1. Introdução
Dos serviços de imagens globais gratuitos e disponíveis publicamente , como Google Earth (2021), Microsoft Bing Maps (2021) e OpenStreetMap (2021), o primeiro é o serviço mais versátil e flexível fornecido como um desktop autônomo acessível em várias plataformas. O Google Earth é um software de globo virtual desenvolvido pelo Google. O software Google Earth fornece acesso a imagens de satélite e aéreas, batimetria oceânica e outros dados geoespaciais, como estradas e fronteiras, e seus dados descritivos, além de fornecer uma variedade de ferramentas, como simulador de voo e Street View.
O Google Earth usa o sistema de coordenadas geográficas (latitude e longitude) no elipsóide de referência do Sistema Geodésico Mundial de 1984WGS84 (World Geodetic System), através do Sistema de Posicionamento Global (GPS). As imagens do Google Earth não são uma única fonte de dados, mas uma integração de imagens de satélite com dados de fotos aéreas, contendo cenas de WorldView (2 m) , Quickbird (72 cm) , Landsat (30 m) e SPOT5 (6 m). Portanto , a resolução espacial e temporal das imagens do Google Earth não é uniforme, consistindo em cenas de alta, média e baixa resolução em diferentes datas e áreas do globo (Jasem; Al-Hamadani, 2020).
Portanto, de acordo com (Silva et al., 2022), a evolução das tecnologias relacionadas à geoinformação aumenta proporcionalmente o número de usuários que não são especialistas em cartografia, onde muitas vezes o cuidado com a qualidade posicional é esquecido. Consequentemente, faltam bases cartográficas nacionais, como destacam (Menezes et al., 2019) que em muitas regiões do Brasil sofrem com a falta ou inadequação do mapeamento cartográfico sistemático e as bases de dados existentes desatualizadas.
Atualmente, a validação da qualidade da informação cartográfica tem sido uma questão cada vez mais evidente e de grande importância (Jasem; Al-Hamadani, 2020; Goudarzi e Landrn, 2017). Com o surgimento da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (INDE) em outubro de 2007, proposta pelo Decreto Presidencial nº 6.666, de 27 de novembro de 2008, surgiram diversas especificações técnicas com o objetivo de regular e padronizar os inúmeros processos relacionados à produção cartográfica nacional. O padrão brasileiro de precisão posicional para dados espaciais é definido pelo Decreto-Lei nº 89.817 de 1984, de acordo com as tolerâncias definidas no Padrão de Precisão Cartográfica (PEC) e Erro Padrão (EP) (Brasil, 1984). Em 2010, a Diretoria do Serviço Geográfico do Exército Brasileiro (DSG) publicou as Especificações Técnicas para Aquisição de Dados Geoespaciais Vetoriais (ET-ADGV), documento vinculado à Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (INDE). Em um de seus tópicos, a ET-ADGV explica como deve ser aplicado o Decreto-Lei nº 89.817 e criou uma classe mais restritiva para produtos cartográficos digitais (PEC-PCD) (Santos et al., 2016; Brasil, 1984).
A avaliação do PEC-PCD em imagens obtidas pelo Google Earth é essencial para determinar a qualidade dos dados cartográficos produzidos, principalmente quando se trata de grandes escalas. A ausência de mapas atualizados nessa escala de representação, tem motivado a utilização de imagens gratuitas obtidas do Google Earth. No Brasil, a precisão planimétrica de produtos cartográficos digitais é frequentemente apresentada em termos do Padrão de Precisão Cartográfica para Produtos Cartográficos Digitais (PEC-PCD), onde as tolerâncias têm seus valores definidos com base na escala de avaliação de dados espacial e classe A, B ou C.
Muitos estudos utilizaram o PEC-PCD para avaliações relacionadas à precisão planimétrica de produtos cartográficos. Em estudos de (Zanetti et al., 2016) verificaram através da avaliação PEC-PCD que os dados advindos da platafroma online Basemap apesar de se enquadrarem na classe “B” para escala 1:10.000, apresentaram tendências no conjunto de discrepâncias posicionais, de acordo com a amostra feições pontuais. Os autores ainda indicaram que as ortoimagens possuem deslocamentos quanto as suas posições consideradas como referências, entretanto, uma simples translação pode corrigir este efeito sistemático.Já em (Oliveira et al., 2018), utilizando PEC-PCD, avaliaram produtos de fotogrametria digital a partir de imagens adquiridas com um VANT de asa fixa durante um voo sobre uma Usina Hidrelétrica (UHE) no Brasil. Enquanto (Elias et al.,2018) analisaram a qualidade posicional dos dados da plataforma Open Street Map (OSM) e utilizaram dados de um padrão de precisão cartográfica da mesma região para esta avaliação por meio do PEC-PCD.
