funcionamento de tal órgão podem ser obtidas na obra de Bassiouni (1983, 445) e McGovern (1997, 1857).

18Tradução livre: “Alguns diriam que os juízes são generalistas e apesar disso nós atribuímos ao judiciário estadual e federal [a decisão sobre] um amplo espectro de controvérsias. Esse argumento, porém, é falho, porque os juízes são especialistas em decidir problemas jurídicos. O judiciário busca resolver litígios com base em regras, ao passo que os mecanismos alternativos de resolução de controvérsias voltam-se a valores não jurídicos. Assim, se os litígios devem ser resolvidos com base em critérios legais, [então] os especialistas jurídicos indicados pelas nossas constituições estaduais e federal — isto é, os juízes— é que deverão decidi-los. Se, ao contrário, for conveniente que os litígios sejam resolvidos mediante aplicação de valores não jurídicos, então devemos reconhecer a necessidade de conhecimento específico sobre o tema.”

Recebido: 10 de Janeiro de 2017; Aceito: 10 de Janeiro de 2019

*Este texto é amplamente baseado em duas publicações anteriores do autor: Harzheim e Facchini (2016) e Facchini (2014).

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