Nesse contexto, este estudo tem como objetivo analisar a acurácia posicional planimétrica de imagens derivadas do software Google Earth para utilização na produção cartográfica, segundo a metodologia descrita pela Especificação Técnica para Controle de Qualidade de Dados Geoespaciais em áreas da zona rural e urbana do estado de Pernambuco.
2. Materiais e Métodos
2.1 Área de estudo
Neste estudo, duas áreas com características espaciais diferentes foram testadas para as análises posicionais, uma na área urbana e outra em uma área rural (Figura 1), no estado de Pernambuco, Brasil.
Na zona urbana, a cidade do Recife (Figura 1), capital do estado de Pernambuco, localizado na região Nordeste do país, possui uma área urbana com porção territorial de 6,87 km². Recife tem uma área de aproximadamente 218 km², formados por uma planície aluvial, tendo como principais características geográficas ilhas, morros, penínsulas e manguezais. Sua composição territorial é composta por 67,43% de morros, 23,26% de planícies, 9,31% de áreas inundáveis e 5,58% de Zonas Especiais de Preservação Ambiental.
A Figura 1 mostra a região em estudo para a zona rural nos municipios de Petrolina e Vertentes. O poligono do lote de amostras está localizado na divisa entre os municípios de Petrolina e Vertentes, no estado de Pernambuco, e possui uma área de, aproximadamente, 8,42 km². Petrolina tem uma área de 4.558,4 km² e tinha 349.145 habitantes no último censo. A densidade populacional é de 76,6 habitantes por km² no território do município (Figura 1). Dormentes é um município brasileiro do estado de Pernambuco. Segundo estimativas do IBGE para 2018, possuía 18.734 habitantes, distribuídos em uma área de 1.539.052 km², possuindo, assim, uma densidade populacional de 11,00 hab /km² (Figura 1). Esta região se localiza na unidade geoambiental da Depressão Sertaneja, unidade que é marcada por uma superfície de pediplanação muito monótona, sendo predominantemente suave-ondulada e atravessada por vales estreitos com vertentes dissecadas.
2.2 Dados de referência e amostragem no Google Earth
O controle de qualidade posicional foi obtido por meio de duas ortofotos fornecida gratuitamente pela COMPESA (Companhia Pernambucana de Saneamento), através do Programa Pernambuco Tridimensional (PE3D), abrangendo a totalidade das duas áreas de estudo no voo que ocorreu em 2011. A imagem possui resolução espacial de 5 cm e atende à classe A, na escala, e 1:1000, na PEC-PCD, georreferenciada no Sistema de Referência Geodésico (SIRGAS2000) e convertida para o Sistema de Referência Geodésico WGS84 no sofwatre QGIS 3.16.
Todos os produtos do Pernambuco Tridimensional passam por três etapas de validação: Análise de Completude, Análise de Consistência e Análise Estatística da Precisão Planialtimétrica. A precisão planimétrica das ortofotos e a precisão altimétrica do perfilamento a laser são analisadas por amostragem. As ortofotos atendem ao Padrão de Exatidão Cartográfica (PEC), referente à Classe A na escala de 1:1000 (PE3D, 2016).Os produtos podem ser dispobilizados através do endereço eletrônico: http://www.pe3d.pe.gov.br/.
Os pontos de controle utilizados na análise foram selecionados em locais de destaque como cantos de telhados, limites de pastagem, entre outros, obtendo-se um lote de amostras de 20 pontos aléatoriamente distribuídos para cada área de estudo (Santos et al., 2016). Com os pontos amostrais na imagem de referência e a descrição da localização correta, foram extraídas da imagem no Google Earth as coordenadas planimétricas dos mesmos pontos em uma escala fixa de 1:1000. Esta escala garante o reconhecimento de feições para que seja realizado o processo de seleção amostral. No momento da aquisição dos dados no Google Earth, o software datou as imagens para o mês de outubro de 2019, para a zona urbana, e fevereiro de 2020, para a zona rural.
2.2 Análise de Tendências
Em (Tomaselli, Monico e Camargo, 1988; Galo e Camargo, 1994), propõe-se uma análise estatística complementar ao procedimento do PEC, de forma a verificar a precisão e a existência de tendência na análise de medições de coordenadas planimétricas em cartas. A verificação de existência de tendências dos dados é feita usando a análise de exatidão. Esta análise consiste em verificar se a média das discrepâncias (diferença entre o valor da coordenada de estudo obtida no campo e o obtido na carta) pode ser considerada igual a zero (Carvalho e Silva, 2018; Merchant, 1982; Monico, 2009).
O procedimento comum adotado para a análise de tendência é aplicar o teste T de Student, que é adequado para a comparação de médias em um teste de hipóteses. O Teste T é qualquer teste de hipótese estatística, em que a estatística do teste segue uma distribuição T de Student sob a hipótese nula (Cramér, 1946). O teste T de Student é utilizado na comparação de dois grupos independentes. Para o teste T não pareado é necessário ter populações normalmente distribuídas e ambas as populações devem ter a mesma variância. É geralmente aceito que, se as variâncias dos dois grupos não diferirem em uma certa quantidade, essa suposição se mantém (Marques Junior et al., 2020). Assim, neste trabalho, foi realizado o teste de tendência com base no teste T de Student. No entanto, como requisito básico, a amostra deve seguir uma distribuição normal ou gaussiana, por isso foi realizado o teste de normalidade de Anderson-Darling. A estatística T para testar se as médias são diferentes pode ser calculada da Ecuação 1:
Aqui, m1 e m2 são os valores médios das duas amostras, Sp é a variância combinada calculada, n1 e n2 são os números de observações nos dois grupos, e T é distribuído de acordo com uma distribuição T, com (n - 2) graus de liberdade. Uma vez que o valor T e os graus de liberdade são determinados, um valor p pode ser encontrado usando uma tabela de valores de distribuição t de Student. Se o valor de p calculado estiver abaixo do limite escolhido para a significância estatística (5% foi adotado), então a hipótese nula é rejeitada em favor da hipótese alternativa (Mozas-Calvache, 2021). Dessa forma, foram avaliadas as seguintes hipóteses:
H0: Não há evidência de tendência entre o conjunto de dados.
H_a: Há evidência de viés no conjunto de dados
2.3 Precisão posicional planimétrica
Neste trabalho, foi abordada a avaliação da acurácia posicional, utilizando o padrão nacional definido pelo Decreto-lei n° 89.817, de 1984, aliado à Especificação Técnica de Aquisição de Dados Geoespaciais Vetoriais (ET-ADGV), implementada em 2011 (Brasil, 1984; DSG, 2011). A ET-ADGV é uma especificação técnica associada à Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (INDE), com intuito de padronizar e orientar o processo de aquisição da geometria dos vários tipos de dados geoespaciais vetoriais (DSG, 2011). Em um de seus itens, a ET-ADGV explica como deve ser a aplicação do Decreto-lei nº. 89.817 e cria uma classe mais restritiva destinada a produtos cartográficos digitais (PEC-PCD).
O Decreto-Lei nº 89.817, de 1984, (BRASIL, 1984) detalha o padrão brasileiro de precisão posicional para dados cartográficos analógicos (PEC) e, com adaptações ao PEC-PCD (para produtos cartográficos digitais), constitui-se o Padrão de Precisão (SEP) e tolerâncias de erro padrão (SE), definidas de acordo com as oito escalas de classificação (1:1000, 1:2000, 1:5000, 1:10,000, 1:25,000, 1:50,000, 1:100,000 e 1: 250,000) e as classes correspondentes A (melhor precisão), B, C e D (classificação intermediária).
Em 2010, o Serviço Geográfico do Exército Brasileiro (DSG) publicou o documento intitulado Especificações de Técnicas de Aquisição de Dados Geoespaciais Vetoriais (ET-ADGV) (DSG, 2016). Em 2016, foi publicada a Especificação Técnica para Controle de Qualidade de Dados Geoespaciais
(ET-CQDG) e para fornecer uma forma padronizada de avaliar a qualidade dos conjuntos de dados geoespaciais, que fazem parte do Sistema Cartográfico Nacional Brasileiro (DSG, 2016). Tanto as especificações técnicas da ET-ADGV quanto da ET-CQDG são complementares ao Decreto-Lei nº 89.817, que tem poder regulatório. Ou seja, para serem classificados em determinada escala e classe, os dados espaciais precisam considerar essas condições (Brasil, 1984; Santos et al., 2016).
Segundo Brasil (1984), Santos (2010) e DSG (2011), para que um produto cartográfico seja classificado quanto ao Decreto-lei 89.817, ele deve atender a duas condições:
(i) 90% dos pontos testados devem apresentar valores de discrepâncias iguais ou inferiores ao valor do PEC em relação à escala e à classe testada e;
(ii) o RMS (root mean square) das discrepâncias deve ser igual ou inferior à tolerância EP, definido pela norma (Tabela 1).
A Tabela 1 mostra as tolerâncias de erro em metros do PEC-PCD, discriminadas pelas classes A, B, C e D. Também mostra as tolerâncias EP, que está relacionada ao RMS, das discrepâncias posicionais dos pontos analisados em relação aos benchmarks (DSG, 2016).
A discrepância planimétrica (Dp), descrita pela Equação 2, é obtida pela resultante posicional entre as coordenadas de campo, ou referência (ER, NR), com as coordenadas do dado espacial em teste (ET, NT). Já o RMS das discrepâncias (RMS), é definido pela Equação 3.
3. Resultados
3.1 Análise Estatística Descritiva
A Figura 2 mostra a distribuição das discrepâncias dos pontos amostrais obtidos na área urbana.
Conforme mostrado no gráfico da figura 3, os erros encontrados nos pontos de controle variam de -1,27 m a 0,35 m na coordenada E, e -2,61 a 1,45, na coordenada N, obtendo uma dispersão posicional de 1,27 m. Em geral, como mostra a Figura 3, as discrepâncias em E foram menores que em N, com média de -0,45 (barra azul) em E, e -0,72 (barra vermelha) em N. Os desvios foram ligeiramente diferentes: 0,47 em E; 1,09 em N; e 0,7 posicional, com 4 pontos classificados como outliers (elipse verde), todos detectados na coordenada N. A Figura 3 mostra a distribuição das discrepâncias dos pontos amostrais obtidos na área rural.
Os erros encontrados nos pontos de controle variam de -6,94 m a -1,26 m, na coordenada E, e -3,18 a 4,62, na coordenada N, obtendo uma dispersão posicional de 4,65 m (Fig 4). As discrepâncias em E foram maiores que em N, com médias de -4,1 em E e 0,82 em N. Os desvios de padrão foram ligeiramente diferentes, sendo 1,6 em E, 1,82 em N e um desvio posicional de 1,22, com 4 pontos classificados como outliers (elipse verde). É válido observar um comportamento de erro sistemático na coordenada E, na qual todos os pontos apresentaram dispersões negativas, embora, na coordenada N, apenas 3 pontos tenham dispersões negativas.
3.2 Avaliação de tendencias
A aceitação no teste de normalidade nos permite afirmar com 95% de confiança que os dados se enquadram na distribuição normal baseada no teste de
Anderson Darling. Portanto, é correto afirmar que não foi encontrado desvio significativo da normalidade. A Figura 4 mostra os valores T calculados na avaliação do teste T de Student.
3.3 Avaliação de precisão
Para o teste de precisão, foi aplicado o padrão de precisão posicional descrito no Decreto-Lei nº 89.817/ET-ADGV, tomando como referência a escala 1:1000, no software Google Earth, e as avaliações nas escalas 1:2000, 1:5000 e 1:10.000. Os resultados dos procedimentos, utilizando a norma brasileira, são apresentados na Tabela 1, indicando que os dados obtidos pelo Google Earth atenderam às duas condições do Decreto-Lei 89.817/ET-ADGV, para as escalas de 1:5000, nas classes B, C e D, e 1:10.000 em todas as classes para a área urbana (Tabela 2).
PEC | ET-CQDG | 1:2000 | 1:5000 | 1:10000 | |||
PEC (m) | EP (m) | PEC (m) | EP (m) | PEC (m) | EP (m) | ||
- | A | 0,56 | 0,34 | 1,4 | 0,85 | 2,8 | 1,7 |
A | B | 1 | 0,6 | 2,5 | 1,5 | 5 | 3 |
B | C | 1,6 | 1 | 4 | 2,5 | 8 | 5 |
C | D | 2 | 1,2 | 5 | 3 | 10 | 6 |
Fonte: autores (2022).
Escala | Classe | ET-CQDG | %id(abs) < PEC | RMS<EP | Resultado |
1:2000 | - | A | 15 | Falhou | Reprovado |
A | B | 45 | Falhou | Reprovado | |
B | C | 80 | Falhou | Reprovado | |
C | D | 85 | Falhou | Reprovado | |
1:5000 | - | A | 65 | Falhou | Reprovado |
A | B | 90 | Passou | Aprovado | |
B | C | 100 | Passou | Aprovado | |
C | D | 100 | Passou | Aprovado | |
- | A | 100 | Passou | Aprovado | |
A | B | 100 | Passou | Aprovado | |
1:10000 | B | C | 100 | Passou | Aprovado |
C | D | 100 | Passou | Aprovado |
Fonte: (autores, 2022)
De acordo com a Tabela 1, para que o produto cartográfico seja classificado na classe D, ele deve ter um Erro Padrão Planimétrico máximo de 1,2 m, um Padrão de Precisão Cartográfica 2m, planimétrico na escala de 1:2000. Nos cálculos realizados para essa área de estudo, foi encontrado um RMS de 1,43 m (maior que o valor de EP), e 85% do conjunto de erros planimétricos foram inferiores aos previstos para o PEC-PCD. Portanto, para a escala 1:2000, não houve ajuste nos parâmetros do PEC-PCD, resultando, assim, em sua reprovação para todas as classes.
Observase na Tabela 2, análise realizada na escala de 1:5000, que o produto não atendeu à classe A e sim às classes B, C e D. Na classe A, o erro padrão foi menor que o RMS (0,85 > 1,43) e 65% dos erros foram menores que o valor do PEC (1,4m) (Tabela 1). Em contrapartida, na classe B, o EP foi totalmente maior que o RMS (1,5 > 1,43), e 90% dos erros foram menores que o PEC (2,5 m). Portanto, o produto atendeu às especificações PEC-PCD em 1:5000, e seu mapeamento é tolerável do ponto de vista planimétrico apenas nas classes B, C e D.
O conjunto de dados planimétricos obtidos pelo Google Earth atendeu a todas as classes na escala de 1:10000, na qual 100% dos erros foram inferiores aos valores previstos para os parâmetros do PEC-PCD, e os EP's foram ligeiramente maiores que o RMS, possibilitando o uso de dados posicionais do Google Earth nessa escala. Para as áreas rurais, a Tabela 3 resume a avaliação da precisão de acordo com a regulamentação do Decreto-Lei 89.817/ET-ADGV.
Escala | Classe | ET-CQDG | %id(abs) < PEC | RMS<EP | Resultado |
1:2000 | - | A | 15 | Falhou | Reprovado |
A | B | 45 | Falhou | Reprovado | |
B | C | 80 | Falhou | Reprovado | |
C | D | 85 | Falhou | Reprovado | |
1:5000 | - | A | 65 | Falhou | Reprovado |
A | B | 90 | Falhou | Reprovado | |
B | C | 100 | Falhou | Reprovado | |
C | D | 100 | Falhou | Reprovado | |
- | A | 100 | Falhou | Reprovado | |
1:10000 | A | B | 100 | Falhou | Reprovado |
B | C | 100 | Passou | Aprovado | |
C | D | 100 | Passou | Aprovado |
Fonte: autores (2022).
Para a área rural, o RMS em E foi de 4,39, em N foi de 1,96, e o RMS posicional, 4,8. Para a escala 1:2.000, os erros padrão (EP), para as classes A, B e C, foram 0,6; 1 e 1,2; e para a escala 1:5.000: 1,5; 2,5 e 3, respectivamente. Como os valores de EP foram consideravelmente maiores que o RMS posicional, a análise de precisão planimétrica de base rural falhou em ambas as classes. Além disso, na escala 1:2000, em todas as classes, nenhum dos pontos apresentou valores iguais ou inferiores aos esperados para o PEC-PCD, assim como para a classe A, na escala 1:5000. As classes B, C e D, para uma escala de 1:5000, apenas 5%, 35% e 60% apresentaram valores iguais ou inferiores aos esperados para o PEC-PCD e, consequentemente, não garantem sua qualidade.
Pode-se observar na Tabela 3, referente à área rural na escala 1:10.000, que o produto não atendeu às classes A e B, mas atendeu às classes C e D. Na classe A, o RMS foi superior ao esperado no PEC (2,8 < 4,8), e 5% dos pontos foram iguais ou inferiores aos valores de EP. Na classe B, o RMS foi inferior ao EP (5 > 4,8), porem 60% foram iguais ou inferiores aos valores do EP. As classes C e D nesta escala foram aprovadas, pois o RMS foi totalmente inferior ao EP (8 > 4,8), (10 > 4,8), respectivamente, e 100% do conjunto de dados foi igual ou inferior aos valores do EP, o que permitiu o uso de dados posicionais do Google Earth , na escala 1:10000.
4. Discussão dos resultados
Os erros apresentados nas Figuras 3 e 4 podem estar atrelados a distorções angulares existentes comumente encontradas em dados de satélites orbitais (formando o sistema de exibição do Google Earth), e a menor resolução espacial disponível na área, conforme detalhado em (Goudarzi; Landrn, 2017). Contudo, apesar das discrepâncias encontradas, as comparações entre médias, por meio do teste T bicaudal, produziram um valor de p de 0,43 e 0,48 com um intervalo de confiança de 95%, o que mostra que não há evidências para rejeitar a hipótese nula. Em outras palavras, estatisticamente, o conjunto amostral não apresenta diferenças significativas nos pares de coordenadas planimétricas (Mners, 2009).
No geral, observa-se uma maior dispersão com os dados de referência na zona rural. Esse comportamento pode estar relacionado à variabilidade da precisão posicional das imagens do Google Earth, que não é a mesma em todo o mundo, uma vez que a plataforma utiliza uma junção de diferentes fontes de imagem. Por outro lado, outro motivo dessa dispersão pode estar relacionado a uma melhor qualidade das imagens Google Earth em áreas metropolitanas, uma vez que são atualizadas com mais frequência (Goudarzi e Landrn, 2017).
Conforme descrito em (Potere, 2008), esta análise geoespacial remove um grande obstáculo para o uso de imagens Google Earth em aplicações científicas, mas as resoluções espaciais, atributos espectrais e qualidades temporais do arquivo Google Earth permanecem descaracterizados. A natureza aberta do arquivo Google Earth possibilita a criação de ferramentas de mineração de dados que permitem mapear as propriedades espaciais e espectrais de todo o arquivo, mas não há oportunidade semelhante de reduzir incógnitas temporais. As imagens obtidas pelo PE3D fazem parte de um voo realizado nos anos 2010/2011, o que pode resultar em prazos incompatíveis na aquisição de imagens do Google Earth , apesar de todos os pontos de teste e referência terem sidos previamente selecionados com base na dinâmica espacial correspondente à aderência temporal entre o conjunto de dados.
Em estudos de (Silva e Nazareno, 2009) avaliaram a acurácia posicional de imagens do Google Earth, no município de Goiânia/GO, por meio do teste do Qui Quadrado, do que resultou a classificação da acurácia posicional como classe A, para a escala 1/5.000. Foi identificada uma tendência no produto, e o deslocamento foi corrigido a partir de uma subtração da média das discrepâncias calculadas para cada uma das direções, Este e Norte, pelas coordenadas obtidas nas imagens. Em (Oliveira et al., 2009) avaliaram um mosaico elaborado pela captura de cenas disponibilizadas pelo Google Earth, para todo o município de São Leopoldo/RS. Os autores utilizaram o teste do Qui-Quadrado para a avalição da precisão e o teste t de Student para a exatidão e concluíram que, para a região de estudo, as imagens não apresentaram tendências e eram compatíveis com a Classe B para a escala 1/15.000. Já (Soares et al. 2010) avaliaram imagens do Google Earth para a zona urbana de Pato Branco/PR, através do teste do Qui-Quadrado. O produto teste apresentou tendência e foi compensado, resultando em um padrão classe A para a escala 1/30.000. Destaca-se que o processo de validação dos trabalhos citados foi baseado na análise das discrepâncias entre as coordenadas obtidas através de receptores GNSS e aquelas obtidas nas imagens do Google Earth.
Os estudos de (Lopes, 2009) avaliou a qualidade posicional e geométrica das imagens de alta resolução disponibilizadas pelo Google Earth, para o município de Barbacena/MG. Utilizou-se como referência uma base de dados municipal na escala 1/2.000, onde comparou 12 pontos de checagem. Os resultados indicaram a fidelidade geométrica de imagens do Google Earth, em comparação ao mapeamento do município de Barbacena, porém apresentaram tendência na avaliação. Para classificação da imagem, o autor utilizou como base o erro de grafismo (0,2 mm), por meio do qual encontraram uma escala de aproximadamente 1/50.000. Em estudos de (Menezes et al.,2019) os autores observaram que o mosaico das imagens disponibilizadas pelo Google Earth, compreendendo uma área de 268,39 km² da região de Paula Cândido/MG e após correção dos efeitos sistemáticos, apresentou uma classificação compatível com a classe A (PEC-PCD), para a escala 1/25.000, e com a classe B (PEC-PCD), para a escala 1/10.000, conforme o padrão brasileiro de acurácia posicional, estabelecido no Decreto n° 89.817 (Brasil, 1994) e na ET-CQDG (DSG, 2016). Os autores ainda indicaram a possibilidade de verificar que as imagens e dados advindos do Google Earth apresentaram tendências no conjunto de discrepâncias posicionais, fazendo-se necessário a correção delas, por meio da aplicação de translação, corrigindo o efeito sistemático presente. Enquanto (Araújo Júnior et al.,2021) revelaram que qualidade do mapeamento usando dados da Google Earth varia de acordo com o local; no entanto, evidências indicaram que a precisão no posicionamento horizontal das imagens é adequada para trabalhar com escalas pequenas e médias. Por fim os autores indicaram o o uso das imagens da Google Earth para vetorização de estradas desde que haja uma avaliação in loco de suas condições.
Finalmente, as precisões mostradas neste estudo podem ser usadas com sucesso para derivar mapas planimétricos com escalas médias e pequenas, assim como podem ser aplicadas em grandes escalas, com certas precauções. As imagens do Google Earth têm uma mudança de posição quase sistemática. Por outro lado, o Google Earth representa uma fonte poderosa e atrativa de dados posicionais que podem ser utilizados para investigações e estudos a priori com escala adequada e de baixo custo. A precisão posicional do Google Earth não é fixa, conforme mostrado neste estudo, mas varia de tempos em tempos, já que o processo de atualização do Google Earth pode substituir as imagens originais por imagens de resolução mais alta.
5. Conclusões
A disponibilidade de dados posicionais oferecida pelo Google Earth, que faz com que usuários de diferentes classes os utilizem, também incentiva pesquisas que atestam e avaliam sua precisão. Por isso, a presente pesquisa apresenta uma avaliação geral da precisão posicional planimétrica das imagens do Google Earth em uma determinada área de estudo.
A precisão horizontal das imagens online do Google Earth para uma área urbana da cidade do Recife atingiu uma discrepância posicional média de 1,26 m e um RMS de 1,43. Atendeu às classes B, C e D na escala 1:5.000 e Classe A na escala 1:10.000 conforme especificações PEC-PCD. Essa acurácia pode ser usada com sucesso para gerar mapas planimétricos de média e pequena escala. Porém, para grandes escalas, alguns cuidados são necessários, principalmente para escalas maiores que 1:5000. O gráfico apresentado na Figura 3, por exemplo, permitiu mostrar que os dados do Google Earth apresentam erros quase sistemáticos, com as menores discrepâncias na coordenada E.
Esses valores são consistentes como mostra muitos estudos e pesquisas anteriores, mas não podem ser generalizados para serem válidos e aplicáveis em outras regiões. Uma análise com maior número de amostras, distâncias e locais com relevo menos acidentado também pode ser necessária. A metodologia desenvolvida nesta pesquisa pode ser adaptada para outras regiões sujeitas à disponibilidade de pontos geodésicos tão precisos e permanentes com visibilidade clara nas imagens do Google Earth.
No geral, o Google Earth representa uma poderosa fonte de dados posicionais que podem ser usados para visualização, pesquisa e estudos preliminares com acurácia adequada e de baixo custo computacional e comercial. O onipresente serviço Google Earth é possivelmente o serviço de Internet mais popular e usado com frequência que fornece acesso gratuito à coleção global de imagens de satélite.